Quem tem medo de magia angelical?
Eu confesso que eu tinha, pelo menos até um tempo atrás. E eu sei que parece bobagem, considerando que magia com anjos sempre foi uma parte integral da tradição mágica ocidental. Mais do que isso ainda, nós somos brasileiros e todo mundo já deve ter visto ou folheado os livros de anjos cabalísticos da Mônica Buonfiglio, dos anos 90. No entanto, eu tenho visto uma grande queda de popularidade nesse tipo de prática em certos meios esotéricos atuais, especialmente entre os mais jovens, que têm maiores tendências ao paganismo, a ponto de as pessoas de fato terem muito medo mesmo de trabalhar com anjos — eu já vi gente do chamado “WitchTT”, por exemplo, a ala de jovens bruxos e bruxas do Twitter, inclusive dando chilique porque alguém estava ensinando o Ritual do Pentagrama para “baby witches”, porque “magia angelical é perigosa” ou “muito avançada”. É pra rir, né? Literalmente o ritual mais básico, para neófitos, do currículo da Golden Dawn!
Mas, bem, para ser justo, se anjos não dessem um pouquinho de medo, NÃO TEMAIS não seria a primeira coisa que eles dizem na Bíblia toda vez que encontram uma pessoa. E isso acontece bastante.
Um aviso desde já, antes de prosseguirmos: este texto é sobre a magia angelical mais tradicional e não dentro do sistema enoquiano1. Esse sistema é uma outra coisa completamente diferente e eu tenho muitas dúvidas, inclusive, a respeito do caráter angelical dos seus espíritos.
Os anjos de Sodoma, do pintor simbolista Gustave Moreau
Como se sabe, o nome “anjo” vem do latim angelus, por meio daquele mesmo processo de transformação linguística que gerou “frio” de “frígido” (frigidus) ou “rijo” de “rígido” (rigidus). O latim, por sua vez, emprestou angelus do grego ángelos (ἄγγελος), que ninguém tem muita certeza da onde veio. A palavra quer dizer “mensageiro” e era utilizada com esse sentido nos textos mais clássicos, como as tragédias e tudo o mais. A etimologia de “evangelho”, aliás, também vem de ángelos, euangélion (εὐαγγέλιον) significando boa (eu) notícia. O ponto em que o termo entra no grego com o sentido religioso é provavelmente a partir do nascimento da Septuaginta, a tradução da Torá para o grego koiné feita no período helenístico, onde ángelos é usado para traduzir o hebraico mala’akh (מלאך), que tem o mesmo sentido, derivada da raíz semítica L-’-K (lamed, álef, caf), “mediar mensagens”, atestada em ugarítico, uma outra língua do Levante, falada na finada cidade-estado de Ugarit, na Síria. Um mala’akh é um mensageiro também, e as entidades que nós entendemos como anjos são, na verdade, mala’akh YHWH ou mala’akh Elohim, mensageiros de Deus. Às vezes eles também são chamados por outras apelações, como bnei Elohim (“filhos de Deus”) ou kedoshim (“os santificados”), como se vê na Jewish Encyclopedia.
Há vários episódios interessantes em que Deus envia um anjo para interagir com humanos no Antigo Testamento. Alguns mais famosos são: o querubim que fica de guarda nos portões do Éden, com uma espada flamejante, após a expulsão do paraíso (Gênesis 3:24); quando Abraão vai sacrificar seu filho Isaac e um anjo aparece para anunciar que era pegadinha (Gên. 22:11); quando um anjo surge diante de Balaão, com espada na mão, mas apenas a jumenta, na qual ele está montado, o vê e o anjo a faz falar (Núm. 22:22–38); quando um anjo aparece diante de Manoá e anuncia que ele terá um filho, Sansão, e que ele deverá ser dedicado desde pequeno a Deus (Juízes 13:3–22); quando Ezequiel tem a sua visão das “rodas dentro de rodas” e seres com cabeça humana, de touro, águia e leão (Ezequiel 1, o capítulo todo); quando um anjo, com um corpo que parecia ser de cristal, rosto como um relâmpago e olhos de fogo, explica para o profeta Daniel o sentido das visões que ele teve (Daniel 10). No Novo Testamento, o arcanjo Gabriel anuncia a Maria que ela terá um filho (Lucas 1:26-38). No islã, Gabriel (Jibra’il ou Jibril) é também o anjo que revela o Corão para Maomé.
