segunda-feira, 31 de outubro de 2022

Enquanto Eu ainda aqui Estiver

 

Enquanto Eu ainda aqui Estiver


[ Reedição ] 

A VERDADE

  Irmãos, o que é a verdade? O Grande Mestre calou-se diante de seu inquiridor. O santo silêncio calou a voz do cordeiro. Esse mesmo silêncio cala também nas almas reflexivas de quem somente consegue responder a si próprios e não ao mundo. Cada personalidade é um mundo e cada mundo detém a prístina verdade. E a verdade não está escondida, mas diante do brilho de cada olhar das almas abastecidas. E ela brilha de tal forma que não consegue ser penetrada por olhos de não ver. Por isso, Jesus calou-se diante de Pilatos. Pois o que as palavras diriam a Pilatos quando os olhos dele não conseguiam ver-se e nem a alma sentir-se? Não creiais, irmãos, que descumpro tal parâmetro. Não seria sensato nem digno assim me representar diante de vós. Quem sois, então, e o que pretendeis com essa busca de comunhão de ideias: acaso todos desconhecem que a verdade está tão clara e distinguível tanto quanto esteja ela encoberta?  

   Sim, irmãos, inúmeros de vós tendes conhecimento de que a verdade encontra-se indelével em cada um e a cada um se revelará em porções definidas quando os degraus forem galgados conscientemente. Pois cada alma, cada ser reencarnante que desceu a esta Terra veio pela sabia vontade do Pai trazendo no imo Sua Presença. E se a Presença do Pai está no imo de cada um então ali está a mais pura verdade. Entretanto, é lícito reconhecer que inúmeros ainda dormem e não despertaram em tempos após tempos, por isso não veem e nem sentem.

  Mas não vós, irmãos, a quem me dirijo diretamente, e que possuís a vossa verdade cunhada na intenção e nas boas e conscientes obras. Por que esta verdade é visível e sensível a todos os que fazem como vós, não importando o modo como façais uma vez que estais viventes na presença espiritual que é uma só. Pois a verdade no imo é viva e bebível como são as águas do regato que correm cristalinas nesta ou naquela direção. E a isto sabeis por intenção própria e pessoal, por vocação ou amor. No entanto, que a vossa verdade seja sempre das águas cristalinas que se movam diariamente, que nunca estacionem e nem se descumpram ante o tronco que lhes atravessa o caminho, e nem se deixem seduzir por um falso e narcísico brilho delas mesmas refletido. Mas sendo essa a sedução, a verdade ora cálida, morna ou refrescante deixará então de vos ser fluente e como águas barradas na nascente secarão em seu próprio leito.

  Em mim, irmãos, pulsa também a verdade que veio sendo buscada na consciência desde tempos remotos nesta Terra de Gaia. Quem sou, perguntais, e vos respondo. Sou como vós irmãos da criação, aquele que tem na sua trilha de milhões de anos sua própria história, a minha história. Em quem a verdade antes não habitante de meu ego, hoje pulsante em mim a cada batimento de meu coração, rebrilha aos meus olhos: essa, a verdade que se mostra cada vez mais claramente, que não precisa de declarações formais para sua real identidade, bastando ouvi-la e vive-la. Sim, eu sou aquele que visitou esta Terra centenas de vezes, que com ela misturou-se; um Adão terreno que viveu pelo sopro do Criador, como o múltiplo Adão que ainda vive no seio de toda a humanidade crendo-se o conhecedor. Mas não sou somente esse; vós não sois somente ele. Nele estais, nele respirais, nele viveis no âmbito de vossas ações e pensamentos terrenos, e, no entanto, entendais bem, não sois ele – não somos mais ele! Esse Adão de tantas vidas, tantas encarnações, tantas Evas de si mesmo viveu as ilusões, nasceu de diferentes ventres, renascendo sempre.

   Sejamos objetivos: cada personalidade é um Adão, uma Eva, aprendizes no finito do espaço-tempo, em cujos íntimos a verdade incondicionada e irrepreensível ainda não reverbera, mas aguarda, se oculta, oferece-lhes o campo e as analogias. Disse o Mestre: Eu Sou o Caminho, a Verdade e a Vida e ninguém vem ao Pai a não ser por Mim. Esse Sou eu – o Eu Sou – e esse Sois vós.

  Agora as imagens se ampliam, alternam-se os parâmetros e penetramos através de outros corredores. Se eu não sou somente esse, mas também aquele, então a verdade estará naquele e não nesse? Por que terei eu vivido tanto e tantas vezes nesse e não somente naquele? Será então a minha verdade tão zelosamente guardada, um modus vivendi interior enganoso e falso?

  Dir-vos-ei irmãos do modo como posso. Somos esse Adão-Eva terrenos e também aquele a quem o Mestre se referiu. Ele é o Cristo, o Cristo está nele; ele é Jesus e ao mesmo tempo Cristo, dois em um e um em dois. Jesus é o conhecedor, Cristo é a sabedoria, a verdade e a vida. Ele disse, ele confirmou várias vezes.

  Então, a verdade está Nele e não em Adão-Eva. Esses nascidos de ventres terrenos são os aprendizes, detêm suas verdades através de centenas de encarnações; são feitos do pó, da terra, são projeções, não são do espírito infinito; são volúveis, corrompíveis e corrompedores; assim já disseram tantos profetas. Porém, a verdade dos que se redimem, que ainda vivem no plano terreno, é aquela que avança em direção a Jesus, o conhecedor, e miram Cristo, a estrela de luz inefável. Jesus são os degraus da luminosa escada da ascensão; mas não iguais aos degraus de Jacó, o empreendedor de outros tempos, o pai dos doze, aquele que veio antes para povoar as almas e não ainda para ser o Salvador.

  Desse modo, todas as verdades que vêm de Adão-Eva mesmo em remissão dos erros são somente as diversas faces, as projeções na personalidade, nas suas emoções, creiais nisso e não vos deixeis enganar. Porém, somente serão definitivamente límpidas e transparentes como o riacho de águas cristalinas, quando forem qual Jesus em vós: uma única e perfeita vertente do começo ao fim. E se a isso não credes em vossos íntimos, pelas vossas presunções, o filho do homem não herdará a terra e não alcançará a mansidão de Jesus; esta somente vos descerá e vos possuirá pelo conhecimento da verdade que purifica e pelas constantes práticas do amor que redime.

  Jesus disse; conhecereis a verdade e a verdade vos libertará. Sim, ele disse, mas não ensinou que devíamos procura-la fora por que a verdade é ele próprio, a via interna, o conhecimento real que leva à sabedoria e a sabedoria que leva à libertação. Reflitamos: digo-vos que a verdade é uma só, mas as nuances são diversas, os gostos são vários, as ações numerosas e os enganos humanos ainda muitos. Pois o espírito de Deus é uno e está em todos, como o imenso exército de almas que pululam pela Terra em febris atividades, que também é uma só, uma só alma. Como pode isso? Sim, irmãos, somos personalidades nesta Terra, mas vive em nós a Chama de Deus-Pai e a alma da Deusa-Mãe e todos são um só. E embora o espírito seja um com tudo e a alma em todos esteja, em vossas qualidades e aparências, as personalidades Adão-Eva em vossos íntimos ainda debatem-se levando a enganos.

A PRESENÇA

   Disse Jesus: Em verdade, em verdade eu vos digo; antes que Abrão existisse, Eu Sou. Que misteriosas palavras proferira o Mestre! Sabeis muito bem, irmãos, que os mundos detêm idades astronômicas. Sistemas solares dissolvem-se, mundos são de novo habitados e universos se expandem. Abraão é referido como o pai da humanidade. Teria nascido em Ur na Caldéia há 2000 anos a.C., portanto muito antes de Jesus e nem por isso o Mestre deixou de citá-lo como um marco na vida semita. Diz a lenda que Melquisedeque de Salem, no papel de uma encarnação de Deus na Terra, profetizara-lhe que a descendência dele, Abraão, contaria mais do que as estrelas no céu.

  Credes, irmãos, em Deus, na encarnação de almas e em seus retornos a esse mundo ora para expiar os seus erros ora para reaprender lições ou continuar em seus avanços em direção e volta ao Criador? Sem dúvida. Não fosse assim, a vida vos soaria sem o menor sentido! Como entender tantas coisas sem a reencarnação e ainda assim crer num Deus Todo-Poderoso criador de tantas belezas, tantos amores e tantas perfeições, mas insensível à dor, à miséria, à maldade e aos crimes hediondos grassantes a solto nesta Terra? Neste contexto vazio, a nós, almas experientes, não haveria a menor lógica em sermos religiosos, esotéricos ou seguirmos ideias disciplinadoras de homens inspirados. Inspirados por quem? Intelectuais, poetas, artistas e homens de ciência ainda se revelam simplesmente ateus por que a realidade de Deus não lhes sensibiliza, não encontra ecos em seus íntimos – oh, que lástima! Quanto mais a existirem aqueles que professam um Deus, mas que não admitem a clara e lógica revelação da reencarnação. E as religiões, por isso, pagam também o preço do ateísmo por consequência de um Deus severo e seletivo.

  Irmãos de toda uma nação de espíritos que para esta Terra viestes, saibais o quanto lutastes por remover a destruição das legítimas pregações de nosso senhor Jesus Cristo que guardastes em vossas mentes e corações. Quantas de nossas cabeças rolaram; quanto os malignos travestidos de discípulos do Mestre, ostentando tremulantes estandartes com a divina cruz estampada e portando insígnias sacrossantas em seus peitos, nos trespassaram com suas lanças e espadas polidas, ou nos imolaram em praças públicas com pedras ou com o fogo que a eles mesmos não purificaria. Lembrai-vos dos primeiros cristãos que fomos – os crucificados ou devorados pelos leões – e das incansáveis perseguições dos adoradores do politeísmo deturpado, das usurpações pelos padres dos sagrados direitos cátaro-albigenses e de inomináveis mortandades a que fomos vitimados. Sim, lá estávamos, lá estivemos a oferecer nossas vidas em sacrifícios extremos de amor ao Deus Criador e a seus profetas.

   Quantos saberes os malignos entranhados nas almas sacerdotais não conseguiriam destruir na religião, se a revelação da lei da reencarnação não houvesse sido suprimida. Saberes que hoje haveriam de emoldurar suas escrituras! Faraós outros sabiam, Akhenaton sabia, Moisés sabia, Buda sabia, Jesus sabia. No entanto, foram divergidos os textos que a isso se referiam. Homens, o quanto deveis ainda aos vossos irmãos por terdes ocultado ou desfigurado esta e outras verdades esclarecedoras, e, juntamente aos malignos a quem elegestes por mestres, também enganastes a respeito de Deus e Seus divinos propósitos!

  Entretanto, a Presença, o Eu Sou revelado aos eleitos foi também revelado ao mundo profano pelas pregações do Mestre há dois milênios. O Eu Sou é exatamente Deus em nós, em todas as almas encarnadas; é a Vida Criadora que está muito além do espaço-tempo e da personalidade Adão-Eva. EHYEH ASHER EHYEH: EU SOU O QUE EU SOU eis a tradução cabalística de todos os tempos, antes mesmo de Jesus, Moisés, de Abraão, Noé, ou do Adão bíblico e de todos os personagens da magia de povos mais antigos.

  Acreditais que na Lemúria, há milhões de anos, já raças tinham conhecimento deste poder secreto em cada ser, em cada vida humana? E que a própria linguagem verbalizada existia com muito menos vocábulos e articulações sonoras, e que ainda assim grandes revelações hoje não compreendidas pelos estudiosos do ser espiritual foram simplesmente vivenciadas com inofensiva naturalidade? Isso mesmo, irmãos, nada é novidade no Deus Criador. Todos os Seus segredos sempre foram nossos por sermos eternos e existirmos como partículas de Seu Ser. Somos Suas chamas que Ele manifesta e depois as recolhe para o Seu íntimo sem nunca terem deixado de Nele existir.

  Quem vos disse que somos produtos híbridos de raças estranhas descidas na Terra? Essa afirmação é falsa da maneira como é dada. Raça alguma alienígena detêm a condição de criar almas e espíritos na acepção única da imortalidade. Criaram corpos? Mas não a grande humanidade; não Almas, não Espíritos, não Chamas Divinas! Aqueles não herdarão a Terra, pois não serão filhos do Criador.

  Tendes ainda dúvidas, irmãos, pela propaganda habilidosa de tantos falsos criadores que dizem terem vindo de outros universos ou sistemas solares para nos criar e ensinar? Somos bilhões de almas e espíritos trazidos para a Terra por ordem do Criador a seus Hierárquicos e Nele sempre estivemos. E haveremos de reconhecer a todos os prepostos do Criador, e somente a eles, quando o momento se eleger.

  O quanto tenho orado e clamado para que a Presença permaneça em mim, em vós. Ele disse: ninguém vem ao Pai a não ser por mim. Ele também é a Presença, o Cristo, a Chama Imortal que jaz em todos os espíritos – nas Mônadas. Atrai-a diariamente às vossas consciências de egos! Pois a Presença sempre esteve latente e poderosa em todos esses filhos do mesmo Pai. Ela é impessoal, é uma só multiplicada bilhões de vezes e tantas outras vezes se multiplicará quantas sejam necessárias. Irmãos, creiais nela, nessa Chama Elétrica que contem todos os segredos do Criador. Ela está em vossos mecanismos biológicos como está em vossos mecanismos de matérias mais sutís. A Presença é uma Chama de pura Inteligência, é um Fogo Sagrado, é Deus, e Deus é um Fogo Criador, o mundo é um Fogo que arde interiormente em todas as qualidades e atributos da Inteligência!

