sábado, 3 de setembro de 2022

A origem e os poderes da Santa Muerte

 

A origem e os poderes da Santa Muerte


Hoje em dia existe uma espécie de divindade, ou figura santa, no México e nos EUA que é conhecida como Santa Muerte. Claro que esta Santa Morte - como lhe poderíamos chamar em português - não é uma santa "oficial", reconhecida pela igreja católica, mas uma figura da religião popular mexicana. Porém, basta olhar brevemente para a sua figura - podem ver um exemplo abaixo, para quem ainda não a conhecer - para se perceber que esta não é uma santa como as outras, mas uma figura religiosa bastante única, que até é muitíssimo fácil de reconhecer pela sua face e corpo esqueletal. Face a essa invulgaridade da figura, que em Portugal provavelmente só é conhecida através de séries de televisão americanas, podemos ser levados a perguntar duas coisas - qual a origem desta figura, e que poderes se crê que ela tem?

Origem da Santa Muerte

A origem da Santa Muerte

Em relação a este primeiro ponto, sabe-se que o culto público a esta santa data de finais do século XX ou inícios do XXI, mas a devoção privada a esta figura antecede essa data... e assim, visto que se tratava, originalmente, de uma figura religiosa privada, que as pessoas até podiam ter em sua casa sem que o mencionassem a mais alguém, é difícil saber quais as suas verdadeiras origens. Mas, através de uma antiga recolha de depoimentos em terras do México, bem como de diálogos com alguns especialistas, descobrimos algumas teorias sobre a possível origem da Santa Muerte. Mencionamos aqui apenas três delas, as que nos pareceram mais interessantes, por motivos de tempo e espaço:

 

Uma hipótese é que ela seja puramente uma representação antropomórfica da morte, enquanto conceito. Isto porque, se existiam anteriormente várias divindades na América do Sul que estavam associadas ao culto dos mortos, e se esse culto ainda existe, hoje, no México com algumas alterações notáveis (recorde-se o chamado Dia de los Muertos, celebrado nesse país a dois de Novembro), a contínua popularidade desse conceito da morte poderá ter gerado esta figura quase humana.

 

Outra hipótese é que seja uma descendente da veneração de San Pascualito [Rey], uma versão de São Pascoal Bailão - esse sim, um santo católico, nascido e falecido em Espanha - que era venerada de forma não-oficial no México sob a forma de um esqueleto com uma coroa. Para quem tiver curiosidade sobre a origem da uma tão estranha representação, diz-se que foi sob essa estranha forma que o santo apareceu a um fiel doente, prometendo curá-lo se este instituísse a veneração dessa figura na terra em que vivia.

 

Uma terceira é que esta figura religiosa tenha descendido de La Catrina, uma figura mexicana criada em inícios do século XX que representa uma mulher-esqueleto vestida de uma forma rica, potencialmente para nos relembrar que os ricos e pobres têm todos o mesmo destino (algo que, muito infelizmente, está bastante esquecido nos dias de hoje). A isso nos leva, sem quaisquer dúvidas, o subtítulo original dessa representação num jornal de 1913 - Las que hoy son empolvadas garbanceras, pararán en deformes calaveras - num evidente sentido de memento mori, i.e. "lembrem-se que terão de morrer".

A Santa Muerte numa bela representação

Os poderes da Santa Muerte

Não sabemos qual destas três hipóteses estará correcta, até porque existem muitas outras, mas o que isto nos permite concluir é que sempre existiu, e continua a existir, na cultura do México uma espécie de obsessão (positiva?) com o próprio conceito da morte, e isso poderá ter suscitado a ideia de venerar esta Santa Muerte como uma figura digna de crédito, como em tempos da Antiguidade alguns decidiram fazer com Satanás. E, nesse seguimento, talvez seja importante frisar que não encontrámos qualquer lenda fidedigna por detrás desta santa - ela não parece ser uma mulher mortal que foi santificada após a morte em virtude dos seus bons actos em vida, como acontece com as outras pessoas que atingiram a santidade, mas sim uma entidade que não se crê que viveu entre nós e que existiu sempre num plano mais místico.

 

E, nesse sentido, é fácil compreenderem-se os próprios poderes desta figura da Santa Muerte - é uma entidade protectora, num sentido que poderá ser interpretado, muito simplificadamente e de forma metafórica, como "venera-me e não morrerás". Até assim se explica que em séries de televisão a santa apareça muito associada ao crime, ao tráfico de drogas, etc., à semelhança daquele Jesus Malverde de que já cá falámos antes. E, de facto,  em artigos sobre essa devoção religiosa nos EUA - um exemplo pode ser visto aqui - é até possível ver que os devotos desta figura também se associam a essa outra figura popular do protector dos traficantes, bem como à famosa Virgem de Guadalupe e ao próprio Jesus Cristo, demostrando uma fusão repetida de crença católica e crença popular que não pode deixar de ser mesmo muito curiosa...