Uma compilação de 30 histórias curtas, em formato de parábolas, que trazem reflexões sobre a vida e sobre a espiritualidade, independente de qual religião você siga.
Basta imaginar
O garoto mal dormira fazia duas noites seguidas. E de novo não conseguia pegar no sono. Passou horas imaginando que entraria na escola nova e ninguém falaria com ele. Imaginou que iria mal nas aulas e os outros tirariam sarro dele. O pai do garoto, vendo que o menino ainda estava acordado, sentou ao seu lado e passou a mão em seus cabelos.
- Pai, estou com medo de que possa acontecer algo ruim. As outras crianças podem não gostar de mim, eu posso não aprender direito e o professor pode ser mau. Eu não quero ir para a escola!
O homem tinha uma aparência bruta, mas demonstrava carinho ao fazer cafuné no garoto.
- Filho, o medo é o pior inimigo do homem. Quanto mais você teme algo, maior é a chance disso acontecer. O medo está em nossa imaginação, e tudo que imaginamos com muita força torna-se real.
- Mas o que posso fazer, papai? As imagens não saem da minha cabeça...
- Você consegue imaginar mais de uma coisa ao mesmo tempo filho?
O garoto para, fecha os olhos e franze a testa. Fica assim por alguns segundos e a testa continua franzida.
- Não dá! Eu não consigo!
- Você está certo, filho! Ninguém consegue ocupar a cabeça com mais de uma cena ao mesmo tempo. Então a melhor coisa a fazer é escolher o que vamos imaginar. Então quando você estiver com medo de alguma coisa, em vez de tentar fugir dessa imagem, apenas comece a pensar e imaginar outra que lhe dê mais conforto, ou até mesmo o contrário daquilo que você não quer que aconteça. Imagine que a escola será um lugar divertido e você terá ótimos amigos e professores lá, assim você sempre estará com imagens boas em sua mente, e não terá tempo para pensar nas coisas que não quer que aconteça.
O garoto suspirou, conseguiu fechar os olhos e soltou o peso do corpo. Durante as próximas horas os dois ficaram lado a lado imaginando como o próximo dia seria bom e divertido.
Quando o sol nasceu, o garoto sentiu que estava entrando em um novo mundo, e o pai começou o dia com um sorriso. Tudo corria bem, como haviam imaginado na noite anterior. Esse é o poder da imaginação. Quanto mais forte você imagina, maior a chance de acontecer o que você focou em sua mente.
Se libertando do passado
Um discípulo chega para conversar com o seu mestre espiritual. Por mais que trabalhasse duro e seguisse o que achava ser o correto, ainda se sentia um fracassado. E por isso foi buscar por respostas.
— Mestre, Por que por mais que eu tente não consigo prosperar e atingir os meus objetivos?
— O fracasso acontece por vários motivos. Mas não podemos temer errar. Somente errando é que aprendemos a chegar aonde queremos. Essa é a primeira lição que lhe dou.
Uma pausa e um respiro profundo, e o mestre continuou:
— E no seu caso, o apego aos fracassos e decepções passadas lhe envenena os pensamentos e afetas as suas ações. Aprender com os erros nos leva a alcançar nossos objetivos, mas ser dependente deles não. Aprenda o que tem que aprender, e olhe para o agora, para o presente. Devemos libertar nossas frustrações passadas se queremos encontrar a nossa essência. Devemos parar de nos segurar no passado, se queremos aproveitar o presente. O passado nada mais é do que uma memória, ele não existe mais. O que existe e deve ser vivido é o agora. Vamos deixar os erros passados sumirem. As lições aprendidas são eternas, mas as memórias de como erramos já não servem para nada, apenas reforçam um sentimento de inadequação e baixa estima. Portanto livre-se de suas decepções, e sua vida fluirá novamente.
O discípulo ouviu o conselho do mestre sem se mexer e começou a refletir sobre como erros que não aconteciam mais, que existiam apenas em sua memória, atrapalhavam as suas ações e a sua forma de se comportar. E então sentiu o que devia fazer para se livrar de seus traumas.
O discípulo foi para um deserto, pegou um punhado de areia na mão e imaginou que todos os seus fracassos e decepções estavam naqueles grãos. Fechou os olhos e soprou-os ao vento, para se juntar com os infinitos grãos de areia, onde nunca mais voltasse a encontrá-los.
Subindo na vida
Um jovem aprendiz de uma fábrica levantava todos os dias com um sorriso no rosto para ir trabalhar. Era o seu primeiro emprego e gostava de observar tudo. Com o tempo, começou a reparar como alguns colegas trabalhavam tanto e sempre tinham a mesma rotina, sem nunca mudar nada e outros, ao contrário, dificilmente paravam no mesmo lugar por muito tempo.
Os meses foram passando, e o jovem ansiava por crescer profissionalmente. Por isso foi buscar conselhos com os trabalhadores mais velhos, que já conheciam a tantos anos aquele lugar.
O primeiro que ele foi puxar conversa sobre trabalho foi um senhor que estava lá há trinta anos:
— Você é um rapaz inteligente, ambicioso. Quer crescer, mas pode esquecer. Aqui todo mundo trabalha muito e ganha pouco. Não adianta querer fazer mais do que é capaz. Isso aqui não muda nunca e nem você vai mudar.
Que homem mais rancoroso e desiludido! Pensou o jovem. E então foi falar com um colega que tinha pouco mais que a sua idade, mas que tinha mais experiência de trabalho do que ele.
— Pra quê você quer mais do que já tem, moleque? Está bom desse jeito. Você tem o que precisa pra ter uma vida boa. Em alguns anos pode até conseguir dinheiro pra comprar um carro!
O jovem não se conformou que um colega quase de sua idade tinha essa opinião quanto à própria vida.
Os dias foram passando e o jovem ainda se questionava como fazer para crescer profissionalmente. Até que em um dia de folga, caminhava no parque e viu o dono da fábrica em que trabalhava. Por um momento hesitou em ir falar com ele, mas decidiu arriscar. Afinal, não tinha nada do que se envergonhar.
— Olá, senhor! Trabalho em sua fábrica durante a semana e gostaria de conversar um pouco sobre meu trabalho.
— Ah! Me lembro de você. É o garoto que entrou faz pouco tempo. Está com dificuldades no serviço?
— Não é isso... É que tenho grandes planos, mas não sei o que fazer para crescer. Conversei com outros funcionários da fábrica e eles só me desanimaram. Dizem que não vale a pena tentar algo maior do que já temos.
O dono da fábrica riu.
— Os seus colegas são boas pessoas, ótimos trabalhadores! Mas você notará algo neles: quem sempre faz a mesma coisa, consegue sempre os mesmos resultados e chega sempre no mesmo lugar. Aqueles que não tem coragem de mudar os seus destinos não merecem algo melhor do que já tem. Nada mais justo.
— Mas porque alguém faria a mesma coisa sempre? Porque eles não querem mais do que tem?
— Por diversos motivos. Algumas pessoas estão satisfeitas com o que têm. Uma vida simples, sem muitas ambições, pode trazer conforto. Mas alguns deles também tem medo. Medo de não serem capazes de mudar o destino, ou acham que não merecem algo diferente em suas vidas. Tudo depende do que você acredita, e o que você busca. Só conseguem atingir altos picos aqueles que ousam escalar as mais altas montanhas. A questão é o que você quer, e o porquê. Se você descobrir aonde quer chegar, nada nem ninguém te impedirá, a não ser os seus próprios medos e incertezas. Portanto não se deixe levar pelo que os outros fazem da vida deles. Descubra o que você quer e não desista.
O garoto ficou quieto e agradeceu.
— Obrigado pelo conselho, senhor. Então agora preciso pensar no que quero... Nunca pensei nisso antes...
— Eu que agradeço por ter vindo me cumprimentar. Gosto de saber que tenho alguém ambicioso trabalhando para mim. Continue perseguindo o seu sonho. Mas saiba o que você quer primeiro.
Então se despediram e cada um seguiu o seu caminho. Mas a conversa só fez o jovem pensar mais. Algumas perguntas ecoavam em sua cabeça: o meu trabalho me faz feliz? Será que é isso mesmo o que quero? Por que tantas pessoas ficam reclamando de seus trabalhos em vez de mudar? Por que se conformar com algo que não te leva a lugar algum?
Perguntas que ecoaram e continuam a ecoar. Mas as respostas ele descobriu que só ele responderia para si, e mais ninguém.
Sintonia
Em uma das universidades mais conceituadas do país, havia um aluno chamado Rodrigo, apelidado como Rod. Todos os professores reconheciam o seu talento e a sua inteligência, porém ele não conseguia se sair bem nas provas e se concentrar nos estudos. Rod era considerado um problemático.
Chegou um momento que a pressão dos estudos era grande e a cobrança por resultados também. Rod não aguentava mais aquele ambiente e decidiu desistir da universidade. Ele começava a acreditar que ele não tinha a mesma capacidade dos outros alunos.
No dia que ele decidiu assistir às suas últimas aulas, um de seus professores o chamou para conversar, longe dos outros alunos.
— Boa noite, Rodrigo! Ouvi dizer que você deixará a nossa universidade. É verdade?
— Pois é, professor. Não consigo me focar nos estudos. Acho que eu não sirvo para isso.
O professor se virou e pegou um velho rádio debaixo de sua mesa.
— Você sabe o que é isso?
O estudante abanou as mãos e levantou as sobrancelhas em direção ao professor. Então respondeu:
— Sim. É um rádio. Bem velho por sinal. Há muito tempo que não usamos um aparelho desses.
— É... Ele está guardado há muito tempo. Mas ainda funciona muito bem e vai servir para eu lhe explicar algo muito importante sobre a sua mente.
Rodrigo cruzou os braços e deu um passo para trás. O professor continuou:
— Eu sei como você tem dificuldade em se concentrar nas aulas por isso vou lhe explicar como a mente funciona. Acredito que isso pode lhe fazer mudar de ideia quanto às suas decisões.
— Ok, estou ouvindo.
— Esse é um rádio analógico. Ele sintoniza as estações com essa pequena roda que vou girando e escolhendo qual a estação ele vai sintonizar.
O professor ligou o aparelho e foi girando o botão até encontrar uma estação que tocava uma música agitada.
— O que você precisa entender é que nossa mente funciona exatamente como esse rádio, Rodrigo. Você precisa ir mudando lentamente o foco para encontrar o que você quer ouvir e se concentrar. Se eu tentar girar muito rápido o botão, olha o que acontece!
O som foi de ruídos e vozes se misturando.
— A sintonia é fina e delicada. Um pequeno movimento e ZZZuuuummmm! O ruído interfere na transmissão e não conseguimos entender mais nada. Então a primeira coisa que você precisa aprender é sintonizar a mente com o que você realmente quer em cada momento. Isso é feito com muita calma e paciência, sem tentar "girar o botão" muito rápido. Muitos pensamentos diferentes são como os ruídos que atrapalham a estação e não conseguimos ouvir nada.
O jovem olhava para o rádio e ouvia os seus ruídos.
— Outra coisa que você deve entender. A sua mente precisa de foco. Defina o que você realmente quer e quais as suas prioridades. Veja o que acontece agora.
Então o professor foi mexendo novamente o botão de sintonia até que ficou em um ponto em que o som vinha de duas estações misturadas. Um locutor falava enquanto se ouvia uma música de outra estação ao mesmo tempo. Não se podia entender o conteúdo de nenhum dos sons.
— Consegue entender algo? Assim também é uma mente com o foco dividido. Você não consegue se concentrar em nenhuma das coisas que te interessam. Entendendo esse princípio você pode pensar melhor na sua decisão. Quais são os ruídos que estão atrapalhando a sua mente e de onde eles vêm? E, se você tem mais de um assunto que divide a sua atenção, como fazer para focar cada um em seu momento adequado, igualzinho a sintonizar a uma estação para ouvi-la com clareza e na hora certa.