  Vistes que todas as coisas criadas são formadas de camadas celulares, moleculares e eletrônicas. As circunvoluções dos elétrons, em prováveis desenhos a que chamais de átomos, produzem novas frequências quando elétrons saltam de suas órbitas. E quando elétrons se chocam explodem em luz e calor. Eis ali o Fogo Divino transmutado em novas energias sob formas infinitesimais, porém poderosas, a despeito de suas micro divisões. E eis essa mesma Presença da energia do Criador em vós, em mim, em todas as coisas viventes.

  Olvidais que somos seres bioelétricos? Bem mais que isso, somos também formações cujas atomicidades nos fazem seres superiores, não por que sejamos mais avançados que os animais, as plantas ou os cristais, que na verdade o somos, porém pelos teores de nossas consciências que a tudo podem penetrar e de tudo auferir. E este saber está na Vontade do Criador que por nós vem buscar a generalidade e a especialidade de todas as coisas por Ele mesmo criadas.

 Soa-vos anátema? Incongruência? Paradoxo? Oh, não irmãos! Pois o Criador, sendo também a Presença, o que a Ele valeria estar em nós sem uma nomeação para algo realizarmos na Terra?

  Irmãos, mediante isto, avancemos mais ainda em nossas reflexões, nesse aparente paradoxo para que entendamos e realizemos conscientemente sob égides de leis cósmicas. Pois, se somos a Presença e a Presença é Ele – que é toda sábia – qual é realmente o sentido de nossas experiências nos mundos, nos sistemas solares, na Terra, naquilo que Ele já criou? Evidentemente que experienciamos de Sua própria criação. Mas, na verdade, o objetivo é ainda maior, mais fantástico e estimulante, porém inescrutável ainda na sua essência para nossas mentes aprendizes. Então, deixemos que a sábia Presença faça e realize em nós e por nós, e assim saibamos de uma intensa e monumental corrente vibratória a ressoar e realizar por todo nosso sistema solar em todas as suas dimensões.

  Simples assim? Não tão simples, mas é o enigma que nosso cogito precisa deslindar.

O CONSOLADOR

 Jesus disse: Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco. O Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito.

  Enigmáticas palavras não? Por que teria Jesus dito tais coisas aos seus apóstolos e seguidores? Irmãos, o quanto a história já testemunhou dos grandes emissários de Deus! Zaratustra, Krishna, Akhenaton, Moisés, Buda e o que permaneceu intocável de suas palavras nas dobras do tempo terreno? Escritos post-mortem foram interpretados de muitas maneiras, adulterados ou sepultados. O quanto sabemos realmente por Eles através de um legado original? As resenhas sobre dois dos mais recentes avatares que desceram a Terra, Buda e Jesus, nos demonstram isso. O budismo transformou-se. A filosofia do Sakyamuni ganhou muitas ramificações, diversos cognomes, várias inserções, numerosos pergaminhos e nenhuma biblioteca completamente fiel e inatacável. O cristianismo documental passou a ser reunido e elaborado bem depois da partida física de Jesus, mas até hoje achados de antigos papiros, submersos em cavernas ou criptas, desmentem trechos das suas mensagens tidas como originais e apontam capítulos e revelações omitidos. O quanto se tergiversou, irmãos, já dissemos isto.....

  Sabeis das vicissitudes dos historiadores crentes, das suas lutas e mortes a fim de conservar algumas das fontes fidedignas dos santos homens seguidores de perto dos Avatares. Os mesmos malignos de sempre brotaram da terra para insuflar homens sem almas e sem direção, a clamar pela destruição. Infiéis misturaram-se aos fiéis e com denodo e notada tenacidade conseguiram sempre divergir, demolir e erradicar. Pobres homens sem visão que facilmente embaraçaram-se nas teias dos malignos.

  Sabeis, irmãos, que em algum tempo do passado, em vidas esquecidas de vossas memórias conscientes, o medo imperou e vos fez odiar e não amar. Esse medo vos aterrorizou desde a infância, aterrorizou aos vossos pais, maculou vossas inocências, vossos sabores naturais pela vida, pelas belezas que o Criador nos legou a todos gratuitamente. Cegastes-vos à candura, ao melífluo, ao perfume dos verdadeiros deuses, aos sonhos de um mundo de felicidade. Esse mesmo medo remeteu-vos a outro passado como uma pedra lançada ao negro abismo, que batendo bem fundo despertou-vos dos tempos de Baal e recrudesceu em vós as vossas memórias inconscientes. Lá sucumbistes aos vossos inimigos poderosos, às suas hipnoses e ameaças. Pois esta mesma submissão ao medo já a tivésseis há milhões de anos no belo continente de Atlântida onde vossas aflições começaram, e onde os malignos adoradores também vos sacrificaram em pavorosos rituais sangrentos até retirarem de vossos peitos os corações ainda palpitantes. Oh Deus!

  O tempo avançou em seus sistemáticos giros, em sua roda inflexível e inexorável deste mundo de vida terrena. Os Avatares vieram e se foram; aqui estivemos e ainda estamos. De todos ouvimos. Duvidais, bem eu sei irmãos em Cristo, de que vossas almas registram as mais sublimes verdades ensinadas pelos iluminados. Vossas mentes terrenas não podem testemunhar essas memórias, vossos intelectos não são o suficiente claros por si sós para de novo apreendê-las. Em muitas instâncias vossos intelectos são meramente vossos inimigos.

  Grandes homens venerados segundo o mundo não foram mais que verdugos de si mesmos, de suas próprias almas, de seus irmãos de criação. Tornaram-se surdos aos mais dignos e procedentes clamores de seus íntimos; secaram a fonte aluminífera que brotava calor interno; tornaram-se opacos e frios e usaram seus intelectos desenvolvidos unicamente ao serviço dos poderes da matéria.  Como necessitam de vós que vos mantendes na luz – de todos nós que oramos e pedimos ao Pai e à Deusa Mãe. Muito mais de nós necessitam aqueles que ao uso de seus poderes convencionais ou usurpadores, em suas caminhadas dualistas, ignoraram os deserdados, trucidaram milhões unicamente por remuneração aos seus egos terrenos, perdidos num oceano de contradições.

  Se dos Avatares impede-vos o vosso cérebro conscientizar-vos de Suas verdades gravadas em vossos imos, do mesmo modo, certamente, não julgareis com razão que o Consolador vos virá com seus poderes espirituais e assim descredes de vossos eus em tudo. Confirmo-vos, irmãos de almas e espíritos, para que não vos deixeis enganar e não serdes levados numa rede de equívocos.  Pois o Consolador não é uma entidade, nem ser nenhum, filosofia alguma, qualquer dos antigos Avatares reencarnado, nada que venha ao encontro exterior de vossos egos, de vossas personalidades em ciclos de ajustes para um novo e visível estandarte ao mundo, como há pouco menos de dois mil anos Jesus desfraldara. Chamou-o, Jesus, mui justa e sabiamente a este Consolador, de o Espírito Santo.

  Digo-vos também, irmãos, com a certeza que minha alma cristificada me inspira e não por outros quaisquer caminhos de aprendizados espirituais, que os ensinamentos do Mestre foram muito claros aos seus seguidores, e mais claros ainda aos seus discípulos por que esses precisavam despertar rapidamente e obrar, pois a missão requeria que logo se dispersassem fazendo-se de uma vez arautos de nova história mundial. Porém, aos próprios discípulos, e aos demais que acreditaram em suas palavras ele também algo ocultou.

  Sabeis, irmãos, o que seja a gnose? Pois tendes em vossas memórias causais o quanto aprendestes dessa gnose professada por Cristo-Jesus a vós, aos que aprendiam ocultamente antes e após o ato da crucificação do cordeiro. A vós que lá estivestes nos cenários e abrigos onde o enviado de Deus ensinou – como esteve esse irmão que vos fala e transmite – a gnose foi explicada em seus segredos maiores. Todos os sinceros seguidores de Cristo foram merecedores das graças recebidas naquela vida, pelo entendimento e aplicação da reta gnose. Assim fostes vós enquanto vos mantivestes em Cristo lá mesmo e em outros lugares de vossas futuras vidas. E amados sempre fostes pelos séculos vindouros. Porém, a uns foi dado mais que a outros, não por que a graça assim escolhesse por razões menos amorosas, porém pelo fato de que nem tudo é para todos por circunstâncias várias, por motivos diversos ou por momentos inoportunos.

  A gnose original nas suas verdades não é apanágio do mundo grego antigo, de seus filósofos e terapeutas, de suas iniciações. Não creiais nisso. Creiais sim que um dia estivestes novamente purificados pela Presença de Sophia – o conhecimento puro – pela vossa aplicação da gnose em vossos pensamentos e atos. E creiais que vossas histórias foram uma só com as de vossos irmãos de mesma jornada, não importando onde estivésseis. O quanto caminhastes pelas orientações de vossos mestres do mundo espiritual, quantas civilizações conhecestes, quanto vos têm custado às demolições de vossos antigos egos ainda em vestiduras Adão-Eva. Com todos vós, irmãos na luz, isto verdadeiramente se passou por que assim quisésseis. Para serdes arautos e obreiros em Cristo, na sua vinda à Galileia, vos foram primeiramente oferecidos os obstáculos em caminhos diversos a fim de que os ultrapassásseis, e assim fazendo fortalecêsseis cada vez mais as vossas vontades, as vossas almas, mantendo-vos determinados pela ansiável  e redentora luz.

  Faltaram-vos forças em certas vidas, bem sei, noutras os inimigos triunfaram interrompendo vossas caminhadas; algumas vezes de modo cruel, já vos dissemos isto. Mas reiniciastes sempre, como fazem os autênticos obreiros, e finalmente chegastes a Jesus, ao Cristo, diante de sua imagem física, ou ante seus mais significativos ensinamentos pouco depois de sua partida às moradas do Pai. Muitos irmãos fiéis vos deram pessoalmente as bases crísticas da gnose real sobre a qual Sua igreja seria edificada em vós, em vossos íntimos. Akhenaton assim tentara, mas sucumbira aos ardilosos vendilhões politeístas. Mas não Jesus-Cristo! Este vivificou e imortalizou Sua obra através de vós, por todos nós os seguidores fiéis da pura gnose, por todas as almas em consciente purificação. Relembrareis disso um dia em vossas almas em toda a sua plenitude, jamais duvideis! Sophia, a sabedoria do mundo, sempre esteve convosco sob outras formas e ofícios, com outras vestiduras e designações para vos despertardes dos diversos complementos interiores que ainda não possuíeis. Muitos céus a isso testemunharam, templos memorizaram os ritos religiosos de que participáveis; os videntes mais sensíveis ainda podem ler dessas efemérides, eras após eras. Os registros etéricos daqueles tempos terrenos ali permanecem como se hoje acontecidos, como se neste exato instante.

  Escandalizam-se os cristãos despidos da gnose sem a sapiência provinda de Sophia, e refutam saberem que esta mesma via espiritual reafirmada por Jesus, começou com um arquétipo mental nos caminhos do Gautama, nas suas escaladas pelos labirintos da mente até dela libertar-se, até que quebrasse os seus elos aprisionantes da Alma. Akhenaton e Moisés haviam preparado a recepção do pensamento uniforme em um só Criador sobre todos os demais deuses. Depois os Essênios buscariam no budismo e trariam para o Mediterrâneo os segredos das curas pelas plantas, os rituais de evocação aos iluminados, e desenvolveriam as materializações de almas e demais conhecimentos da gnose. E Jesus, entre eles, vivenciaria esses conhecimentos e com sua arte divina os reforçaria mais tarde com os budistas no Tibet; e brindaria os monges com sua genialidade e maior visão, e lá mesmo renovaria ensinamentos mais significativos.

  Sábios foram aqueles homens de eras passadas que nos despertariam as altas aspirações para além das magias astrais, para distante dos fenômenos ilusórios que encantam e aprisionam, e nos ensinariam os preâmbulos de todas as transformações internas de que necessitávamos, para futuramente encarnarmos a Alma Imortal. Esses iluminados nos auxiliariam a entendermos a existência dos degraus sublimatórios internos, que nada mais são que as iniciações conducentes cada vez mais acima, até que finalmente cheguemos a indefiníveis e indissolúveis identidades com Cristo. Creio plenamente nisso, e creiais, irmãos, nessas lídimas e fluentes verdades. Não permitais que de novo Adão-Eva em vós, quase mortos, que de seus próprios estertores e insuflados pelos ardilosos malignos, venham rearticular os vossos pensamentos, vossos intelectos, para conhecimentos sem alma, para distrações do mundo, para os encantamentos da ciência cética e materialista. Lembrai-vos sempre: somos vidas milenares, viventes em Cristo, mas não ainda completamente remidos pela luz redentora que buscamos.

