sexta-feira, 9 de setembro de 2022

Sete mantras do budismo tibetano

 

Sete mantras do budismo tibetano

antra” é uma palavra em sânscrito que significa algo como “instrumento do pensamento”. O sânscrito é uma língua indo-europeia, o que significa que tem as mesmas origens e partilha de diversas características de outras línguas com as quais nós temos alguma familiaridade, como o grego, o latim e seus descendentes – foram essas características, aliás, que levaram filólogos europeus, no começo do século XIX, a considerar o sânscrito uma língua a ser levada a sério, como o grego e o latim.[1] A palavra é derivada da raiz protoindo-europeia man-, que quer dizer “pensar” e que também dá no latim mens (daí “mente” em português) e no inglês mind, por via do protogermânico. O -tra é um sufixo que cria palavras para designar instrumentos e ferramentas, – por isso “instrumento do pensamento” é uma forma de entender mantra, apesar de não esgotar a discussão.

Em seu contexto original, mantra se refere, como consta no dicionário, a um texto ou oração sagrada, um hino védico ou fórmula sacrificial, um encantamento ou verso místico. Ironicamente, na linguagem popular do Ocidente, o termo já foi pervertido e qualquer coisa que se repita sem pensar é chamada de mantra, o que inclui lemas, slogans, palavras de ordem e frases de efeito. Num nível um pouco mais específico, mantras são fórmulas repetidas para propósitos mágico-espirituais – fala-se às vezes em “mantras sufis” como La Illaha Illallah; Damien Echols chama de mantras os nomes divinos em hebraico das fórmulas cabalísticas da Golden Dawn; e Frater U.D. ensina, em Practical Sigil Magic, a tomar declarações de intenção específicas e criar com elas, por meio de rearranjos das letras, sigilos sonoros para serem repetidos de forma mântrica. O uso da palavra “God” repetida em meditação no clássico medieval A Nuvem do Não Saber e as repetições de versículos da meditação cabalística também podem ser chamados de mantras. Mas, num nível mais específico ainda, mantras são fórmulas divinas com origem nas brumas da história do subcontinente indiano.

Antes de tudo, eu preciso avisar que, ao falar deste assunto, eu não estou exatamente no meu habitat natural – esoterismo ocidental e práticas místicas e mágicas do Oriente Próximo são assuntos que eu estudei bem… mas quando vamos um pouco mais para o oriente a partir da Mesopotâmia, aí eu já não me garanto. Para este texto eu consultei sobretudo as seguintes obras, que eu recomendo: MantrasPalavras Sagradas de Poder, de John Blofeld; O Tantra Iluminado, de Christopher Wallis; Profound Buddhism, de Kalu Rinpoche (traduzido do tibetano para o inglês); Tantra in Practice, de David Gordon White; e PRONAOS: Reflections on the Preliminary Practices of Buddhist Tantra, de Greg Kaminsky. Essa bibliografia, porém, apenas arranha a superfície e é possível que eu cometa algum deslize aqui, utilize algum termo inadequado ou uma generalização já não mais aceita academicamente. Por isso, peço desculpas desde já. Meu objetivo aqui é familiarizar os leitores d’O Zigurate com algumas práticas que podem ser úteis, e espero que esta intenção pese mais do que qualquer deslize técnico. No que diz respeito ao uso dessas fórmulas na prática, há mais alguns links citados, sempre de fontes que, até onde eu entendo, são fidedignas (nada de nomes New Age ou coisas do tipo).

É importante avisar também que, apesar de eu começar aqui falando historicamente dos mantras num contexto hindu, a minha ênfase é no seu uso dentro de um contexto esotérico budista. Mas vamos chegar lá daqui a pouco.

O mantra mais famoso e mais importante é também o mais simples, muitas vezes usado como o primeiro som de mantras mais complexos – a sílaba OM ou AUM. A Illustrated Encyclopedia of Hinduism (p. 482) descreve o OM nos seguintes termos:

Um som sagrado. Segundo a tradição, ele deve ser pronunciado antes e depois de se ler os Vedas (os mais antigos textos religiosos hindus), de se fazer qualquer prece ou realizar qualquer rito sagrado. Ao ser enunciado no começo de um rito, acredita-se que ele remova obstáculos e, enunciado ao seu término, é visto como uma afirmação de conclusão. Por conta de seu uso ritualístico universal, o som Om é visto como a essência de todo discurso sagrado. Já no Mandukya Upanishad, os elementos fonéticos do som (A, U e M) eram interpretados como correspondentes a diferentes estados da consciência, designando, em seu nível mais fundamental, o Si-mesmo (atman).

Na escrita devanágari usada para o sânscrito, sendo um tipo de silabário, o OM é representado por um único símbolo, que todo mundo já viu na vida (nem que seja em cartaz de rave). Ele é mais famoso nesse sistema, mas há outros usados ao longo da Ásia, como podemos ver abaixo:

A sílaba OM nos sistemas de escrita devanágari, tâmil, tibetano, balinês, bangla e jainista

Os registros mais antigos que temos do uso dos mantras vêm dos Vedas, um antigo e vasto corpus de material poético e técnico, por assim dizer (em termos de conhecimento litúrgico, práticas meditativas, etc.), disseminado por transmissão oral desde o II milênio a.C., mas registrado por escrito apenas muito posteriormente, por volta de 500 a.C. A descrição abrange quatro textos, o Rigveda, o Yajurveda, o Samaveda e o Atharvaveda. Esse material é considerado śruti, isto é, um conhecimento revelado, não uma criação humana.

