sexta-feira, 15 de outubro de 2021

MARIA DOS FARRAPOS (Psicografia em verso e prosa)

 

 MARIA DOS FARRAPOS
(Psicografia em verso e prosa)


Pode ser uma imagem de céuPsicografado por Pablo de Salamanca

PELO ESPÍRITO "POETINHA":
Eu estava sob a luz da lua em baixa cidade do Astral. Lá havia uma mulher praticamente nua, em profundo desequilíbrio espiritual.

Cobriam, seu corpo sutil, frangalhos. Sorria de forma anormal. Seus olhos eram esbugalhados. Este era o resultado da sementeira no mal.

Seus pensamentos eram fixos em imagens de teor sensual. Não se lembrava do Cristo. Transformação interior não era sua meta final.

Vivera para as sensações, em função do seu corpo material. Precisava sempre de pesadas emoções para preencher seu vazio mental.

Não aceitara estudar, embora boa chance houvera. Tivera bons pai e mãe para lhe ajudar. Contudo, nunca respeitá-los quisera.

Infeliz mulher enlouquecida! Agora, era tenaz espírito obsessor. Acompanhava, na Terra, jovem semi-enceguecida, que ainda não entendia a vida e o seu real valor.

Flora, assim, era perseguida. Estava despertando muito cedo à sua libido. A pobre moça-menina tinha vida sofrida e estava correndo real, mas oculto, perigo.

Não sabia de onde vinham aqueles pensamentos. Pareciam não pertencer a si.
A moça da favela, em quase todos momentos, passava por tentações e tormentos.

Flora tinha treze anos de idade. Em vida passada, perdera-se na prostituição. Tentava agora, sem falsidade, encontrar o caminho da recuperação.

Mas a mulher vestida de trapos, antiga companheira de sofreguidão, queria reduzir a frangalhos a sua atual resolução de transformação.

Portanto, minha missão era difícil. Com certeza, havia grande ligação entre a jovem e a alma cheia de vício, que tanto desejava o prazer e a sensação.

Flora, às vezes, buscava a religião. Tentava, em vão, amortecer a turbulência em seu coração, Através de momentos de oração.

Sentia que devia se afastar do caminho que se apresentava. Mas, até mesmo faltava bom ar para respirar.

O ambiente de sua vida era muito pouco são. Sua mãe era alma sofrida e, seu pai, um alcoólatra folgazão.

Eu necessitava de boa estratégia para encontrar uma solução. Precisava evitar uma tragédia, naquela família em dissolução.

Seu pai ficou gravemente doente. O fígado quase não mais trabalhava. Aquele homem, tão descrente, estava muito próximo da derrocada.

A mãe não sabia o que fazer, sem os trocados que o marido amealhava. Não podia mais, o ofício de pedreiro, exercer. Assim, ela estava quase desesperada.

Então atuei em sua mente, sugerindo-lhe uma solução: Deveria empregar sua filha adolescente, para ajudar a ganhar o bendito pão.

Eu conhecia luminosa pessoa, que poderia bem ajudar. Era alma realmente muito boa, prestativa e sempre pronta a amparar.

Consegui, sem muita demora, que a mãe de Flora fosse lhe procurar, num Centro Espírita consagrado à “Nossa Senhora”, que dirigia com amor e força para disciplinar.

Através de breves acertos, decidiu-se que Flora ficaria ali para faxinar. Embora a menina tivesse alguns receios, logo percebeu que era um bom lugar.

Passou a ganhar o pão material, mas benefícios maiores estavam por chegar. A dirigente convidou-a para um culto espiritual, onde cresceram suas esperanças em melhorar.

Sentira que uma nova vida se abria à visão da sua mente. Os doces ensinamentos que ouvira, tornaram-se uma boa semente.

Mas, uma parte difícil me cabia. Era encaminhar o espírito doente, que acompanhava a Flora moça-menina, e que, agora, estava muito descontente.

Ela se autodenominava Maria, "A poderosa Maria dos Farrapos"! Então, prometera que transformaria a vida da jovem em frangalhos.

Em noite de lua cheia, fui à casa de Flora, que dormira logo após a uma breve ceia. Eu deveria agir sem demora.

Próximo à seu vaso físico, em repouso, estava a entidade obsessora. Gritava para que o seu espírito saísse do corpo. Queria intimidar e, à prova, pô-la.

Eu intervi rapidamente, materializando-me de supetão. Surgi bem em sua frente, causando surpresa e irritação.