  Saibais, irmãos, quem seja o Consolador e muitos de vós tendes a consciência deste saber. Aquele que Jesus pediu ao Pai que aqui vos viesse, e a mim, e a todos os seguidores da luz. Pois Ele é o próprio Cristo que renasce em nós, em nossa manjedoura, e na criança dourada cresce em nossas almas. Uma pura alma dentro de outra alma; e enaltece-nos, e reativa-nos aos nossos átomos superiores, e nos toma na medida de nossos atos mais puros, e nos inspira, e nos fala, e nos intui, e realiza por nós as verdades viventes em nossos íntimos! Eis o Consolador para as almas interiorizadas que vivem no mundo, mas que não são mais do mundo, que buscam manter Adão-Eva em padrões frequênciais menores, inatingíveis às emoções elevadas, às santas aspirações e realizações ao serviço.

  Assim eu sinto, assim eu penso; eu vosso irmão igual e seguidor de um Irmão Maior – um divino Ser, um Salvador – e de Seus Irmãos Mensageiros que aqui vieram sacrificar sua Paz, suas plenitudes sábias, que desceram dos mundos celestiais a fim de também ensinar em como sairmos das cadeias tecidas pelos nossos próprios e imperfeitos egos, nesse mundo de antigas provações, e a escaparmos dos astutos senhores dos reinos da não luz, e a auxiliarmos aos irmãos incautos por eles aprisionados.

“O Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não no vê, nem o conhece; vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós”. – João 14-17.

Por Rayom Ra

                   Este texto pode ser copiado desde que coloquem os créditos

   Rayom Ra
        http://arcadeouro.blogspot.com.br

A Igreja Gnóstica

 

A Igreja Gnóstica 


  [Reedição]
  Apresentamos extratos da obra A Igreja Gnóstica, do Dr. Krumm Heller, fundador da Fraternidade Rosacruz Antiqua – Fra, onde o autor nos traz uma panorâmica do que seja sua Igreja e o gnosticismo por ela representado.

       “Assim como em todas as religiões existe um Livro Sagrado, Bíblia ou Conjunto de todos os ensinamentos e doutrinas que integram cada uma dessas religiões, do mesmo modo, nós gnósticos, dentro de nossa igreja, dispomos também de um Livro Sagrado; e, com algumas referências sobre ele. Quisera começar seu estudo, advertindo, desde já, que para compreender os diferentes autores, temos que levar em conta a época e o sentido esotérico em que foram escritos. O que é o Talmude para os semitas, o Bhagavad-Gita para os budistas(*), o Corão para os muçulmanos e a Bíblia para os cristãos, assim é para nós a Pistis Sophia.

  (*) Não sabemos com exatidão por qual razão o autor subordinou os seguimentos búdicos ao Bhagavad-Gita, uma vez que seja tradicionalmente dos ensinamentos védicos da Índia. O Bhagavad-Gita, conhecido como O Canto do Senhor, é um capítulo do grande poema épico da Índia, o Mahâbhârata, com idade de mais de 5.000 anos, enquanto o budismo surgiria em 500 a. C. Sabemos que Buda parece ter tido sua iluminação no sul do Nepal, que é um país cujos limites são ao norte a China Tibetana, e ao sul, leste e oeste a Índia, não tendo o Gautama obedecido aos preceitos de nenhuma outra religião, e nem mandado elaborar um livro, código ou credo, embora, presuma-se, tenha sido em certa época influenciado pelo bramanismo, até encontrar seu próprio caminho.

  Entretanto, como o Nepal é um país de muitas tradições étnicas e a população indu detém aproximadamente 80% da sua massa populacional, torna-se mais compreensível que segmentos ou ramos budistas pós Buda, possam lá mesmo assimilar da tradição indu e de suas escrituras, embora o Gautama não tenha edificado o dinamismo de sua doutrina e filosofia original sobre aquela tradição religiosa, nem sobre outra qualquer tradição. (Rayom Ra)
Ficheiro:Dr. Henrich Arnold Krumm Heller.jpg
Arnoldo Krumm Heller - 1876-1949
   Vejamos, pois, em síntese, o que diz sobre ela um historiador, e então concluiremos que o Pistis é um livro e uma entidade espiritual ao mesmo tempo. Trata-se do livro máximo de todas as doutrinas, publicado em latim no ano de 1851, por Schwartze e Petermann, de acordo com o código do Museu de Londres, chamado “Askeniano”, cuja antiguidade remonta do século III, ainda que alguns achem mais prováveis ser do século V. (Opus Gnosticum adjudicatum est Códice manuscripto Cóptico Londinensi descripsit est latine verit M.G. Schwartze).

  O original grego desta obra, que serviu de base nos primeiros séculos, não pôde ser encontrado. Só se tem o texto saítico, que é uma tradução para o copta, do manuscrito primitivo. Quanto ao papiro copta, foi encontrado no Egito, sem que nada pudesse testemunhar se o original grego foi composto, também, nesta localidade. Entretanto, todos os críticos concordam em que a obra provém de algumas das múltiplas escolas ou sociedades gnósticas primitivas, acreditando-se, mais ainda, que pertenceria aos ofitas.

  Divide-se em 148 capítulos e em quatro grandes partes ou livros. O primeiro e o quarto não levam títulos, enquanto que o segundo intitula-se: Segundo Livro de Pistis Sophia. Apresenta, também, um rótulo no final que diz: Parte dos Volumes do Salvador. Este mesmo rótulo volta a aparecer no final do terceiro livro que, contudo, aparece sem cabeçalho. Esta falta de homogeneidade é que faz com que alguns críticos suponham que a Pistis Sophia não foi composta de acordo com uma estrutura unitária e que a maior parte de seus escritos seja de épocas diferentes. Por isso garantem que o Quarto Livro é mais antigo que os outros.

  Ao escrever-se essa obra, supõe-se que hajam transcorrido onze anos desde a ressurreição de Jesus e se o descreve conversando com seus discípulos no Monte das Oliveiras, dando-lhes a conhecer as grandes e supremas verdades iniciáticas. Com a vestimenta de luz que o rodeava, pôde atravessar o mundo supra-sensível, e remontando-se de esfera em esfera foram-lhe franqueadas todas as portas, atemorizando os próprios Arcontes ou Guardiões Daqueles Lugares, que o adoraram.

  Jesus chega ao plano onde estão esses Arcontes ou Senhores Tiranos, cujo príncipe é Adamas. Eles vêm a ser os donos do destino. Mas Jesus, provido de seu habitual heroísmo, chega ao 13º. Eon, onde se encontrava estacionada primitivamente a Pistis Sophia. Em relação a isto, conta a seus discípulos a história deste ser misterioso que, pretendendo chegar à região da luz suprema, atravessando os doze eones, sai de sua morada limitada pelo 13º. Eon e, ao ascender em seu voo, é atirado pelos Arcontes na imensidão do caos. Tal era a triste situação da Pistis, até que o Pai lhe enviou Jesus como libertador. Jesus, então, apela a Gabriel e a Miguel, para que a levem em suas mãos com a finalidade de que nenhuma de suas partes se perca nas trevas, transladando-a, assim, do caos para um lugar que se encontra abaixo do 13º. Eon. Por fim, depois de uma cruenta luta, Jesus despoja os Arcontes de suas luzes e a Pistis Sophia é conduzida ao Lugar Sagrado, onde mora, como todos os seus irmãos invisíveis.

  Na história da Pistis Sophia, o relato se interrompe repetidas vezes com o recitativo de vários hinos que ela fazia chegar do Caos à Luz. Estes são 13 e cada vez que Jesus recita um deles aos seus discípulos, convida-os a dar sua explicação. Com frequência falam as santas mulheres, Maria ou Salomé. Outras vezes algum apóstolo, como André, Pedro, Mateus ou Felipe, os quais interpretam os hinos da Pistis, adicionando alguns salmos de David ou Salomão. É uma característica dos gnósticos coptas não procurar outra autoridade para confirmar seus escritos a nãos ser as Sagradas Escrituras: e se algum sincretismo se observa neles, é mais na forma do que nas idéias.

  Depois, este livro, trata da sorte que espera as Almas além da morte, revelando-nos o que acontecerá a cada uma das diferentes categorias de homens; as alegrias e privilégios que aguardam uns, e os tormentos e penas que afligirão a outros. Seu tema principal é, pois, a redenção das almas.

  Na primeira parte, ocupa-se da sorte das almas privilegiadas, isto é, dos apóstolos, das santas mulheres e dos perfeitos ou iniciados, que haviam renunciado à matéria e aos cuidados do mundo. Na segunda, revela-nos o destino reservado às outras almas, especialmente às que se arrependem de seus pecados. Depois, vem outra parte em que se trata dos Mistérios e de sua eficácia. Finalmente, chega-se àquela em que se descrevem os tormentos dos condenados. Veremos mais tarde que o principal são os Mistérios e que tudo o mais gira em seu redor.

  No quarto livro, fala-se da ressurreição de Jesus, de quem se diz que venceu os Arcontes do Destino e da Fatalidade, cuja sombra nefasta deixará de pesar, daí em diante, sobre os homens. Aqui, Jesus relata a seus discípulos as façanhas destes Arcontes, filhos de Adamas, os quais, persistindo em seu afã do procriar, deram origem aos Arcanjos, Anjos, Liturgos e Decanos, até que interveio Jeú, a quem Jesus chamava de PAI DE MEU PAI. Jabraoth Adamas e os seus se obstinaram em seu pecado; por isso Jeú os prendeu à Esteira onde atualmente formam parte do Zodíaco, vindo estes a ser os Arcontes do Destino, os quais tiranizavam os homens cujos passos a astrologia trata de investigar.

  Continua, ainda, a descrição do modo torturante como os Arcontes penetram nos homens e os incitam ao mal, atraindo sobre eles terríveis castigos e perdição absoluta. Até aqui, eis o quanto se pensa profanamente e se percebe dos ensinamentos deste livro sagrado sobre o qual os historiadores e investigadores não podem se aprofundar por falta de Chaves. Pistis, para nós, significa FÉ, mas não nossa fé habitual, que resulta da aceitação de uma opinião estranha, porque a contaram. Não. Fé, em sentido bíblico, é uma força, é a força mágica, que basta se ter tanto quanto um grão de mostarda para se levantar uma montanha e jogá-la ao mar. Sophia, sabemos que é ciência, de modo que Pistis Sophia é poder ciência, é teurgia, magia branca, cuja chave, naturalmente, não se pode dar neste livro., mas se dá nos cursos secretos que podem ser proporcionados pelo autor. Aí está a diferença principal entre ela e a teosofia indu. Aquela é teoria, e muitos são até contrários à prática da magia. O gnóstico exige primeiro o governo de Pistis e depois a comprovação dos fatos. É, pois, antes de mais nada, prática real, efetiva, sem nada de especulação à priori.

  É racional e justo que alguns críticos suponham, devido à falta de concordância e homogeneidade de suas partes, que esta obra não foi escrita com vistas a uma unidade e a um plano pré-concebido, mas isto se deve ao fato de que, na tradução de Schwartze e ainda no códice do Museu de Londres, só existam fragmentos esparsos deixados, indubitavelmente, por algumas das primitivas escolas gnósticas.

  O livro completo, íntegro, intacto, o verdadeiro original grego, tal qual foi escrito e com toda a pureza de seus ensinamentos, está em poder de nossa Santa Igreja, como relíquia esotérica, que não é dado a conhecer, senão àqueles que estão em condições de receber suas profundas e claras verdades.

  (...) A ação da substância cristônica do sol em nosso sangue, como é experimentada pelos Rosa-Cruzes, e como já a descrevemos em nosso livro “Plantas Sagradas”, nos dá a chave da pré-história dos povos e permite formar grupos de sangue como os idealizados por Wirth, oferecendo-nos a solução de todos os enigmas da natureza. E, da mesma forma, a chave de todos os cultos, e nos transporta à primitiva linguagem de luz explicada em nosso livro “Logos-Mantram-Magia”. Todas essas experiências nos demonstraram que aquilo era sabido nos mistérios antigos e o que conhecemos hoje, mediante a Igreja Gnóstica, têm base real e positiva. Contudo, o que os citados investigadores fizeram foi materializar estes conhecimentos.

  (...) E perguntareis por que a Igreja Gnóstica dá mais importância a Jesus da Galiléia que a qualquer outro fundador de religião? Pois bem: porque entre aqueles e Jesus existiu uma grande diferença, que foi a Ressurreição. Nem Lao-Tsé, nem Confúcio, nem Buda, nem Maomé ressuscitaram. Terminaram para nosso mundo visível ao acontecer suas mortes. Só o corpo astral do Nazareno regressou e se perpetuou com todas as forças. O processo iniciático ficou, em consequência, completo somente nele, e daí que seja tão necessário e interessante a imitação de Jesus. A substância de Jesus, do Logos Solar, se propagou pelo mundo e transformou seu ambiente perpetuando-se até nossos dias como essência solar, que oferecemos em nossa Unção Eucarística.

