POMBAGIRA MARIA QUITÉRIA
A dona do Cabaré.
Na França existe uma cidadeE é de lá que Quitéria veio.
Em 1275 uma bruxa de nome
Angèle foi queimada viva
Na praça central acusada de ter
Parido um filho fruto de uma
Relação sexual que ela teve
Com o próprio Demônio.
Isso de ela ter engravidado de Satã
Era mentira, devaneio dos
Inquisidores que a torturaram
Até que ela assinasse a
Confissão de todas
As loucuras de que tinha sido acusada.
Acusaram Angèle de matar
E beber o sangue de bebês,
De invocar espíritos e
Aliciar moças honestas
Para se converterem ao paganismo,
Mas todas essas acusações eram falsas.
Angèle era uma bruxa sim,
Mas não era satânica, aliás
Ela não acreditava em Satanás,
A religião dela não incluia demonios,
Ela cria nos poderes da natureza
E nada lei natural das coisas.
Angèle fez uma poção para uma
Mulher conseguir o amor
De homem, mas este homem
Era o regente de Toulouse,
E quando ele descobriu que
A sua noiva o havia enfeitiçado
Ele investigou até achar Angèle.
Ela havia sim parido uma filha,
Mas a menina ficou a salvo,
Quando os soldados prenderam
Angèle a menina tinha apenas dois
Anos de idade e foi
Escondida por amigas de Angèle
E criada por elas.
Amigas de Bruxas são Bruxas também,
Mas estas amigas Bruxas
Eram chamadas "Femme méprisable"
Ou seja, eram prostitutas.
A filha de Angèle se tornou uma
Prostituta também e a sua filha,
E a sua neta, a sua bisneta...
Por muitas e muitas gerações
As Bruxas da raiz de Angèle
Foram prostitutas de Toulouse.
Como os homens não assumiam
Os filhos que tinham com elas
As meninas só conheciam as mães.
O exemplo da morte terrível
Da antepassada fez com que a
Magia da família fossem mantida
Em segredo.
Por volta de 1800 a cidade de Toulouse
Passou a ter salões de espetáculos
Noturnos que eram chamados
De Cabarés.
Na França estava começando
Um período chamado " Belle Époque"
Que foi a época em que movimentos
Culturais foram avivados
E a noite se tornou cheia de lugares
Para se contemplar a arte,
Então inventaram os Cabarés (Cabaret)
Que traziam cortesãs artistas
No lugar das antigas prostitutas
De bordel.
Da familia de Angèle havia
Uma jovem moça chamada Sophie
Que já era Prostituta desde menina.
Sophie era também uma Bruxa
Como todas as mulheres da família.
A inquisição ja estava enfraquecida
Mas ainda assim a história da Bruxa
Angèle era muito famosa na cidade.
Sophie trabalhava em um bordel
Muito chinfrim, sem a menor classe,
Mas ela usava todo o dinheiro que
Ganhava para estudar etiqueta e artes
Para se preparar e abrir seu próprio
Cabaré.
Era o sonho dela ser uma cafetina.
Certa noite um cliente estava
Completamente embriagado e
Começou a maltratar as moças
Que trabalhavam no bordel.
Ele ofendeu varias, bateu em outras
E fez da noite um inferno.
Quando a Dona da casa tentou
Para-lo ele aesmurrou e ela caiu.
Sophie se revoltou, apanhou uma
Faca na cozinha e correu até o cliente.
O homem debochou dela
Pois dizia que uma mulher tão
Pequena não teria força para
Lutar com ele.
Mas a intenção de Sophie não era
Lutar, ela apontou a faca para o peito
Dele e disse palavras de bruxaria.
O coração do homem parou na hora,
Um ataque fulminante.
A dona do Cabaré se levantou
E murmurou:
- Sophie o que você fez!
Sophie sorriu e disse:
- Eu salvei a sua vida mademoiselle Marta...
A senhora com uma expressão de tristeza respondeu:
- Para me salvar você se condenou Sophie.
Ela apontou para as mesas do
Fundo salão e Sophie viu ali
Varios guardas da cidade que
Aproveitavam a noite,
Eles estavam com os olhos fixos nela
E um a um sairam aos poucos
De um modo muito suspeito.
Sophie entendeu que eles em
Breve voltariam para leva-la
Para a prisão, ela seria acusada
De Bruxaria.
A dona do Cabaré apanhou Sophie
Pelas mãos a correu com ela
Para os quartos do andar superior
E disse:
- Eles foram informar ao Padre, só o Padre pode expedir a ordem de prisão para Bruxas, você tem que fugir daqui agora!
Ela deu para Sophie uma grande soma
Em dinheiro, uma mala com alguns
Vestidos novos e um papel com um
Endereço de um falsário em
Port-Bou, que era na fronteira da
Espanha com a França.
Sophie agradeceu a Marta e
Fugiu na mesma noite,
Andou a pé pela floresta até
Chegar a um rancho onde
Comprou um cavalo,
Demorou cinco dias para
Atravessar a fronteira e chegar até
Port-Bou.
Ao chegar ela foi até o falsário
E disse que estava fugindo e
Precisava de um destino seguro.
Ele o aconselhou a ir para a nova
Colônia de Portugal, o Brasil.
O Brasil era um lugar imundo
De onde Portugal extraia riquezas
E exilava parias e pessoas das
Quais o rei não queria na Europa.