Os três arcanjos mais célebres são Gabriel, Rafael e Miguel (Michael). Todos os nomes terminam com -el por serem nomes teofóricos: El era o nome do grande deus que era o chefe do panteão do Levante, como se observa nos textos de Ugarit, cujo culto, acredita-se, acabou se fundindo com o de YHWH, mais ao sul, formando os princípios da religião do antigo Israel, de modo que ambos os nomes (e mais alguns ainda) aparecem como nomes de Deus no Antigo Testamento. O nome Gabriel, da mesma raiz G-B-R que dá gibor e geburah, significa “Deus é minha força” ou “força de Deus”; Rafael vem de “cura de Deus” ou “Deus cura”; e Michael (o CH é pronunciado como um som gutural… algo mais como Mirraél e não Maicol, óbvio) significa “quem é como Deus?”. Em Daniel (12:1), Miguel aparece como o arcanjo que irá se levantar nos dias finais, para livrar o povo judaico. Os exegetas também entendem que Gabriel teria sido o anjo que explica as visões a Daniel, e os três teriam aparecido juntos a Abraão em Mamre, num momento meio Liga da Justiça, como se lê no Talmude: Miguel para anunciar a Sara que ela teria um filho, Rafael para curar Abraão após a circuncisão e Gabriel para destruir Sodoma. Rafael tem um papel mais importante no livro de Tobit (ou Tobias), onde ele acompanha o herói, disfarçado, e o ensina a afastar o demônio Asmodeus que matou todos os sete noivos anteriores de sua futura esposa na noite de núpcias. Já Miguel, no cristianismo, é o anjo que vence Satã, bem como o anjo caído Semyazas no apócrifo livro de Enoque.
Meio como o Ringo do grupo, menos famoso que os três principais, mas ainda formando um quarteto com eles muito conhecido entre ocultistas, temos o arcanjo Uriel, Auriel ou Oriel, do hebraico para “Deus é minha luz”, que é quem explica tudo para o patriarca Enoque em seu livro. Os quatro são invocados numa prece judaica para ser recitada antes de ir dormir, da qual o pessoal da Golden Dawn derivou a invocação que conclui o Ritual do Pentagrama. Outros anjos famosos são ainda Metatron e Sandalfon, que, segundo os escritos judaicos, teriam nascido como humanos, o patriarca Enoque e o profeta Elias, levados ainda vivos, arrebatados numa carruagem de fogo, por Deus.
Ilustração da visão de Ezequiel, por Bernard Picart (1761)
A Bíblia, de um modo geral, é muito reticente quanto aos anjos. Deus os envia em missões, e eles têm poderes milagrosos. Com muita frequência, aparecem disfarçados em forma humana — e é bom lembrar que temos o episódio terrível, no livro do Gênesis (19:3-11), em que os habitantes de Sodoma queriam estuprar os anjos, que revidam deixando-os cegos — , mas eles também podem aparecer de maneiras mais aterrorizantes como luz e fogo. Quem vai descrever melhor as características desses seres são os autores posteriores da literatura talmúdica, bem como os autores da longa tradição do misticismo judaico. Uma das primeiras formas dessa tradição, inclusive, que emerge antes da era cristã, é a chamada de misticismo da Merkabah, ocupada com os mistérios da visão de Ezequiel. Entende-se que os seres que o profeta viu seriam os chayyot (“seres viventes”) e ofanim (“rodas”), mas temos alguns outros tipos ainda, como os arelim ou erelim (de etimologia obscura), os querubim (cherubim, singular cheruv, um nome possivelmente emprestado do verbo babilônico karabum, abençoar) e os serafim (“seres ardentes”), dotados de seis asas, como descrito por Isaías.
No entanto, apesar de uma multidão de autores ter escrito sobre o assunto, não existe nada na tradição judaica que se pareça com uma sistematização — dado, inclusive, o fato de que o número de autores escrevendo em tempos e lugares muito distintos já impossibilitava a empreitada. Quem vai tentar pensar a coisa de forma mais sistemática é o autor cristão e neoplatônico Pseudo-Dionísio, o Areopagita, do século VI, autor de A Hierarquia Celeste, onde temos a ordem dos anjos que a maioria das pessoas conhece: anjos, arcanjos, principalidades, potestades, virtudes, dominações, tronos, querubim e serafim.
Apesar de alguns anjos terem nomes próprios e até uma mitologia em torno (Miguel sendo um dos mais famosos), o total de anjos que existe é incontável. Aryeh Kaplan explica que há anjos temporários, sem nome, que Deus criou no segundo dia para realizar dadas tarefas e que depois desaparecerão, e anjos permanentes, com nome, que teriam sido concebidos no quinto dia da Criação. Para Damien Echols, em seu Angels and Archangels, para questões de prática mágica, o que ele chama de anjos, em oposição aos arcanjos, seriam talvez esses anjos sem nome e também sem maior inteligência, mais semelhantes a noções de energia mágica do que qualquer coisa, enquanto os arcanjos são inteligentes e têm nome.