Rodrigo soltou a respiração e, quando começou a tomar folego para falar, o professor continuou:
— E mais uma coisa! A nossa mente tem à disposição milhares, ou até mesmo milhões, de emissoras, ruídos e frequências que podemos sintonizar a qualquer momento. Ela é muito mais potente do que qualquer rádio. Por isso você deve refletir também sobre o que é essencial para entrar em contato. Temos a capacidade de receber infinitas informações, mas quais delas são necessárias para você?
O aluno abaixou a cabeça, enquanto seu olhar se perdia no vazio. Depois de alguns segundos de silêncio, despediram-se e, no caminho de volta para casa, Rodrigo começou a refletir sobre quais eram os pensamentos que invadiam a sua mente durante o dia, como aqueles ruídos. No dia seguinte ele voltou a assistir as aulas, mas dessa vez seu olhar era fixo e sem nenhum traço de hesitação.
O que é o amor?
Um garoto que acaba de brigar com o seu irmão corre para a mãe para lhe contar tudo:
— Mãe, não aguento mais meu irmão! Nós brigamos muito. Somos muito diferentes e nunca ficamos em paz.
A mãe acaricia os cabelos do filho e diz:
— É porque vocês não aprenderam a amar, filho. Quando vocês entenderem como amar, não haverá mais briga entre vocês, e nem com nenhuma outra pessoa.
O garoto continuava inquieto.
— Mas o que é o amor, mãe? Você quer que eu fique abraçando e beijando meu irmão e fingir que sou feliz com ele?
A mãe ri e abre um sorriso.
— Não, filho. Abraçar, beijar e sorrir para alguém são demonstrações de carinho, de afeto. Demonstra que você gosta da pessoa, mas não é o amor em si. Demonstrar afeto por alguém é uma consequência do amor, mas não é o amor. O amor é muito além disso. O amor é o movimento da vida que une os opostos. Amar é aceitar as nossas diferenças e respeitar que cada pessoa é única e insubstituível. É conseguir, por mais diferentes que sejam as pessoas, fazer algo criativo, criar algo a partir dessas diferenças.
— Mas como posso amar o meu irmão, mãe?
— Você deve aceitar que ele não tem os mesmos gostos e ideias que você, filho. Em vez de forçar ele a fazer algo que você gosta, ou forçar ele a ter a mesma opinião que você, você deve achar algo novo que vocês possam fazer juntos, algo que, por mais diferente que seja, no final agradará aos dois.
— Mas nós somos muito diferentes!
— Quanto mais diferentes, mais amor vocês precisarão ter um pelo outro. É exatamente o que ele tem de mais diferente de você que você precisa aprender a conviver para se tornar um grande homem. Todos os grandes homens sabem conviver com as diferenças dos outros, e eles tem um grande respeito por todos. Eles sabem como tudo que é diferente torna nossa vida mais rica e prazerosa, e sabem o que é amar.
O filho respira fundo e se acalma um pouco.
— Tudo bem, mãe. Vou aprender a amar meu irmão. Mas o que vai acontecer quando eu conseguir? Nós não vamos mais brigar?
— Quando aprendermos a criar algo a partir de nossas diferenças, quando aceitarmos os outros como eles são, não haverá mais brigas, e tudo estará em paz.
As três ferramentas do capitão
Um velho capitão estava para se aposentar. Já tinha navegado pelos mares e explorado todos os continentes do planeta. Sua saúde estava frágil e precisava treinar um de seus homens para ficar no seu lugar. Ele escolheu um de seus melhores marinheiros. O jovem tinha postura e atitude de líder, porém a sua ousadia em excesso podia ser um empecilho para ele assumir o controle do navio.
O marinheiro era conhecido por suas aventuras em terra, onde bebia muito rum e caía na graça das mulheres. Preocupado com a falta de direção do jovem, antes de passar o comando para ele, o capitão chamou-o para uma última conversa.
— Pronto para assumir o navio, garoto?
— Pode ter certeza que sim, capitão!
— Ok. Mas eu conheço a sua fama quando estamos em terra. E por isso vou lhe dar uma última lição. Está pronto?
— Estou ouvindo, capitão.
— Você sabe o que é uma âncora?
— É claro que sei, oras! É para atracarmos o barco e ele não ser levado pelo mar.
— Pois bem. Agora você terá muitas responsabilidades e portanto imagine que precisará de uma âncora, de um leme e de uma bússola fora do navio, em sua vida.
O marinheiro fitava o rosto do capitão com as duas sobrancelhas erguidas.
— Como assim, capitão?
O capitão continuou:
— Primeiro: a nossa mente inconsciente e nossas emoções são como o mar. Se você se deixar levar por impulsos inconscientes, pode perder o barco, que é a sua vida. Portanto lembre-se da âncora. Quando encontrar o litoral, se esforce para não deixar ser levado pelas suas emoções descontroladas.
— Segundo: o barco é a sua vida, e você precisa da bússola e do leme. A bússola é para você saber em que direção quer ir. Em sua vida, o que você quer explorar de novo? O que você quer conquistar? Após responder essas questões, use o leme e assim você vai se direcionar para aonde quer ir e não fica à deriva. Direcione no sentido que vai te levar às suas conquistas, e não contra elas.
— E por último: lembre-se que a sabedoria do capitão não está em possuir essas ferramentas, mas sim em saber usá-las na hora certa e do jeito certo. Essa é a sabedoria de quem sabe conduzir pelo mar.
O marinheiro balançou um pouco o corpo, mesmo sem estar embriagado. Ele desejava muito assumir o barco, assim como sentiu que deveria assumir o comando da própria vida.
Ele se virou para o mar e observou as ondas que vinham e iam com muita força e foi quando percebeu que nenhuma embarcação poderia ficar sem direção e sem comando. Pois assim muitas vidas poderiam se perder no mar, assim como muitas vidas passaram por ele em seus momentos de descontrole. A partir de então, ele aprendeu a comandar sobre as águas, e não mais a se afundar na imensidão de suas emoções inconscientes. E muitas vidas foram poupadas.
As cores dos peixes
Em um lugar em meio à natureza, vivia uma velha feiticeira. Era uma mulher negra de cabelos brancos, com roupas simples e que andava com uma bengala para apoiar o seu corpo curvado. Ela morava sozinha, mas de tempos em tempos seu neto ia visitá-la.
Em uma dessas visitas, o menino reparou que a vó passava muito tempo sentada, contemplando um lago que havia perto de sua casa. Curioso, o menino lhe perguntou:
— Vó, por que você passa tanto tempo olhando para esse lago parado? Não vejo nada de interessante nele.
A velha sorriu com a pergunta.
— Veja, filho, venha cá. Mergulhe o seu rosto por alguns instantes na água e me diga o que vê. Mas tome cuidado para não cair lá dentro! — A anciã riu.
O garoto enfiou a cabeça com tudo na água e depois de alguns segundos levantou.
— E então, filho. O que viu?
— Nossa, vó! Tem muitos peixes nessa água. Eles nadam rápido! E tem de todas as cores e tamanhos. É lindo! Eu nunca vi nada igual.
— É verdade, filho. Nada é mais lindo do que ver a vida como ela é. A natureza sempre vai lhe surpreender. Por trás do que parece ser algo parado e monótono, há vida e movimento! E esse lago é antigo. Muitos animais já beberam dessa água, e muitos já viveram nela. Um lago é como nossas emoções mais profundas. Se a gente parar pra olhar para elas, vamos encontrar a beleza e os movimentos da vida... E quantas cores encontramos por trás daquilo que parece estar parado!
Namastê
Em uma área remota na China havia um monastério. Vários candidatos a monge chegavam todos os anos em busca de uma oportunidade para aprender os segredos milenares de uma tradição religiosa preservada pelos mestres de lá.
Como não havia espaço para alojar todos os candidatos, era feita uma seleção de quem poderia entrar para o monastério. No dia da escolha, o monge mais antigo do monastério foi falar com os candidatos que estavam reunidos no pátio.
— Bem-vindos. Obrigado a todos pelo interesse e pela boa vontade de estarem aqui. Gostaríamos de abrigar a todos, mas como os recursos são limitados, começaremos hoje mesmo nossa seleção.
A euforia era grande, e todos ouviam atentamente as palavras do monge.
— Mas tenho um aviso a fazer. Esse ano temos somente uma vaga sobrando em nosso alojamento. Então de todos vocês, apenas um será escolhido para ser nosso discípulo.
A decepção foi grande, e os candidatos que estavam sorridentes agora estavam com a boca aberta sem ter o que falar. E o monge continuou:
— A tarefa que dou a vocês é: prestem uma homenagem à divindade! Estão livres para fazer como quiserem. Observaremos todos e no final do dia avaliaremos quem está apto a entrar para nossa casa.
Os candidatos se apressaram e começaram a fazer algo para impressionar. Muitos assumiram postura de meditação ali mesmo, e mantras ecoaram pelo ambiente. Outros correram e se postaram em frente a estátuas de divindades, e ali ficaram, em postura de reverência, sem pronunciar uma única palavra. Mas houve um sujeito que saiu caminhando, indo em direção ao vilarejo, e simplesmente sumiu de vista.
Quando a noite chegou, o monge que dera as instruções voltou ao pátio, e os candidatos se reuniram novamente, incluindo o rapaz que fora para a aldeia. E então o monge se pronunciou:
— Todos foram dignos e fizeram um ótimo trabalho, muitos de vocês eu vi que nem mesmo pararam para comer. É impressionante a devoção de vocês e agradeço a presença de todos. E agora já escolhemos quem entrará para nossa casa.
O monge andou entre os candidatos e, para a surpresa de todos, parou em frente ao rapaz que havia saído para a aldeia. Lhe dirigiu a palavra com um gesto de reverência:
— Bem-vindo ao nosso monastério. Pode entrar e levar suas coisas para dentro. Lhe mostraremos onde dormirá a partir de agora.
A revolta foi grande, e um dos candidatos protestou:
— Como pode escolher alguém que nem ao menos ficou aqui? Não ficou nem um minuto orando e reverenciando a divindade!
O monge sentiu que devia explicações e falou:
— Durante a tarde, fui ao vilarejo buscar comida com alguns amigos lavradores e durante a minha passagem vi o rapaz que escolhemos. Ele estava conversando com as pessoas, parecia muito interessado na vida de todos que moram ali, e sua curiosidade pelos outros se mostrava autêntica. E por isso o escolhemos.
Um outro candidato não entendeu e perguntou:
— Mas não deveríamos reverenciar a divindade?
O monge respondeu:
— Sim. E assim ele fez. A divindade não é reverenciada apenas com mantras e orações. Se quisermos entrar em contato com a divindade, devemos olhar para o próximo, pois o divino mora dentro de cada um de nós. Por que dirigir a mente somente para o céu, se temos a divindade bem aqui do nosso lado, nas pessoas? O homem que tem curiosidade em conhecer o outro, que dá atenção para o outro, está reverenciando o divino. É como diz a antiga saudação: namastê! O deus que mora em mim, saúda o deus que mora em você.
Seja como uma Flor de Lótus
Em um país no sul da Ásia acontecia há anos uma grande guerra. Famílias foram separadas, casas foram destruídas e a violência era presente em todos os lugares. O povo daquela região não tinha mais esperanças de que pudessem encontrar a paz e a beleza que há tanto tempo não se via por ali.
Em um vilarejo na zona rural, os moradores se reuniam para se organizarem na distribuição da escassa comida que tinham e dos itens básicos para a sobrevivência.