  A Eucaristia não é somente uma simples rememoração, nem devemos tomá-la ao pé da letra como fazem os católicos quando afirmam que, se um sacerdote pronuncia a fórmula HOC EST ENIM CORPUS MEUM e depois a de HIC EST ENIM CALIX SANGUINIS MEI, instantaneamente o pão se converte em carne e o vinho em sangue. Nem mesmo como os protestantes, ao afirmar que a ceia é tão somente uma lembrança imorredoura do ágape do Senhor. A igreja Gnóstica transita por um caminho médio. O verdadeiro sacerdote ao pronunciar nossas fórmulas sagradas pode, se quiser, despertar a força solar dentro do pão para que tenha vida, como também pode curar, se o desejar, o corpo e a alma de todos os seus semelhantes.

  (...) O credo romano, que foi retirado também dos mistérios, contém as frases que destacamos: “Creio em...o todo visível e invisível...em Jesus Cristo...que nasceu do pai antes de todos os séculos. Deus de Deus, luz de luz...por quem foram feitas todas as coisas”. Este princípio imaterial – ainda que este termo não seja exato – é o éter químico, cuja base é a substância de Cristo. A diferença entre o catolicismo e a Igreja Gnóstica estriba-se em que, para nós, Cristo é uma substância e sua existência na Terra, um fato ou um fenômeno cósmico-biológico, enquanto os católicos somente dão importância ao fato histórico-material desconhecendo o verdadeiro mistério da substância cristônica.

  Nossa Igreja tem três únicos sacramentos: o Batismo, a Eucaristia e a Extrema-Unção, cujo ritual tem um poder mágico e eficaz. Conserva, também, a Confissão, porém, não ao modo dos católicos. A nossa é uma espécie de solicitação de conselhos e instrução que se faz ao sacerdote, já que este, como conhecedor da parte oculta, pode dar e oferecer normas em cada caso concreto. Não aceita pecados, mas, sim erros, porquanto se tem como um absurdo fazer crer aos demais, que seus pecados serão perdoados, quando ninguém pode adjudicar-se esse poder, nem prestar, sequer, a menor ajuda nesses problemas em que só é responsável a personalidade de cada um. Em troca, o erro se pode corrigir e reparar com o conselho do sacerdote gnóstico, porque ele une ao seu ministério a qualidade de ser um médico por excelência que, dentro da psicanálise, lhe é dado transmutar os erros e fazê-los converter-se em santas e puras verdades.

  Para isto é necessário estar com boa disposição e em condições de receber Forças Divinas, cuja atitude só se consegue colocando-nos em contato com a Santa Eucaristia. Um sacerdote, como não é infalível em sua vida comum, poderá enganar-se numa de suas apreciações ou opiniões; porém ao atuar como sacerdote neste sagrado sacramento, todas as forças se concentram nele e, então, representa um Alto Iniciado, o Ungido, o próprio Deus e esparge e dá aos demais tudo quanto recebe. Nesse supremo instante é quando devem se aproximar do altar todos os enfermos e aflitos. Dali, certamente, sairão curados.

  Todos os grandes iniciado, aqueles que chamamos Santos e Pais de nossa Igreja Gnóstica, estão de acordo com essa doutrina, e assim a deixaram exposta em obras transcendentais que hoje, dificilmente, poderão ser encontradas nas bibliotecas. A Igreja Católica em sua luta para conseguir seu estabelecimento no mundo, fez tudo quanto pôde para apagar os vestígios da presença dos gnósticos, cujos ensinamentos eram demasiado claros e abertos, e muito ampla a sustentação da verdade. E, embora, depois corressem rios de sangue para a imposição do cristianismo em sua forma católica, ela se valeu, nos primeiros séculos, de meios mais diplomáticos, retornando, então, à queima de livros, a falsificar outros e a recolher os de maior importância iniciática que hoje se encontram escondidos no Vaticano. Muito, naturalmente, está expresso neles metáforas, em símbolos, que os católicos não se deram ao trabalho de decifrar, porém, que agora nos vemos forçados a esclarecer, cumprindo nossa missão, embora isso seja com dezoito séculos de atraso.

  Vamos, finalmente, consegui-lo-lo com Epifania. Epifania é uma palavra procedente do grego, que mesmo sendo a atual ocupação e preocupação constante dos teólogos, não permitiu que se obtivesse resolutamente sobre ela uma justa e acertada explicação. Contudo, podemos dizer que entendemos por Epifania, a Revelação, a Ascensão ou a Manifestação de Cristo em nós".

Rayom Ra
                                                      Rayom Ra                                                                                                     http://arcadeouro.blogspot.com.br   

 "O texto pode ser copiado e reproduzido desde que dados os seus respectivos créditos"

Fundamentos da Meditação (6) - Preparação para a Serenidade

 

Fundamentos da Meditação (6) - Preparação para a Serenidade


The beginning stages of concentration
  Figura 1
  “Todos sabemos como nossa mente pode estar em constante movimento: pensando, cheia de vozes, demandas, questões e  sobre cuja existência parece-nos não determos um controle. Qualquer pessoa que tenha tentado aprender meditação sabe disso como um fato. Nosso instrutor para a meditação nos comanda a nos sentarmos e a esvaziarmos a mente dos pensamentos, mas não conseguimos fazer isso uma vez que os pensamentos continuam acontecendo. Através de toda a nossa vida, isso vem demonstrar uma falta de serenidade pelo não uso da vontade conscientemente dirigida ao controle diário da mente”.

  Os Estágios Iniciais da Concentração

   Tais como pessoas interessadas em meditação queremos também serenidade. Na maioria dos casos, quando as pessoas são atraídas a estudar meditação ou espiritualidade o fato acontece por algum sofrimento que os aflige, de que buscam por alívio. A meditação é uma solução conhecida; é ciência comprovada que muda diretamente nosso sofrimento e nos traz a oportunidade de descobrirmos o que verdadeiramente seja serenidade.

  Serenidade não nos pode ser dada como se fora um presente. Não é algo que recebamos dos deuses, nem o que possa ser comprado. Se tenhamos obtido alguma experiência neste mundo, teremos encontrado pessoas muito pobres ou muito ricas, e teremos atestado por nós próprios que serenidade é algo que lhes seja completamente desconhecida.  Riqueza não resolve seus problemas com o sofrimento ou com o descontentamento, visto podermos perfeitamente encontrar pessoas pobres igualmente infelizes. Podemos também encontrar pessoas ricas ou pobres igualmente contentes. A diferença entre elas não está em suas posses materiais ou em seus status sociais, mas em suas atitudes. A diferença não é material, mas sim psicológica.

   Meditação é realmente significativa na espiritualidade. Serenidade é um Resultado da Ação. Ao usarmos a palavra serenidade a estaremos usando de um modo muito técnico, descrevendo um estado mental bastante específico, um estado do ser. Serenidade é algo que experienciamos e que nele vivemos. Serenidade não está no futuro nem no passado é alguma coisa que somente podemos conhecer no presente. Refere-se àquela mente em estado paz – estável e calma – e não em caos ou submersa em pensamentos, emoções, desejos ou medos.

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  Figura 2
  Esta imagem ilustra nossos cinco centros, também chamados três cérebros. São ferramentas psicológicas, máquinas que estamos usando o tempo todo. Contudo, não somos muito cônscios delas, não prestamos devida atenção a elas.

   A qualidade da energia que passa através dessas máquinas psicológicas é o que determina nossa experiência de vida no momento. Nossa experiência de vida é o resultado de nossas ações psicológicas.

  O estado da energia que flui através do intelecto é o que experienciamos como mente ou pensamento; possui um elenco de qualidades, que, além de tudo, detém ainda uma característica dominante: nosso estado mental fora de controle. É um caos que a nos parece estarmos incapazes ou impossibilitados de controla-lo.

  Todos sabemos como nossa mente pode estar em constante movimento: pensando, cheia de vozes, demandas, questões e  sobre cuja existência parece-nos não determos um controle. Qualquer pessoa que tenha tentado aprender meditação sabe disso como um fato. Nosso instrutor para a meditação nos comanda a nos sentarmos e a esvaziarmos a mente dos pensamentos, mas não conseguimos fazer isso uma vez que os pensamentos continuam acontecendo. Através de toda a nossa vida, isso vem demonstrar uma falta de serenidade pelo não uso da vontade conscientemente dirigida ao controle diário da mente.

  Existe também um estado da mente que podemos chamar de tédio ou laxismo. É um estado em que a mente está obscurecida, opaca e grudenta como melaço ou lama. Ou como algo espesso e impenetrável. Podemos também a isso experienciar em nossa vida diária em tentativas de meditar, quando a mente nos parece exatamente letárgica. Nesse tipo de estado, não podemos realmente pensar com clareza. Normalmente, ao nos sentirmos assim, nos socorremos com um café ou com a cama. Esse estado indulgente é também consequência de nossa atitude psicológica, o modo como usamos a mente a cada instante.

   A excitação extrema, a agitação, o estresse e alta energia opõem-se em outro extremo à opacidade, à obstrução, à obscuridade, à fadiga e à preguiça mental. O mesmo pêndulo que oscila entre extremos oscila também, igualmente, noutros centros. Emocionalmente, a característica dominante é aqui a mesma: nossas emoções estarão naturalmente fora de controle. As emoções continuarão acontecendo e não conseguiremos controla-las do modo como elas nos controlam.

  Oscilamos de um extremo emocional a outro. Conseguimos ficar emocionalmente excitados, atraídos, interessados, aborrecidos, com estresse, ansiedade, medo, excitamento, e luxúria. Isso inclui todas as formas de desejos onde nos tornamos fixados em algo e nosso desejo emocional nos conduz enormemente à compulsão.

  Por que nos absorvemos em shows e musicais de tv? Porque é justamente o que nos provoca aquele estado emocional; desejamos experienciar aquele estado emocional em lugar de outros. Por que nos absorvemos no facebook ou escrevendo textos? Porque queremos constantemente deter a “emoção” de nos sentirmos o quanto somos amados, incluídos, valorizados, queridos. Não aquilatamos como essas emoções são ilusórias. Cada um de nós tem vícios emocionais e hábitos emocionais e não parece termos o menor controle sobre eles.

  O pior é que nossas emoções – tão caóticas ou tão fora de controle que possam estar, ou tão frias e sem vida que as possamos sentir em nosso coração – não correspondem à realidade. O que sentimos emocionalmente é subjetivo. Como de fato sabermos disso? Observando-nos. Quando acontece uma tragédia observemos a frieza de coração que temos. Quando algo maravilhoso acontece a alguém observemos a frieza de coração que temos ou a raiva ou inveja que sentimos. Podemos ir a uma festa onde todos estejam felizes, mas nós estejamos depressivos e nos sentindo miseráveis. Até podemos não saber porquê. Sentimo-nos unicamente mal. Ao prestarmos atenção a nós veremos que é muito comum aquele nosso estado interior não combinar com as circunstâncias exteriores.

   No terceiro cérebro, nesses três centros: o motor, os centros instintual e o sexual, acontecem coisas muito mais rápidas e muito mais difíceis de termos consciência por serem bastante sutis e estarem em profundo interior da psique. Contudo, encontramos esse mesmo pêndulo fundamental entre o excitamento e o laxismo, entre a agitação e a letargia.

  O ponto fundamental é que tudo daquele caos que experienciamos psicologicamente, que pensamos seja vida normal, não é normal. Na verdade, não é vida. É reação. É estarmos numa gaiola, uma gaiola psicológica, sobre a qual não detemos controle. Em outras palavras: coisas acontecem e dentro de nós as reações estão constantemente em ebulição naqueles centros. Tudo o que fazemos o tempo inteiro é tentar conte-las, mesmo que seja escapando delas, mascarando-as ou as escondendo.

  E a vida continua, trazendo-nos coisas dolorosas e coisas difíceis. Temos ansiedades, estresses e incertezas. Temos objetivos que não podemos alcança-los. Temos problemas que não conseguimos resolvê-los. Coisas que estão constantemente acontecendo e nunca cessam. E no dia a dia pisamos em água; lutamos para não afundarmos de todo. Em nosso íntimo ardem todos os tipos de reações sempre que não podemos manobra-las. Não sabemos como faze-lo, e assim corpo, coração e mente sofrem.

  Existe um extremo estado de agitação que vem se tornando cada vez mais agudo, que piora dia a dia. Eis porque vemos pessoas buscando por alívio das dores, das incertezas e dificuldades da vida, e não ficando somente nisso tornam suas vidas ainda piores: viciam-se com álcool, cigarros, drogas, sexo, dinheiro, poder, tv, shopping, etc. Consomem comidas em demasia; buscam a todos os tipos de sensações. São indulgentes com elas próprias nas sensações, em tentativas de ludibriarem o que trazem em mentes, corações e corpos. Eis porque a sociedade está se destruindo. Não está equipada com conhecimento específico  para transformar agora, neste momento, o seu estado de ser a fim de, verdadeira e completamente, experienciar a serenidade.

   Serenidade é simplesmente um estado psicológico acontecido quando a mente não está agitada. Observemos um lago: quando não há vento o lago se encontra perfeitamente tranquilo. Com nossa mente se dá o mesmo. O vento são pensamentos, emoções, desejos, preocupações, medos, etc. Quando aprendermos a parar de nos atarmos completamente a todos eles, a mente ficará perfeitamente silenciosa, serena, quieta mesmo que as circunstâncias externas não estejam serenas.