Agora quanto ao local onde esses anjos habitam, entende-se que seria, no esquema teosófico mais típico, o plano espiritual, de modo que eles precisam usar invólucros mentais e astrais para descerem até nós, mais ou menos como um mergulhador com roupa de mergulho — é assim que eles são descritos, inclusive, no bestiário moderno que é o livro Monsters, do John Michael Greer. Em termos cabalísticos, Aryeh Kaplan nos diz que as 10 sefiroth da Árvore da Vida se encontram em Atzilut, o mundo mais elevado e próximo de Deus. Depois o segundo mundo, Briah, do Trono, faz a interface entre esse mundo e os inferiores, e Yetzirah, o terceiro, é o mundo onde as coisas tomam forma antes de chegarem aqui, em Assiah. É em Yetzirah que se encontram os anjos, diz ele, e cada anjo é uma palavra de Deus, como se lê no Talmude. Eles são feitos de fogo e luz e, quando não estão encarregados com alguma missão, suas funções são de manter o universo funcionando. Nem uma folha de relva cresce sem que uma estrela (mazal) a comande, e encarregados das estrelas, estão os anjos, como se os corpos celestes fossem de fato corpos, e os anjos, suas almas. A partir daí dá para ter uma noção da cosmologia cabalística (ou, pelo menos, uma de suas versões), segundo a qual tudo se origina como ideias na mente de Deus, então toma forma de anjos, suas palavras, que organizam o mundo por intermédio das forças brutas dos astros, equivalentes aos “demônios” planetários de Agrippa.
Fala-se às vezes em anjos bons e “anjos maus”, porém se são anjos realmente malignos ou apenas desagradáveis para nós como mortais (como Azrael, o anjo da morte) ou se ainda são demônios ou anjos caídos, aí já é assunto para uma discussão mais tensa. O entendimento mais canônico quanto aos anjos no judaísmo é o de que sua vontade coincide sempre com a Vontade de Deus, sendo eles, portanto, desprovidos de livre-arbítrio. Mas há histórias mais controversas, como no relato de R. Simon ben Lakish, de que, ao subir a montanha, Moisés teria dado porrada em vários anjos, sendo protegido pelo próprio Deus. É meio complicado.
No livro do Gênesis, cap. 6, temos a menção a uma espécie misteriosa de seres chamada Nephilim, que se costuma traduzir como “gigantes”, no período anterior ao Dilúvio, que se convencionou interpretar como descendentes dos “filhos de Deus” que copularam com mulheres humanas. O trecho é enigmático e, para os autores do apócrifo livro de Enoque, serviu de base para uma narrativa mais elaborada sobre a queda dos anjos rebeldes. Enoque, porém, não é um livro canônico, nem para o judaísmo, nem para os cristãos, e sobrevive hoje apenas por ter sido importante para alguns sectos judaicos e cristãos da Etiópia, motivo pelo qual podemos encontrar o texto integral apenas em ge’ez, uma língua semítica das regiões da Eritreia e norte da Etiópia. No entanto, sua influência no período intertestamental é notória, a começar pelo fato de a queda dos anjos rebeldes, liderados por Lúcifer, ter se tornado canônica para os cristãos.
Gravura de Gustave Doré, representando a guerra no céu descrita no Paraíso Perdido, de Milton.
E na magia?
Vamos agora ao que interessa. Os anjos cuidam de vários aspectos da realidade, podendo intervir quando necessário, e são considerados subservientes ao ser humano (no islã, inclusive, a queda de Satã se dá por ele ter se recusado a se curvar diante da última criação de Deus). Assim, faz sentido que seja possível recorrer a eles para afetar a realidade, se você tiver desenvolvido bem seus músculos espirituais e estiver em estado de pureza.
Um dos livros mais antigos e interessantes sobre o tema é o Livro dos Mistérios, em hebraico Sepher HaRazim, datado do século IV. O que é fascinante sobre esta obra é que ela se estrutura como uma jornada mística pelos sete céus que constituem o firmamento, entregue a Noé pelo arcanjo Raziel (cujo nome significa “Mistério de Deus”). Para cada um dos sete céus há uma descrição breve, acompanhada da lista dos nomes dos anjos lá posicionados. Cito dele o seguinte trecho:
O nome do primeiro firmamento é Shamayim [literalmente “céu” em hebraico]. Dentro dele se encontram acampamentos de anjos cheios de fúria. E sete tronos estão preparados lá, sobre os quais se assentam os comandantes, e ao redor deles em todos os lados, há acampamentos de anjos estacionados e obedientes ao homem que pratica magia, a qualquer um que tenha aprendido a derramar libações a seus nomes e citá-los por seus sinais no período quando se ouve a prece, de modo a fazer seu ritual mágico ser bem-sucedido. Sobre todos esses acampamentos de anjos, há sete comandantes que governam e os despacham para todo tipo de assunto, de modo que se apressem e tragam sucesso.
Estes são os nomes dos sete comandantes que se assentam nos sete tronos: o nome do primeiro é ‘WRPNY’L [Orfaniel] e o nome do segundo é TYGRH [Tygrah] e o nome do terceiro é DNHL [Danahel] e o nome do quarto é KLMYY’ [Kalmiyah], e o nome do quinto é ‘SYMWR [Asymor] e o nome do sexto é PSKR [Pesaker] e o nome do sétimo é BW’L [Boel]. E todos foram criados a partir do fogo e sua aparência é como fogo, e seu fogo flameja, pois surgiram do fogo.