Um senhor de cabelos e barba branca se levanta mais uma vez para passar as notícias da guerra:
— Mais um mês se passa e nada melhorou. O exército rebelde está fraco, mas não vai parar os ataques contra o governo. E o ministro-chefe já anunciou que os racionamentos continuarão enquanto não conseguirem liberar as estradas para o transporte de suprimentos.
Muitos voltaram seus olhos para o chão e algumas reclamações eram sussurradas.
O jovem escultor da cidade não aguentava mais a situação e, limpando as lágrimas de seu rosto, levantou para falar:
— Não aguento mais viver nesse país! Minha arte foi destruída! O trabalho de toda a minha vida foi destruído e nada me sobrou, nem mesmo o que comer. Como posso ter forças para continuar fazendo o que amo se tudo está sendo destruído?
O ancião que organizava a reunião olhou para o jovem, mas não falou nada. Alguns falavam "não temos esperança". Foi quando um homem magro, com as rugas marcadas em seu rosto, mas com os olhos ainda brilhantes, se levantou:
— Alguns de vocês já me conhecem, sou o jardineiro dessa vila e tenho que discordar de vocês. Ainda há esperança! A guerra não é o fim de tudo!
Uma pessoa se manifestou:
— O que alguém que cuida de plantas sabe sobre a guerra?
— Muito se pode aprender com as plantas. Mais do que vocês imaginam. O que digo para vocês é: sejam como uma Flor de Lótus! — disse o jardineiro.
O ancião levantou a cabeça e o encarou:
— O que quer dizer com isso?
— Olhem para a beleza de uma flor de lótus. Como vocês acham que ela cresceu e ficou tão bela assim? Ela cresceu no lodo, na lama! E apesar de toda a sujeira em volta de suas raízes, ela se ergue firme em direção ao nascer do Sol e mostra a sua beleza ao mundo. Sua flor fica acima da água buscando a luz do sol. Por isso digo a vocês: sejam como a Flor de Lótus! Apesar de toda sujeira que estamos vivendo em nosso país, toda a lama em que estamos afundados, vamos nos erguer acima disso e mostrar a nossa beleza. Não vamos deixar que a guerra abale o nosso valor. Vamos continuar a fazer o que amamos, vamos continuar a fazer a nossa arte e o nosso trabalho. Todos ainda podemos crescer em meio ao lodo e sermos como uma flor, como a mais sagrada flor do Oriente.
Uma flecha
Em uma tribo indígena, um jovem saía para a sua primeira aula para aprender a caçar. Ele e seu professor, um experiente caçador, entraram na floresta e caminharam durante meia hora. O caçador parou e disse:
— Agora vamos esperar.
Os dois sentaram e ficaram ali, parados, somente observando o que tinha ao redor.
O garoto ficou impaciente de tanto esperar e perguntou ao seu professor:
— Por que esperar tanto? Vamos andar e procurar em algum outro lugar!
— Primeira lição: conheça o seu território. Observe tudo ao seu redor. Saiba onde está cada galho e cada folha e como usá-los a seu favor. Isso se chama estratégia. Você não conseguirá explorar novas terras enquanto primeiro não conhecer onde está. — respondeu o caçador.
O caçador fez sinal para seu aprendiz fazer silêncio e levantou seu arco e flecha sem fazer barulho. Ele apontava agora para um javali, que passava a alguns metros de distância. O garoto queria pegar sua primeira presa logo. Ele levantou seu arco e atirou contra o javali, mas errou. E o javali fugiu.
O caçador continuava observando tudo e disse ao garoto:
— Antes de agir, aprenda. Agora me observe e não faça mais nada. Fique em silêncio.
Eles andaram mais e pararam novamente, esperando pelo javali. Foi nesse momento que o garoto percebeu que o caçador só carregava uma flecha, e mais nada.
— Mas por que você carrega somente uma flecha?
— Silêncio! Observe.
O javali estava na frente deles, mas dessa vez estava mais distante e parecia mais difícil de acertá-lo.
O caçador levantou seu arco e flecha, mirou e atirou. Então virou-se para o garoto.
— Uma presa, um objetivo, uma flecha! Ter muitas flechas desvia a sua atenção do que você quer. Viemos aqui para caçar um animal e não para brincar de atirar. Saiba onde quer atirar e como irá atirar, e irá acertar. Uma flecha é o que você precisa, e nada mais.
Os dois se levantaram e foram pegar a presa abatida para levar de volta à tribo.
O mundo é daqueles que lutam
No meio de um desfiladeiro, algumas centenas de soldados esperavam o ataque iminente do exército inimigo. O objetivo dos soldados era proteger a capital de seu país, mas para isso tinham que batalhar com milhares, talvez até mesmo dezenas de milhares de guerreiros sedentos por sangue.
Um dos mais novos soldados do batalhão estava preocupado. Ele tinha medo e não sabia onde encontrar coragem para encarar o que poderia ser a sua última batalha.
O general do exército, um homem que já havia batalhado muito, conquistado muito e aberto caminhos para a grandeza de toda uma nação, percebeu o medo nos olhos do companheiro e foi falar com ele:
— O que teme, irmão? Não está animado para a grande batalha de sua vida?
— General, nós vamos morrer! Estamos em um número pelo menos dez vezes menor do que o inimigo. Como devo me animar assim? Você está louco?
O general tinha brilho nos olhos. Sorriu e falou:
— Seja um guerreiro! Eles podem ser muitos, mas que a nossa coragem e nossa honra seja dez vezes maior que a deles. Lutamos por um bem maior, e mesmo que nossas vidas sejam sacrificadas, nossa nação será protegida para continuar crescendo.
Deu uma pausa, olhou para o nascer do sol, e então continuou:
— Que a justiça seja feita! Vamos apontar as espadas para a garganta deles! Prefiro uma morte com honra, lutando, do que uma vida de apatia e lamentações. Nenhum rei impera sem ter sofrido com as cicatrizes da guerra. Então levante! O mundo é daqueles que tem coragem para lutar! Vamos à luta!
E o sol nasceu sem nuvens para escondê-lo. O sangue derrubado consagrou o solo onde se firmam as raízes de um império que reina até hoje, e aqueles homens que lutaram como verdadeiros guerreiros são lembrados como heróis.
Perguntas
Cris era um rapaz que acreditava em tudo. Tinha uma fé muito forte, mas era visto por seus amigos como um supersticioso. Ele se considerava um buscador da verdade e por todo lugar que passava era facilmente atraído pelos mais diversos místicos.
Tarólogos, astrólogos, padres, pastores e leitores de mãos. Cris não escapava de um e sempre se impressionava com as respostas que obtinha. O problema era que, mesmo ele ouvindo todos, nenhum deles foi capaz de lhe dar o que buscava.
O que ele perguntava? Basicamente o que todos nós nos perguntamos um dia. Quem sou? Para onde vou? Por que estou aqui? Qual é o sentido da vida? São questões que foram exploradas por filósofos desde tempos remotos. Porém, as respostas nunca foram certas. Muitas teorias foram feitas, mas nenhuma responde a todas as perguntas.
Essa falta de respostas firmes e claras foi deixando Cris cada vez mais desanimado e descrente da vida. Sua fé parecia abalada, até que um dia ele olhou para as estrelas e pediu uma resposta simples e clara, que lhe resolvesse todas as dúvidas que lhe perturbavam.
Suas preces mergulharam noite adentro. E mais um dia terminava sem respostas.
No dia seguinte sua fé deu espaço ao vazio que tomou conta de sua alma. Se nada faz sentido, do que vale a pena viver? Pensava o jovem. E as horas se passaram e era apenas mais um dia.
Na hora do almoço, ele resolveu sair do trabalho e ir almoçar sozinho. Andava pelas ruas sem ânimo até encontrar um restaurante chinês para almoçar. Entrou e pediu um lámen com carne de porco e uma coca-cola. A garçonete o serviu e trouxe junto um brinde da casa. O famoso biscoito da sorte chinês. Parecia uma piada de mau gosto. Depois de tantos anos acreditando em videntes e sacerdotes e apostando na sorte, parecia que as superstições corriam atrás dele.
Terminou seu refrigerante e sua refeição e quando ia se levantando para ir embora pegou o biscoito e abriu sem muito entusiasmo. O pequeno papel dizia: "Não existem respostas prontas. Para cada pessoa existe uma verdade. Não tente encontrá-la através de outros. Ela só pode ser encontrada dentro de você."
Parece que seu desejo de obter uma resposta simples e clara foi realizado. Ele só não esperava que, depois de tantos solos sagrados que havia pisado, a resposta viria de um restaurante chinês encardido.
Abrir portas
Um mestre iluminado morava na cidade grande, fazendo o seu trabalho e ensinando aqueles que o procuravam sem busca de conhecimento. Mas aqueles que não o entendiam, o criticavam e o atacavam. Muitos não suportavam a presença do mestre.
Um de seus discípulos ficava muito intrigado com essa situação e foi conversar com o mestre.
— Mestre, o senhor é um homem sábio e uma das pessoas mais bondosas que já conheci, e mesmo assim as pessoas te atacam e querem te ter como inimigo. Por que isso acontece?
— Eles podem me considerar um inimigo, mas estou aqui para ajudar, e quando eles quiserem minha ajuda as portas estarão abertas.
— Mas mestre, o senhor sendo um "iluminado" e um grande místico, não deveria fazer todos a sua volta serem bondosos somente com a sua presença?
O mestre riu.
— Eu não posso obrigar as pessoas a serem bondosas. Cada um tem o livre arbítrio para escolher como quer se relacionar com o mundo. Se eles querem odiar, a escolha é deles. A minha presença pode inspirar algumas pessoas, mas também incomoda outras. Lembre-se que um dos maiores mestres que passou por esse mundo foi crucificado pelo seu próprio povo. Um sol que brilha é forte demais para aqueles que não querem sair da escuridão. E eles tentam se trancar no escuro a qualquer custo, nem que para isso tenham que atacar o próprio sol.
— E o que podemos fazer por eles, mestre?
— Abrir portas. Para, quando eles estiverem dispostos, receber eles com alegria. Mas fora isso, nada podemos fazer por eles. Só podemos ajudar aqueles que querem ser ajudados.
O seu corpo é o seu templo
Um peregrino que estava doente decidiu percorrer as maiores catedrais da Europa em busca da melhora de sua saúde através da fé. Foi uma longa viagem e muitos países foram percorridos. Ele visitou igrejas majestosas, e assistiu a missas e sermões de respeitados padres de cada região.
Apesar de todo o esforço e muitas orações serem feitas, sua saúde não melhorou. Foi então que no fim de sua viagem entrou em uma pequena catedral no interior da Espanha para uma última oração. O padre local, ao perceber que o peregrino estava com o corpo mal conseguindo se manter de pé, foi falar com ele:
— Bom dia senhor. Está buscando a ajuda divina em nossa humilde catedral?
O homem virou-se com um olhar sem brilho.
— Bom dia padre. Na verdade estou muito doente, e, por mais que eu ore, minhas preces não foram atendidas. Não consigo melhorar.
O padre deu um sorriso, e o peregrino percebeu como aquele homem estava saudável apesar de sua velhice.
— Padre, como o senhor consegue manter uma disposição e saúde tão boas? Será que estou orando errado?
O padre abriu um sorriso.
— Pode orar o quanto quiser, filho, mas, se não der atenção ao seu corpo como deve, não encontrará a saúde. As orações são para o céu, que sempre nos traz conforto, mas o corpo está na terra, e precisa ser cuidado. Você pode ir às maiores catedrais do mundo, mas o templo mais precioso que existe para você é o seu corpo. Uma alma saudável precisa de um corpo saudável para habitar, portanto não olhe apenas para o céu, filho. Lembre-se que estamos na terra, e o corpo não sobrevive só de orações.
