Quando ele me pede ajuda...
Eu ajudo.
Não me julguem por não saber
Dizer não, as coisas do coração
São muito complicadas.
Aquela desgraçada foi a dona
Do meu coração na época em
Que eu tinha um.
Quando ele me pede ajuda...
Eu ajudo.Não me julguem por não saber
Dizer não, as coisas do coração
São muito complicadas.
Aquela desgraçada foi a dona
Do meu coração na época em
Que eu tinha um.
Quando me chamou cochichou
Em meu ouvido o local onde
Rosa Vermelha escondia duas
Caixas de Madeira,
Onde Rosa Caveira escondia
Outra, onde Quitéria escondeu
outra.
Entreguei a Padilha essas quatro
Caixas e ela me mostrou
Ter posse de uma, então ali
Eram cinco. Pediu que eu
Fosse atras de mais uma caixa,
E dessa vez me orientou a ser
Extremamente cuidadoso pois
Teria de Roubar de Júlia.
Ah Júlia era uma miúda
Que mesmo após morta
O povo chamava de Menina.
Não estava confortável com isso,
Mas Padilha fazia beicinho,
Me beijava atras das orelhas
até eu dizer que sim a todas
as maluquices dela.
Era uma noite escura, chuvosa,
Os relâmpagos eram a unica
Luz que clareava a noite.
Fui sorrateiro ate a morada
De Menina, uma casa de dois
Andares abandonada
Em São Pedro, vasculhei
A casa todos os quartos,
Mas não encontrei nada.
Quando ja estava de saída
Atravessei matagal
Que outrora havia sido um
Belo jardim e fui surpreendido
Por Menina sentada em
Um balanço velho amarrado
Ao galho de uma árvore,
Estava la com a costumeira
Cara de Sonsa, tinha apoiado
No colo a caixa que eu procurava.
Bateu os pés no chão e parou
O balanço.
— Sabe Tranca Ruas, ela devia saber... devia saber que eu ia saber.
— Eu acho que ela sabe que você sabe.
Rimos da repetição de palavras.
— As vezes eu vejo o futuro sabia?
— Sim, sabia.
— Você confia nela?
— Sinceramente? Não.
— Mas ainda assim faz tudo o que ela quer. Sempre fez.
— Sim.
— Eu vou te dar a caixa, depois vou soar o alarme. Tu corre rápido Tranca Ruas?
— Mais veloz que uma chita.
— Será? Vamos ver.
Ela estendeu os bracinhos curtos,
Eu apanhei a caixa.
— Porque esta entregando sem resistência?
— Não sou uma Maria, nem uma Rosa, nem mesmo uma Sete. Eu não sou uma delas, então... meu papel nessa jogada é apenas ver o que vai acontecer.
Não entendi o que ela quis dizer,
Apanhei a caixa me virei de costas
Pronto para ir embora,
E então Menina gritou
Um grito tão agudo e tão alto
Que me deixou um pouco tonto.
Aquilo era o alarme.
Corri para a cidade, pelas ruas
Da Cabo Frio, em uma encruzilhada
foi surpreendido por três delas,
Pelos brilho dourado, purpura e prata
Eu reconheci Dama da Noite,
Maria Mulambo e Rosa Caveira.
Inclinei o corpo e como um
Corisco eu desviei delas,
As unhas negras e pontiagudas
de Dama da Noite por pouco
não me rasgaram.
Elas vieram atrás, mas na
Corrida não eram pario para mim.
Quando o pavimento da
Cidade acabou, entrei na floresta
E continuei a corrida deixando as
Trêspara trás, mas então me
Preocupei quando vi o vulto
Vermelh correndo entre os troncos
A minha direita, era Rosa Vermelha,
E ela sim poderia me ganhar
Em uma corrida, então
dei o melhor de mim
corri como o vento e ja
Estava chegando no local
Combinado quando Rosa Vermelha
Conseguiu agarrar meu braço,
Mas não parei de correr,
Por uns duzentos metros
Corremos assim, agarrados.
— Porque esta fazendo isso?! Devolva! Não tem ideia do que tem dentro dessa caixa.
— Largue!
— Entregue a caixa!