Na sequência, o autor lista os 72 nomes dos anjos que servem a Orfaniel, que atendem a rituais de cura. Para invocá-los, é preciso, na segunda hora da noite (mais ou menos às 19h, mas pode ser antes ou depois dependendo da latitude ou época do ano) esquentar carvões e queimar neles resina de mirra e olíbano enquanto se recita o nome de Orfaniel e então repetir 7 vezes o nome dos 72 anjos que obedecem a ele, com o pedido: “Eu, ____ filho/a de _____, vos solicito que concedam sucesso em curar a ____ filho/a de ____”. Quem quiser saber mais, pode consultar o livro (temos uma edição em inglês, na tradução de Michael Morgan, que você encontra fácil na internet). Infelizmente, como é um problema clássico em tudo que diz respeito ao hebraico, não sabemos exatamente como pronunciar o nome desses 72 anjos (que, só pra constar, não são os 72 do Shemhamephorash, apesar do número), porque o livro só registra as consoantes2. É possível que outras abordagens sejam viáveis, no entanto, como utilizar os nomes dos anjos por escrito ou invocar Orfaniel pelos métodos salomônicos típicos, mas aí já é território de magia experimental.
Os 72 anjos subservientes a Orfaniel no Sepher HaRazim
E o livro continua com rituais para destruir inimigos, para adivinhação, para obter favores de pessoas importantes, para falar com os espíritos dos mortos e… ganhar corrida de cavalo. Não vou negar que me faz rir muito a justaposição entre os elementos mais elevados do ritual (nada menos do que a conjuração de anjos!) para propósitos banais, e não tenho dúvida de que se esse livro fosse escrito no Brasil teria ritual angelical para ganhar no jogo do bicho. O Sepher HaRazim, porém, não é um livro dos mais típicos, porque muitas de suas fórmulas envolvem práticas proibidas para os judeus: primeiro que vários rituais incluem o uso de materia magica, como ervas, partes de animais e vasos cheios de água, o que já é uma das coisas que separa a magia lícita da ilícita, segundo o Talmude (nisso, aliás, o Sepher HaRazim se assemelha muito aos PGM, no que diz respeito à construção dos rituais). Depois também que é proibido aos judeus praticar necromancia, consumir sangue e invocar deuses pagãos como Helios e Hermes, que aparecem em dois dos feitiços. O problema da tensão entre as exigências de pureza ritual feitas pelo livro e o aspecto ilícito do que está envolvido nas suas práticas ainda não foi bem resolvido e, para mim, é parte do fascínio dessa obra. Tanto o Sepher HaRazim quanto o protocabalístico Sepher Yetzirah serviram de influência para o Sepher Raziel HaMala’akh, o Livro do Anjo Raziel, grimório cabalístico do século XIII, também extremamente importante para os desenvolvimentos posteriores na magia.
No mundo árabe e cristão medieval, a magia angelical se tornou popular como uma das raras práticas mágicas toleradas, pelo menos em algum grau e alguns momentos históricos (contanto que não se chame de magia). Qualquer católico está familiarizado com a Oração de São Miguel Arcanjo, por exemplo, apesar que o padre da sua paróquia provavelmente torceria o nariz com uma conjuração de um arcanjo mais lado B. Em todo caso, a popularidade dessa forma de magia atravessou os três mundos das religiões abraâmicas durante o medievo. No Picatrix, nós encontramos os nomes de anjos que governam os sete planetas, criando o elo entre magia angelical e magia astrológica, e a Hygromanteia vai ainda mais longe e nos fala dos anjos (e demônios!) de cada hora astrológica do dia. Mas o modo como essa tradição se estabelece na Europa deriva de grimórios como o Heptameron.
O Heptameron é um livrinho atribuído ao frade Pietro d’Abano, do século XIII. É nele onde encontramos a tradição, ainda corrente, segundo a qual o arcanjo do Sol é Miguel, a ser conjurado no domingo; o arcanjo da Lua, da segunda-feira, é Gabriel; o arcanjo de Marte, da terça, é Samael; o arcanjo de Mercúrio, da quarta, é Rafael; o arcanjo de Júpiter, na quinta, é Sachiel; o arcanjo de Vênus, na sexta, é Anael; e o arcanjo de Saturno, no sábado, é Cassiel. Há algumas variações nos nomes — Samael às vezes é Camael ou Zamael, Sachiel às vezes é substituído pelo nome a partir do qual Sachiel talvez seja uma corruptela, Tzadikiel, e o mesmo se aplica Cassiel e o nome Tzafkiel. E às vezes também Miguel e Rafael trocam de cargo. Apesar disso, é aqui que a coisa começa a se estabilizar e esses são os nomes que encontramos, por exemplo, em Agrippa. As conjurações do Heptameron e os sigilos dos anjos e correspondências fornecem um sistema bastante praticável de evocação angelical e qualquer um com interesse no assunto faria bem em dar uma olhadinha lá (tem disponível, num inglês meio empoeirado, no Esoteric Archive). Esses mesmos arcanjos aparecem em Rufus Opus, no seu Seven Spheres, como os arcanjos a serem consultados para propósitos de elevação espiritual, à moda hermética.