  Estudamos religião e vemos que profetas e santos souberam como manobrar com essas coisas. Em meio aos inacreditáveis julgamentos a que foram submetidos eles mantiveram amor, compaixão, paciência, tolerância e grande e diligente trabalho em benefício de outros, apesar de terem sido torturados, perseguidos, ridicularizados e alvos de intrigas. Nenhum desses sofrimentos os afetou. Mesmo estando a ficar empobrecidos, famintos, no deserto, ainda assim endereçaram uma atitude amorosa aos seus perseguidores. Essa é uma espiritualidade real: a de deter a habilidade em permanecer sereno não importando as circunstâncias.

  Serenidade não é um fator externo; não é um presente dos deuses; não é algo enganoso, não pode ser enganosa. É realidade. É o estado natural do Ser. É imodificável e incondicionada. Serenidade é o que está dentro de nós; já está lá, todos a temos em nosso íntimo.

  O processo do aprendizado da meditação é chegarmos a transformar nossas respostas em estímulos internos e externos, passando a perceber ambos num caminho real e não a darmos respostas mecânicas e automáticas devido à raiva, medo, luxúria, ambição, inveja, gula ou a quaisquer outras qualidades negativas. Mas sim nos ligarmos ao verdadeiro e real estado natural do nosso ser interior, que é serenidade, amor, altruísmo, paciência, diligência – aqueles tipos de qualidades positivas que todos possuímos intimamente.

   O que estamos destacando é uma fundamental diferença na atitude. A maioria das pessoas que busca a meditação, deseja uma pomada que lhe anestesie o sofrimento. Quer que lhe seja dada uma solução rápida: “façam essa prática, tomem esse remédio, comprem aquele aparelho, vão ao shopping, gastem milhares de dólares e darei a vocês a chave da felicidade”.

  É isso que dizem e as pessoas acreditam. São todas mentiras; é tudo mentira. A realidade é que a serenidade já está dentro de nós. É um estado natural de nossa consciência. Tudo o que temos a realizar é transformar o modelo de cada um de nossos momentos quando fazemos coisas. É uma mudança de atitude. Ao invés de perseguirmos a serenidade procuremos pelas coisas que a vedam e estaremos estabelecendo respostas. Essa simples ação permite à serenidade emergir dela mesma; a conduz a retornar ao seu estado natural. É bastante simples, mas exige trabalho. É algo simples, mas não fácil.

  O que isso requer é ficarmos preparados para estarmos presentes a cada momento, permanecermos cônscios de partes de nós, daqueles cinco centros, deles vigilantes e conscientemente nos seus comandos. Nessa linha, quando alguém vier com fofocas e ouvirmos: “Oh, essa pessoa anda dizendo essas coisas sobre você...” Ao invés de nos permitirmos ficar fulos de raiva, com medo ou de orgulho ferido, que tomemos o controle de nosssa mente, coração e corpo e não nos liguemos àquele fato. E reflitamos considerando intimamente: “quem se importa com o que ela pensa, suas palavras não significam nada a menos que alguém as dê algum valor. Eu não dou o menor valor, então nada me significam. Por que eu deveria perturbar a minha paz mental? Além do mais se ela disse tais coisas talvez eu tenha feito algo errado; talvez eu esteja em falta e tenha magoado essa pessoa”.

  Desse modo, ao invés de ficarmos com ódio, fiquemos benevolentes, compreendamos e permaneçamos em paz. É uma mudança de atitude, uma mudança de como transformar impactos e sabermos utilizar em nós aqueles centros. Se formos capazes disso seremos capazes de aprender a meditar.

   Como Cultivar a Serenidade

  Em palestras anteriores vimos estudando este gráfico. Esta é uma imagem do budismo tibetano. Ilustra as etapas fundamentais a que cada praticante vai percorrendo na intenção de alcançar a serenidade. De novo, não é algo teórico nem questionável. É um estado de consciência que qualquer pessoa pode experienciar se produzir as causas conducentes àquele resultado.

  Figura 3
  (Obtenha um poster desta imagem)
shamatha lg
 
  Essa tradição expõe a existência de dois modos fundamentais para nos prepararmos a alcançar a serenidade, logo começando através deles. São bastante simples.

  Preparação
  Prática

  Já antes explicávamos que a sabedoria de que necessitamos a fim de entendermos a vida e nossos problemas é alcançada através de um processo com três etapas:

  Ética (Sila)
  Êxtase, Serenidade (Samadhi)
  Sabedoria (Prajna)
   
  A terceira etapa é a própria sabedoria que em sânscrito é chamada prajna, significando conhecimento profundo. A etapa anterior é chamada samadhi, significando êxtase. Refere-se ao estado do ser quando nossa consciência não está mais condicionada com nenhuma outra coisa. Significa que nossa consciência não se encontra condicionada pelo corpo, por qualquer dos sentidos nem por qualquer defeito egoísta ou psicológico, como orgulho, ódio ou sensualidade. Quando nossa consciência estiver libertada de tudo isso experienciamos o que é chamado samadhi ou êxtase. É uma experiência de pura libertação. Mesmo que permaneça somente por um momento é experiência inesquecível porque vemos, experienciamos e saberemos que nossa real natureza é serena.

  A fim de alcançarmos o samadhi necessitamos do primeiro dos três estágios, chamado sila, significando ética. Começamos com ética e através dela estabilizaremos nossas experiências psicológicas de tal modo que a consciência possa experienciar a serenidade. Partindo da serenidade acessamos a sabedoria. Isso é o significado de tudo: o que é simples. Alcançando a serenidade temos a chave para chegarmos à sabedoria. Para alcançarmos a serenidade a chave é a ética. Se assim não iniciarmos com base na ética, então nunca aprenderemos a meditar.

  Se estivermos estudando e praticando meditação e falhando em realmente experienciarmos mudanças e avanços em nossas práticas, então não teremos o correto conhecimento. Por outro lado, possuindo o correto conhecimento e produzindo o dharma pelo serviço ao próximo, haverá somente uma coisa a mais que pode impedir-nos de experienciarmos a realidade da meditação, e essa coisa é nossa ética. Se não estivermos experienciando samadhi e prajna em nossa meditação aquilo será o porquê das razões. Precisaremos reexaminar nossas práticas questionando-nos para entendermos: o que nos estará bloqueando? É esse o nosso foco fundamental. Não estaremos buscando a experiência, mas nos focando naquilo que a estará obstruindo. Na vasta quantidade do tempo, o que obstrui nosso acesso à experiência espiritual reside no estado de nossa psique, ou seja: em alguma brecha ou ponto cego na ética ou mesmo em algo que estejamos fazendo de bom grado que não deveríamos fazer.

  1. Preparação Para Serenidade Meditativa

  Isso é mais especificamente diagramar sobre o primeiro aspecto para a serenidade da meditação, que é em suma a própria preparação. Essa é tradicionalmente descrita como possuindo seis aspectos.

  Moradia Apropriada
 
shamatha monk
  Figura 4
 
  Primeiro é ter um lugar para morar que adapte nossa motivação e nossa vida espiritual. Isso é representado no gráfico. Bem abaixo, à direita, vemos esse templo e o monge – o renunciante – que inicia o caminho. Então, o início do caminho para se alcançar o estado de meditação depende de um lugar que seja ajustável a isso. Muitas pessoas leem daquela  “moradia apropriada” e unicamente interpretam-na segundo as antigas tradições, em que um postulante tinha que viver numa caverna ou ir para um monastério no deserto, ficando isolado da sociedade. Essa condição, entretanto, prendia-se unicamente às circunstâncias externas. Pois a razão que detinha de abandonar a sociedade devia-se a isolar-se de todas as suas ligações: família, amigos, amor, interesses, álcool, intoxicantes, apelos do desejo, coisas em seguir comprando e vendendo, enfim todas as coisas que são partes da sociedade que mantêm a mente em agitação.

  É o que está implícito em “moradia apropriada” em seu mais fundamental nível, portanto no seu real significado: moradia apropriada significa precisarmos tomar medidas a fim de implementar nosso meio ambiente. Por exemplo: manter a casa bem limpa tem um grande impacto em nosso bem estar espiritual, produzindo bom efeito psicológico. Mantenhamos também a nós próprios limpos. Tendo no lar um espaço onde seja possível praticar isso pode realmente ajudar, mesmo em sendo um canto, uma dependência. Conheço pessoas que transformam o toilete em sala de meditação. Se conseguirmos cultivar um ambiente para trazer serenidade é o melhor de tudo. Se em nossa casa tenhamos a tv ou rádio sempre ligados, pessoas fumando, usando drogas e dormindo em qualquer canto ou vivermos em dormitórios coletivos, para o objetivo de moradia apropriada nos será muito difícil. Essa dificuldade com pessoas em dormitórios coletivos ou em prédios de apartamentos cercados por intensas influências psicológicas bastante negativas, são completamente contraditórias para chegarmos à serenidade. O esforço, o trabalho a ser empreendido para superar tudo aquilo é por demais significativo. Uma pessoa nessas circunstâncias pode necessitar de algum lugar em que possa ir para uma pausa, para ter paz, como, por exemplo, próximo a uma igreja, um templo, uma floresta, um lago; algum lugar onde possa ir e sentir-se isolada de tudo aquilo, pelo menos enquanto tente meditar.

  Moradia apropriada refere-se às coisas identificadas em nosso ambiente a fim de que possamos mudar para nos defendermos, nos protegermos e nos ampararmos em nossos esforços de meditar. Principalmente, sobre estarmos a salvos e seguros.

  Não fazer da “moradia apropriada” o nosso problema principal. Também nos é necessário aprender a aceitar as dificuldades que não conseguimos modificar e fazermos da maneira que der àquilo de que necessitamos. Temos observado pessoas que bem conseguem meditar perfeitamente, mesmo que haja uma britadeira perfurando pedras a pouca distância dali. Há pessoas que conseguem meditar serenamente em meio a grandes ruídos de multidões, ou estando cercadas por gritos de crianças, carros buzinando, cães latindo, ou em hospitais junto aos sofrimentos, etc. Essas pessoas não são “agraciadas” ou “abençoadas”; elas simplesmente mudaram suas atitudes e não mais se ligam mecanicamente às impressões. Notemos que isso está adstrito a atitude, aceitação e ao controle em como responder às coisas.

  2. Ter Pouco Desejo

  O segundo aspecto é termos pouco desejo; não ficando distraídos por todas as coisas que nos querem nelas prestando atenção, como os anúncios, os novos produtos chegando, às mudanças da moda e tudo o que nossos amigos estão fazendo ou o que eles possuam. Vermos nossos amigos saindo em viagens, indo esquiar, surfar, indo aqui e ali, tendo um belo carro, um ótimo emprego e não desejarmos todas aquelas coisas. Nunca questionarmos aqueles desejos.

  Esses aspectos nos convidam a questionar: por que queremos isso e aquilo? Por que estou me interessando por essas insignificâncias o tempo inteiro? Por que estou me permitindo que todos esses desejos por circunstâncias ou de posses tragam-me descontentamentos e agitações psicológicas? Temos tantos desejos que nos influenciam o tempo inteiro e a maioria deles é devida à inveja. Vemos pessoas na tv e nas lojas parecendo ter de tudo. Os anunciantes estão certos de que ao nos mostrar esses produtos ficaremos felizes como aquelas pessoas nos comerciais [ridículos]. Somos influenciados por aquelas coisas. Pensamos necessitar nos vestirmos de certa maneira. Acreditamos necessitar de certas posses, em termos um certo estilo de vida para sermos felizes. São todas mentiras, todas elas. Precisamos estar cônscios disso, de nos tornarmos cognizantes dos tipos de influência que nos afetam o tempo inteiro; que estão na verdade sugando a vida de todos. Por que precisarmos sair a comprar a todos esses produtos? Por que irmos tanto às compras, buscando realmente por coisas insignificantes? Gastamos muito de nossas vidas em bobagens. Nunca paramos a fim de realmente determos o controle disso. Então, termos pouco desejo refere-se a essas coisas.

  3. Estar Contente

  Quando aprendermos a estar contentes com o que tivermos, a reconhecermos que o que temos é muito especial, a ficarmos contentes vendo vantagens naquilo, a serenidade emergirá rapidamente. Estar contente é estar sereno. É estar de bem com o que se tem e como se é.

  Porém, isso é ligeiramente dúbio, uma vez que, obviamente, se estivermos interessados na espiritualidade vamos querer mudar. Reconhecemos que há coisas que podem se tornar melhores. Se estivermos sofrendo necessitaremos encontrar maneiras de modificar as coisas e mudarmos. Desse modo, isso não significa estarmos complacentes com nossos defeitos, vícios e erros. Significa isto sim estarmos contentes com coisas materiais, com nossas circunstâncias, e não lutarmos em demasia contra a realidade.