A prática de mantras é comum em muito das tradições religiosas do subcontinente indiano que mais tarde foram agrupadas sob o termo guarda-chuva de “hinduísmo”, mas é especialmente importante no Tantra, um desenvolvimento místico posterior dentro desse contexto. A maioria das pessoas, ao ler o nome “Tantra” ou “tântrico”, entende com isso certas práticas sexuais ligadas ao prolongamento do orgasmo ou, pelo menos, magia sexual e coisas assim. Essa imagem, é claro, é uma caricatura grotesca – apesar de certas práticas de magia sexual terem chegado aqui, o Tantra é um conceito infinitamente mais amplo do que isso.

Como explica Wallis, Tantra é uma palavra em sânscrito que significa “teoria”, “doutrina” ou simplesmente “livro”, descrevendo os muitos livros escritos como revelação divina a partir do século VI d.C. na Índia, cada um deles contendo um sistema completo de práticas espirituais. Há centenas desses textos, suplementados por milhares de textos menores, incluindo comentários, que designam as linhagens seguidas pelos gurus tântricos – e a transmissão dos ensinamentos num contexto de um guru e seus estudantes é um elemento crucial dessas tradições. Num comentário do estudioso Rama-Katha (950–1000), os Tantras são essas obras que explicam o que é necessário e o que são impedimentos na prática de adoração do Divino e descrevem cerimônias especializadas de iniciação e purificação que são seus pré-requisitos, visando a concretizar tanto os objetivos mais e menos elevados, i.e. tanto moksha, a Iluminação ou liberação do sofrimento a que a consciência encarnada está sujeita, quanto os siddhis, o dom de manifestar resultados no mundo material, incluindo prosperidade e poderes mundanos.

Como se sabe, o budismo surge a princípio como um tipo de divergência em relação à antiga religião védica (inclusive no que diz respeito a práticas vistas como mágicas como o uso de mantras), mas há um ramo budista que incorporou extensivamente o Tantra, o chamado Vajrayana, mais conhecido como o budismo tântrico, esotérico ou tibetano – um nome meio inadequado, mas que é o que temos para hoje[2]. A distinção mais comum entre os chamados três veículos do budismo – e aqui estou me orientando pelo lama Kalu Rinpoche – utiliza os termos Hinayana, Mahayana e Vajrayana. Hinayana quer dizer “pequeno veículo” e é, na verdade, um nome pejorativo dado às formas mais antigas do budismo, cujo objetivo é tornar-se um arhat (um santo ou, literalmente, merecedor) retirando-se do mundo e vivendo uma vida de privações e ascetismo. Um outro termo, mais aceitável, para essa vertente do budismo, é Theravada (“doutrina dos anciões”), que é o nome com o qual essa tradição se estabeleceu no Sri Lanka, no período do rei Ashoka, séc. III a.C.

O budismo Mahayana, “grande veículo”, veio depois, no séc. I a.C., já meio que polemizando as práticas anteriores (daí vem o título pejorativo de Hinayana). O conceito é que o ideal do arhat não seria um objetivo final bom o suficiente, sendo necessário mesmo se tornar um bodhisattva, aquele cujo caminho espiritual busca beneficiar e liberar todos os seres sencientes do sofrimento do ciclo de morte e renascimento. O último veículo, o Vajrayana, mais recente, surge só no século VIII d.C. no Tibete. Mas, primeiro, um comentário sobre o nome vajra.

A palavra, do sânscrito, designa originalmente a arma do deus Indra e o material indestrutível do qual ela é feita, às vezes traduzido como “diamante”. Sendo um deus atmosférico, sua arma é o trovão, e a iconografia clássica a representa de uma forma curiosamente semelhante ao que se observa um pouco mais para cá geograficamente, nas representações do raio de Marduk e Zeus. O vajra budista, porém, tem as pontas curvadas para dentro, como um sinal de compaixão, e é um dos principais símbolos dessa escola. Assim, é possível interpretar o nome como “o veículo do relâmpago”, o “veículo indestrutível” ou “o veículo de diamante”.

O “veículo de diamante”[3], então (você vê que o carro vai ficando mais elaborado), combina os ensinamentos do Mahayana com as práticas tântricas que vinham se desenvolvendo na Índia nesse mesmo período (e é possível que tenha também uma influência das práticas nativas do povo Bön do Tibete, mas isso é controverso). O grande herói, guru e mago do Vajrayana é o Guru Rinpoche, Padmasambhava (“o nascido da lótus”), que, segundo os relatos, teria dominado e apaziguado todos os deuses, espíritos e demônios locais, disseminando o budismo na região[4]. Ele também deixou ensinamentos secretos para serem descobertos, via revelação mística, por mestres posteriores, chamados terma ou gter ma. Há quatro linhagens no Vajrayana: Nyingma (a mais antiga), Kagyu (associada a outro nome lendário, o do poeta Milarepa), Sakya (fundada pelo sábio e tradutor Drogmi) e Gelug (a mais recente e famosa, à qual pertence o Dalai Lama). O canal do YouTube especializado em conteúdo budista Doug’s Dharma tem um bom resumo da história do desenvolvimento dessa tradição neste vídeo.