Vamos celebrar a morte!
Há cerca de três mil anos, um povo que habitava o velho continente comemorava seu ano novo no dia dos mortos. Neste dia eles honravam seus ancestrais e celebravam um novo ciclo.
Em uma dessas comemorações, uma menina que estava por volta dos seus dez anos de idade conversava com sua tia preferida que era uma grande bruxa.
— Tia, por que o s mortos voltam nesse dia para conversar com a gente?
— Para nos mostrar que há mais vida na morte do que imaginamos. - disse a Bruxa.
A garota franziu os olhos, e ainda não tinha entendido.
— Mas vida e morte não são coisas tão diferentes, tia?
— Na verdade elas se completam. Onde uma começa a outra termina, em um eterno ciclo.
— Eu entendo... Mas se há vida na morte, porque quando alguém morre algumas pessoas ficam sérias e parecem tristes?
Os olhos da bruxa pareciam ter lágrimas.
— É porque sentimos falta daqueles que amamos. Mas não ache que isso é o fim da jornada, minha pequena. Apesar de sentirmos tristeza pela partida deles, devemos reconhecer a morte como algo tão divino e gracioso quanto é à vida. Ela traz fim ao que deve se tornar algo novo.
A menina ia falar algo, mas a bruxa continuou a explicação:
— Assim como os restos de uma planta morta servem para tornar a terra rica e novas plantas possam nascer, as pessoas também morrem para que possam renascer em uma nova forma. Esse ciclo funciona para tudo. Pensamentos, trabalhos, e até mesmo a ligação que temos com outras pessoas devem um dia morrer para renascer e continuar o ciclo da eterna evolução.
— Que bom, tia! Agora entendo porque temos festa hoje! Vamos celebrar a morte! Ebaaa!
A velha ri alto.
— Vamos celebrar a morte! Pois sabemos que o fim de uma jornada é apenas o começo de algo muito maior.
Tâmaras
Há muito tempo, existiu uma antiga tribo no oeste da África. A vida lá era dura e todos tinham que trabalhar muito para sobreviver e manter a ordem. As mulheres tinham que andar quilômetros para buscar água todos os dias. Os homens saiam em longas caçadas e as crianças teciam com os anciões.
Apesar de todos se dedicarem muito, havia um rapaz que não gostava de trabalhar. Ele dormia muito e na hora do trabalho dava um jeito de escapar para ficar à toa. Sua mãe, que já estava incomodada com a postura do garoto, certo dia decidiu conversar com o filho sobre a sua falta de dedicação nas tarefas diárias da tribo:
— Filho, por que você não ajuda trabalhando um pouco? Você é jovem e forte. Poderia fazer muitas coisas por aqui, sabia?
O garoto não moveu um só dedo e respondeu a mãe:
— Desculpa, mãe. Às vezes até tenho vontade de trabalhar, mas eu trabalho um dia, dois e depois fico enjoado do que faço. É tudo muito repetitivo e eu não vejo que isso ajude muita coisa. Por mais que eu tente, não consigo ter disciplina.
— Pois bem! Você aprenderá!
A mãe do rapaz saiu determinada a mudar a atitude de seu filho. Quando os homens voltaram da caça, ela foi de encontro com o caçador mais experiente e pediu para ele ensinar seu filho a ter disciplina.
No dia seguinte, logo pela manhã, a mãe pediu ao filho que conversasse com o respeitado caçador.
— Olá. Minha mãe pediu para que eu viesse vê-lo.
O caçador saudou o jovem, virou-se e pegou algo em um saco e segurou em uma das mãos.
— Oi, garoto! Sua mãe disse que você não tem disciplina para o trabalho. Por que você não consegue trabalhar como os outros?
— Eu até gosto de trabalhar. De verdade! Mas tudo me parece inútil. O trabalho apenas se repete dia após dia, e não consigo ver resultados. Por que fazer tudo repetidamente se não acontece nada?
O caçador balançou levemente a cabeça.
— Vou te perguntar uma coisa: quanto tempo demora para crescer uma árvore?
O garoto pensou um pouco e ficou meio desconfiado, mas respondeu:
— Deve ser muito tempo. Desde que nasci, as árvores aqui perto já eram grandes, e muitos anos depois continuam da mesma forma.
— Mas elas já nasceram grandes?
— Acho que não né!
O homem estendeu a palma de sua mão para o garoto e nela havia algumas sementes. Então disse:
— Aqui em nossa terra, tudo é muito seco. As plantas são raras, e quase não temos frutos. Por isso temos que ir longe para conseguir comida. Assim cada árvore a nossa volta é muito importante para a nossa sobrevivência. Pegue essas sementes! São poucas, mas muito especiais. São as únicas que temos aqui, pois foi preciso ir muito longe para consegui-las.
O rapaz pegou as sementes e ficou observando cada uma delas. Então o caçador continuou:
— Vou lhe ensinar a ter disciplina agora. Pegue cada uma dessas sementes e plante perto de nossa aldeia. Elas devem ser regadas todos os dias para não morrerem. E você não pode deixar que ninguém pise nelas ou destrua-as por acidente. Cada árvore que nascer é uma vida que deve ser cuidada. E em nossas terras cada planta deve ser valorizada, pois dependemos delas para sobreviver também. Você não verá resultados rápidos, pois as árvores, assim como o trabalho, não cresce e dá frutos da noite para o dia. Serão necessários anos de dedicação e cuidado para podermos desfrutar de sua sombra e seus frutos. Quando faltar caça, dependeremos das frutas dessa árvore para comer. Eu lhe dou essa responsabilidade. Entendeu?
O jovem sentiu a pressão da responsabilidade que o caçador lhe dera e ficou tenso. Mas acenou com a cabeça para mostrar que tinha aceitado a tarefa.
Muitos anos se passaram e a seca continuo. Mas uma coisa havia mudado na tribo. Os homens quando voltavam da caça agora podiam desfrutar de doces tâmaras. Graças a algumas árvores que um jovem cultivou durante muito tempo e que deram muitos frutos.
Guerrilheiros
Há muito tempo, existiu um revolucionário que chegou ao poder de um pequeno país banhado pelo oceano atlântico. O "Comandante" (era assim que era chamado pela população) conseguiu lutar contra as injustiças sociais nesse país pobre após ele e seu exército derrubarem do poder um ditador que estava lá há décadas.
Sua fama espalhou-se pelo mundo e muitos simpatizantes de suas causas saiam de diversos lugares para pedir treinamento em guerrilha para lutar em seus países. O Comandante, como um bom homem, recebia a todos com um grande sorriso, mas surpreendia com a sua recusa em treinar guerrilheiros.
Certa vez, um jovem idealista questionou do porquê ele não aceitar treinar novos revolucionários:
— Mas comandante, — disse o jovem – juntos podemos mudar o mundo para melhor! Lutaremos por uma sociedade mais justa. Vamos fazer a revolução do povo!
O Comandante, com um olhar fixo e com a firmeza de um militar, respondeu de imediato:
— Menino (era assim que costumava chamar a todos os jovens que iam até ele), quantos anos você têm?
— 23, senhor!
— Estudou?
— Sim! Acabei de me formar na faculdade.
— Então é inteligente! Muito bom! Me diga como alguém inteligente como você pode vir até aqui falar com um chefe de Estado e não sabe nem fazer a barba direito?
O rapaz ficou desconcertado com a resposta, não esperava ser julgado desse jeito.
— Com todo respeito, Comandante. Não sei o que isso tem a ver com a revolução, senhor. Eu luto pela justiça social, e não pelos padrões de beleza que a mídia impõe.
— Certo! Então é por isso que também não penteia seus cabelos e usa roupas velhas e rasgadas também? Ou é por que não tem dinheiro para roupas?
— Tenho dinheiro para roupas, senhor. Mas não me importo com isso. Meu sonho é mudar as pessoas, mudar o mundo. Quero revolucionar o meu país!
— Menino, vou te contar o verdadeiro segredo da revolução! A única revolução que existe é pessoal e interna. Então, se você quer mudar o mundo, comece por si mesmo. Vejo pela sua aparência e pelo seu estado que você não dá valor para si mesmo há um bom tempo. Se quiser revolucionar algo, comece descobrindo quem você é. Cuide de si mesmo e descubra o seu talento em vez de querer ir para guerra. Essa é a única revolução que realmente existe.
O jovem engoliu seco e lágrimas surgiram em seus olhos.
— Mas, Comandante! O senhor conseguiu a revolução! Com a guerrilha tomou o poder e mudou a vida de milhares de pessoas.
— Esse foi o meu caminho, o meu destino. Não me orgulho de ter conseguido isso através da guerra. Mas faço hoje o que descobri ser o meu talento. O que tenho de melhor a oferecer ao mundo é meu poder de organização e disciplina para tornar a política mais honesta e justa. Mas não tente repetir o meu caminho, a minha história. Descubra qual é o seu caminho, qual é o seu talento, que você poderá mudar o mundo com ele muito mais do que fazendo guerra.
O amor certo
Essa é uma história que se repete. Ela já aconteceu em muitos lugares do mundo com todo o tipo de pessoas, e continua se repetindo.
Essa história é um caso de um jovem que sofria por um amor que não era mais correspondido. Ele se envolveu com uma mulher e pensava ser a que ele sempre quis como esposa, mas depois de algum tempo ele já não se sentia mais feliz ao seu lado.
Com muita dor, o jovem foi pedir conselhos ao seu avô. Um homem de cabelos brancos e sorriso sereno, foi casado três vezes e teve muitos filhos. Ele teve muitas experiências amorosas e sabia aconselhar com carinho aqueles que sofrem por um caso de amor.
— Meu filho! Você está muito cabisbaixo! Parece mais cansado que esse velho aqui. Me diga qual é o peso que você carrega no seu coração.
— Vô, estou desapontado. A mulher que pensei que era perfeita agora só me deixa triste. Sinto que me esforço tanto para dar amor a ela, e pouco recebo em troca. Um dia pensei que quem desse muito amor seria valorizado, mas não é o que está acontecendo.
O rapaz só olhava para baixo. Não conseguia nem encarar o velho nos olhos.
— Nem sempre as coisas acontecem como a gente quer que aconteça. — disse o avô — Eu também já amei e me decepcionei. Eu sei o que você sente.
O velho deu um trago em seu cachimbo, tocou o ombro de seu neto e continuou a falar.
— Acontece que quando a gente conhece alguém, imagina que ela tenha tudo o que a gente sempre procurou em outra pessoa. Carinho, afeto, beleza, amizade. Mas a gente sempre se desaponta né? A gente não pode esperar demais do outro. Tudo o que a gente busca a gente só pode achar em nós mesmos. Então o melhor que você pode fazer é o que você não encontrou na sua mulher, encontre dentro de você. Se ela não foi atenciosa, você agora pode ser atencioso, se ela não foi amorosa, você agora pode ser amoroso. Agente só vai achar no outro o que a gente quer, quando a gente já tiver isso dentro de nós, filho.
— Entendi... Mas e como devo fazer isso? Vou ficar sozinho de novo? Eu não quero ficar sem alguém ao meu lado.
— Calma. Para tudo que termina, algo novo nasce. E o mais importante que pode nascer do fim de um amor que não deu certo é o amor-próprio que vai despertar em você. E quando esse amor aparecer, uma nova pessoa vai surgir na sua vida, e você vai descobrir que tudo valeu a pena.
O voo majestoso
Há algumas décadas, existia um grupo de pesquisadores que eram fascinados por aves raras e exóticas. Eles conheciam cada detalhe de cada pássaro raro que existia no planeta. Porém, existia um pássaro que eles nunca tinham visto pessoalmente. Era um tipo muito raro de uma espécie em extinção.