  Antes de entrarmos na espiritualidade pensávamos sempre: “Preciso de um emprego melhor, uma esposa melhor, um carro melhor, uma casa melhor, mais roupas, mais dinheiro no banco”. Há sempre esse tipo de descontentamento alimentado pela inveja em adquirir tantas coisas que não possuímos. Tendo entrado na espiritualidade mantemos essa mesma atitude, mas direcionada para coisas espirituais: “Não tenho as iniciações que preciso. Não tenho a esposa que preciso. Não tenho acesso aos professores que preciso. Não tenho tempo para meditar. Não tenho isso e aquilo”. É uma longa lista de coisas que pensamos que se as tivéssemos estaríamos contentes. As pessoas estão sempre procurando lá fora pelas compensações a fim de preencher o dolorido vácuo espiritual em seus corações. Contudo, essas coisas não as satisfazem para essa finalidade, pois nenhuma posse ou circunstâncias nos trará a serenidade. A serenidade emerge de dentro e não tem nada a ver com circunstâncias externas.

  Um caminho para transformar esse aspecto de nossa psicologia está em quando sentirmos essa urgência, esse estímulo – “preciso disso, preciso daquilo! Ai de mim! Minha situação é terrível. Não tenho aquelas coisas que deveria ter. Tenho agora trinta e cinco anos, ou quarenta, e não tenho crianças. Não consegui minha educação e não tenho o dinheiro que precisava ter” – é olharmos a nossa volta. É uma coisa fácil de a isso transformar. É simplesmente observarmos aos fatos da vida das pessoas. Todas essas coisas que dizemos a nós próprios são lixo. Então é vermos essas pessoas sofrendo bem mais que nós próprios. É abrimos os olhos para a realidade. A vida não está para satisfazer os nossos  desejos. Nossa cultura nos diz sobre o que está por aí, mas essa cultura é vazia, nada tem a oferecer. Ela somente existe para dar possibilidades a outras pessoas de ficarem ricos. Nossa cultura não nos oferece nada de espiritual e nada subsiste; é como vapor, ilusão.

  Se quisermos algo real, que nos seja duradouro, então abandonemos os desejos e nos tornemos presentes aqui e agora; tornemo-nos contentes com o que temos e nos centremos em obter plenas vantagens disso. Quando nos sentirmos descontentes olhemos para os que têm menos. Sempre haverá alguém a sofrer mais que nós próprios, possuindo bem menos. Especialmente nós, no ocidente, não temos real conceito sobre o sofrimento, ainda que pensemos que sofremos muito. Estamos nos atoleimando.

  4. Abandonar Tarefas Inúteis

  Por que gastamos tanta energia e tempo sem sentido algum? Se entendêssemos da fragilidade da vida, da impermanência do corpo, então não nos engajaríamos em atividades inúteis. Conscientizemo-nos, pois, da possibilidade em acessar algo que seja real, que esteja além do corpo. Abandonar atividades inúteis é um passo fácil de dar. A realidade é que todos nós morreremos e não sabemos quando. Quando verdadeiramente nos dermos conta do fato trazendo-o à nossa real conscientização – compreendendo-o de todo – gastarmos qualquer momento numa coisa estúpida nos será impensável.

  Fazer-nos o possível cognizantes sobre a inevitabilidade de nossa morte e sabedores de nosso estado do ser naquele momento, determinam o que acontecerá após a nossa morte. Se estivermos com o nosso ser nesse seu estado corrente atual, no momento da morte de nosso corpo físico, nos acontecerá exatamente o que acontece quando caímos no sono a noite. Ao acordamos pela manhã lembramo-nos do que aconteceu por toda a madrugada? Não acordamos a manhã seguinte somente com algumas vagas memórias? É isso o que nos acontece quando morremos. Acordamos em algum novo corpo em qualquer outro lugar.

  Não nos lembraremos de nada, nem mesmo quem fomos. Nasceremos novamente e dependendo de nosso carma, de nossas ações, teremos o que merecermos, do que obtivemos. Enquanto lá, iremos chorar, uma alma de choro convulsivo, porque não saberemos quem somos nem onde estamos e não reconheceremos nada exceto frio, medo, incerteza e o sofrimento de uma pessoa alta de branco nos dando palmadas.

  Se quisermos ter controle desse processo de morte e renascimento, e estarmos cônscios disso, temos de mudar agora, hoje, o nível de nosso ser de modo que ao cairmos no sono a noite, saibamos o que nos está acontecendo por todo o tempo de sono, estando cônscios disso, e quando voltarmos ao nosso corpo pela manhã, saibamos quem somos, por onde estivemos e nunca perdermos a consciência durante o sono noturno.

  Isso não é teoria nem é crença. Está acontecendo com as pessoas que praticam esses ensinamentos. Aqueles que praticam diariamente, deitam-se para dormir, mas não caem no sono. O corpo dorme, mas a consciência não dorme. Usam aquele tempo enquanto o corpo esteja dormindo a fim de continuarem a trabalhar a si próprios, transformando-se não no mundo físico, mas no mundo dos sonhos.

  Na Árvore da Vida o nível mais baixo é Malkuth, o mundo físico. Sobre ele é Sim a quarta dimensão (Eden), e então segue-se a quinta dimensão, o mundo dos sonhos, Hod e Netzach. Qualquer religião que estudemos diz-nos sobre estarmos acordados no mundo dos sonhos, ali falando com os deuses, na quinta dimensão, seja no cristianismo, no judaísmo, no budismo, no hinduísmo. As pessoas de hoje pensam que isso é uma piada. Não é não, é real.

  Abandonarmos atividades inúteis significa que ao invés de perdermos tempo fazendo compras, absorvendo-nos no facebook por horas em nosso aparelho, paremos de fazer coisas estúpidas como aquelas. Voltemos nossa energia e atenção às coisas que sejam frutuosas, que realmente tragam benefícios e significados não unicamente a nós, mas também aos outros. Pessoas às vezes reclamam: “não sei o que fazer para ajudar outras pessoas. Não sei o que fazer para avançar na minha vida espiritual”. É somente ver como gastam o seu tempo, e mudar isso.

  Cada pessoa vivente tem muitas coisas a oferecer em ajuda aos outros, sem qualquer exceção. Temos estudantes; e um em particular está vindo a minha mente. Esse estudante é um homem bem jovem que está mentalmente desorganizado. Não é fácil lidar com ele. É muito imprevisível. Ele é alto, musculoso, enorme e de muita energia. É intimidador, mas tem enorme compaixão. Apesar de sua condição mental ele investe seu tempo e energia não como um “batata de sofá” a assistir tv ou a jogar vídeo games, mas servindo e ajudando os outros. Portanto, se ele com sua condição e limitações pode fazer isso, eu sei que todos podem também faze-lo. Não temos desculpas.

  Então, ao invés de perdermos tempo com coisas inúteis, mas investirmos nosso tempo e energia em ações frutuosas que beneficiem os outros, receberemos benefícios. Portanto, ao invés de passarmos o tempo com coisas egoístas, desperdiçando esse tempo, ajudemos os outros e em troca recebamos ajuda.

  5. Pura Disciplina Ética

  A quinta é a pura disciplina ética. Significa sermos muito verdadeiros para nossa consciência. Significa nunca mentir não importando o custo. Nunca mentir! Nunca roubar! Nunca matar! Entendemos agora que os grandes professores e grandes mestres nos explicaram que todas as éticas que aprendemos, como os Dez Mandamentos e o Vinaya, deram-nos todas as diferentes descrições de como nos comportar. Não podemos de nenhum modo tomar isso como um advogado a procurar por brechas. Temos de viver o espírito da ética.

  Há pessoas que cresceram na cristandade e pensam assim: “Bem, Deus disse que não devíamos fornicar nem cometer adultério. Mas estamos numa era moderna, todos estão fazendo isso, então Deus me perdoará mais tarde. Tudo o que eu tenho a fazer é dizer que aceito Jesus e pedir que me perdoe e Deus dirá Okay e me conduzirá ao Paraíso”.

  A Bíblia não diz assim. Nem as escrituras do induismo, budismo e judaísmo. Nenhuma diz isso. Jesus nunca disse isso. O que as escrituras dizem é que nenhum adúltero, nenhum assassino, nenhum mentiroso, nenhum ladrão irá para o paraíso. Todos nós temos aqueles elementos conosco: “bem, eu não matei ninguém, não cometi adultério”. Mas compreendendo o que os ensinamentos dizem, o que Jesus ele mesmo disse, que qualquer um que olhar para uma mulher com luxúria já cometeu adultério com ela em sua psique, em seu coração, em sua mente, isso vem significar que todos somos adúlteros, assassinos e ladrões, por que cometemos esses crimes psicologicamente. Permitimo-nos fazer isso diariamente.

  Ter pura disciplina ética significa trabalhar contra isso. Não importa se alguém mais concordar que estaremos indo contra a totalidade do mundo. O que importa é nossa íntima relação com a divindade. Lembro-me agora de umas belas palavras ditas por Joana D’Arc: “Prefiro morrer a fazer alguma coisa que eu saiba ser errada”.

  Isso mostra o quanto ela estava envolvida com a ética correta, com a disciplina ética. Ela viveu com isso e transformou a Europa com essa atitude. Nós próprios necessitamos adotar esse tipo de atitude para descobrirmos a verdadeira ética. É algo conhecido através de nossa consciência.

  Há coisas que devemos estudar para nos auxiliar. Todos temos nossas escrituras, a Bíblia, os Sutras, os Tantras, o Gita, o Mahabharata e o Vinaya. Temos muitas escrituras de muitas tradições que explicam o espírito da tradição ética – a ética que necessitamos para libertar a consciência do sofrimento. Precisamos exatamente fazer isso.  A maioria das especificidades sobre disciplina ética são claramente óbvias. São baseadas em alertas que todos conhecemos, tal como: faze aos outros o que queres que te façam. Em outras palavras: tenha compaixão, seja bondoso, seja paciente e tenha amor.

  Há uma instrução em disciplina ética que pessoas modernas negligenciam ou evitam, e em alguns casos nada sabem dela. É a instrução que todo monge, freira, padre ou iogue recebe, que é estar num estado de Brahmacharya ou pureza sexual. Essa instrução é extremamente significativa. Modernos estudantes de meditação negligenciam esse alerta e acham que se aplica unicamente a monges, freiras e padres. Na verdade se trata da real fundação que estabiliza a consciência. Nosso uso da energia sexual tem um tremendo impacto em nossa psique. Brahmacharya ou castidade sexual não se refere à repressão ou evitação da sexualidade. Contrariamente, refere-se a um uso saudável da energia sexual: um uso da energia que abandona o desejo, que é aproveitada para intenções espirituais. A fim de tornar isso mais fácil, o estudante recebe instruções para exercícios em que a energia pode ser reaproveitada e transformada com o objetivo de nutrir a livre consciência, em troca de alimentar a sensualidade, o orgulho, a inveja, a ganância, a gula e todas as demais tendências a que nossa energia sexual se inclina em alimentar quando não está sob o controle da disciplina espiritual.

  A energia sexual é criativa, mas também é destrutiva. A pessoa bastante responsável sobre o desenvolvimento de sua consciência e auto libertação do sofrimento, virá utilizar o poder sexual para aquela libertação. Significa estar envolta pela disciplina ética ao uso da sexualidade. Em síntese, a disciplina ética da sexualidade conduz a retornar aquela energia para dentro de si próprio na intenção do desenvolvimento espiritual a fim de se libertar de sua submissão ao desejo animal à luxúria, fazendo algo puro, humano, algo que suporte o desenvolvimento e crescimento da consciência libertada.

  6. Estancar Pensamentos de Desejos

  O sexto pré requisito é estancar pensamentos de desejos ou pensamentos que são manobrados pelos desejos. Quando de fato observamos e honestamente prestamos atenção aos nossos pensamentos, emoções e aos impulsos que se movem o tempo inteiro através de nossa psique, descobriremos que eles são fortemente endereçados a todos os tipos de atrações pelos desejos de sensações. Em síntese, pensamentos, emoções e impulsos no corpo estão, na maior parte do tempo, enraizados nos desejos. Então, para este sexto pré requisito estancar os pensamentos de desejos é necessário transformar aquilo.

  Ao invés de sermos escravos de nossos pensamentos e sermos sempre pegos em seu constante fluxo, aprendemos a ter o controle  de nossa experiência psicológica e a observar o conteúdo dos pensamentos e emoções a fim de nos tornarmos cônscios deles. Começamos a questionar: de onde provêm esses pensamentos? Quem está realmente pensando? Sobre o quê, em verdade, são esses sentimentos? Há um desejo que esteja estimulando esse pensamento ou essa emoção ou esse impulso a agir? O que realmente esse desejo quer? É compatível com minhas aspirações espirituais ou é contraditório?

  Se formos honestos conosco, atestaremos que a maioria dos pensamentos, sentimentos e impulsos que experienciamos incide na gratificação dos desejos; a atração corre em direção às sensações e circunstâncias. É extremamente raro eles terem algo a ver com valores espirituais. Um modo de trabalhar esse estado de condicionamento psicológico de que somos possuidores é inverter nossa visão sobre esse ponto. Quando nos pegarmos a pensar, sentir e a seguir os impulsos mecânicos e animais, enraizados nos desejos, devemos então refletir sobre a impermanência, a inevitabilidade da morte, e sobre causa e efeito.