Eu pessoalmente tenho grande interesse pelo budismo Vajrayana, pela sua combinação de técnicas avançadas e austeras para desenvolvimento espiritual (que permitem, dizem, chegar à iluminação em uma única vida) com técnicas mágicas poderosas. Para quem tem uma ideia ocidentalizada de um budismo asséptico (uma imagem criada no final do séc. XIX justamente para apelar ao racionalismo ocidental[5] no auge de sua crise religiosa), as práticas tibetanas, as quais incluem invocações de divindades (muitas delas terríveis e furiosas), exorcismos e conjurações de espíritos, além do uso de objetos rituais como flautas e dados feitas de ossos, podem ser meio chocantes, mas é o tipo de coisa que tem um apelo enorme para mim[6].

Como um fenômeno comum ao Tantra de modo geral, as tradições Vajrayana são todas iniciáticas. São “práticas fechadas”, como se diz hoje, pela segurança das linhagens e dos próprios praticantes e não necessariamente por conta de alguma noção de purismo – com a fuga de muitos mestres tibetanos desde a década de 1950, por conta da dominação chinesa, já descrita em termos de um genocídio cultural, esses ensinamentos vêm, cada vez mais chegando ao Ocidente. As práticas plenas só podem ser realizadas direito após a iniciação.

Dito isto, porém, os mantras que eu selecionei e que seguem abaixo são aceitáveis para não-iniciados e podem ser utilizados tranquilamente. Quase todos se encontram no livro de Blofeld que eu citei acima, um voluminho pequeno, que você acha fácil em sebos e trata da experiência do autor, um inglês do começo do século XX que teve uma profunda experiência em suas viagens pela China e outros países asiáticos, onde entrou em contato com lamas, mestres zen e sábios daoístas. Ele recebe uma iniciação na linhagem Nyingma e comenta, na abertura do livro, sua cautela e receio em revelar esse tipo de material ao Ocidente, embora contasse com as bênçãos de seu mestre, Dodrup Chen.

Óbvio que eu não vou compartilhar aqui nenhum tipo de conhecimento secreto, ilícito ou perigoso nesse sentido. Primeiro que eu não sou burro – quem fez meus cursos sabe que eu prezo a segurança dos meus alunos –, nem louco – conhecimentos secretos são defendidos pelos protetores de cada linhagem e divulgá-los resultaria, no mínimo, em um ataque espiritual violento contra a minha pessoa. Depois, não é como se esse material mais fechado e perigoso pudesse ser encontrado fácil assim. Podem ficar tranquilos quanto a isso.

Só que, para os mantras serem eficazes é preciso, além de foco e concentração (nada de entoar os mantras pensando no que vai ter para almoço), também cultivar o estado de espírito adequado. Esse estado de espírito é descrito pela palavra bodhicitta, a “mente da iluminação” e resumido no lema: “Eu realizarei estas práticas espirituais e atividades virtuosas para obter a Iluminação completa em benefício de todos os seres sencientes”. Você não precisa ser budista oficialmente ou “acreditar no Buda” (crença sequer é um conceito que aparece nas doutrinas budistas), mas, sem essa mentalidade, nada aqui vai funcionar.

Por fim, só um breve comentário sobre a questão da pronúncia: os primeiros mantras, como dito, surgem no material védico, composto em sânscrito, que é uma língua indo-europeia. O tibetano é de outro tronco linguístico, chamado sino-tibetano, de onde também derivam as várias línguas chinesas. Para comparação, é mais ou menos a distância entre as línguas semíticas do Oriente Próximo, como árabe e hebraico, e o grego e latim. Por isso, muita coisa fica confusa nesse processo. Uma palavra como vajra, por exemplo, do sânscrito, é pronunciada como benza em tibetano. Eu imagino que isso possa ser motivo de conflito entre as perspectivas védicas mais clássicas e a perspectiva budista (como se já não tivesse conflitos teológicos sérios aí, né), pois no material antigo há uma ênfase na pronúncia mais consagrada e, como se pode ver, quando passamos para esse outro contexto a pronúncia é tudo menos estável. Há uma discussão interessante que pode surgir a partir daí, mas vai ter que ficar para outra hora.

Arte tibetana do século XVII, representando o mantra de Kalachakra, Tibet Museum, em Lhasa (fonte). Eu não vou falar deste mantra neste texto, porque é complexo e avançado (vide este artigo aqui), mas a imagem é bonita, né?

Com isso em mente, vamos ao que interessa, então!

