ARQUÉTIPO 9: A CUCA
Você pode até estar pensando: A cuca? Um arquétipo de Poder? Agora ela está inventando… só que: NÃO! Cuca a bruxa anciã ridicularizada, difamada e ofendida em sua feminilidade!
ARQUÉTIPO 9: A CUCA
Você pode até estar pensando: A cuca? Um arquétipo de Poder? Agora ela está inventando… só que: NÃO! Cuca a bruxa anciã ridicularizada, difamada e ofendida em sua feminilidade!
Uma das lendas mais icônicas do folclore brasileiro é a Cuca. Inicialmente retratada nos contos sob a forma de uma mulher velha com feições horrendas, ficou depois popularizada nos contos do famoso escritor Monteiro Lobato, como uma entidade que tem cabeça de jacaré e unhas imensas e é motivada unicamente pela maldade. Contos mais fundamentados (como as lendas russas) trata a Cuca como uma anciã, magra e corcunda, que possui a pele bastante enrugada e cabelos brancos. Mas essa descrição da Cuca fez com que ela fosse encarada em muitos locais como uma verdadeira bruxa ou feiticeira.
Cuca é oriunda da Península Ibérica e estava presente na cultura popular tanto de portugueses quanto de espanhóis. Nesses países, a lenda da Cuca era conhecida pelos nomes de Coco e Coca. Na Espanha, era enxergada com a forma de um dragão; na região da Galícia, acreditava-se que a Coca saía pelas ruas no dia de Corpus Christi para cometer maldades. Em geral, tanto em Portugal como na Espanha, acreditava-se que a Coca poderia ser um papão, isto é, poderia devorar seres humanos. A Coca também se relacionava com uma prática comum em uma região de Portugal chamada Minho. Nessa região era comum desenhar um rosto tenebroso em uma abóbora e colocá-la em locais públicos da vila/aldeia com o cair da noite. A abóbora era decorada com uma vela, que destacava o rosto assustador e tinha como propósito assustar as crianças.
Numa época em que as escolas quase que exclusivamente eram constituídas por instituições religiosas, a Cuca era a ameaça preferida para instigar obediência e medo nas crianças. Até as canções de ninar contém versos a Cuca (Vai-te, Coca, sai daqui para cima do telhado; deixa dormir o menino o seu sono sossegado) ou (Cuidado com a Cuca que a Cuca te pega, te pega daqui te pega de lá) ou ainda (Nana nené que a Cuca vem pegar. Papai foi pra roça e mamãe foi trabalhar)
A influência da cultura africana é mais fidedigna porque fez com que alguns lugares começassem a enxergar a Cuca como um negro velho ou negra velha. No idioma “mbunda”, o termo “cuco” ou “cuca” é usado para se referir a um avô ou avó, portanto a uma pessoa velha. Assim, acredita-se que o “negro velho” era uma versão da Cuca na cultura africana. Outra derivação da cultura africana relata que a Cuca é noturna e pode se transformar em corujas e mariposas.
Explicam que ela fora uma jovem que envelheceu sozinha e recôndita numa floresta após ter sido expulsa de casa pelos pais, quando apareceu grávida. Como o homem que lhe tirou a virgindade havia desaparecido (era um viajante) ela foi banida pelos familiares, quando a barriga começou a crescer. Passou toda gravidez sozinha e ao fim de nove meses deu à luz ao pé de uma grande árvore, só os animais presenciaram seu sofrimento. Mas a criança morreu ao nascer. Para aplacar a sua dor e tristeza, os espíritos da floresta puseram uma mariposa de asas abertas para cobrir seus olhos e fazê-la dormir numa lua cheia. Assim, a Cuca passou a viver como elas: durante o dia se refugiava e a noite despertava para caminhar em paz, sem ser perturbada por nenhuma presença humana, colhendo ervas, raízes e bulbos para cozer no caldeirão que guardava numa gruta. O aspecto macilento e esverdeado de sua pele devia-se a dieta exclusivamente vegetariana.
Mas quem era de fato a Cuca? O Sagrado conta outra história: A Cuca se encaixa fielmente na descrição do folclorista russo (Nikolaevich Afanasyev): “Uma mulher velha e má reconhecida pelo povo como Baba Yaga que voa pelos céus montada em um pilão, apagando seus rastros com uma vassoura. Sua casa fica dentro de uma floresta, porém pode mudar de lugar, já que se edifica sobre pés de galinha gigantes. Sua fachada é coberta por ossos humanos e crânios com olhos brilhantes sobre a cerca. A fechadura é em formato de uma boca cheia de dentes. Baba Yaga é conhecida por ser canibal, (ou tipo de papão), um verdadeiro monstro que mata e devora criancinhas, e não demorou muito para que sua imagem fosse associada à palavra bruxa. Muitos mitólogos afirmam que Baba Yaga era uma deusa pagã que acabou sofrendo os efeitos da demonização cristã. O fato é que Coco, Coca ou Cuca foi mais uma alegoria criada pelo patriarcado para retratar as anciãs sábias como velhas feias e más, com o propósito de descaracterizar a beleza de sua missão perante o sagrado: ensinar e iniciar as mulheres mais novas a conhecer e praticar a sua conexão com a Grande Mãe.
FONTES: Gabrielle Santana de Souza (2021)/ Toda Matéria (on line) e Brasil Escola (on line).
Sandra Bezerril e Mulheres de A Távola de Morgana