Essa ave tinha as plumas todas douradas, e inspirava nobreza e confiança por onde passava. Mas ela era tão difícil de ser encontrada que o único registro de sua existência tinha sido a muito tempo, e poucas informações foram coletadas.
Os pesquisadores às vezes até se questionavam se não era uma lenda a sua existência. Mas decidiram partir em busca do seu objeto de estudo mais precioso. A única informação que eles dispunham quanto à localização dizia que ela vivia no topo de montanhas na Cordilheira dos Andes, um lugar místico e cheio de uma energia mágica deixada por nossos ancestrais.
O grupo de cientistas embarcou para esse lugar tão especial das Américas e mergulharam por meses em busca do pássaro mais raro do mundo.
As dificuldades e acidentes começaram a acontecer, colocando a vida deles em risco. Muitos guias locais abandonaram a expedição por temerem que os deuses antigos estivessem contra aquela missão, mas os pesquisadores não deram valor à palavra dos locais e continuaram as buscas.
Depois de mais de um ano em meio a doenças, injúrias e até mesmo fatalidades, o grupo conseguiu encontrar e capturar a ave enquanto ela dormia desprevenida em meio a névoa das montanhas. A comemoração foi grande. Estavam todos em estado de êxtase e quando voltaram para sua terra natal a imprensa os fez heróis aventureiros!
Como era linda aquela ave que eles encontraram! Todos diziam isso. Porém, o que poucos viam era como ela estava adoecendo e morrendo a cada dia que se passava em cativeiro. Suas plumas começaram a perder o brilho, e o que era dourado estava ficando opaco. Não se via mais a majestade que ela esbanjava ao ar livre. O mais belo dos pássaros estava morrendo encarcerado.
O filho caçula de um dos cientistas da expedição gostava muito de animais, tinha um verdadeiro amor por todo ser vivo que encontrava. Ele, a noite, escondido do pai, entrava no laboratório e conversava com a ave em sua deprimente gaiola.
— Você está muito triste, o que fizeram com você, passarinho?
A ave apenas olhava com um olhar baixo e se encolhia em um canto de seu cativeiro.
Dias se passaram desde que o menino conversara com a ave pela primeira vez. Sentindo a angústia que o pássaro vivia, ele decidiu fazer algo. Em uma noite de feriado nacional, quando todos estavam festejando com suas famílias e longe do laboratório, o garoto abriu a gaiola, pegou o pássaro com as mãos e o levou até a cobertura do prédio onde estavam. Era um prédio bem alto, e a ave poderia voar livre sem correr o risco que alguém a visse lá de baixo.
— Vá! Eu te protejo! Seja livre como você deve ser. A sua beleza não foi feita para ficar presa entre grades! — disse o menino.
A ave pareceu recuperar seu olhar majestoso e em poucos segundos suas penas voltaram a cor dourada forte que tinha. Ela olhou para o garoto uma única vez, e parecia agradecida. Então ergueu voo para nunca mais ser vista entre aqueles homens.
O que precisamos aprender com essa história é que todos nós somos como aves raras. Não podemos nos deixar presos e escravizados, seja em nome da ciência, da razão, da sociedade ou de um sistema financeiro. A beleza que mora dentro de cada um de nós só pode brilhar se estivermos livres. E para nos libertarmos de nossas prisões, podemos pedir ajuda a alguém puro, que ainda não perdeu a bondade e o amor universal: a nossa criança interior.
Há algumas décadas, existia um grupo de pesquisadores que eram fascinados por aves raras e exóticas. Eles conheciam cada detalhe de cada pássaro raro que existia no planeta. Porém, existia um pássaro que eles nunca tinham visto pessoalmente. Era um tipo muito raro de uma espécie em extinção.
Essa ave tinha as plumas todas douradas, e inspirava nobreza e confiança por onde passava. Mas ela era tão difícil de ser encontrada que o único registro de sua existência tinha sido a muito tempo, e poucas informações foram coletadas.
Os pesquisadores às vezes até se questionavam se não era uma lenda a sua existência. Mas decidiram partir em busca do seu objeto de estudo mais precioso. A única informação que eles dispunham quanto à localização dizia que ela vivia no topo de montanhas na Cordilheira dos Andes, um lugar místico e cheio de uma energia mágica deixada por nossos ancestrais.
O grupo de cientistas embarcou para esse lugar tão especial das Américas e mergulharam por meses em busca do pássaro mais raro do mundo.
As dificuldades e acidentes começaram a acontecer, colocando a vida deles em risco. Muitos guias locais abandonaram a expedição por temerem que os deuses antigos estivessem contra aquela missão, mas os pesquisadores não deram valor à palavra dos locais e continuaram as buscas.
Depois de mais de um ano em meio a doenças, injúrias e até mesmo fatalidades, o grupo conseguiu encontrar e capturar a ave enquanto ela dormia desprevenida em meio a névoa das montanhas. A comemoração foi grande. Estavam todos em estado de êxtase e quando voltaram para sua terra natal a imprensa os fez heróis aventureiros!
Como era linda aquela ave que eles encontraram! Todos diziam isso. Porém, o que poucos viam era como ela estava adoecendo e morrendo a cada dia que se passava em cativeiro. Suas plumas começaram a perder o brilho, e o que era dourado estava ficando opaco. Não se via mais a majestade que ela esbanjava ao ar livre. O mais belo dos pássaros estava morrendo encarcerado.
O filho caçula de um dos cientistas da expedição gostava muito de animais, tinha um verdadeiro amor por todo ser vivo que encontrava. Ele, a noite, escondido do pai, entrava no laboratório e conversava com a ave em sua deprimente gaiola.
— Você está muito triste, o que fizeram com você, passarinho?
A ave apenas olhava com um olhar baixo e se encolhia em um canto de seu cativeiro.
Dias se passaram desde que o menino conversara com a ave pela primeira vez. Sentindo a angústia que o pássaro vivia, ele decidiu fazer algo. Em uma noite de feriado nacional, quando todos estavam festejando com suas famílias e longe do laboratório, o garoto abriu a gaiola, pegou o pássaro com as mãos e o levou até a cobertura do prédio onde estavam. Era um prédio bem alto, e a ave poderia voar livre sem correr o risco que alguém a visse lá de baixo.
— Vá! Eu te protejo! Seja livre como você deve ser. A sua beleza não foi feita para ficar presa entre grades! — disse o menino.
A ave pareceu recuperar seu olhar majestoso e em poucos segundos suas penas voltaram a cor dourada forte que tinha. Ela olhou para o garoto uma única vez, e parecia agradecida. Então ergueu voo para nunca mais ser vista entre aqueles homens.
O que precisamos aprender com essa história é que todos nós somos como aves raras. Não podemos nos deixar presos e escravizados, seja em nome da ciência, da razão, da sociedade ou de um sistema financeiro. A beleza que mora dentro de cada um de nós só pode brilhar se estivermos livres. E para nos libertarmos de nossas prisões, podemos pedir ajuda a alguém puro, que ainda não perdeu a bondade e o amor universal: a nossa criança interior.
O encontro com a Morte
Lá estava Carlos em sua cama a noite, esperando o sono chegar. Mas quem chegou não foi o sono, mas a Morte que apareceu para levá-lo. O que ele não esperava era que ela se mostrasse tão doce.
Uma bela dama de cabelos negros com um vestido longo e olhos cobertos por um véu negro entrou suavemente no quarto. Tinha um corpo esguio e era linda, apesar de não expressar emoção alguma em sua face. Seus movimentos eram sutis e precisos.
Carlos ficou tão assustado com a aparição que pensou ser um sonho, mas não era. E então perguntou:
— Quem é você e o que faz aqui? Assombração!
— Boa noite, Carlos. Eu sou a Morte.
— Meu Deus! Você é a morte? Por que veio agora? Não é possível! Sou tão novo, não fiz quase nada na vida... Mas... Espere um pouco! A morte é uma mulher bonita?
O jovem estava perturbado. Pensou em correr, em fugir, mas não conseguia mover suas pernas.
— O que esperava? Uma velha? Um esqueleto ambulante? Ou um vulto branco e deformado? A morte é tão bela quanto a vida, e tão encantadora quanto o pôr do sol. É uma pena que a maioria das pessoas demore a reconhecer a minha beleza.
Ainda não acreditando no que estava vendo, Carlos começou a surtar.
— Não! NÃO! Não posso morrer agora! Ainda não terminei meu trabalh! Ainda não me casei e nem tive filhos! Viajei tão pouco e não conheço nada do mundo! Ainda não sou feliz como queria ser. Não me leve, por favor!
A morte não demonstrava emoção, piedade ou dó do homem. Afinal, ela sabe muito bem da história dele, e de todos nós. Ela não precisa de piedade, pois ela sabe da importância de sua função e da verdade que existe no fim de cada ciclo. E então ela falou:
— Esse é o preço que se paga por ter vendido o seu tempo. Todos tem o tempo que precisam para serem felizes e realizarem seus sonhos, mas poucos sabem aproveitá-lo. Você não realizou seus sonhos por que não quis. Você teve medo e se deixou levar. Foi escravo da vontade dos outros e apenas trabalhou para enriquecê-los. Enquanto suas aspirações foram jogadas no lixo.
Carlos ainda apavorado começou a suplicar:
— Me perdoe! Me dê mais uma chance! Por favor! Eu juro que farei o que você quiser. Qual é o seu preço? Me diga!
— Você acha que pode subornar a morte? Eu não sou como vocês, humanos gananciosos que vendem a vida por dinheiro, status e um falso poder na sociedade. Esqueça! Agora não há mais tempo. Você irá para uma nova realidade em um novo lugar. Te levarei até lá. Você querendo ou não.
— Me desculpe... Tudo bem, eu vou. Mas me diga. O que fiz errado? Eu só fiz o que as pessoas esperam de um bom homem. Trabalhei, dei duro e fui honesto. O que mais poderia ter feito?
A Morte olhou-o nos olhos e disse:
— Você não agiu para si mesmo e para seus sonhos. Agiu apenas para os outros. Esse foi o seu erro. E por isso desperdiçou uma vida que poderia ter sido muito mais bem aproveitada. Agora não espere por uma próxima vez. O tempo que você vendeu ontem, não voltará mais amanhã.
A escuridão tomou conta do quarto. No dia seguinte, o patrão de Carlos estranhou a ausência dele e mandou alguns criados buscarem ele em sua casa. Quando eles chegaram, ninguém abriu a porta. Um corpo morto esperava no andar de cima. Ele não poderia mais vender o seu tempo para um trabalho que consumiu toda a sua vida. E também não poderia mais realizar os sonhos que deixou para trás.
Um amor inesperado
Há alguns séculos, existiu um grande império no mundo ocidental. E, apesar de toda a sua grandeza, sofria ataques dos outros reinos que buscavam a expansão de seus domínios.
Em um desses ataques um soldado do exército inimigo foi capturado e preso. O soldado era um homem de muita coragem e honra e se negou a fornecer informações sobre o seu rei e seus planos. Sendo assim, o prisioneiro não foi julgado ou solto, apenas permaneceu trancafiado em uma cela gelada no subsolo.
Os meses foram passando e a mente do guerreiro só se manteve sã devido à intervenção de uma escrava que levava comida para ele todos os dias. Em poucos minutos, eles conversavam e assim ambos descobriram que existia alguém no mundo que entendia o sofrimento pelo qual passavam.
— Se você não falasse comigo eu já estaria ficado louco e teria me enforcado por falta de esperança na vida. Obrigado por vir aqui. — Disse o soldado.
