O QUE AS ENTIDADES PRECISAM PARA TRABALHAR?
Thaís amava a Umbanda mais do que tudo na sua vida. Desde que pisara pela primeira vez no terreiro, encantou-se pelo o que viu, escutou, cheirou e sentiu. Encontrara em si a certeza de que ali era o seu lugar. Sem hesitar, pediu para participar da casa, ainda que toda a sua formação havia lhe ensinado a temer a religião. Movida por um impulso que não compreendia muito bem, o qual aprendeu a confiar, dedicou-se muitos anos ao axé daquele local sagrado.
Ela se sentia em família. O templo era simples, humildade, porém bem organizado. Havia união, apesar de desavenças eventuais. O amor e o desejo de ajudar o próximo eram abundantes. Não entendia tudo o que era realizado, muitos rituais soavam como um mistério para ela. Entretanto, presenciara verdadeiros milagres que fortaleceram sua fé: problemas ditos insolúveis se resolverem, pessoas imudáveis se transformarem, doenças incuráveis se tratarem.
Com o tempo, ela mesmo se descobriu médium. Apesar de seus medos e inseguranças, Thaís invocou a coragem para mergulhar em todo o seu processo de amadurecimento espiritual. Conheceu seus guias e protetores, e notou como eles sempre a acompanharam, desde seus primeiros passou. Foi entre lágrimas e sorrisos que reconheceu que nunca esteve sozinha em sua caminhada. E quando finalmente seus pais de cabeça se apresentaram, agradeceu por toda a força recebida nas batalhas da vida.
O mundo, porém, dá suas voltas. Por questões profissionais e familiares, precisou mudar para uma cidade distante, no interior de outro estado. Foi com muita dor que precisou deixar aquele terreiro, que por tantos anos a acolheu. Sentia que deixava uma parte de si naquele espaço sagrado. Recebeu encorajamento dos seus irmãos de corrente e agradecimento da sacerdotisa; antes de partir, escutou uma curiosa orientação do guia chefe da casa:
- “Você vai para longe. Mas nós vamos para perto. Isto não é uma despedida, e sim um reencontro. Lembre, estaremos sempre contigo”.
Não havia terreiro ou centro em sua nova localidade, nem mesmo próximo. Ainda assim, a jovem médium procurou a todo custo manter as práticas de sua fé. Preparava seus banhos de ervas, declarava suas preces, realizava firmezas e deformações em sua residência. Era uma maravilha. Entretanto, com o passar dos meses, o desânimo e saudades cresceu em seu coração; até que, aos poucos, foi deixando de lado sua vida espiritual. Restou memórias felizes e muitas incertezas.
Alguém bateu em sua porta. Era seu vizinho, o qual evitava uma vez que só reclamava da vida e isto a esgotava. Tentou ignorá-lo, porém cedeu à insistência e pena. Encontrou-o com respiração ofegante, o rosto sombrio, os olhos tristes. Ele explicou que não estava conseguindo lidar com os pesos da vida, estava prestes a abandoná-la, porém sentiu um impulso para procurar a moça. Thaís não sabia como responder àquela situação, mas se viu a lhe aplicar um passe e palavras de conforto fluíram. Em um breve período, estava transformado.
Estes pedidos de ajuda se repetiram. Não apenas do vizinho, mas outras pessoas se aproximaram, muitas das quais Thaís não fazia ideia como souberam dela. Ela ficava muito preocupada, perguntava, em suas orações, se agia corretamente. Tudo o que recebia como resposta era uma simples questão: “o que as entidades precisam para trabalhar”? Entendia a importância de oferecer ajuda espiritual, porém, sua residência não possuía firmezas, assentamentos, correntes e tantos outros fundamentos que aprendera.
Um dia ela compreendeu a resposta. Estava na fila de um banco, esperava sua vez de ser atendida, quando subitamente alguém caiu no chão. Ele estava visivelmente em dor. Pensou em socorrê-lo, porém outra pessoa se aproximou, declarando-se médico. Por mais de 30 minutos, manteve o enfermo vivo, através de movimentos precisos na região do coração. Foi o tempo necessário para chegar uma ambulância.
Thaís, diante da cena, refletiu “mesmo longe do hospital e sem nenhum equipamento, aquele médico conseguiu prestar socorro. Não é diferente do que eu faço espiritualmente”. E, logo em seguida, escutou de volta a mesma pergunta “o que as entidades precisam para trabalhar?”. Ela já sabia a resposta, mas tornou a ouvir “firmezas e assentamentos, minha filha, são importantes, e você os construirá na hora certa. Porém, não deixe de atender o chamado recebido. Tudo o que precisamos para trabalhar é um coração disposto a ajudar o próximo”.
Depois desse dia, Thaís sentiu seus laços com os guias e Orixás se renovarem. O ânimo e fé cresceram em seu coração, retomou as atividades espirituais e notou que a energia a sua volta se transformava. As pessoas continuaram a procurá-la e, com o tempo, ela formou o seu próprio terreiro e corrente. Já não alimentava medo de prestar o trabalho espiritual, estava segura em seus atendimentos, pois jamais duvidara de seu desejo de realizar a caridade.
Saravá a todos!
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