Eu conheço Oyá Bagan.
Isso faz muito tempo
Na época que eu era muito jovem,
Quase que um moleque
E ainda estava conhecendo o candomblé.
Eu me lembro daquela noite
Como se fosse ontem
Eu conheço Oyá Bagan.
Isso faz muito tempo
Na época que eu era muito jovem,
Quase que um moleque
E ainda estava conhecendo o candomblé.
Eu me lembro daquela noite
Como se fosse ontem,
Um amigo me chamou para ir
Ate o terreiro de uma senhora
Uma Iyalorixa que eu já conhecia
Pois ela era assistente social no posto
De saúde do bairro,
Ela era uma mulher baixinha e muito risonha
Uma típica filha de Oyá
Dessas que é amiga de todo mundo.
Eu fui, era festa de Xango,
O terreiro era para bem dizer
Um cômodo grande nos fundos de uma casa,
Era necessário descer uma enorme
Escadaria irregular
E chegando lá o salão era de
Chão de cimento queimado
E as paredes sem reboco
Um quadro desbotado de santa bárbara na parede,
Aquelas lampadas amarelas antigas
E um punhado de cadeiras de plástico
Para o povo sentar
E eu era jovem e metido a besta
E já tinha ido
Em terreiros mais luxuosos
Já olhei torto para o lugar pensando
"Que diaxo que vai sair nesse barraco de favela?"
Eu ainda não tinha a habilidade de enxergar
A riqueza verdadeira de um ilê axé,
Pois aquele terreiro na verdade tinha mais axé
Que todos os outros de piso de mármore
Que eu ja tinha ido.
Eu cheguei cedo e peguei a casa vazia
Mas dali a pouco começou a lotar,
Era tanta gente que não tinha cadeira suficiente
Nem para a metade e após lotar o lugar
Alguns ficaram do lado de fora
Espiando pelas janelas.
A festa começou
E em um determinado momento
Os ogans começaram a tocar o alujá
E Xango se manifestou em alguns de seus filhos,
Mas o que me deixou chocado
Foi quando o som alto dos atabaques
Foi derrotado por um outro som,
Um brado tão imponente
Que ultrapassou os atabaques
E reberverou no salão
"HEEEEEEEEEEEEEEEEEEY!"
Então meus olhos
imediatamente são levados até ela,
Oyá acabava de se manifestar na Iyalorixa,
Com as mãos na cintura e o queixo erguido
ela sacolejava os ombros lentamente
Com os olhos fechados em uma expressão altiva
De modo totalmente deslumbrante.
Sabe, eu nessa época não levava
Fé em Orixa de Candomblé,
Achava que na verdade era um povo meio doido
E nada alem disso, eu ia so porque achava bonito
Mas naquele momento
Diante daquela mulher
Eu não tinha um resquício sequer de dúvida,
Não sei como mas eu sabia
Que ali bem na minha frente
Estava Oyá, ela sim, eu estava diante de um Orixá
E não havia uma pessoa naquela sala
Que pudesse desconfiar daquele transe.
Meu corpo se tremeu
De surpresa e de reconhecimento,
E é estranho pois era a primeira vez
Que eu via aquela iyalorixa em transe
Mas a sensação era de conhecer aquela pessoa profundamente,
Sim, naquele dia eu vi Oyá,
OYÁ BAGAN.
Em um segundo a gritaria ensurdecedora começou,
Absolutamente todos os que
Tinham habilidade de incorporação
Foram possuidos por seus Orixás,
Oya saiu dançando atrás de Xango
E vários orixás se juntaram a ela,
Gente muito simples
Que não tinha rechileu pra usar,
Alguns tinham roupas de cetim
Outros de calça Jeans mesmo
Mas os Orixas estavam todos lá
E eu acredito piamente que estavam sim.
A palavra "Axé" as vezes parece muito vaga
Mas ela foi usada de forma literal ali
Pois eu senti o Axé daquele lugar
De forma tremenda.
Oyá saiu da vista do povo
E então apagaram as luzes
E xango veio com sua panela de fogo nas mãos
E Oya logo atrás segurando outra sobre a cabeça,
Ela vinha requebrandos os quadris
Fazendo a saia esvoaçar,
Ela mantinha as mãos segurando a borda da panela
Sendo possível ver as labaredas
Lambendo seus dedos
Mas ela não sentia, não se queimava.
Eu só me lembro de levar as mãos aos olhos
E enxugar as minhas lágrimas,
Eu chorava de pura gratidão
Por ter sido merecedor de ter estado ali
E visto aquilo
Pois era um momento tão precioso,
Tão absurdamente fantástico
Que nunca hei de esquecer.
No fim da festa
Antes de Oyá ir embora
Ela deixou cair um de seus idés de cobre
E eu abaixei para pegar e devolver
Mas ela segurou minha mão com a pulseira
E levou ela até meu peito
Então a Ekeji disse "Ela está dando pra você",
E eu sei que um idé é uma coisa barata
Que se compra em lojas de artigos religiosos aos montes
Mas eu guardo ele até hoje
Como se fosse feito de ouro maciço
E vou manter comigo eternamente
Pois mesmo se fosse um grão de areia
Eu guardaria pois foi Oyá quem me deu.
Hoje infelizmente essa iyalorixa já não está entre nós,
A idade avançou e Iku veio buscar,
Olorum deu a ela o merecido descanso,
Mas eu me lembro dela
De seus sorrisos com batom vermelho demais,
De sempre ter uma latinha de cerveja na mão,
De arrumar confusão no mercado
Porque não gostou do jeito da moça do caixa,
De zombar do meu modo arrastado de falar,
De contar piadas e rir a ponto de precisar sentar no chão,
De ir comigo comprar miçangas para meus fios
Pois conseguia fazer o rapaz da loja fazer um preço melhor,
E principalmente eu me lembro
Com grande orgulho
De ter conhecido através dela
A grande ancestral Oyá Bagan.
Havia grande dignidade ali.
Eepa Heiy!
Oyá é mulher forte!
Dedico essa imagem a minha grande amiga Dofona Dyandra de Oya que por uma coincidência divina também é filha de Bagan, também dedico a todo povo filho dela, se orgulhem desta mãe tão bela.
Espero que tenham gostado, quem quiser encomendar desenhos, brasões ou telas pode me chamar no whatsapp 11944833724
Obrigado