E, falando em hermetismo, um elemento importante da cosmologia hermética é a divisão 4–7–12: 4 elementos, 7 planetas, 12 constelações. Os anjos dos 7 planetas são esses, e a tradição da Golden Dawn atribuiu aos quatro arcanjos Rafael, Gabriel, Miguel e Uriel também os elementos do ar, água, fogo e terra, respectivamente. Porém, entende-se que o trio Rafael, Gabriel e Miguel aqui não são os mesmos que os anjos de Mercúrio, da Lua e do Sol — ou melhor, são, mas não são… como se fosse uma mesma pessoa que trabalha em mais de um cargo e aí tem números de telefone oficiais diferentes. Os anjos dos 7 planetas também foram encaixados nas 10 sefiroth da seguinte forma: Yesod=Lua=Gabriel; Hod=Mercúrio=Rafael; Netzach=Vênus=Anael; Tiffereth=Sol=Miguel; Chesed=Júpiter=Tzadikiel; Binah=Saturno=Tzafkiel. Por fim, Sandalfon ficou com Malkut, que não tem atribuição astrológica nenhuma, sendo entendido, nesta tradição, como o mundo material, Raziel (às vezes Iofiel) pega a sefirah de Chokhmah, equivalente às estrelas fixas, e Metatron fica com Keter, a mais elevada e próxima de Deus.
Quanto aos anjos das principais constelações dos 12 signos, seus nomes são: Melchiadel (Áries), Asmodel (Touro), Ambriel (Gêmeos), Muriel (Câncer), Veruchiel (Leão), Hamaliel (Virgem), Zuriel (Libra), Barachiel (Escorpião), Advachiel (Sagitário), Hanael (Capricórnio), Cambriel (Aquário) e Amnitiziel (Peixes). Como lemos em Damien Echols, no livro 777 de Crowley e em Franz Bardon, esses arcanjos zodiacais têm seus poderes próprios, ligados ao simbolismo do signo em questão, porém cada autor oferece uma versão desses poderes, bem como sigilos distintos, então fica em aberto a questão do quanto eles seriam os mesmos anjos3. Da minha parte, eu não deixo de achar tudo isso incrível e fascinante e um material rico para estudo (que eu pretendo explorar assim que tiver mais tempo livre).
Mas espere, tem mais! Você já deve ter ouvido falar do Shemhameforash, o nome revelado, explícito, de Deus, que consiste em 72 nomes. Estes nomes são derivados de uma disposição das letras dos versículos 19 a 21 do capítulo 14 do livro do Êxodo. Estes três versículos têm o mesmo número de letras, então ao colocarmos o versículo 19 na direção tradicional (da direita para a esquerda), o versículo 20 na direção oposta e o 21 de novo na direção certa, temos 72 nomes de 3 letras, lendo-os de cima para baixo. O primeiro, por exemplo, é a combinação vav-he-vav, V-H-V. Somando o final -iah (outro sufixo teofórico4), temos então o anjo Vehuiah. Depois a combinação é iud, lamed, iud, Y-L-Y, que, com o final -el (eles se alternam) rende Ieliel ou Jeliel. E assim vai. Quem leu já a Mônica Buonfiglio vai reconhecer que são esses os anjos com os quais ela trabalha.
Cada um dos 72 anjos do Shemhameforash pode ser chamado individualmente para resolver uma questão específica — entende-se inclusive que estes 72 anjos são a contraparte dos 72 demônios da Goetia, por isso devem ser chamados para controlar o bicho antes das evocações. Mas eles também podem ser conjurados, todos juntos, num ritual que Echols apelidou de the Shem operation, que é extremamente poderoso, demora cerca de umas 3 horas para completar e acumula uma quantidade violenta de energia espiritual.
Por fim, temos também as 28 mansões da Lua, um conceito importantíssimo para a astrologia védica, cada qual também tem um nome próprio e um anjo regente, e os 36 anjos dos decanos, divididos em 3 para cada um dos 12 zodiacais. É anjo pra cacete. E nenhum desses anjos ainda é os do Sefer HaRazim!
Para quem tem interesse, Damien Echols em Angels and Archangels oferece várias dicas para trabalhar com esse pessoal, inclusive seus sigilos e visualizações. Scott Stenwick em seu blog também tem toda uma sessão dedicada à conjuração dos anjos planetários e zodiacais, mas é um trabalho mais restrito ao modelo de evocação nos moldes da Thelema e Golden Dawn — assim, o livro de Echols acaba sendo mais acessível ao praticante médio. Mas nem por isso ele é necessariamente mais raso. Um dos rituais que Echols ensina envolve a conjuração progressiva dos grupos de anjos, começando com os 4 arcanjos do RmP, mais Sandalfon abaixo e Metatron acima, ao que se somam os 10 arcanjos da Árvore da Vida, os 12 zodiacais e os 36. A grande quantidade de energia espiritual gerada por esse trabalho pode ser utilizada para magia de manifestação ou ser absorvida como “alimento espiritual”, como ele diz.