Com um olhar de quem conhece as dores da falta de liberdade ela responde:
— É bom ter alguém com quem conversar. Nasci escrava e nunca me senti parte desse povo. Pela primeira vez encontrei alguém que posso falar o que penso. Nunca imaginei que um estrangeiro de um reino tão diferente pudesse ter tanto em comum comigo.
Com sorriso o guerreiro respondeu:
— Penso muito no tamanho do erro que cometi ao tentar invadir um império a que não me pertence. Mas por outro lado, sem ter feito isso eu nunca saberia que existem pessoas tão boas como você nessa terra de loucos.
Em um momento de silêncio, os olhares se cruzaram. E, em todos os dias que se passaram, no momento em que um pequeno raio de sol entrava por uma cavidade no teto, a jovem escrava chegava e dois sorrisos podiam ser vistos em uma cela sombria, mas não morta.
Meses se passaram e um ataque do exército inimigo derrubou as muralhas que separavam aquele lugar do resto do mundo. O imperador foi capturado e os novos governantes juraram que os tempos de tirania estavam acabados.
Os presos e escravos foram libertados e finalmente o soldado pode ver o sol por completo e sentir o punho de sua espada novamente. Ele encontrou a escrava que o mantivera vivo por tanto tempo e juntos fugiram dali para nunca mais serem vistos.
Muito tempo se passou e longe dali um belo reinado de paz, amor e harmonia foi erguido e foi reconhecido por ser um dos reinos mais prósperos já vistos sob a face da terra. Já em outras terras, escravos e combatentes presos ouviam falar desse reino e se perguntavam se era uma lenda ou realidade. Os viajantes e andarilhos que já tinham visto com os próprios olhos a beleza desse lugar mágico contavam em segredo: "Saibam que o mais belo dos reinos foi erguido por um rei e uma rainha que um dia também foram prisioneiro e escrava? Portanto mantenham a fé, meus amigos, que um dia venceremos e todos nós teremos o nosso próprio reino".
Há alguns séculos, existiu um grande império no mundo ocidental. E, apesar de toda a sua grandeza, sofria ataques dos outros reinos que buscavam a expansão de seus domínios.
Em um desses ataques um soldado do exército inimigo foi capturado e preso. O soldado era um homem de muita coragem e honra e se negou a fornecer informações sobre o seu rei e seus planos. Sendo assim, o prisioneiro não foi julgado ou solto, apenas permaneceu trancafiado em uma cela gelada no subsolo.
Os meses foram passando e a mente do guerreiro só se manteve sã devido à intervenção de uma escrava que levava comida para ele todos os dias. Em poucos minutos, eles conversavam e assim ambos descobriram que existia alguém no mundo que entendia o sofrimento pelo qual passavam.
— Se você não falasse comigo eu já estaria ficado louco e teria me enforcado por falta de esperança na vida. Obrigado por vir aqui. — Disse o soldado.
Com um olhar de quem conhece as dores da falta de liberdade ela responde:
— É bom ter alguém com quem conversar. Nasci escrava e nunca me senti parte desse povo. Pela primeira vez encontrei alguém que posso falar o que penso. Nunca imaginei que um estrangeiro de um reino tão diferente pudesse ter tanto em comum comigo.
Com sorriso o guerreiro respondeu:
— Penso muito no tamanho do erro que cometi ao tentar invadir um império a que não me pertence. Mas por outro lado, sem ter feito isso eu nunca saberia que existem pessoas tão boas como você nessa terra de loucos.
Em um momento de silêncio, os olhares se cruzaram. E, em todos os dias que se passaram, no momento em que um pequeno raio de sol entrava por uma cavidade no teto, a jovem escrava chegava e dois sorrisos podiam ser vistos em uma cela sombria, mas não morta.
Meses se passaram e um ataque do exército inimigo derrubou as muralhas que separavam aquele lugar do resto do mundo. O imperador foi capturado e os novos governantes juraram que os tempos de tirania estavam acabados.
Os presos e escravos foram libertados e finalmente o soldado pode ver o sol por completo e sentir o punho de sua espada novamente. Ele encontrou a escrava que o mantivera vivo por tanto tempo e juntos fugiram dali para nunca mais serem vistos.
Muito tempo se passou e longe dali um belo reinado de paz, amor e harmonia foi erguido e foi reconhecido por ser um dos reinos mais prósperos já vistos sob a face da terra. Já em outras terras, escravos e combatentes presos ouviam falar desse reino e se perguntavam se era uma lenda ou realidade. Os viajantes e andarilhos que já tinham visto com os próprios olhos a beleza desse lugar mágico contavam em segredo: "Saibam que o mais belo dos reinos foi erguido por um rei e uma rainha que um dia também foram prisioneiro e escrava? Portanto mantenham a fé, meus amigos, que um dia venceremos e todos nós teremos o nosso próprio reino".
O voo da águia
Em uma época onde o mundo era dividido em reinos, viveu um rei que era conhecido por suas estratégias impecáveis de conquistas e por isso era reconhecido como aquele que nunca perdera uma guerra.
Ele era muito admirado por todos os soldados que guiava pelas batalhas e, mesmo estando em uma posição de poder, sempre acompanhava seus súditos e conversava com eles de igual para igual.
Certa vez um soldado muito promissor de seu exército veio conversar com seu rei em tempos de paz:
— Senhor, admiro as suas conquistas e te sigo em todas as batalhas. Te respeito muito, mas algo me incomoda. Não consigo mais ficar parado esperando a próxima batalha. Quero conquistar mais e poder ser útil para nosso povo novamente. Com a nossa força podemos construir um império em pouco tempo. Por que paramos os ataques?
O rei sabia que muitos de seus soldados não gostavam de ficar sem missões. Então ele explicou o porquê dos ciclos das batalhas serem daquele jeito:
— A águia é um dos animais mais belos da natureza, mas, ao mesmo tempo, também é um dos mais eficientes e vorazes na caça. Observe a natureza e verá que todas as respostas estão lá! Você me pergunta por que paramos as invasões sendo que podíamos estar conquistando muito mais. Observe a águia, soldado! E saberá por que ela reina no céu.
O rei deu uma breve pausa para olhar para o céu e então continuou:
— A águia voa muito alto e por muito tempo, mas as vezes até ela precisa parar nas montanhas para descansar e assim poder alçar voos ainda mais longos em suas próximas viagens.
O soldado ficou em silêncio. Após alguns instantes ele se levantou e agradeceu ao rei pela conversa. E quando ia se retirando, reparou com um breve olhar como era grandiosa aquela águia dourada bordada na capa de seu rei. Então ele soube que cedo ou tarde eles iriam alçar voo.
Um homem de fé
João era um homem simples. Cresceu em uma família pobre e não teve a oportunidade de frequentar a escola, pois teve que trabalhar desde quando era ainda um menino. Mas apesar de ter tido poucos estudos, ele tinha algo que muitas pessoas que passam a vida inteira estudando não conseguem ter. Ele tinha fé. Uma fé verdadeira e inabalável.
Em todas as situações difíceis pelas quais passou ele seguiu firme e no final sempre tudo deu certo. E quando perguntavam para ele como ele conseguia seguir em frente ele apenas respondia: eu tenho fé!
Os anos se passaram e João casou e teve filhos. Trabalhava como caminhoneiro e viajava pelas estradas mais esquecidas de seu país, pois nenhum outro homem tinha coragem de fazer tais trajetos. Quando o seu filho mais velho completou dezoito anos, ele começou a levá-lo em suas viagens para aprender a sua profissão e também para ter companhia nas longas horas na estrada.
O filho não era como o pai. Ele era um jovem inteligente, gostava de ler e estudar bastante. Mas não tinha a mesma fé de João. Pelo contrário, ele tinha muitas dúvidas. Em uma das viagens, ele começou uma conversa com o pai:
— Pai, o que é fé? Eu não entendo! Já li sobre ela em vários livros, mas nunca encontrei uma resposta que eu gostei de verdade. E pra todo mundo que perguntei, me falaram que o senhor é a pessoa certa para me explicar sobre a fé.
Eles estavam levando uma valiosa carga para uma cidade distante, já era noite, mas eles não podiam parar a viagem pois precisavam entregar a encomenda logo cedo no dia seguinte. Era uma estrada com muitas curvas e era conhecida pelo alto número de acidentes que aconteciam ali. Quando o rapaz começou a falar com o pai, eles estavam entrando em uma parte totalmente coberta por neblina. Então João respondeu:
— Tá vendo essa neblina, filho? Essa é uma das estradas mais perigosas dessa região e com qualquer erro podemos cair no barranco e morrermos. Todo mundo tem medo de estar aqui a essa hora da noite. O medo tenta me pegar também, mas eu continuo dirigindo, hora após hora, mesmo que a neblina atrapalhe o que vejo. E você sabe por que, filho?
— Não sei. — Disse o garoto.
— Porque eu sei que tenho um dever para cumprir e, se eu não entregar essa carga a tempo, muitas pessoas vão se dar mal. Eu assumi uma responsabilidade e tenho a certeza que sou capaz de cumprir a minha missão, não importando o quanto pareça difícil ou arriscado. Mesmo dirigindo no meio da névoa, sem enxergar direito e sem saber o que vai aparecer na frente, eu continuo seguindo, sem parar. Isso, meu filho, é ter fé.
Os senhores da terra
Quando o mundo foi criado, algumas regiões foram feitas para serem mais chuvosas, outras mais secas, e outras com uma fauna e flora diversificada. E uma dessas inúmeras terras foi abençoada para que a agricultura fosse fértil e tudo o que fosse plantado crescesse de forma abundante. E foi nessa terra que certo dia um pai agricultor viu o seu filho plantando as suas primeiras árvores.
O garoto desde pequeno demonstrava ser bem ambicioso e não via a hora de ter a sua própria plantação, com uma diversidade enorme das mais saborosas frutas. Mas o que ele ainda não tinha entendido era o porquê de ter que trabalhar na terra de outros se ele podia plantar as suas próprias sementes e comer os seus próprios frutos.
Suas sementes começaram a brotar. Algumas cresciam lentamente, enquanto outras morreram e outras foram esquecidas e abandonadas durante o inverno. Quando o pai, que era um homem experiente no campo, viu o desânimo do filho, foi conversar com ele.
— Filho, eu sei que você quer ter a sua própria plantação e poder ter os seus próprios frutos. Mas tudo leva tempo. A natureza é sábia e se trabalharmos de acordo com os seus ciclos tudo crescerá no momento certo.
Indignado com a incapacidade de ver suas sementes virarem árvores, o filho não via a hora de poder comer um fruto de uma árvore plantada por suas próprias mãos.
— Mas, pai, eu não quero mais trabalhar na lavoura de outros senhores de terra sendo que podemos ter a nossa própria colheita. Não é justo!
— Eu sei, filho. Mas tem que entender que uma semente não vira árvore da noite pro dia. E, enquanto não colhemos nossos próprios frutos, temos que continuar trabalhando nas terras dos outros, mas continuando a regar e a cuidar de nossas sementes até que um dia poderemos ter um grande pomar. Então não precisaremos mais ficar dependentes dos frutos dos senhores de outras terras.
— O que eu me revolto, pai, é como esses senhores nos dão tão pouco em troca de muito trabalho duro.
— Nessas terras esses homens não nos valorizam muito, mas em outros lugares do mundo já não é tanto assim. Mas chegará um dia em que todos nós colheremos os nossos próprios frutos e esse será o dia que os senhores de terras sentirão falta de nosso trabalho. E quando isso acontecer, o mundo será mais justo, e não precisaremos mais nos escravizar. Mas para chegar lá, meu filho, continue regando as suas sementes e continue firme, pois tudo o que se planta nessa terra nasce.