Para facilitar a vida de todo mundo, eu estou fornecendo, junto com cada mantra, um link do YouTube com a sua recitação. Essas gravações são úteis não apenas para aprender o mantra, mas podem ser ouvidas também para acalmar o seu estado de espírito, especialmente se ele tiver sendo perturbado por algum dos cinco venenos (e se você estiver num ambiente onde não possa entoá-los, por exemplo) e até mesmo usados em fones de ouvido para purificar e abençoar o ambiente.

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OM AH HUM – (às vezes também grafado OM AH HUNG) um dos mantras mais básicos do Vajrayana, não no sentido negativo ou pejorativo de “básico”, mas porque serve de base, inclusive, para outros mantras mais complexos como o do Guru ou de Kalachakra, que o utilizam como um tipo de prefixo. Segundo Blofeld, é um dos mantras usados para purificação pessoal. Diz o autor:

OM, a sílaba inicial de quase todos os mantras, encarna (como sempre) um tremendo poder criador e representa o Infinito, a Mente Única, a consciência que tudo abrange e a própria essência da existência. AH mantém e preserva tudo que OM cria. HUM imbui o que foi criado com energia vital, além de submeter a paixão e destruir o pensamento dualístico.

Ele também comenta a distribuição das sílabas nos chakras das divindades visualizadas (veremos isso logo abaixo), que purifica a respiração, a vitalidade e os canais psíquicos do adepto de modo que “o OM representa o Dharmakaya ou Corpo Místico (Vazio) de alguém Totalmente Iluminado; AH representa a Fala Sagrada; HUM representa a mente do Buda” (grifos meus). É um mantra que alude, portanto, à pureza, santidade e iluminação no nível do corpo (OM), da fala (AH) e da mente (HUM). Você pode recitá-lo 108 vezes (o número favorito da maioria das práticas, sendo equivalente a uma contagem inteira de um mala) antes de qualquer coisa que você for fazer. Se 108 for muito, por questões de tempo, é possível fazer menos vezes (54 ou 27, divisões de 108), mas é aquela coisa, né… não é o ideal, e quanto mais você fizer, mais profunda será a limpeza.

Alguns professores falam das possibilidades de complementar a recitação com visualizações. Olhe a imagem abaixo:

Cada esfera ali contém uma das sílabas deste mantra, na belíssima escrita tibetana. Após familiarizar-se com elas, você irá meditar visualizando-as com essas cores em seu corpo, na seguinte ordem: o OM na sua testa, em branco brilhante, emanando chamas brancas, o AH na garganta, com chamas vermelhas, e o HUM no peito, com chamas azuis. Segundo as instruções do mestre Rimay Gyalten Sogdzin Rinpoche (link aqui), você começa com essa visualização, então prossegue com a repetição de 3 malas deste mantra, totalizando 324 repetições. Ao fazer o primeiro mala, você se concentra no OM na sua testa e suas chamas brancas, visualizando-o queimar toda “enfermidade, karma negativo e obscuridades físicas provenientes do corpo“. Com o segundo mala, você se concentra no AH na garganta, conforme suas chamas vermelhas queimam todas essas coisas ruins também provenientes da fala. Por fim, no terceiro mala, concentrado no HUM no peito, chamas azuis queimam tudo isso também proveniente da mente. Na sequência você pode fazer sua meditação normal, pranayama mesmo. Quando terminar, volte à visualização e veja cada sílaba se dissolver na sílaba seguinte: o OM na testa se dissolve no AH na garganta, que se dissolve no HUM no peito, que desaparece no vazio do espaço infinito. O mestre comenta ainda que, se não for possível dar conta de três malas, você pode fazer a visualização em silêncio durante 5, 20 ou 30 minutos, de acordo com o que for conveniente para você.

Um outro autor que atende por Yogi Steven, com bem menos autoridade, mas que pode nos revelar algumas coisas úteis ainda assim, ensina em seu site que esse mantra pode ser usado também para limpar chakras e purificar um tipo específico de energia do pensamento. “Aplique este mantra a qualquer parte de si que você desejar purificar, transformar ou libertar”, diz ele. Por esse motivo, temos aí um mantra multiuso poderoso. Blofeld também comenta que é possível usá-lo ainda como uma saudação às deidades – de modo que, por exemplo, o bodhisattva Samantabhadra seria saudado com OM SAMANTABHADRA AH HUM.

E uma outra aplicação ainda: o Lama Zopa Rinpoche ensina, neste outro texto, uma dica de prática para usá-lo a fim de abençoar e purificar alimentos (em contexto, um aluno pede essa dica porque sua família tem uma fábrica no ramo alimentício). A recitação do mantra combinada com sua visualização tem um intenso efeito purificador. Mesmo que seja o único mantra que você aprenda, já dá para fazer muita coisa com ele, como se pode ver.