Anjos e o paganismo
O contexto em que a magia angelical ganha corpo é notoriamente abraâmico, especialmente judaico — afinal os anjos, em sua maioria atendem a nomes em hebraico ou ainda em árabe, como Gabriel também é chamado de Jibra’il. Nesse sentido, é compreensível que um neopagão se sinta desconfortável com magia angelical: são seres de tradições monoteístas com um julgamento muito severo em relação ao politeísmo. Toda a coisa do “não terás outros deuses” e tal. Já imaginou você ter todo um trabalho para conjurar o arcanjo Miguel e ele te mandar abandonar esses ídolos impuros?
Bem, de novo, essa noção faz sentido a princípio, mas não tem base histórica. Sim, a magia angelical se desenvolve num contexto judaico, como se observa no Sepher HaRazim, cristão (Heptameron) e islâmico (Picatrix), mas tudo indica que não se tratava de um conceito nativo a Israel. O pesquisador John Charles Arnold tem um livro, dedicado inteiramente a acompanhar o desenvolvimento do culto de Miguel, em que ele toca nesse assunto, The Footprints of Michael the Archangel: The Formation and Diffusion of a Saintly Cult, c. 300 — c. 800. Diz ele numa das primeiras páginas do volume:
Durante o meio milênio entre os anos 300 e 800, os cristãos passaram a venerar Miguel como se fosse um santo humano. Meu objetivo neste livro é compreender melhor a natureza dessa preocupação humana com Miguel. Especificamente, eu me pergunto por que e como cristãos, diante da resistência apostólica e patrística, encontraram refúgio no abraço desse anjo em particular nessa época em particular. Miguel era uma escolha estranha para tal reverência, ainda mais com o fato de ele nunca ter sido humano. Gabriel seria um candidato mais óbvio dentre os anjos para o reconhecimento cristão. Foi ele, afinal, quem articulou com Maria a doutrina cristã central da Encarnação. Mesmo Rafael, o “curador de Deus”, ocupara um papel central como protagonista do livro apócrifo de Tobias. Em vez disso, os cristãos celebraram uma figura ecumênica nada exclusiva à tradição cristã. Judeus prestavam reverência a Miguel como o Guardião de Israel, Sumo Sacerdote Celestial, Comandante das Hostes Celestiais e psicopompo. Eles peticionavam seus poderes com invocações por via de preces e amuletos. Politeístas também adoravam a Miguel como um portal aos deuses superiores, quando não como uma divindade menor em si. Os pagãos ganhavam a atenção do “olho perfeito de Zeus” queimando incenso, entoando preces e manipulando objetos. O arcanjo pagão poderia subjugar inimigos, atrair vários clientes para negócios, conferir força e frustrar pilotos de carruagem rivais. Apenas após muitos séculos de contestação cultural e religiosa que os cristãos remodelaram a identidade e personalidade do sacerdote guerreiro judaico e mediador e curandeiro pagão de modo a se tornar uma figura humilde o suficiente para aceitar a veneração em nome de Deus. (p. 4)
Eu acho muito divertido Miguel ser descrito como “olho perfeito de Zeus”, haja vista que, por volta do período helenístico e possivelmente como resultado do contato com essas culturas mais monoteístas, o conceito de Zeus Pantocrator como um nome grego para o Deus Supremo, que bota ordem no Universo e não apenas como mais um dentre dos deuses e participante de uma mitologia onde aparece como um completo tarado. E eu já mencionei mais de uma vez que os arcanjos aparecem em evocações dos PGM e que o Hermetismo clássico é uma doutrina espiritual que admite a existência de Deus (com D maiúsculo), deuses, anjos, dáimons e energias.
O arcanjo Miguel acorrentando Satã, arte de William Blake.
Como Arnold comenta posteriormente (p. 12), costuma-se creditar o desenvolvimento da angelologia judaica ao seu contato com a religião persa e babilônica. Isso não quer dizer que anjos sejam um conceito originalmente mesopotâmico, “roubado” pelos israelitas (o que seria uma posição bem antissemita5), mas sim um fenômeno que emerge a partir dessas culturas em contato. Como eu já disse antes também, as estátuas e relevos mesopotâmicos representavam gênios alados que serviam de intermediários entre a humanidade e os deuses, bem como figuras tetramórficas na forma dos lamassu que incorporavam as imagens dos quatro símbolos zodiacais: o touro e o leão, equivalentes às constelações com estes nomes, um homem (Aquário) e uma águia (Escorpião). A dimensão divina dessa simbologia, que faz deles emissários cósmicos, é evidenciada quando essa mesma descrição é feita na visão mística de Ezequiel. Eu gosto muito de pensar nessa ideia de uma entidade como lamassus aparecendo para um profeta israelita, pois, em vez de apontar para algum tipo de separação essencial entre as duas religiões, ela sugere um tipo de unidade espiritual que, ainda que não anule as diferenças, acaba sendo relevante para quem lida com essas formas mais alternativas de espiritualidade que não se enquadram na religiosidade comum. Outras práticas mágicas e espirituais interessantes também foram desenvolvidas posteriormente por judeus na Babilônia como se observa nas práticas das tigelas que serviam como armadilhas para demônios e no texto místico, pré-cabalístico, Shi’ur Qomah6.