Vivendo um sonho
"A vida é curta se passarmos todo o nosso tempo de forma automática e sem buscar nossos sonhos. Mas se ela for vivida com amor, ela será intensa e eterna."
Século XXI. O nosso mundo teve uma evolução tecnológica incrível nas últimas décadas. A ciência melhorou nossas vidas em tudo, mas algumas coisas parecem não estarem tão boas quanto os comerciais da televisão nos dizem.
Lilian é uma mulher que mora em uma grande cidade. Ela estudou durante toda a sua juventude para finalmente ter uma carreira profissional e conseguir casar com um homem de boa aparência e com algum dinheiro. Ensinaram a ela que era assim que a vida tinha que ser. Ela acordava cedo todos os dias e passava uma boa parte do seu tempo para chegar ao trabalho. Ruas lotadas, muito barulho e uma paisagem cinza como uma prisão.
Ao chegar ao trabalho, ela seguia uma rotina e fazia algumas coisas que ela gostava e outras que não sonharia nem de longe fazer, mas, mesmo assim, fazia. Ela conversava com algumas pessoas que gostava, mas fingia ser educada com outras que nunca quis chegar perto.
A vida de Lilian é comum como muitas outras vidas de pessoas que escolheram viver a rotina das grandes cidades. Até que um dia algo mudou. Em um exame de rotina seu médico teve que lhe dar uma notícia:
— Como vai, Lilian?
— Muito bem, doutor. Meio estressada como sempre. Mas é normal não é mesmo?
— Tudo bem... Preciso falar sobre os seus exames.
Ela olhou para o médico enquanto cruzava bem forte os braços. Nunca imaginara que fosse ter problemas de saúde, afinal, ela não bebia, não fumava e se alimentava bem. Ouviu o que o médico tinha a dizer. E foi um choque quando descobriu que estava com uma doença rara e, caso passasse por um intenso tratamento, poderia ter a chance de viver por mais alguns meses, talvez até um ano.
— Como isso pode estar acontecendo, doutor? – Lilian falava quase sem força na voz — Uma mulher nova como eu ter uma doença como essas. Não acredito!
O médico passou todas as informações necessárias para ela tomar as decisões que precisava e passar pelo tratamento. Chegando em casa, ela contou ao marido o que estava por vir. Ambos choraram e se sentiam muito mal por pensar que tudo o que tinham passado juntos ia terminar de forma inesperada.
Algumas horas se passaram e após muito refletir sobre o inevitável, Juliano, seu marido, sentiu que precisava falar sem falsas esperanças para tomarem uma decisão:
— Amor, você acha que passar os seus últimos meses de vida presa em um quarto de hospital fará sua vida terminar bem?
Com lágrimas nos olhos ela respondeu:
— Não acho. Se eu vou partir desse mundo, eu não quero que seja assim.
— Então sei o que devemos fazer. — Respondeu Juliano — Vamos largar tudo o que nunca deveríamos ter perdido tempo e vamos aproveitar cada minuto que nos resta juntos. Vamos ser felizes e, quando tudo acabar, o que ficará na lembrança serão esses bons momentos.
Os dois sabiam que era a melhor decisão a tomar. Por que gastar os últimos momentos da vida sofrendo? Eles pegaram papel e caneta. Começaram a anotar todas as atividades que faziam em suas rotinas diárias. Após listar tudo, Juliano tomou a iniciativa:
— Vamos riscar da lista tudo o que fazemos hoje e que não gostamos e que não queremos mais perder tempo com isso. Não precisamos mais fazer o que não queremos e nem o que não nos beneficia em nada. Não importa mais.
Eles foram riscando item a item. Trabalho, reuniões, encontros com pessoas que não gostavam, alguns passatempos sem sentido, passar horas no trânsito, comprar coisas que não precisavam, entre outros itens, quase tudo foi riscado.
Quando terminaram de riscar, sobraram poucos itens. Passar tempo com quem se ama, viajar, fazer amor, conhecer novas culturas, conversar com os amigos, visitar a família. Eles sabiam o que tinham que fazer para aproveitar cada momento que lhe restavam juntos.
As semanas seguintes foram turbulentas. Venderam o apartamento, o carro, pediram demissão de seus empregos e, com todo o dinheiro que sobrou, embarcaram em uma viagem que sempre sonharam em fazer, mas nunca tiveram coragem. Iriam enfim conhecer o mundo!
A cada lugar que passavam se maravilharam com as belezas de cada cultura que descobriam. Conheceram pessoas maravilhosas no caminho e também encontraram muitos amigos e parentes que moravam longe. Cada momento que tiveram foi como eles tinham planejado naquela noite que receberam aquela notícia. Foram momentos mágicos!
Os meses foram passando e a doença de Lilian começou a se mostrar cada vez mais grave. Em uma tarde cinzenta de Outubro ela estava pronta para dar os seus últimos suspiros. Deitada em uma cama, em um lugar onde se podia ouvir o barulho do mar, ela disse as últimas palavras ao seu marido:
— Obrigado por tudo, amor. Esses foram os melhores dias da minha vida. Eu te amo e sempre te amarei. E agora só lhe peço um último pedido.
— Pode falar... Farei qualquer coisa. — Ele respondia com lágrimas nos olhos.
— Passe uma mensagem a todos que conhecemos e a todos que quiserem ouvir. Diga para eles não desperdiçarem suas vidas por causa de dinheiro ou trabalho. Diga para passarem mais tempo com as pessoas que amam e para se aventurarem a fazer o que sonham. Diga para que não esperem uma doença como a minha aparecer para mudarem de atitude. O mundo foi feito para sermos felizes. Então não vamos esperar a morte chegar para mudarmos. Todos podem fazer muito mais e ser muito mais enquanto ainda é tempo.
Eles se olharam e deram um último beijo. E, quando Lilian fechou os olhos pela última vez, Juliano falou bem baixinho em seu ouvido:
— Eu prometo. A nossa história vai inspirar muitas pessoas um dia. Por amor.
A força de um guerreiro
Há séculos, o Japão feudal era ocupado por diversos clãs que batalhavam entre eles pela expansão de seus territórios. Nessa época a população dependia da agricultura para a sua sobrevivência, e proteger e conquistar terras era algo essencial para um clã se manter forte. Foi nesse cenário que os guerreiros samurais tiveram um papel essencial na história desse país e desse povo.
Em um povoado que possuía terras no sudoeste do Japão, havia um jovem camponês que sonhava em ser samurai e fazer parte da elite de guerreiros que protegiam todas as riquezas de sua comunidade. Ele tinha nascido em uma família de camponeses onde nunca nenhum deles almejara se tornar algo além disso.
O rapaz fez algo que nenhum de seus antepassados fizera, e decidiu mudar a linhagem da família. Ele estava decidido a se tornar um samurai e nada o impediria disso. O jovem sempre tentava conversar com os guerreiros quando voltavam de batalha para tentar convencer a aceitá-lo como um deles, mas ele foi subestimado.
Certo dia, um dos samurais mais velhos da comunidade virou para ele e disse:
— Se você quer ser um de nós, prove que você tem força de vontade para isso ou pare de nos incomodar. O treinamento de um guerreiro é duro e somente alguém com muita coragem e determinação consegue passar por tudo o que passamos. As batalhas são violentas e os inimigos são implacáveis. Você quer mesmo passar por tudo isso? Então mostre o seu valor!
O guerreiro jogou uma espada de bambu para o jovem e o desafiou para uma luta.
— Vamos! Prove que você é capaz de ser um guerreiro!
O camponês sabia que seria sua única oportunidade na vida de provar para um samurai que ele poderia ser como eles, então pegou a espada e, mesmo sem saber manejá-la direito, tentou atacar seu adversário.
O confronto foi rápido, e o ancião em poucos movimentos, e sem precisar de arma alguma, desarmou o jovem e deu-lhe algumas pancadas para derrubá-lo.
— Muito lento! Dessa forma você nunca será um samurai. Prove que você pode ser melhor que isso.
Ele chutou a espada em direção ao jovem caído.
A cena se repetiu, e dessa vez os golpes foram mais fortes e mais violentos.
— Muito fraco! Não sinto que você tenha vontade o suficiente.
O jovem estava machucado e sangrando em algumas partes do corpo, mas, mesmo assim, se levantou e foi para cima do seu adversário.
Mais golpes, mais sangue, e caiu mais uma vez no chão.
A essa altura algumas pessoas tinham parado para olhar o que estava acontecendo e pareciam lamentar pela surra que o jovem tomava.
Porém, o camponês não admitia desistir do seu objetivo. Ele se levantou, apanhou e caiu várias e várias vezes. Quando suas pernas já não aguentavam mais o peso de seu corpo, o guerreiro ficou a sua frente e deixou a espada de bambu para ele.
— Sua primeira lição para se tornar um samurai: jamais fique longe de sua espada. Sua espada é a sua vontade e essa espada de bambu agora é sua. Você vai andar com ela, vai dormir com ela e em hipótese alguma vai deixá-la a uma distância em que não possa pegá-la de prontidão. Um samurai sempre deve estar pronto para a batalha.
O jovem encarava o guerreiro. Ele queria dizer algo, mas muito sangue escorria de sua boca para conseguir falar. O guerreiro continuou:
— A segunda lição você já está aprendendo: não importa quantas vezes você caia, você sempre levantará. Sempre! Lembre-se disso. Você só perde a luta quando perde a sua vontade. Enquanto houver vontade, não importa quantas vezes você for golpeado, você levantará. Esse é o segredo do samurai. Ele tem a vontade mais forte do que todo um exército inimigo e nada o impedirá de cumprir com a sua missão.
As feridas no corpo do jovem demoraram a cicatrizar, e ele nunca esqueceu da surra que tomou aquele dia. Porém, conseguiu ser aceito como discípulo do velho guerreiro. Com o tempo descobriu que as feridas das batalhas eram muito mais profundas do que imaginara, e que a guerra podia derrubar o mais forte dos homens. Mas nos piores momentos e nas situações mais difíceis ele se concentrava e lembrava da lição que todo samurai carrega em sua alma: nada é mais forte do que a sua vontade!
A pesca e o pescador
Rafael e Liliane eram um casal que estavam juntos há dois anos. Eles moravam em uma grande cidade e dedicavam suas vidas trabalhando em grandes empresas.
O tempo foi passando e os dias dentro de escritórios ficavam cada vez mais cansativos e monótonos. Graças a essa falta de aventura no cotidiano, eles decidiram tirar férias e viajar para alguma cidade distante, para descansar e conhecer uma nova cultura. Depois de muita pesquisa, decidiram ir para uma cidade litorânea no norte do país.
Arrumaram as malas, se despediram da família e amigos e partiram. Chegando à cidade, eles se hospedaram em um simples chalé que ficava em meio a um vilarejo de pescadores. Eles podiam ver o mar e relaxar observando o voo das gaivotas.
Os dias foram passando e eles se divertiram muito até que a viagem estava chegando ao fim. Só de lembrar de ter que voltar para o trabalho na empresa Rafael se sentia mal e Liliane não sentia vontade alguma de voltar. Foi nesses dias que eles começaram a se questionar porque trabalhar era algo tão penoso. E foi pensando nessa questão que eles repararam como os pescadores e as outras pessoas daquele lugar trabalhavam felizes e sem preocupações. Como isso era possível?
No último dia de estadia na cidade eles foram conversar com um dos pescadores que havia pescado muitos dos peixes que eles haviam comido. Esse homem nunca tinha pedido sequer uma gorjeta, e parecia não se importar em ter que trabalhar mais por causa dos turistas. Isso chamou a atenção do casal.
— Boa tarde, amigo!
Rafael se aproximou para uma conversa.
— Boa tarde, sinhô! Tudo bão?