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RAM YAM KHAM – (também grafado RAM YAM HAM) um mantra para purificação e proteção do espaço contra influências malignas, segundo Blofeld. Ele oferece dois mantras para isso, na verdade, este sendo o mais forte, e OM VAJRA BHUMI AH HUM sendo mais fraco/suave. A explicação aqui é que cada uma dessas sílabas equivale a um elemento: RAM é o fogo; YAM é o ar; e KHAM é a água, com a ideia de que o fogo queima as impurezas do nosso espaço, o ar as sopra para longe e a água as lava. Jason Miller, que recebeu treinamento Vajrayana durante muito tempo, explica em The Sorcerer’s Secrets, como os tibetanos utilizam uma técnica de escudo energético que cria barreiras com os elementos, e eu entendo que a lógica aqui seja parecida. Blofeld tem o seguinte a dizer, nesse sentido:

A visualização que a acompanha é grandiosa e terrível. O adepto se julga sentado no centro de uma área cercada por chamas devastadoras como o fogo pelo qual o universo será destruído ao final de um kalpa [éon]: rodeando as chamas, há uma negra tempestade como um turbilhão ao fim de uma era; além, fica um oceano coberto de imensas ondas violentamente agitadas.

Para estabelecer uma comparação, talvez meio tosca, esse mantra pode servir como um tipo de equivalente às práticas de banimento da magia moderna (embora provavelmente muito mais poderoso, dada a continuidade das linhagens Vajrayana, em comparação com essa tradição fraturada que é a ocidental). Por isso, se você procura uma prática não material (i.e. que não envolva defumação ou banhos de chão) para limpeza de ambientes, mas não se sente à vontade com rituais de banimento por qualquer motivo (e sentir-se ridículo é um motivo bastante compreensível), este mantra é uma excelente alternativa.

RAM YAM KHAM costuma ser usado em combinação com OM AH HUM em cerimônias budistas. Neste arquivo aqui, do Buddhist Studies Institute, parte de um curso intitulado Presence as the Path – Part One: Foundational practices of the Buddhist Yogis Sangha as taught by Pema Khandro, nós podemos observar isso em ação no roteiro para o festival de Tsok. A sequência RAM YAM KHAM OM AH HUM é usada para purificar, abençoar e multiplicar as oferendas antes de elas serem dedicadas.

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OM VAJRASATTVA HUM – a versão abreviada do mantra de Vajrasattva. Este é um dos casos em que pronúncia em tibetano é um pouco diferente do que você pode imaginar se for se orientar pela escrita, pois eles dizem OM BENZA SATO HUM. Vajrasattva (literalmente “ser de diamante”) é uma das divindades dos budismos Mahayana e Vajrayana, além de um bodhisattva cuja especialidade é a purificação. Isso, claro, é verdade em termos relativos, porque, como explica este artigo, assim como todas as divindades budistas, Vajrasattva desafia as noções do ego. Em termos práticos, ele é uma divindade de uma brancura purificadora, visualizado sobre uma flor de lótus, com frequência em união sexual com sua esposa Vajragarvi. Ambos estão sentados em posição de lótus – ele com um vajra e um sino nas mãos, ela com uma adaga e uma taça feita de um crânio humano (relationship goals aí).

O trabalho com Vajrasattva é um aspecto crucial das práticas preliminares do Vajrayana. Como detalha Greg Kaminsky em seu livro, as quatro etapas desse processo incluem: 1) refúgio (via prostrações e preces sobre refugiar-se no dharma); 2) purificação (usando este mantra); 3) oferendas de mandalas; e 4) guru yoga (um retiro em que a mente do guru vai se unir à do discípulo).

Qual a diferença entre a purificação oferecida pelo mantra de Vajrasattva e os mantras anteriores? Bem, isso eu confesso que não sei dizer ao certo, mas eu entendo que a ênfase aqui é a purificação do karma. Como explica Kaminsky:

Se desejamos nos tornar semelhantes ao Divino, devemos nos libertar de toda poluição. Mas o que constitui poluição nesse contexto? Aqui estamos nos referindo aos pensamentos e ações que estimulam nossa tendência ao apego. Também inclui ações de encarnações passadas, de modo que é possível presumir que, nós somos, em algum nível, responsáveis por uma miríade de ações prejudiciais derivadas dessa visão iludida, das quais devemos nos purificar. (…) As memórias dos erros do passado podem nos sabotar, e nossos hábitos são gravados como os padrões nos quais recaímos, com a menor desatenção.

Essa é uma ótima explicação para a necessidade da limpeza e purificação energéticas (e, não por acaso, é a base da filosofia de escolas como a Cura Prânica também). Como dito, a versão acima é a versão curta do mantra. A versão longa, completa, tem 100 sílabas, e é a seguinte:

OM BENZA SATTO SAMAYA MANU PALAYA
BENZA SATTO TENOPA TISHTA
DRIDHO ME BHAWA
SUTO KHAYO ME BHAWA
SUPO KAHYO ME BHAWA
ANU RAKTO ME BHAWA
SARWA SIDDHI ME PRAYATSA
SARVA KARMA SUTSA ME
CHITAM SHRIYAM KURU HUM
HA HA HA HA HO
BHAGAWAN
SARVA TATHAGATA BENZA MAME MUNTSA
BENZA BHAWA MAHA SAMAYA SATO AH

(esta já é a versão na pronúncia tibetana. Pode haver divergências na transcrição deste mantra para o alfabeto latino, mas não faz mal)