  Ao nos sentirmos atraídos a adquirir algo; a termos uma experiência ou estarmos atraídos por uma pessoa e não conseguirmos deixar de pensar sobre isso, precisamos refletir da natureza dessa atração. O que isso significa? O que há no interior disso? Por que somos uma vítima disso? Por que isso nos está direcionando?  Mesmo que consigamos a coisa que desejávamos não a teremos por muito tempo. Sofremos agora por não tê-la. Após a termos, sofreremos pelo medo de perdê-la e eventual e inevitavelmente a perderemos. Então, quando a perdermos, sofreremos. Por que então entrar nesse inteiro processo? Por que entrar no processo em sendo uma vítima do desejo e uma vítima do sofrimento? Por que, exatamente, não renunciar àquele desejo agora e evitar a todo o anunciado sofrimento?

  Deste modo, podemos transformar essa tendência de pensar constantemente em tudo que desejarmos, de estarmos jogando emoções e impulsos sobre as coisas a fim de obtermos e experienciarmos delas. Obviamente que para realizarmos isso temos de ser autoconscientes, auto-observantes. Precisamos estar observando nossa mente, intelecto, sentimentos, coração e corpo. Precisamos estar vigilantes e despertos. Nesse processo da plena consciência e vigilância estaremos desenvolvendo a concentração e a serenidade meditativa. Nisso desenvolvemos também nossas habilidades para a meditação e para reconhecermos a diferença entre nós e nossos pensamentos.

  O ponto essencial para todos esses pré requisitos é o modificar de nossos comportamentos de tal maneira que não mais tenhamos nossa psique interrompida. Ao invés de nos causarmos maiores distúrbios psicológicos temos de modificar nossos comportamentos, ações, pensamentos, sentimentos e o modo de usarmos nosso corpo, conduzindo-nos através da serenidade e tranquilidade. Isso é possível alcançarmos pelo abandono de nossos maus comportamentos, dos maus modos de pensar, das emoções nocivas e das ações perversas do corpo. A mente se estabiliza naturalmente e a psique mergulha num estado igualmente natural de calma.

  A razão de nossa mente estar perturbada e instável prende-se a não conseguir concentrar nem relaxar devido aos nossos comportamentos. Ao nos aplicarmos a esses dois pré requisitos eles convergem aos nossos comportamentos (físicos e psicológicos) e a serenidade vem tornar-se o natural destaque. Isso é simples causa e efeito.

  Permitam-nos enfatizar novamente que a base de toda essa mudança é energética. É a energia que nutre nossas ações. A energia mais poderosa que possuímos é a sexual. Podemos realizar todas as mudanças éticas, meditar diariamente por horas, mas se não estivermos trabalhando com a energia sexual de um modo correto, nunca aprenderemos da verdadeira serenidade. A energia sexual detém o maior poder de perturbar a mente, o coração e o corpo. Inversamente, é também o maior poder para criar a serenidade na mente, no coração e corpo. Então, se realmente desejarmos aprender a meditar, sejamos sérios no sentido de também transformarmos nossa vida sexual.

  Tudo isso será somente o primeiro aspecto da preparação para a serenidade. Se observarmos esses passos e praticá-los veremos que eles significam a troca das coisas que nos dão descontentamento, que nos vem causando dor, ansiedade, raiva, inveja, orgulho, sensualidade e todas as demais qualidades que são opostas à serenidade.

  Se quisermos serenidade na meditação, se quisermos adentrar esse caminho e estabilizar a nossa psique de modo a podermos refletir a realidade e adquirirmos sabedoria, então necessitamos parar de nos comportarmos de maneira contraditória. Observemos, reconheçamos os comportamentos com que nos desempenhamos, que nos causam a não serenidade, e então mudemos. Somos invejosos? Estamos descontentes, ansiosos, estressados, luxuriosos, raivosos? Transformemos tudo isso.

  A maioria de nós pensa assim: “ficarei contente se conseguir me mudar, se puder sair de minha cidade, meu local, meu apartamento; se puder encontrar uma namorada ou namorado, se conseguir melhor emprego”. Todos achamos que coisas exteriores nos trarão contentamento. Não trarão. Todas as circunstâncias exteriores nos criarão exatamente o mesmo problema. Nosso descontentamento não é causado pelas coisas exteriores, mas por nossa psique.

  Em resumo: esses seis passos estão encadeados para conduzir-nos a uma nova atitude; ensinar-nos a nos transformar; a encontrarmos contentamento para o momento; a sermos cônscios de nós próprios; a estarmos relaxados não permitindo aos desejos e ao descontentamento estarem ao comando de nossa experiência psicológica; para termos nossa força de vontade focada no momento: aberta, não desejosa, não alheia, percebendo a realidade, observando os fatos, vendo as coisas como são e manobrando com elas. É tudo muito prático: pés no chão e não estarmos com a cabeça nas nuvens, não sonharmos sobre o nirvana ou paraíso, não enfatizarmos sermos uma pessoa espiritualizada; é estarmos no momento, vivendo com plena atenção, com a consciência integrada ao completo poder de nossa habilidade em perceber, recebendo aquela informação e a transformando. Falamos sobre algo que é muito energético, muito consciente. Se pudermos começar esse processo então estaremos realizando o que é chamada auto-observância.

  Auto-Observância

  Auto-Observância é a continuidade da nossa própria conscientização de momento a momento. Não é a simples e casual conscientização, mas uma ativa observância. Diz sobre estarmos olhando os fatos, relaxando e continuamente observando.

  Relaxar não é o elemento chave. Podemos observar que quando nossa habitação ou lar é um lugar de caos estamos sempre irritados e incomodados. Isso nos deixa estressados e não conseguimos relaxar. Quando não estejamos contentes; cheios de tantas coisas de atividades, ficamos estressados e não relaxados. Não detemos boa ética. Mentimos, fornicamos, cometemos adultério, trapaceamos, não estamos sendo honestos, ficamos ansiosos. E tantas outras coisas mais! Que dizer das eleições; do presidente? Sobre a guerra?

  Todas essas informações fluindo sobre nós o tempo todo nos fazem muito tensos, estressados e caóticos. Acontecem por que não as estamos transformando. Essa é a escolha que devemos fazer. Ao mudarmos nossa atitude mudamos também as coisas que podemos mudar em nosso meio ambiente. Talvez haja algumas coisas que possamos melhorar em nosso lar: sejam nossos comportamentos, atitudes ou atividades em que estejamos envolvidos. Talvez possamos diminuir coisas de que não necessitamos estar fazendo. Porém, principalmente, necessitamos aprender a mudar nossa experiência de cada momento. Necessitamos estar presentes a observar fatos e relaxar.

  Esse relax é para o corpo inteiro o tempo todo; a qualquer momento que possamos nos lembrar. O que estejamos a fazer – no trabalho, dirigindo o carro, em casa, lavando pratos, lavando a roupa – tornemo-nos cônscios a nós próprios. “Por que estou tenso? Estou somente lavando a roupa! Por que minha mente dispara quando estou somente lavando roupas?”. Relaxemos e estejamos totalmente presentes. Não há necessidade de pensarmos sobre o amanhã ou o ontem. Vejamos o que estamos a fazer e unicamente façamos aquilo. Descartemo-nos de tudo mais. Respiremos, relaxemos e observemos. Mantenhamos essa continuidade, ação após ação.

  Quando estivermos no trabalho tratando com nosso empregador, e com pessoas a quem servimos, precisamos aplicar o mesmo princípio. Notemos que em meio a uma conversação ficamos muito tensos, começando a agir de diferentes modos a fim de impressionar as pessoas, a agradar-lhes para influencia-las nas suas atitudes conosco. Por que fazemos isso? Por que não ficarmos relaxados e sermos nós mesmos? Por que não sermos honestos? Por que não ficarmos contentes e não nos ligarmos ao fato de gostarem ou não de nós, se nos elogiam ou nos censuram? Ao sermos honestos conosco podemos ser fortes naquilo, ao invés de ficarmos passivos, decepcionados, não agindo como somos de fato. Se estivermos agindo como fôssemos outra pessoa, normalmente ficaremos ansiosos por não sermos genuínos.

  Essas coisas são simples, mas produzem um grande impacto sobre nossa psique.

  Todas essas ações cumulativas através do dia estarão a produzir nossa experiência de vida. Se estivermos experienciando descontentamento, ansiedade, estresse, estaremos nós mesmos criando cada vez mais essas coisas. Se, entretanto, pudermos mudar nossas atitudes aprendendo a observar e relaxar durante todo o tempo, tudo mais mudará. 

  Existe um princípio fundamental, uma lei da natureza: “se mudarmos interiormente, tudo mais exteriormente também mudará”. Isso é uma lei da natureza, não é uma teoria, e podemos comprova-la.

  Observemos as pessoas. A alguém que tenhamos conhecimento de sua vida por muito tempo e subitamente comece a beber, a fumar, a dormir em qualquer canto, tornando-se um viciado, um mentiroso e ladrão. Podemos observar como sua vida foi para dentro do toilette. Agora, observemos outra pessoa que tenha sido má e tenha feito coisas ruins, porém tenha mudado, desistido dos vícios, desistido de ser desonesta e constatemos como sua vida tem melhorado. Essas mudanças refletem leis da natureza. São observáveis, factuais e comprováveis. Vivamos por nossa própria conta.

  Escolhamos ações superiores e recebamos resultados superiores.

  Todas essas coisas concernem à nossa vida diária. Em nossa vida diária implantamos um ambiente psicológico. Podemos tornar essas coisas bem claras a nós próprios. O modo como estamos engajados no mundo vem criando um ambiente para nossa psique. Se estivermos nos comportando de um modo superior e apropriado, aquele nosso ambiente também se torna apropriado para a meditação. Somente num ambiente desses a meditação pode grassar. Aquele que for viciado em drogas, álcool, sexo, dinheiro, em divertir-se e em todas as coisas que podem viciar, esse nunca chegará a aprender meditação até que largue os vícios. Qualquer tipo de atividade ou comportamento que produza descontentamento, desequilíbrio, ódio, dor, ansiedade e todos os tipos de semelhantes qualidades [negativas] contraditórias à serenidade, contradizem à meditação. A meditação acontece quando a psique está calma e serena. Ao ouvirmos pessoas a falar sobre vida espiritual, encorajando o uso de drogas, do álcool, ao abuso do sexo e a considerarem quantidades do dinheiro envolvido, estão mentindo.

  2. Prática Para Serenidade Meditativa

  Uma vez criado o ambiente psicológico entramos na verdadeira prática para o desenvolvimento da concentração de modo a eventualmente conseguirmos acessar o estado de meditação.

  A prática tem dois aspectos:
  - Postura Efetiva
  - Prática Efetiva

  Ao longo de nossa vida diária nossa atitude psicológica encontra-se fora de controle, onde não estivemos cultivando o relaxamento e a tranquilidade; então, ao tentarmos meditar não conseguimos ficar relaxados. Voltando a nossa casa após um dia maluco: ansiosos, zangados, tristes e querendo meditar – será muito difícil conseguirmos. Podemos nos sentar e tentar meditar, mas pode nos tomar muito tempo para sairmos daquela intensidade. Vemos agora como faz sentido termos nossa vida diária cultivada com a serenidade antes de praticarmos meditação, visto que, ao virmos para a nossa meditação precisarmos nos ter mantido relaxados o dia inteiro a fim de que a meditação se tornasse fácil. Então, com essa atitude, já teremos vencido esse estágio e nosso corpo estará relaxado, nossa mente pronta, e igualmente pronto estará nosso coração.

   Postura Efetiva: Relaxamento & Vigília

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    Figura 5
    Postura
  A efetiva postura significa primeiramente estarmos relaxados. Essa é a coisa mais significativa. Temos de estar completa e plenamente relaxados; não unicamente física, mas também mental e emocionalmente. Na linhagem da meditação tradicional existem posturas específicas recomendadas, que são muito boas. Há a tradicional postura do lótus ou a postura meio-lotus que a maioria das pessoas associa com meditação por uma razão. É um fundamento extremamente efetivo para a prática da meditação, contudo não seja o único. Podemos nos sentar ao estilo japonês, com as pernas dobradas debaixo de nós. Podemos nos sentar numa cadeira, com mãos nos joelhos, pés no chão e costas retas. Essas posturas básicas não são as melhores para iniciantes terem sua espinha reta, sua cabeça em pé e o corpo relaxado. A razão de querermos estar empertigados, sendo iniciantes, prende-se a não cairmos no sono.