No mais, como aponta Arnold, a divisão do firmamento em sete era tradicionalmente babilônica (ligada aos astros) e o próprio R. Simon ben Lakish afirmava que os nomes de Miguel, Rafael, Gabriel “vieram conosco” da Babilônia — mesmo o nome Miguel tinha um predecessor babilônico no nome Mannu-ki-ili, “quem é como Deus?”. É possível, ainda que improvável, que em algum momento tivesse sido desenvolvida uma angelologia mais complexa no mundo mesopotâmico. Acontece, porém, que o Império Babilônico substituiu, como idioma oficial, sua língua nativa, o acadiano (que era registrado em cuneiforme em tabuletas de argila que sobreviveram até hoje), pelo aramaico, escrito em papiro ou pergaminho, que se perde com o tempo exceto sob condições ideais. E aí não tem como sabermos.
No que diz respeito às práticas, Echols teve uma experiência que eu achei particularmente reveladora (porém, para quem está lendo o Angels and Archangels, é meio que um spoiler). Tendo desenvolvido suas técnicas energéticas e de magia angelical na prisão e usando-as para elevação espiritual, a ponto de fazer a Shem operation nada menos que três vezes ao dia, em dado momento Echols chega a uma experiência mística de morte do ego: ele sente como se a terra aos pés desaparecesse, uma luz insuportavelmente radiante ao seu redor que de repente se apaga e tudo fica escuro. Ele sente como se estivesse se desintegrando, mas uma outra parte de sua consciência, uma parte superior, observa essa desintegração e, por fim, numa visão do céu noturno pontuado de estrelas aparece o nome Enlil.
Um lamassu, cujo corpo é misto de ser humano, águia, leão e touro, os quatro seres que compõe as hayyot.
Echols tinha estudado formalmente só até o nono ano, por isso nunca tinha ouvido falar dessa divindade, que, como vocês lembram do meu texto sobre o assunto, é o chefe do panteão sumério, o que ele descobriu depois. Pode ser um caso do que se chama de UPG (Unverified Personal Gnosis, i.e. revelações que a pessoa teve sem serem sustentadas por outras autoridades no assunto), mas uma experiência que faz todo sentido dado o que sabemos sobre as origens mesopotâmicas da angelologia. E aí temos um elo cabalístico interessante com o que vimos em Kaplan: os anjos são a alma das estrelas, mas também esses deuses têm elos cósmicos com os corpos celestes e constelações, não por acaso as três faixas do céu eram entendidas pelos antigos como pertencentes a Anu, Enlil e Enki, os três grandes deuses mesopotâmicos, e os lamassu incorporam a iconografia das constelações dos quatro signos fixos. A partir daí, Echols passou a entender a magia que ele pratica (e que passou a incluir um trabalho de invocação e devoção a Enlil) pelo nome de astroteurgia, a elevação espiritual por via dessas inteligências cósmicas. Eu não sei afirmar o quão ortodoxo é o caminho do Echols ou se ele está seguindo por veredas desconhecidas, mas me parece uma perspectiva bastante válida.
Desnecessário dizer, portanto, que, para quem tem um trabalho devocional sério com divindades além das tradições abraâmicas, contanto que centrado no desenvolvimento espiritual (e não em bobagem adolescente do tipo “eu gosto de assistir desenho com Apolo comigo no sofá”), não tem muito o que temer com magia angelical. Não posso garantir que isso se aplique a todos os panteões nem a todos os deuses (e certamente não garanto que seja viável para quem é do rolê da demonolatria ou magia qlifótica), mas me sinto seguro em dizer que os anjos estão mais preocupados com o seu desenvolvimento espiritual do que com o fato de você seguir ou não as regras, muitas vezes arbitrárias e humanas, das religiões. E é muito bom poder escrever isso em 2020 e não em 1700 sem me preocupar em ser queimado na fogueira7.