Acima, Vajrasattva e Vajragarvi, em união; abaixo, o polêmico Dorje Shugden, um protetor da linhagem Gelug

Uma das formas de fazer a prática de Vajrasattva, descrita por Kaminsky, envolve visualizar a divindade acima de você, irradiando luz branca e emanando um néctar purificador. Este néctar se acumula na base da sua espinha e então começa a subir. Nisso, toda a sujeira do seu corpo energético vai sendo empurrada para fora (visualizada como um lodo escuro), caindo vários andares abaixo de onde você está, onde é consumida por um touro vermelho (nem todos os autores que ensinam essa visualização vão incluir todos os detalhes como o touro, mas eu incluí aqui porque achei divertido). Conforme seu corpo energético vai sendo purificado, você visualiza uma luz branca nos centros de energia (chakras) do seu plexo solar, coração, garganta, ajna e coroa. Em práticas mais avançadas, você se visualiza como a divindade, mas isso é limitado aos iniciados.

É comum trabalhar em sessões de 21 repetições, então você pode começar por aí, mas é aquilo, né, quanto mais melhor. Se estiver fazendo as práticas preliminares para a iniciação, você vai precisar acumular um total de 111.111 repetições deste mantra, o que dá fácil uns 3 malas por dia durante um ano.

Mas, mesmo depois de acumular essas 111.111 repetições, esse mantra continua útil. Como explica o Lama Thubten Yeshe, o mantra de Vajrasattva idealmente deve ser utilizado ainda como prática diária, feito antes de dormir, para purificar o karma negativo contraído durante o dia, a fim de evitar que ele se multiplique, fazendo ou 21 repetições da forma longa ou 28 da forma curta.

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OM TARE TUTTARE TURE SOHA – o mantra de Syamatara, ou a Tara verde. Como tudo no budismo tibetano, o conceito das divindades é extremamente complexo e envolve sincretismos culturais entre a Índia e o Tibete, além de noções de emanações de divindades superiores e deuses que podem ou não ser bodhisattvas também. Eu não vou fingir que eu entendo como funciona. Para vocês terem uma ideia, tem 21 formas de Tara, além de suas aparições em cinco cores.

Segundo o Lama Zangmo (neste texto aqui, que é bastante profundo e iluminador), apesar dessa complexidade, os princípios básicos de Tara são: ser destemida e corajosa. A ação rápida e a ausência do medo, diz ele, são uma qualidade da mente iluminada. Nesse sentido, uma das funções do trabalho com Tara é a purificação do sentimento do medo… ou, melhor dizendo, dos oito medos: apego, raiva, ignorância, ciúme, orgulho, avareza, visão equivocada e dúvida. Além dos benefícios espirituais, como acelerar a iluminação e evitar uma reencarnação horrível na próxima vida, a prática de Tara verde e seu mantra tem benefícios mundanos como proteção e a libertação dos medos.

Como explica o Lama Palden Droma (neste artigo), uma das formas de se trabalhar com Tara é invocá-la, em meditação, usando sua sílaba TAM, visualizando-a numa cor verde-azul turquesa acima de você. De sua mão, flui um rio de um elixir dessa cor, que banha você enquanto recita o seu mantra (de novo, 108 repetições é um bom número). Há preces a serem feitas, de refúgio no dharma e dedicação de mérito, antes e depois, mas a base da prática é essa.


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OM AH HUM VAJRA GURU PADME SIDDHI HUM – o mantra do Guru Padmasambhava, pronunciado em tibetano como OM AH HUM BENZA GURU PEMA SIDDHI HUM. Eu não posso sequer exprimir o grau de importância de Padmasambhava para o budismo tibetano. O objetivo dessa fórmula, em termos simples, é possibilitar a “penetração da consciência da qualidade indestrutível do guru”, a fim de “abrir o coração” do praticante, “abrir a fechada, conceitualizada, e confusa fronteira do ego e conceder o poder milagroso da compaixão, a comunicação suprema”, nas palavras de Chögyam Trungpa Rinpoche.

Ao passo que os mantras vistos acima oferecem vários tipos de limpeza e purificação, este aqui representa um tipo de bênção em todos os níveis. Num dos terma, os textos revelados como tesouros que Padmasambhava legou para futuros adeptos, lê-se o seguinte:

Porém, em tempos como estes, este mantra essencial do Vajra Guru (…) concederá inconcebíveis benefícios e poderes. Países em toda parte serão protegidos de toda peste, fome, guerra, violência armada, colheitas ruins, maus presságios e feitiços malignos. A chuva cairá na época certa, colheitas e gado serão excelentes, e a terra prosperará. (…) Mesmo cem recitações por dia, sem interrupção, bastam para tornar-te atraente aos outros, e fazer com que alimentos, riqueza e prazeres surjam sem esforço. Se recitares o mantra mil, dez mil ou mais vezes por dia, atrairás os outros sob tua influência com teu brilho, e bênçãos e poderes serão continuamente obtidos, sem obstrução. (…) Se fizeres 30.000.000, 70.000.000 ou mais recitações, tu jamais virá a separar-te dos Budas das três eras, nem de mim; assim as oito classes de deuses e espíritos obedecerão às tuas ordens, louvarão tuas palavras e realizarão qualquer tarefa com as quais tu possas encarregá-los.