Disse-lhe que representava uma força de mais alto, estando ali para ajudá-la, naquele momento incauto.

Perguntou-me se eu era juiz, se sabia da real situação. A jovem, segundo ela, sempre fez o que quis e lhe era devedora, desde outra encarnação.

Então dirigi-me, resoluto, à infeliz. Utilizei forte argumentação, demonstrando que os erros têm como matriz a falta de amor e a ausência do perdão.

Apontei fatos de sua última vida, que caracterizavam a sua má conduta. Remexi antigas feridas, que amorteceram o seu vigor naquela disputa.

Ela não quis admitir seus erros, preferindo fugir da situação. Escondeu-se no baixo Astral, em feios becos, sem compreender a melhor solução.

Eu havia lhe oferecido nova vida, em menos denso plano espiritual. Trabalharia, sem se expor a maior perigo, se preparando para uma nova encarnação, afinal.

Para aquele espírito empedernido, não era fácil decidir. Vivera em dissolução por tempo indefinido e os velhos apegos não permitiam melhor porvir.

Contudo, senti que a havia atingido. Percebi, nela, uma nesga de esperança. Em minha mente surgiu um plano conciso, que, mais à frente, resultaria em bonança.

No entanto, sabia que ela iria retornar à procura de Flora. Esperaria eu me afastar, para assediar a menina em outra hora.

Após três dias de afastamento, voltei a buscar a adolescente. Neste período, houve bom planejamento para encaminhar a entidade doente.

Maria já havia retornado, desejosa de continuar a obsessão. Mas, seu espírito estava ressabiado. Sentia que havia uma nova situação.

Não era tão fácil influenciar Flora, que, agora, buscava mais forças na oração. A moça estava esperançosa com a nova porta, que se abria para o seu coração.

O Centro lhe dava a esperança, através de seus positivos ensinamentos. Aos poucos, retornava uma alegria de criança, que crê no futuro, deixando de lado os medos.

Haveria, em breve, uma nova sessão. Nela, ocorreria um trabalho especial. Era a tarefa de desobsessão, muito bem feita naquela casa espiritual.

Flora fora convidada, mas surgiu-lhe um aperto no peito. Era Maria, muito transtornada, não sabendo bem o que seria feito.

Faltando poucas horas para a reunião, a adolescente sentira-se mal. Eu, invisível à Maria, sustentei-lhe a resolução de comparecer ao culto espiritual.

Chegando ao Centro, a jovem vomitou. Mas, haviam muitos médiuns atentos, que logo perceberam a entidade e seu intento.

Ajudaram à moça-menina, com passes de limpeza e de sustentação. Maria, vestida em farrapos, estava ressentida, pois uma rede de energia já lhe tolhia a ação.

Com os trabalhos iniciados, após bela e profunda oração, o ambiente ficou todo magnetizado por poderosa vibração.

Até Maria se aquietou para ouvir esclarecedora explicação, oriunda do Evangelho que Jesus deixou, através dos seus atos de amor e de perdão.

Mais à frente, numa médium incorporada, Maria apresentou-se em longo choro de mágoas. Desfiava pérolas de uma angústia cansada, por meio de palavras muito amargas.

Depois do desabafo, sem calma, ouviu assertivas de esperança. Contudo ainda existiam, em sua alma, muitas dúvidas e destemperanças.

Foi necessário um tratamento magnético à entidade ainda acoplada. Retiraram miasmas extremamente maléficos, que embotavam o raciocínio de sua mente viciada.

Após o impacto da irradiação, Maria sentiu-se muito cansada. Mas, ainda pôde manter uma conversação. Logo aceitou, para um hospital espiritual, ser levada.

Depois de um período de recuperação, Maria estava renovada. Queria seguir um caminho de evolução, mas sua intenção deveria ser provada.

Então, entendeu que a reencarnação era meta fundamental na sua estrada. Para isso recebeu boa e segura orientação, facilitando a sua nova jornada.

Em breve seria recebida, com carinho e emoção, nos braços de Flora, já não moça e nem menina, em busca de sua redenção.

Minha tarefa estava terminada. Agradeci profundamente ao Pai Celestial. Retornei, feliz, à humilde caminhada de um Trabalhador do Umbral.

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Da obra "O Trabalhador do Umbral", Pablo de Salamanca, médium psicógrafo, Rio de Janeiro, 2007.