Ela enfiou uma de suas
pernas entre as minhas,
Caímos, na verdade rolamos
Por vários metros.
A caixa saltou de minhas mãos
e deslizou pelo gramado
Umido de chuva.
Nisso me dei conta que
ja estava no local combinado,
O cemitério da Boa Fé.
Rosa Vermelha olhou
Para o lado e gritou:
— Padilha ele roubou a caixa de Menina! Pegue e esconda! Não sei o que ele quer, mas acho que esta mancomunado com a Sete Catacumbas.
Olhei para a direita e la estava
Maria Padilha, ela apanhou a caixa
no gramado, e sorridente disse:
— Obrigado Tranca Ruas, sempre me ajuda muito. Assim que acabar aqui vou lhe recompensar por esse gesto.
Eu sorri e ergui o polegar para ela,
Ela gargalhou e deu as costas,
Desaparecendo atras de um mausoléu.
Rosa se levantou aturdida.
— Ela te agradeceu... não... foi ele que lhe mandou roubar a caixa?
— As suas duas eu também roubei.
Ela abriu a boca assustada e correu
Atrás de Padilha, e enquanto
Eu ficava em pé vi passarem
Correndo Rosa Caveira, Navalha
Mulambo, Quitéria, e Dama da Noite,
E assim que passaram ouvi
Gritos e uma luminosidade
alaranjada banhar as tumbas,
Então as segui para ver
O que ia acontecer.
O que eu vi foi fantástico,
Um tanto absurdo mas sem
Dúvida fantástico!
Sete Saias rodopiava na ponta
Dos pés como uma bailarina
E de sua figura saia fogo!
Ela trançava um círculo perfeito
girando e erguendo atras de si
Uma parede de chamas vermelhas
Impedindo as recém chegadas
de passar.
Ouvi Navalha falar:
— Não sabia que Sete Saias podia fazer isto...
— A questão não é ela poder fazer, mas sim o motivo de estar fazendo. Ela esta do lado de Padilha.
Saltei sobre o telhadinho
de um mausoléus,
Queria ver o que sete Saias
Protegia das outras,
Ali de cima vi que
no meio do círculo estava
Maria Padilha e uma mulher
de vestido Branco, elas
Estavam abaixadas posicionando
Todas as caixas, as quais
Contei serem sete,
Na posição de uma cruz deitada.
— Pronto, agora por obséquio, as abra.
— Certo. — disse a mulher de branco.
Ela mostrou a Padilha
Uma chave de prata e a
Segurando com a mão tremula
Ela fez menção de abrir uma
Das caixas, mas parou e
Olhou para Padilha receosa.
— Tem certeza que isso é uma boa ideia?
— Claro que sim, Sete Catacumbas nós temos esse plano a anos, não da pra voltar atrás agora.
A tal Sete Catacumbas
engoliu em seco
E foi abrindo caixa por caixa,
E então ela e Padilha se
Afastaram.
— Pode parar Sete Saias.
Sete Saias parou com o giro
Pirotécnico e caiu de joelhos no
Chão, arfando, o fogo se
Extinguiu e Quitéria deu
Um passo a frente
berrando furiosa:
— O que vocês fizeram?!
Dama da Noite também berrou:
— Como você pôde nos trair desta maneira?!
— Tolas...
— Vocês deviam ter suspeitado. Eu sempre as achava, sempre sabia onde estavam, o que estavam fazendo. Nunca passou pela mente de vocês que alguém estava me contando essas coisas? Eu fui ate o amante de Mulambo, ate o estalajadeiro de Quitéria, até o morro de Maria Navalha, ate o convento... como eu saberia dessas pessoas e desses locais?
— Padilha era quem lhe contava tudo...
— Sim, eu sempre adorei uma boa fofoca. Agora silêncio, vai começar.
Ouvi estalos altos, nisso as
Tampas das caixas se
Partiram e lascas de madeira
Voaram para todos os lados.
Ossos humanos flutuaram para
Fora de seus delas e
Se ergueram no ar,
Como se fossem influênciados
Por magnetismo os ossos foram
se unindo, montando um
Esqueleto perfeito,
Que se pôs ereto flutuando
a um metro do chão.