Para despistar os inquisidores ela
Comprou documentos falsos
Com nomes em Português,
Ela escolheu único nome de Portugal
Que conhecia, o nome foi
Maria Quitéria, tal como a Santa.
As Bruxas conheciam muito bem
A história dessa Santa, ela havia
Sido uma Bruxa também que
Ao ser decapitada pelo próprio pai
Se levantou, apanhou a cabeça
E mesmo morta ela andou até
A sua cidade natal onde foi enterrada
Por suas irmãs Bruxas.
Sophie passou a se chamar
Madame Maria Quitéria.
Comprou uma passagem de navio
Para o Brasil, após dias de viagem
Ela aportou no norte,
Mas como o norte do país era muito movimentado pelo comércio
Ela preferiu ir para o sul,
Para perto das minas de ouro.
Aqui ninguém jamais soube que
Seu nome era Sophie,
Ela inventou toda uma história falsa
De seu passado e afirmou
"Maria Quitéria" como um nome forte.
Os inquisidores nunca a acharam.
A moeda francesa valía muito mais
Que o ouro daqui e por isso com
O dinheiro que tinha
Ela pode comprar um
Casarão enorme e fundou
Nele o seu Cabaré.
Ela realizou seu sonho
De ser grandiosa,
O Cabaré foi um sucesso,
Cheio das mais belas moças
E das mais hábeis artistas
Que cantavam, atuavam,
Dançavam e faziam da noite
Espetáculos magníficos.
Para as muitas mulheres ela ensinou
Os segredos de sua bruxaria,
E principalmente ela ensinou como
Continuar em contato com os mortos.
Antes que as mulheres mortas
Fossem chamadas de Pombagiras
(Afinal esse nome é recente)
Quitéria ja sabía como chamar
Os espíritos de suas antepassadas
E de mulheres fortes do passado.
Ela ensinou como trazer os espíritos
Usando mechas do cabelo de um
Cadaver ou o osso do fêmur,
Fez as moças incorporarem com
Os espíritos antigos,
O porão do Cabaré era lugar da Feitiçaria.
Ela ensinou como ler a sorte
Nas cartas, na borra de café
E nas folhas de chá.
Até no formato das nuvens ela
Sabia ler os segredos do mundo.
Mas ela não somente ensinou,
Ela também aprendeu,
Com as Ciganas dessa terra
A ensinaram a usar as ervas raras,
As africanas ensinaram os
Segredos dos elementos,
Das Índias ela aprendeu
A arte de curar,
E de todo tipo de gente ela
Absorveu um pouco para se tornar
Uma feiticeira completa.
Quitéria mesmo quando ficou velha
Não aparentava a idade,
Ela usava dos seus feitiços
Para parecer jovem e assim
Seguiu até o fim.
Ela tinha um pente de chumbo
Para pentear o cabelo e assim nunca
Ficar grisalha,
Lavava a pele com água de chuva
Caida nos dias certos e assim
Ficava sempre bela,
E muitas coisas ela fazia
Para ser sempre perfeita.
Dentro do Cabaré de Maria Quitéria
Muitas moças famosas surgiram,
Todas essas Pombagiras que se dizem
Vindas de Cabaré fizeram escola
Com Maria Quitéria.
Muitos outros Cabarés foram abertos
Pelo país copiando o molde
Que ela trouxe de sua terra natal,
Muitas brasileiras fingiam
Sotaque francés para imitar
Maria Quitéria,
Ser como ela era ser chique,
Tudo de melhor ela tinha.
Ela sempre foi popular,
E muito invejada,
Mas nem tudo eram rosas,
Ela era envolvida com política,
Contrabando e aliada de gente
Corrupta das altas patentes,
Era uma verdadeira mafiosa
E por isso seu patrimônio era
Tão grande.
Por conta dessa vida conturbada
Ela nunca teve como se apaixonar,
Teve dezenas de amantes,
Homens importantes que
Alavancaram ainda mais os negócios,
Mas ela nunca amou homem nenhum
E isso era a única coisa que
Doía em seu coração.
Ela não teve filhos, não passou
O sangue a diante.
A falta de amor a torturava
E ela se tornou uma mulher
Um tanto séria e amarga
Por conta disso.
No dia em que eu conheci
Maria Quitéria em um terreiro
Aqui de São Paulo
Padilha me alertou
Para não se aproximar demais dela
Pois ela era muito esperta
E nisto se tornava perigosa.
Padilha me contou coisas sobre ela
Que me deixaram com os cabelos
Em pé.
Maria Padilha cresceu
Dentro do Cabaré de Quitéria
E sabía da maneira
Com que ela dirigia as coisas.
Maria Quitéria se faz de boba,
Se faz de sonsa, até pode fingir
Que é burra, mas isso são
Apenas máscaras que ela usa
Pois a sua astúcia é tão grande
Que ela ganha quem ela quiser
E leva qualquer um no papo
Fazendo suas atuações perfeitas.
Ela é poderosíssima,
Mas quem conhece Quitéria sabe
Que na verdade ela pouco sorri,
São raras as pessoas que ela gosta
E são muitas as pessoas que ela desgosta.
Ela não tem escrúpulos
Faz o que quiser, quando quiser
E ninguém pode impedir.
Saravá Dona Maria Quitéria!
A dona do Cabaré!
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