(tesouro revelado a Tulku Karma Lingpa)

Parece bom, né? Blofeld recomenda praticar esse mantra de manhã, após as práticas preliminares, visualizando um plácido lago azul, onde paira um imenso lótus, dentro do qual se encontra Padmasambhava. Para quem quiser estabelecer um trabalho ainda mais intenso com o grande Guru, existe também uma poderosa prece de sete versos que pode ser incluída como parte das reverências.

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OM MANI PADME HUM – o mantra de Kuan Yin, uma divindade extremamente popular em toda a Ásia oriental, da China e do Tibete até o Japão, Coreia, Singapura, Tailândia, etc. Em alguns lugares, sua representação mais comum é feminina; em outros, masculina. No entendimento budista, Kuan Yin é um dos avatares de Avalokiteśvara, o bodhisattva que representa a compaixão de todos os Budas. Ele é também chamado, em tibetano, de Chenrezig. Sim, é meio complexo e, de novo, eu não vou nem fingir que eu sei como funciona. A quem quiser entender, eu recomendo um outro livro de John Blofeld, Bodhisattva of Compassion, onde isso é explicado a fundo.

Este é um dos mantras mais populares do budismo tibetano, e o ato de cantá-lo ou escrevê-lo serve para atrair as bênçãos de Chenrezig/Kuan Yin. É comum encontrá-lo gravado em pedras no Tibete, na Índia e no Nepal. Mani quer dizer “joia” e Padme (ou Pema na pronúncia tibetana) é “lótus”, por isso ele é conhecido como o “mantra da joia de lótus”, numa imagem que alude à consciência humana: a joia é a mente em repouso sobre a lótus do coração. Suas seis sílabas, dizem, abrangem todo o dharma.

Há muitos benefícios no uso deste mantra, como vocês podem imaginar. Um de seus poderes é a neutralização ou transmutação do karma negativo e o de levar quem o canta a avançar no caminho da Iluminação, trazendo a cessação do sofrimento a todos os seres – o grande objetivo nutrido pela compaixão do bodhisattva. Diz o Lama Zopa Rinpoche, que se uma pessoa recitar 10 malas deste mantra em um dia e então sair para nadar, a água que ela toca vai se tornar abençoada e purificadora, abençoando todos os seres que entrarem em contato com ela, para que não renasçam nos mundos inferiores na próxima encarnação.

Mas há benefícios num nível um pouco mais mundano e menos transcendental também, que incluem a criação de um ambiente harmônico com as outras pessoas, a atração da prosperidade, a proteção da sua prosperidade e a proteção do seu ser de modo geral. O mestre Drukpa Choegon IX também o inclui como finalização de um mantra para bênção de alimentos. Neste link aqui, ele trata da bênção para carnes, o que pode ser meio polêmico, porque o ideal é que você assuma um estilo de vida vegetariano… mas, se for o caso de estar comendo carne, você pode diminuir os malefícios com a combinação de um mantra específico para isso e sete repetições de OM MANI PADME HUM. Como conclui o mestre, mesmo que você esteja se alimentando de comida vegana, ainda assim você não está 100% livre de gerar karma negativo no processo – um problema que pode ser amenizado com essas sete repetições deste mantra antes das refeições.

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TAYATA OM BEKADZE BEKADZE MAHA BEKADZE BEKADZE RADZA SAMUNGATE SOHA – o mantra de Bhaisajyaguru, o Buda da Medicina. Trata-se de um bodhisattva também extremamente popular pela Ásia, sendo invocado para rituais de cura e recuperação. Sua iconografia costuma representá-lo sereno e compassivo, com uma pele da cor de lápis-lazúli, sentado numa flor de lótus, e uma fruta em uma mão. Na outra, há uma vasilha, também de lápis-lazúli, contendo o néctar que cura todos os males, não só do corpo, mas também da mente, incluindo karma negativo e outros sofrimentos.

Para receber as bênçãos desse Buda, você pode invocá-lo, visualizando-o acima de sua cabeça e emanando sua luz. Então você repete 108 vezes seu mantra. A mesma cena que acontece com a prática de Vajrasattva, visualizando a sujeira e a doença sendo expulsas na forma de um lodo escuro (ou fumaça) conforme a luz se acumula, se repete aqui. É possível também complementar a visualização com as sílabas OM AH HUM nos respectivos centros energéticos do corpo do Buda enquanto ele te abençoa, do mesmo como se faz na meditação com esse mantra. Se a prática for feita para abençoar outra pessoa, então você visualiza o doente com você, recebendo a luz. Também é comum a prática de se abençoar um copo d’água com 108 repetições desse mantra e então oferecê-lo para a pessoa tomar[7]. Diz o editor do Buddha Weekly (no último link, de onde eu tirei algumas das informações neste parágrafo), que os curadores de práticas herbais do Tibete recitam o mantra enquanto preparam seus remédios, para potencializar seus efeitos, por isso eu imagino que algo parecido possa ser feito, abençoando-se chás ou outras preparações ou comprimidos mesmo, antes de o doente tomá-los. Se você quiser trabalhar com esse Buda repetidamente, pode ser uma boa ideia ter também uma imagem dele, a fim de fortalecer essa relação com a entidade.