Então a última caixa liberou
Uma peça dourada,
Uma coroa de puro ouro
Com rubys incrustados
Que flutuou até pousar no
Topo do crânio do esqueleto.
O que se seguiu foi uma ventania
tão absurdamente forte
Que eu mesmo sendo um
Espírito de homem morto
Tive de me agarrar a estátua
de um anjo erguida ali
Sobre o telhadinho.
Então aconteceu, do esqueleto
saltou uma luz vermelha
Uma bolinha minúscula
Que cresceu e cresceu
ate criar tronco, cabeça,
braços e pernas, e em um
Piscar de olhos pisou no
Solo do cemitério uma mulher
de vestes vermelhas em
Estilo medieval, com os
Olhos e labios cheios de kajal
E com a cabeça adornada pela
Coroa dourada, os ossos cairam
Displicentes pelo gramado
Mas a coroa permaneceu sobre
A cabeça daquele espírito.
Era notoriamente uma Rainha.
— Enfim... fui libertada. Quem me libertou?
— Eu minha senhora.
— Serei eternamente grata. Agora... todas vocês, de joelhos perante sua Rainha.
Todas que estavam ali cairam
De joelhos, e eu fiquei atónito
ao ver obediência nelas.
Então vi pelas posturas rígidas
Dos corpos que aquilo não era
Uma escolha, elas foram impelidas
Por alguma força da qual desconheço
A se ajoelhar.
A Rainha foi caminhando entre
Elas, dando tapinhas leves
nas bochechas de cada uma
Tal qual se faz nas ancas de um
Cavalo ao avalia-lo na hora
Da compra.
— Rainha nós...
— SILÊNCIO!
Os lábios de todas se selaram.
— Vocês vão me servir muito bom, tenho propósitos... grandes propósitos que vocês irão realizar... para mim.
— Iremos é?
A Rainha virou o rosto
E encarou Padilha que
Se erguia do chão.
— Como... EU MANDEI FICAR DE JOELHOS E CALADA!
— Eu ouvi da primeira vez, mas estou cagando para os seus desejos, majestade Sereníssima...
Então ela fez uma vénia debochada.
— Majestade a senhora está muito exaltada. Aposto que meia hora de pica é o que lhe faz falta, Milady.
— O QUE?!
— Pare de gritar, piranha velha, vai acordar os passarinhos.
— Passarinhos? Do que está falando? E como ficou imune a meu poder?
Padilha sorriu a apontou para cima,
Rainha ergueu a cabeça,
E eu também, o céu chuvoso estava
Preto de tao escuro, mas de repente,
Por um curto instante a escuridão
Foi cortada pelo clarão de
Um relâmpago e eu vi muitos,
Dezenas daquelas sombras escuras
Voando sobre nós, circulando
o lugar como urubus atras
De carniça. No extremo alto,
No exato meio da roda de alados
Vi um maioral entre eles,
Um que era alto e forte
E que me fez sentir medo.
— Lúcifer...
A Rainha balbulciou incrédula.
— Sim, eu fiz amizade com Lulu, e ele é um amor. Sabe, dona Rainha sei-la-do-quê, eu sempre gostei da sua história. Sim, quando eu era viva, Quitéria me contou muitas vezes, a história da maior da bruxas, a que foi devorada pelos próprios filhos... nessas decadas em que estive vagando por ai como um espírito amaldiçoado, tentei replicar a sua história, tentei encontrar um demónio que me desse poderes extraordinários... mas sabe, não encontrei. Essa terra,essa maldita colónia Portuguesa não tem demónios. É uma coisa estranha, os Deuses dos índios proibiram Lúcifer e seus amiguinhos de pisar aqui. Mas estamos em um momento onde os Deuses estão isolados em seus espaços sagrados, lamentando o genocídio de seus povo, e isso significa que não ha deuses aqui agora para proteger o lugar. Significa também que um espírito de feiticeira nascido e morrido aqui, com os restos mortais enterrados neste solo, poderia convidar Lúcifer a entrar. Eu sou exatamente uma feiticeira nascida, morta e enterrada aqui. Uns anos atras sai pelo mundo buscando um demónio que pudesse me levar ate Lúcifer, e encontrei um em uma ilha distante da costa da Bahia, e ele me levou ate o tal. Fizemos um acordo, eu e ele sabe...