— Tudo bem! E parece que aí está tudo tranquilo também, não é mesmo?
— Tudo bão! Sempre ta tudo bão!
E o pescador riu.
— Me diga uma coisa, amigo. Fiquei hospedado aqui no vilarejo por vários dias e fiquei impressionado como o senhor trabalha tanto e sempre parece feliz. Lá onde eu moro eu trabalho tanto, mas nunca consigo terminar o dia com o sorriso como o senhor tem. Me conte! Qual é o seu segredo?
O pescador olhou e não pareceu surpreso com a pergunta. Provavelmente já respondera essa questão outras vezes.
— O sinhô é da cidade grande, né?
— Sou sim. Da capital. Respondeu Rafael.
— É por isso. Eu já vivi lá um tempo. E sei como é difícil trabalhar por lá. Por isso vim trabalhar aqui. Como pescador.
O casal apenas olhou apreensivo, esperando ouvir o resto da história. Então o homem continuou:
— Na cidade grande todo mundo trabalha esperando ser recompensado. Todo mundo trabalha querendo prêmio, querendo medalha. O que cêis fazem lá não é trabalho, é competição. E eu num gosto dessas coisas não, sinhô.
Ao ouvir isso, Liliane perguntou:
— O que o senhor gosta, então?
Eu gosto é de trabalhar, dona! Sabe... As pessoa da cidade grande devia parar de competir umas com as outras, parar de querer ser reconhecido. O que dá gosto mesmo é poder trabalhar sem se preocupar com essas coisas. É chegar ao fim do dia e saber que dei o meu melhor. Eu não importo se os outros vão elogiar o peixe que eu peguei ou não, porque eu sei que eu dei o meu melhor e não preciso ganhar elogio pra saber disso. A felicidade, dona, está no fazer. No prazer de fazer pelo fazer, e não no fazer pra mostrar pros outros que ta fazendo. Entende?
Liliane ficou em silêncio por um instante. Refletia nas palavras simples do pescador. O quanto ela não trabalhava apenas para conseguir uma promoção na empresa? O quanto ela não tirou diplomas e ficou trabalhando até tarde para ser reconhecida e ganhar um elogio do chefe? E nessas preocupações "da cidade grande" ela se esquecera do prazer que tinha em fazer o seu trabalho. Ela se esquecera que um dia tinha escolhido a sua profissão porque aquilo lhe dava prazer em fazer, e sem se importar com o que os outros iam achar. Porque quando você faz algo com o coração, o que mais importa é aquele momento. Aquele simples momento em que tudo em volta parece não existir, e você está imerso em algo, em um fazer que faz parte de você. E é nesse momento que não existe mais o trabalho e o trabalhador, mas sim eles são uma coisa só. E então se encontra a felicidade.
Perdas e cicatrizes
Há tempos, existiu um grande império na Terra. Esse império era conhecido por suas vitórias nas guerras as quais seus guerreiros encaravam seus inimigos sem medo. O que poucos sabem é que, antes de se tornar um grande império, esse povo perdeu muitas outras guerras até conseguir se firmar como uma grande potência.
Foi em certa batalha que um bravo soldado cravaria seu nome nos contos que eternizaram a história desse imponente império. Para esse conto, vamos chamá-lo de Victor. Mas muitos outros nomes foram usados para se referir ao grande herói.
Era uma manhã quente. O sol queimava a pele dos soldados e o ar estava seco. O batalhão no qual Victor se alistara estava diante de um confronto. Dezenas de milhares de soldados inimigos marchavam de encontro a eles.
Um outro guerreiro, mais jovem e ainda em sua primeira guerra, tinha o olhar aflito e foi perguntar para Victor se a quantidade de guerreiros inimigos não o deixavam com medo.
— Você me pergunta se eu tenho medo? Respondia Victor. – Eu já tive medo um dia, quando eu era inexperiente tive medo do fracasso. Mas já aprendi que esse é o pior erro que qualquer um pode cometer.
—Pensei que fosse algo normal – disse o garoto.
— Não deveria ser. E sabe por quê? Na verdade o fracasso não existe. Se as pessoas soubessem disso elas não teriam medo e arriscariam mais em suas vidas. Seja no campo de batalha ou em qualquer outro lugar.
— Como assim o fracasso não existe? Podemos perder tudo nessa guerra! – O jovem não entendia o que estava ouvindo.
— Entenda uma coisa, garoto. O fracasso é a melhor motivação que um guerreiro pode ter para chegar à vitória. Eu já perdi batalhas, e cada uma delas me fez enxergar o quanto eu precisava melhorar como guerreiro e como pessoa. E essas derrotas não se limitam ao campo de batalha. Em tudo o que passamos na vida podemos aprender com os supostos fracassos. Na família, nos amores, no ofício e nas conquistas. Todos que já venceram, um dia já perderam. E quer saber o que diferencia um perdedor de um vencedor?
O soldado balançou a cabeça para ele continuar.
— O que diferencia o vencedor do perdedor é que o perdedor desiste quando perde algo, ele não aceita a derrota. O vencedor usa a perda como motivação para se tornar alguém melhor e essa experiência serve como aprendizado. Um fracasso nada mais é do que um combustível para lutar. É a melhor motivação que você pode ter para vencer. É isso o que separa o perdedor do vencedor.
Houve uma pausa na conversa. O medo parecia ter sumido com um vento forte que passará por ali. E Victor deu um último recado para o jovem guerreiro:
— Eu nunca conheci um grande guerreiro que não tenha cicatrizes. Então não tenha medo de ganhar as suas. Pelo contrário, se vanglorie delas. Pois cada golpe tomado nos torna mais fortes, para um dia chegarmos à vitória.
O que realmente importa
João era um homem de bom coração. Ele costumava levar comida aos pobres e sempre parava para conversar com os necessitados. Ele nunca recusou um pedido de ajuda.
Após uma crise econômica em sua cidade, João perdeu quase tudo o que tinha e ficou desanimado ao ver a pobreza e a escassez que o cercava. Mesmo assim, continuou compartilhando o pouco que tinha com os moradores de rua.
Certa noite, ele encontrou um velho com roupas bem gastas. Era um senhor por volta dos setenta anos e tinha uma longa barba grisalha. Após oferecer uma sopa para aquecer o velho, eles começaram a conversar. João puxou assunto:
— Sempre passei nessas ruas e é a primeira vez que te vejo por aqui. Como veio parar nesse lugar?
— Eu sou um andarilho. Onde estou hoje, não estarei amanhã.
— Ok... Quer me contar um pouco da sua história? Por que acabou morando na rua?
O velho parecia cansado, mas não derrotado.
— Um dia já fui muito rico. Fui dono de muitas terras. Mas às vezes o destino nos surpreende, e vi tudo o que tinha ser perdido.
— Sei como é isso. Todos nessa cidade estão sofrendo com por causa da crise econômica — disse João.
— Eu sei. E por isso preciso te ensinar a lição mais importante que aprendi com todas as minhas perdas — respondeu o velho.
João arregalou os olhos e esperou o velho falar. Estava buscando uma resposta sobre o que fazer em momentos de escassez.
— Quando perdi todas as coisas, depois de muito tempo sozinho, percebi o que era a única coisa realmente importante que eu tinha perdido. Era o amor.
Os olhos do velho se encheram de lágrimas de saudades, e então ele continuou:
— Vou te dar um conselho. Faça de tudo para se manter próximo daqueles que você ama, isso é o mais importante de tudo. As posses materiais e seus títulos ou premiações não valem nada sem termos aqueles que amamos por perto. E se tivermos amor, podemos reconstruir o que quisermos. As pessoas são o que mais importa. Então antes de correr atrás do que perdeu, corra atrás das pessoas que ama para mantê-las por perto. Isso é o que você realmente não pode perder, meu amigo.
Ao ouvir o conselho do andarilho, João sentiu que ainda era rico. Pois ainda tinha as pessoas que amava por perto.
A vida é uma dança
Natalie era uma adolescente problemática. Ela não ia bem na escola, não se dava bem com a sua família e parecia não se importar com a vida padrão que as pessoas levam. Quando sua mãe perguntava o porquê de tanta rebeldia, ela falava:
— Não acho que posso ter sucesso na vida. Olhe para onde estamos, mãe. Nascemos pobres e não me parece que o mundo tem muitas oportunidades para quem nasce desfavorecido na vida.
A mãe da garota não sabia como mostrar que a vida valia a pena ser vivida.
A única coisa que conseguia fazer Natalie aproveitar o momento e ter prazer era o balé. Ela fazia aulas desde pequena e via aquilo como uma boa diversão e descontração da violência das ruas do bairro em que morava. Ela apenas dançava sem parar, sem se preocupar, e naquele instante nada mais existia.
A mãe de Natalie percebeu que era na hora das aulas de dança que a filha se empolgava, então resolveu falar com a sua professora. Amélia era uma mulher de meia idade que dedicou sua vida a arte dos movimentos corporais. Ela fora reconhecida como uma das melhores dançarinas de sua geração e depois de anos se apresentando pelo mundo decidiu ensinar tudo o que sabia para crianças carentes de sua cidade natal.
Quando a professora ouviu o pedido da mãe da garota, ela concordou em conversar com ela.
— Oi, Natalie! Esteve ótima na aula hoje. Está ficando cada vez melhor!
— Obrigada, professora! Nada como fazer o que gosta, não é mesmo?
— Pois é... Mas preciso conversar contigo sobre outras coisas. Sua mãe anda preocupada. Disse que você não dá mais valor ao que tem e não se anima com muita frequência. Tem algo que te incomoda, Natalie?
A garota deu um suspiro, olhou para baixo e desabafou:
— Professora, você dançou no mundo todo e teve uma vida rica, mas eu não sou como você. Eu nasci e moro em um bairro pobre, não tenho esperanças de ter um futuro bom. Não me dou bem na escola e não gosto da ideia de ter que trabalhar como empregada como minha mãe faz. Por que a vida tem que ser tão dura?
Amélia sorriu. Sorriu porque sabia que são nos momentos difíceis que aprendemos a valorizar o que mais temos de importante.
— Natalie, como você se sente quando dança?
— Eu me sinto como se nada mais em volta existisse. Eu amo dançar!
— E quando você está dançando você fica pensando em quando a música irá acabar?
— De jeito nenhum, professora! Se eu me preocupar com isso eu não conseguiria aproveitar o momento, o movimento, e cada passo que dou.
— Pois bem. Assim também é a vida. Se nós ficarmos pensando se vamos ter sucesso ou riqueza no futuro, não conseguimos parar para aproveitar o momento que estamos passando e acabamos perdendo o que mais nos importa e o que mais amamos. Então deixe de se preocupar com o futuro pois ele é incerto. Apenas aproveite a vida. Curta cada momento como se fosse uma dança e assim você preceberá os prazeres que está deixando de lado e que podem te fazer feliz e aceitar que a vida é beleza e arte, assim como o balé.
Depois desse dia, Natalie entendeu o que sua professora quis dizer. Não importa onde nascemos ou se passamos por dificuldades. O que importa é perceber que cada momento da vida é único e maravilhoso e vale a pena ser vivido. Então ela aproveitou cada passo de sua vida como um momento único, e nunca mais se importou como acabaria, e sim aproveitou cada instante, porque a beleza e o prazer da dança não estão em seu fim, mas sim enquanto ela dura.
E o melhor de tudo, foi que depois de ela começar a aproveitar a vida como uma dança, a vida sorriu de volta para ela. Anos se passaram e a garota ficou conhecida como uma das mais talentosas dançarinas de balé do seu país. E quando a dançarina encontra a sua dança dentro de si mesma, ela encontra a felicidade. E Natalie dançou feliz.