  Como iniciantes, estamos aprendendo a relaxar o corpo, a traze-lo daquela intensidade do stress e da busca por desejos, para um estado de contentamento. Entretanto, o hábito com que estamos hoje em dia acostumados é de, ao nos sentarmos ou nos largarmos para relaxar, cairmos diretamente no sono. Na prática meditativa não queremos cair no sono e perder a consciência. Então, aprendemos a manter uma postura onde possamos relaxar, embora permaneçamos vigilantes. A vigília significa mantermos nossa consciência presente ao que estejamos fazendo. Por vezes usamos a palavra sonolência ao falarmos sobre prática meditativa. Algumas linhagens condenam a sonolência. Dizem não devermos ficar sonolentos. Estão significando que não devemos cair no sono perdendo nossa consciência. O que significamos por sonolência é quando o corpo esteja tão bem relaxado que não tenhamos de prestar-lhe atenção, o que é idêntico a quando nos preparamos para tirar uma soneca ou dormir. O corpo se torna exatamente imóvel. Essa é a melhor postura a conseguirmos para a meditação. O que devemos querer em nossa prática meditativa é estarmos aptos a esquecer o corpo, colocando-o naquela postura e o deixando ali, parado, perfeitamente imóvel. Ademais, com a sonolência acessamos facilmente o poder da imaginação, que é supinamente importante para o acesso ao samadhi. Adiante, falaremos mais sobre esse assunto

  Nosso objetivo, conforme explicado em palestras anteriores, é retirarmos nossa consciência para fora do corpo físico. Relembremos: Malkuth representa a fisicalidade. Cada uma daquelas esferas acima de Malkuth representa outros aspectos de nossas experiências energéticas e psicológicas: energia, emoção e vontade. Devemos querer relaxar para além daqueles fatores condicionantes. Não conseguiremos fazer isso se nosso corpo físico estiver desconfortável, com dores e nos perturbando. Daí necessitarmos estar aptos a colocarmos o corpo numa postura em que possa descansar, estar contente e imóvel. Para tanto necessitaremos do relaxamento.

  Prática Efetiva

   A prática efetiva requer dois componentes:
   Atenção plena (corda): atenção é não nos distrairmos do objeto da concentração.
  Vigilância (gancho): conscientização de estarmos distraídos.
 
  Esses dois componentes estão representados pelos implementos que o monge carrega. Na sua mais básica forma, atenção plena significa permanecermos atentos ao que estejamos fazendo. Ao estarmos lavando pratos permanecemos atentos nessa tarefa? Se formos honestos diremos, não. A maioria de nós lava pratos pensando em qualquer outra coisa. Lavamos mecanicamente. Não prestamos atenção àquilo; ouvimos o rádio ou pensamos sobre o trabalho, sobre aquela pessoa atraente que vimos, ou sobre aquele produto que desejamos comprar na internet. Lembramos dos problemas que tivemos naquele dia ou dos problemas que iremos tratar amanhã, continuando a lavar os pratos sem nos conscientizarmos de nosso corpo. Isso é falta de atenção plena, o que será um obstáculo para a meditação. Para estarmos aptos a meditar necessitamos de uma atenção bastante forte. Significa nossa atenção não estar distraída sobre o que estejamos concentrados. Ao iniciarmos o procedimento do desenvolvimento da serenidade meditativa, aprendemos a colocar nossa consciência num só objeto, mantendo-a ali, retirando nossa atenção de qualquer outra coisa.

  Uma prática comum e básica a usarmos é a mecânica da respiração. Ao observarmos as sensações da respiração na medida em que acontecem, e sem muda-las, mantemos nossa atenção naquilo. Atenção plena é como aquela corda entre o lugar de onde a consciência procede e o objeto  que estejamos observando. É uma corda que nos conecta. Estarmos cônscios sobre o que estejamos fazendo é atenção plena. É isso o que devemos aperfeiçoar. Podemos desenvolver a atenção o dia inteiro durante todas as nossas atividades. Ao dirigirmos o carro estejamos inteiramente atentos à direção. Devemos estar cônscios do que fazemos, observando a continuidade daquela conscientização. E ao ficarmos distraídos, de novo trazermos de volta nossa atenção permanecendo atentos continuamente, cônscios sobre tudo o que estivermos fazendo. Desse modo, estaremos desenvolvendo nossa prática meditativa mesmo ao volante, andando, lavando pratos ou enquanto trabalhamos. Nossa vida se fortalecerá para o objetivo do desenvolvimento espiritual.

  O gancho que ele mantém na sua outra mão é a vigilância. Isso é usado para vigiar quando começarmos a ficar distraídos. Digamos que estejamos a meditar observando nossa respiração, então estamos vigilantes de que os pensamentos começam a acontecer sobre o show na tv, e puxa! Foi engraçado quando tais e tais fizeram isso e aquilo, e quando disseram isso também, aha aha....[risos]. Então nós nos pegamos: ah, não estou prestando atenção. Esse é o gancho da vigilância trazendo-nos de volta àquele objeto da concentração.

  Essas duas ferramentas são significativas.

  Quando inicialmente estiverem aprendendo a meditar se sentirão impossibilitados de executar qualquer delas. Daremos a instrução para todos relaxarem, vocês tomarão uma postura e diremos: Okay, agora observem sua respiração, não prestem atenção a nada mais e coloquem 100% da atenção nas sensações respiratórias”. Começarão na observação por cinco segundos, dez segundos, quinze segundos, então se lembrarão de um episódio de algum show na tv quando foram crianças, que foi muito engraçado. Vinte minutos se irão e eu direi: “Okay, feito”. Vocês dirão: “Espere um minuto. Tudo o que eu fiz foi pensar sobre tv”. Parecerá frustrante. O que essa experiência demonstra é quão pouca atenção, quão pouca vigilância detiveram, não unicamente na meditação, mas pelo dia inteiro. Então terá sido uma boa experiência que mostrará o quanto de trabalho será necessário realizar. É uma experiência penosa, mas bela. Esse é o momento inicial e quando conseguirmos realizar exultaremos: “Uau! Isso é real. Eu posso mudar!”

  Mudamos isso através de nossas atividades diárias, praticando diariamente. Pouco a pouco nossas ferramentas vão ficando melhores. Ficamos mais fortes. Tornamo-nos capazes de manter a vigilância em tudo o que estivermos fazendo em longos períodos. Nossa vigilância desenvolverá de um modo a estarmos sempre ali, aguardando para ver se nos distraímos e nos pegar para trazer-nos de volta ao foco do objeto da meditação.

  Isso é fundamentalmente como começamos a caminhada ao longo da trilha da serenidade.

  Primeiro Estágio da Serenidade Meditativa
 
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  Figura 6
  Fixamo-nos na psique pela retirada da atenção de qualquer outra coisa e a conduzimos diretamente para um único foco.

  O primeiro estágio mostra um monge perseguindo um elefante e um macaco. O elefante representa a dureza e o peso da mente que se encontra fora de controle. A mente está sendo ao longo conduzida pelo macaco, que está sempre distraído e curioso, sempre navegando na internet, indo ao facebook, indo aqui e ali, interessado nisso, naquilo, sempre escapando da verdade. Nós, como pessoas espiritualizadas, a consciência que deseja mudar, temos de perseguir esses animais em nossa mente. Para fazermos isso, necessitamos da corda e do gancho.

  Então, através de nossa vida diária e também através de nossa prática diária da concentração, necessitamos aprender a fixar a psique pela retirada da atenção de qualquer outra coisa e a conduzirmos diretamente para um único foco.

  Esse é o estágio um. Cada buda, anjo e mestre que por certo aprenderam a se tornar naquilo o que são, começaram aqui. O começo não é fácil. É o que o fogo a esquerda representa, ou seja: a intensidade de esforços que isso exige, a quantidade de energia que nos toma para nos mantermos cônscios de nós próprios, muitas e muitas vezes. O Buddha Shakyamuni disse que em nossa prática a mente vagueia milhares de vezes e a retornamos para a vigília milhares de vezes e que isso era uma bela meditação.

  A chave é mantê-la quando estivermos distraídos e trazer de volta nossa atenção ao objeto da observação. Isso tem de ser um esforço diário e continuado, todos os dias sem exceção. É isso que inicia o processo de mudança. Se fizermos assim uma vez na semana nunca chegaremos a lugar algum. Desistiremos. Entretanto, se trabalhamos nisso diariamente, fazendo o máximo esforço que possamos, então chegaremos na mudança. Chegaremos. É inevitável. É científico.

  Esse esforço tem dois componentes:

  Concentração diária: nessa experiência diária, o dia inteiro, é estarmos vigilantes, presentes e relaxando, observando o que estejamos fazendo, não ficando distraídos, e quando começarmos a nos distrair, retornamos a atenção à completa conscientização naquilo ao que estejamos fazendo no momento.

  Prática de concentração diária: todos os dias tomando dez ou vinte minutos sentados, fechando todos os nossos sentidos e focalizando a concentração numa só coisa. Essa coisa pode ser o que desejarmos, mas não mudando isso. A observância ao fluxo natural da respiração é a mais simples: temos sempre ela conosco. É justamente observar as sensações da respiração por nossas narinas. Não mudemos nossa respiração, não a modifiquemos, somente a observemos: existem pequenas e constantes mudanças naquelas sensações, assim unicamente as observemos e vejamos não somente o quanto detalhada e focada nossa concentração pode ser, mas também o quanto contínua.  

  Se quisermos realmente levar a concentração a sério precisaremos fazer isso duramente, porém com mais efetivos exercícios: primeiramente, observarmos um objeto sagrado, como uma estátua ou imagem de divindade. Digamos, uma imagem de Jesus ou Buddha ou alguma divindade. Memorizarmos o que vemos. Em outras palavras, trazermos o quadro mental daquilo. Depois usarmos aquele quadro mental como nosso objeto de foco. Fechamos os olhos e o visualizamos. Isso é bem mais difícil que observarmos a respiração, mas proporciona mais frutos.

  Faz-se necessária a prática da concentração nesse mesmo modo pelo dia inteiro. Para iniciantes é eficiente fazerem isso em pequenas sessões a fim de não se exaurirem: façam por dez minutos, deem uma parada e se desejarem façam outra sessão por mais dez minutos, deem outra parada, etc. Isso é o começo do treinamento da atenção.

  Segundo Estágio da Serenidade Meditativa

  A continuada fixação envolve a atenção que foi inicialmente direcionada para o contínuo foco sem ficar distraída por qualquer outra coisa.

  Ao trabalharmos seriamente com aquelas duas áreas de práticas alcançaremos o segundo estágio. Aquele estágio que mais estaremos mirando a fim de diretamente desenvolvermos a maior continuidade da atenção.

  No primeiro estágio aprendemos a colocar a atenção numa só coisa. No segundo estágio estaremos constantemente trazendo isso de volta. Eles nos soam muito familiares. A diferença está em que no segundo estágio já existe um pouco mais de atenção e vigilância, significando determos alguma conscientização de que devemos nos concentrar naquilo que estejamos fazendo. No gráfico podemos ver agora que existe um pouco de branco nos animais. Aquele branco é claridade, serenidade, concentração, fixação, etc. Ilustra como a psique começa a se tornar um pouco diferente. Ao invés de estarmos indômitos durante todo o tempo temos esses momentos em que experienciamos paz. Podem acontecer a qualquer hora. Podem ser durante o dia ou durante nossa prática de meditação, entretanto começamos a perceber o fato. Podem acontecer assim: “Uau! Realmente me sinto relaxado, sinto-me vigilante e um pouco mais concentrado”. É algo muito bonito começarmos a ver esse fruto. Se realmente estivermos fazendo o esforço a fim de desenvolver esses dois aspectos da concentração – diariamente com atenção plena e diariamente com práticas concentradas – então estaremos iniciando uma mudança dinâmica em nossa experiência de vida e os resultados emergirão inevitavelmente. É simplesmente causa e efeito: produzimos as causas e os efeitos chegarão.

  Os efeitos dessas práticas começam primeiramente com momentos de serenidade, paz, calma, contentamento simples. Do mesmo modo em que estejamos praticando atenção plena durante todo o tempo, esses efeitos podem emergir a qualquer hora. Então, sejamos pacientes, persistentes, e confiemos na inevitabilidade da causa e efeito.

  Exercícios

  Todos os dias para desenvolver a todo momento a auto-observância. Também para ampliar a atenção plena: o espaço de tempo em que estejam cônscios de vocês mesmos.

  Todos os dias desenvolver a concentração meditativa. Adotar uma postura de meditação, relaxar completamente e então focalizar 100% da atenção sobre um objeto escolhido.

  Escrever os fatos de seu dia em seu Diário Espiritual

  Ao desejar serenidade e a possibilidade de eventualmente acessar a meditação, colocar essas ideias em prática na vida diária: observar-se todos os dias, realizar a concentração meditativa todos os dias, e reportar aos fatos de sua experiência num diário espiritual. É assim que se torna responsável a si mesmo e honesto consigo próprio. O diário não é para qualquer um estar olhando. É só seu. Pode ser simples ou implementado como cada um o queira. Começar a reportar pelo mínimo: “hoje fiz esforço, hoje aprendi isso e hoje pratiquei por dez ou vinte minutos”. 

  Começar recordando esses fatos sobre seu trabalho espiritual e pouco a pouco começará a ver que produzem percepção; muita percepção. Algumas dessas serão dolorosas. Se, entretanto, reconhecer aqueles locais de dor é possível trabalhar neles e eles se desfarão. Se não vê-los e não manobrar com eles a dor ainda continuará ali. Melhor aprender sobre eles e a manobra-los.

POR UM INSTRUTOR GNÓSTICO

Fonte:https://gnosticteachings.org/courses/meditation-essentials/3786-meditation-essentials-06-preparation-for-serenity.html

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https://arcadeouro.blogspot.com/2019/04/fundamentos-da-meditacao-5-o-caminho-da.html
  Tradução Inglês / Português: Rayom Ra

                                                      Rayom Ra                                                                http://arcadeouro.blogspot.com.br