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E isso conclui nossa breve introdução a alguns dos mantras mais clássicos usados pelo budismo Vajrayana. Como dito, estamos apenas arranhando a superfície, mas já há muitos benefícios aqui – e a ideia é oferecer os mantras mais utilizados para limpeza, purificação, proteção, poder, cura, harmonia, etc., tudo que um iniciante precisa. Se essas técnicas espirituais e os ensinamentos que as sustentam lhe parecem interessantes, então temos aqui mais do que o suficiente para começar a desenvolver uma rotina robusta. Caso você ainda não tenha uma rotina (ou se enjoou da que já tem), no mínimo vale a experimentação.

De novo, para quem se interessa, os livros citados anteriormente (e todos os links, que não são poucos) podem ser uma boa introdução ao assunto. E, para quem se interessa de verdade, vale acompanhar o trabalho, pelo menos, dos dois maiores templos Vajrayana que temos aqui no Brasil. O primeiro é o Khadro Ling (link para o Instagram), o primeiro templo Vajrayana do Brasil, fundado em Três Coroas, Rio Grande do Sul, por Sua Eminência Chagdud Tulku Rinpoche, de linhagem Nyingma, que veio para o país em 1994 e estabeleceu toda uma rede de centros de prática, chamado Chagdud Gonpa Brasil. O segundo, inaugurado em 2008, é o Odsal Ling (Instagram), entre Cotia e Embu das Artes, em São Paulo, e também ligado a essa rede. A rede toda conduz práticas, eventos e retiros… só que, vale lembrar, no momento, por conta da pandemia, os espaços ainda estão fechados para visitação. Mas há eventos online que podemos acompanhar nas redes sociais enquanto isso.

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[1] Havia essa noção de idiomas “superiores” e “inferiores”, e claramente o grego e o latim constavam na primeira categoria para os europeus desse período. O sânscrito, por ter várias características gramaticais em comum com esses dois idiomas, passou a ser valorizado igualmente. Sim, e a ideia de uma “superioridade ariana” começa a surgir por aí também.

[2] É complicada essa questão de terminologia. Nem todo budismo no tibete é Vajrayana (o Mahayana é comum por lá também) e nem todo Vajrayana é tibetano – essa forma de budismo é comum também no Nepal, no Butão e em algumas partes da Índia, apesar de lá não haver uma tradição tão contínua por conta das invasões islâmicas do século XII que quase dizimaram o budismo na região. Existem ainda tradições tântricas/esotéricas na China (Zhēnyán) e no Japão (Shingon), mas eu já não sei se dizer se conta como Vajrayna ou se é uma outra coisa. Enfim, aí para facilitar, usei o nome “budismo tibetano” no título, pois é o mais reconhecível para o público em geral.

[3] A lógica dos veículos (yana) é o seguinte: a busca do budista é para escapar do sofrimento… e você escapa do sofrimento em um veículo, como se fosse um carro ou bote salva-vidas. O Hinayana seria, pelas explicações que eu li, um pequeno veículo, pois cabe apenas uma pessoa (sua preocupação é com a salvação individual), ao passo que o Mahayana é um grande veículo por tentar trazer mais pessoas à libertação. O Vajrayana é o carro que passou pelo pimp my ride, claramente.

[4] Uma das influências mais surpreendentes sobre essas formas modernas do budismo incluem o idealismo alemão e a poesia romântica, por exemplo. Sobre o assunto, recomendo o estudo The Making of Buddhist Modernism, de David L. McMahan.

[5] Para quem quiser estudar mais a fundo os ensinamentos do mestre Padmasambhava, tem um volume denso e profundamente iluminador chamado Ensinamentos do Mestre que Nasceu do Lótus. Apesar de não ser uma tradição estritamente budista, a Cura Prânica tem uma relação com essa figura, pois entende-se que Mahaguruji Mei Ling, o guia espiritual que orientou seu fundador, Mestre Choa Kok Sui, é uma das formas de Padmasambhava.

[6] Sinto que eu preciso me justificar aqui para não parecer que eu estou fetichizando ou exotizando a tradição Vajrayana. Na verdade, o que me atrai mais são não tanto as diferenças quanto as semelhanças. Como um praticante de magia cerimonial, esse aspecto ritualístico, o uso de fórmulas verbais de poder espiritual, a conjuração de espíritos e invocação de divindades são aspectos com os quais eu já estou bem familiarizado, e assim acaba sendo muito mais fácil de casar com o que eu já faço, pessoalmente, do que a filosofia mais minimalista do Zen-Budismo, por exemplo.

[7] Óbvio que tem que tomar cuidado para, nesse processo, não contaminar ainda mais o doente cuspindo no copo d’água. Os cuidados de saúde no plano físico devem estar alinhados aos cuidados de saúde no nível energético.