Para quem tem interesse no assunto, eu recomendo, é claro, o livro do Echols, bem como também os outros autores que ele cita como Sandra e Chic Cicero, autores de Tarot Talismans: Invoke the Angels of the Tarot, e Damon Brand, que tem vários volumes sobre magia angelical. Um outro livro interessante é Angel Magic: The Ancient Art of Summoning and Communicating with Angelic Beings, de Geoffrey James, e The Sacred Magic of the Angels do David Goddard. No lado cabalístico, a versão do Sepher Yetzirah do Aryeh Kaplan (que temos em português também pela editora Sêfer) é recomendável, e eu também sugiro a leitura dos grimórios clássicos como o Heptameron, o Picatrix e os livros de Agrippa. Em território brasileiro, se o seu inglês for ruim, é possível ter acesso aos livros Anjos Cabalísticos e A Magia dos Anjos Cabalísticos da Mônica Buonfiglio em qualquer sebo. Apesar de as pessoas torcerem o nariz, esses livros são surpreendentemente bem pesquisados e muita gente já obteve bons resultados com eles (incluindo a própria autora, a julgar por sua carreira), porém é importante lembrar que precisam ser lidos com uma postura crítica, pois as partes que ela deriva de outros livros (como as descrições e poderes dos anjos) acabam misturadas com um tipo menos feliz de UPG como “demora dois dias para uma prece chegar no anjo”. Um livro melhor é o e-book Magia Angelical: da teoria à prática, do Frater Dalton. Em todo caso, uma das grandes vantagens da magia angelical é que você precisa se esforçar muito para conseguir fazer cagada com esse tipo de prática e, por mais que ter os sigilos, acessórios e conjurações exatas ajude muito, já é possível obter resultados apenas com os nomes dos anjos e visualizações.
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[1] Enoquiano é um sistema mágico recebido pelo mago elisabetano John Dee e seu vidente Edward Kelley no século XVI, posteriormente trabalhado por outros ocultistas, inclusive o pessoal da Golden Dawn.
[2] Orfaniel, aliás, e os outros nomes aqui são uma aproximação, traçada pela pesquisadora Kimberly Stratton num artigo que compara o HaRazim com a Liturgia de Mitras nos PGM (link aqui). A pronúncia real é desconhecida.
[3] Por exemplo, Melchiadel, de Áries, diz Echols, preside sobre toda energia de combate, sendo útil para fornecer auxílio para superar medos e lidar com qualquer confronto. O autor traça o seu sigilo usando o famoso método da sigilação rosacruz, enquanto Scott Stenwick, que segue os padrões do Crowley para sua evocação, o faz utilizando o quadrado mágico de Marte, planeta que rege Áries. Bardon, porém, em A Prática da Evocação Mágica, recebe o seu sigilo do anjo diretamente e descreve as suas funções cósmicas em termos de “controlar e direcionar a vontade e atividade de toda criatura na terra e domínio sobre a magia do fogo em seu estado original”. Seria possível entender as duas coisas como facetas de um mesmo anjo, Echols lidando com o seu lado mais acessível para o praticante comum e Bardon tratando de sua dimensão mais profunda – afinal, ele o insere na esfera hermética de Júpiter, acima de todas as outras, exceto Saturno, e exigindo que o conjurador passe por elas todas antes de chegar nesse ponto. Eu só tenho um pé atrás com a parte do Crowley, pois os poderes desses anjos no 777, “o poder da consagração”, foram derivados apenas de suas correspondências do tarô.
[4] Vários nomes hebraicos terminam em -yah ou -yahu como Yeshayahu e Yermiyahu, em português Isaías e Jeremias. Yah (ou, como é o estereótipo Rastafari, Jah) é uma versão abreviada, YH, do nome divino YHWH. Daí que os nomes dos profetas signifiquem “Deus salva” e “Deus o levantou”.
[5] Existe uma tendência perversa no ocultismo de se creditar o misticismo judaico a outras culturas, o que é extremamente problemático e serve a uma lógica antissemita de se apropriar dessas técnicas, que sempre circularam em meios muito fechados, enquanto se despreza os judeus e sua religião. Blavatsky, por exemplo, atribui o desenvolvimento da religião judaica a algum tipo de herança, via telefone sem fio, do misticismo oriental ariano, uma ideia em que ela encontra companhia hoje ao lado dos nazistas plagiadores da Joys of Satan. Apesar das influências gregas, babilônicas e árabes, a Cabala em si deve ser entendida como um fenômeno judaico.
[6] Este livro, cujo nome significa “medida do corpo”, é uma obra exegética, extremamente polêmica, do Cântico dos Cânticos (5:11-16) e uma descrição do corpo de Deus. Martin Samuel Cohen a analisa em seu estudo, The Shi’Ur Qomah: Liturgy and Theurgy in Pre-Kabbalistic Jewish Mysticism, onde comenta, inclusive, a visão de que o misticismo prático era essencialmente um fenômeno babilônico, ainda que ele mesmo não concorde com essa caracterização estrita.
[7] Digo, se o Brasil continuar firme, como parece estar, em seu caminho rumo ao fundamentalismo narcopentecostal que já é a ordem do dia no Rio de Janeiro, então talvez as coisas continuem assim por pouquíssimo tempo. Por isso é bom aproveitar enquanto ainda dá.