— Que acordo?
— Ele me daria por algumas horas parte do poder dele próprio... sabe qual é o maior poder dele, heim dona Rainha?
Rainha deu alguns passos
Para trás temerosa.
— Ah uma mulher inteligente como a senhora saberia, é claro que saberia. Lúcifer se alimenta de Almas, suga a vitalidade delas como um morcego suga o sangue de um porco no chiqueiro. Nao se afaste meu amor, eu so quero lhe dar um beijo.
A Rainha se virou girando,
Fazendo seu vestido abrir
No ar, mas antes que pudesse
Fugir, Maria Padilha a agarrou
Pelos cabelos e pisou na barra
Da saia da soberana, que caiu
Estabacada no chão.
— Eu amo ver essa expressão de terror no rosto dos poderosos. Pessoas dotadas de grande poder nunca cogitam a derrota, então quando caem... a expressão de horror e incredulidade é... maravilhosa se ver.
— Escute, eu... você... você não precisa fazer isso, eu posso repartir meus dons contigo por livre e espontânea vontade!
— Sei que pode se quiser, mas eu quero tomar a força.
Então vi Padilha
Se inclinar, agarrar
A nuca da Rainha.
— Achou mesmo que essa situação era sobre você? Aprenda desde já mulher, onde eu estiver a situação é sempre, sempre e sempre sobre mim.
Padilha abaixou o rosto
e forçou nela um denso
Beijo nos lábios.
Então a Rainha caiu desfalecida,
O corpo inerte.
Padilha tocou com o dedo
Indicador o exato
ponto entre os seios da Rainha.
— Venha para mim...
Dali surgiu uma luz dourada
Que Maria Padilha apanhou
Com ambas as mãos,
Levou ate a boca e...
Engoliu.
Por algum tempo ficou
com os olhos fechados
Saboreando aquilo,
que eu suspeitava
ser a alma da Rainha.
Então abriu os olhos
Exibindo agora iris vermelhas
Fulgurantes.
Todas as moças ali ajoelhadas
E caladas puderam finalmente
se mover e falar, o poder
da Rainha não as dominava mais.
— Você me enganou... me usou...
— Padilha o que você fez...
Padilha ergueu o queixo
E gritou aos seres que voavam
Sobre nós:
— Lúcifer! Cumpriste a tua parte no acordo, agora cumpro a minha! Desça! Eu, filha desta terra permito que habite sobre ela!
E eles desceram, eram seres
Tao brancos que as peles
Até tomavam um tom acinzentado,
Os cabelos longos e louro prateados,
As asas de plumas alvas como a neve
e os olhos de iris de prata
Cheios de maldade.
Eram dezenas, centenas...
E o último a descer foi o líder,
Lúcifer era o único a ostentar
asas e cabelos negros como petróleo,
Ele pousou ao lado de Padilha
E sorriu para ela.
Ela por si ergueu a mão
E ele apanho a beijou sobre
Os dedos.
— Grato.
Disse com o tom de voz
Mais afinado que ja ouvi.
Ela acariciou-lhe a bochecha
E saiu caminhando, ajudou
Sete Saias a ficar em pé e
Saíram as duas de braços dados.
Corri atras delas e as parei
Na entrada no cemitério.
— O que você fez Padilha... tem noção da gravidade do que fez?
— Sinceramente? Noção de toda a situação eu não tenho, mas hoje derrotei uma Rainha. Sabe como diz o ditado, Rainha morta, Rainha posta. Eu sou a grande agora. E você meu caro terá a chance de ser uns dos poucos que poderá se sentir seguro daqui por Diante, pois eu o protejerei.
— E quem você pensa que é com essa megalomania toda?
— Eu não penso que sou, eu de fato sou Maria Padilha... Das Almas.
E ela gargalhou, se virou e junto
Com a amiga sumiu
Na escuridão da madrugada.
A daquela noite, por muitos
e muitos anos o que existiu
Aqui nesta terra foi o mais
Puro império do terror.
Felipe Caprini, Contos das Muitas Marias
Segunda Temporada — Conto 13 (Final)
Espero que tenham gostado!
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