PSICOGRAFIA DO "ESPIRITO DE UM EX-SENHOR DE ENGENHO", CONTANDO TODO SEU SOFRIMENTO NO ALÉM.
Estou aqui quase dois séculos e ainda hoje não consigo me perdoar de todas as maldades que fiz.
PSICOGRAFIA DO "ESPIRITO DE UM EX-SENHOR DE ENGENHO", CONTANDO TODO SEU SOFRIMENTO NO ALÉM.
Estou aqui quase dois séculos e ainda hoje não consigo me perdoar de todas as maldades que fiz. Fui um rico dono de várias fazendas, muitas terras, muitos escravos. Era temido por todos, respeitado e também muito odiado e até hoje existem negros, ex-escravos que não conseguem me perdoar. Na minha principal fazenda, onde eu residia com a minha família eu tinha muitos, muitos escravos, e como “dono” de todos aqueles seres teria eu, hoje sei disso, que ter ajudado a quantos viviam sobre o meu domínio.
Tratava aquelas pobres criaturas com mãos de ferro, tinha prazer de tratá-los com crueldade, me comprazia enormemente com isso.
Gostava de ver aqueles mais rebeldes serem castigados, terem suas costas abertas em feridas, aquilo me deixava feliz, pra mim eles não tinham alma.
As negrinhas da minha senzala eram todas abusadas por mim, quantas infâncias eu destruí.
Gostava de ver os pais daquelas pobres crianças assistindo toda a minha maldade e os mais atrevidos eram mortos sem pena, afinal era só um a menos em meio a tantos escravos.
Pratiquei as maiores crueldades que um ser humano pode praticar.
Meu Deus como me envergonho!
Mas vou dizer, preciso dizer. Quando descobria que as moças abusadas por mim esperavam uma criança eu nem me importava em pensar o que fazer, a ordem era a mesma para todas. Ao darem a luz, o capataz, homem igualmente ruim, pegava o recém nascido e enterrava vivo, muitas vezes sobre o protesto louco de suas mães, outras já tão sofridas com toda a humilhação nem se importavam, ficavam inermes vendo toda aquela barbárie.
Eu não podia me comprometer, odiava os negros, como explicar que gostava de me deitar com as jovens negrinhas da minha senzala?
Antes que alguma suspeita pudesse recair sobre mim eu eliminava a prova. Matei muitos filhos, sou um assassino cruel, matei meus próprios filhos.
Oh meu Deus que dor sinto agora, o que fazer para corrigir tantas maldades? Vivo atormentado, ouço choro de recém nascidos, esse som não para nunca, vejo mulheres a me acusar de assassino, homens a me xingarem.
Vivo num tormento sem fim.
Desespero, desespero e desespero é isso o que eu sinto, a vergonha de mim mesmo, a dor de ver como num ato contínuo todas as minhas maldades como um filme que não tem fim.
Hoje sou um pobre maltrapilho, um monstro sem face, preciso de ajuda, mas não consigo pedir, a vergonha não deixa, sofro a dor de todos os que eu fiz sofrer.
Se alguém ler essa narrativa e se sensibilizar com o sofrimento que causei aos meus irmãos, sim meus irmãos, aquelas pobres criaturas que eu tanto fiz sofrer são sim meus irmãos, peço que orem por eles, para que eles possam me perdoar, não por mim, pois que eu não mereço, mas por eles que sofrem terrivelmente até hoje por não me perdoarem, vivem igualmente a mim presos nas trevas do ódio e da vingança.
Ajude-os com suas orações, peçam a Jesus por eles?
Quanto a mim? Não mereço nada, nem o sofrimento de quase dois séculos paga a metade do que fiz sofrerem os outros.
Me desculpe fazer com que leiam coisas tão cruéis, mas precisava desabafar e pedir pelos os que fiz tanto mal.
Um ex-senhor de engenho.
Um pobre ser reduzido a nada pela própria consciência culpada.
Médium: Débora S C.
-Antonio Carlos Piesigilli