sábado, 14 de maio de 2022

Era meu filho. Não importa se era Temido, mal falado. Para mim era só meu filho. Acordei com as galinhas, Como fazia todos os dias, Era segunda-feira, Dia que ele vinha me ver logo cedo. Desde que havia se tornado moço, Se mudou para o centro da cidade Eu fiquei no sítio.

 Era meu filho.
Não importa se era
Temido, mal falado.
Para mim era só meu filho.
Acordei com as galinhas,
Como fazia todos os dias,
Era segunda-feira,
Dia que ele vinha me ver logo cedo.
Desde que havia se tornado moço,
Se mudou para o centro da cidade
Eu fiquei no sítio.


Pode ser uma imagem de 1 pessoaEra meu filho.
Não importa se era
Temido, mal falado.
Para mim era só meu filho.
Acordei com as galinhas,
Como fazia todos os dias,
Era segunda-feira,
Dia que ele vinha me ver logo cedo.
Desde que havia se tornado moço,
Se mudou para o centro da cidade
Eu fiquei no sítio.
Toda a vida criei cabras,
Tal qual meu pai e meu avô,
Mas entendia que meu Filippo
Não tinha índole para o campo.
Então esperei sentada diante
Do fogão a lenha,
A leiteira esquentando na beira,
O café passando pelo pano,
Pão de linguiça recém assado.
Ele ia chegar de manhã,
Sempre chegava de manhã,
Ia trazer dinheiro, café e queijo
Como de costume.
Meu menino passava as madrugadas
Fazendo as coisas que
Dizia que tinha de fazer.
Eu bem sabia que estas coisas
Não eram boas,
Mas já não me opunha a nada,
Estava velha demais para
Bronquear com as escolhas dele.
Estranhei a demora,
Lá pelas sete ja era tempo
De estar em casa.
Deu sete, oito, nove, dez horas
Da manhã e nada.
Meu coração apertou.
Disse a mim mesma:
"Deixe de ser parva Gioconda, de vez em quando ele chega tarde mesmo, jaja está ai".
Mas meu peito cheio de angústia
Não acreditou nisto.
Não acreditou pois o medo
Do passado me assombrava.
Quando ja era de tarde,
Quase de Noite,
Um molecote veio dar um recado,
Disse que se possível eu devia ir
Até a rua do Marechal com urgência.

Meu coração afundou no peito,
Só havia um casarão na rua
Do Marechal que eu meu filho
Frequentava.
Subi na charrete e me piquei
Para lá.
Cheguei a mansão, era um Palácio.
A dona da casa, uma falsa fidalga
Apareceu a porta e eu a contra gosto
Lhe fiz uma vênia.
Todos sabiam que aquilo era uma
Prostituta, uma marafona.
Pelo menos é o que havia sido
Antes de enricar e se tornar nobre.
Entrei na casa e a tal que
Agora era mencionada como
Madame Helena
Mas que eu bem sabia que
Era conhecida como Dama da Noite,
Veio me perguntar se eu era
A mãe do tal Meia-Noite.
Tive de confirmar, era por esse nome
Que meu Filippo
Era conhecido na cidade.
Ela me disse que estavam
A fazer todo o possível.
Não entendi do que se tratava,
Pedi para que me explicasse melhor.
Não houve a necessidade de explicar,
Ouvi um berro tão estridente e sofrido
Mas que imediatamente reconheci,
Era meu filho.
Ela me olhou com certa tristeza
E me levou para o andar de cima.
A mansão era belíssima,
Marmore por todo lado,
Vitrais coloridos nas janelas.
Mas a beleza da casa murchou
Quando vi os respingos de sangue
No corredor.
Entramos em um quarto
Que mais parecia o de um rei,
Mas minha atenção se pegou toda
No Homem em cima da cama.
Meu menino estava ali.
Nao era um menino, eu sei,
Era um homem tão grande que
Os pés espichavam para além
Do colchão.
Estava com o peito desnudo
Exibindo um grande corte.
Meu filho berrava a pleno e pulmões,
Berros tão altos quantos os de um urso.
Fui para o lado dele e segurei
Sua mão.

🐐 — Filippo! Filippo mamãe está aqui! Olhe pra mamãe!

Mas ele não olhou.
Estava atônito, berrando e esperneando.
Começou a bater a cabeça com força
Na cabeceira da cama,
E foi então que me dei conta
Das pessoas no quarto
Pois dois homens vieram
E o seguraram ate que parasse
De se bater.
Um eu reconheci, era Tibério,
O tal que chamavam Capa Preta.
O outro era negro mas sem feitio
De escravo, não conhecia mas logo
Se apresentou como Tiriri.
Perguntei-lhes o que estava
Se passando com meu filho,
Dama da Noite me levou para
Fora, para longe dos berros
Ensurdecedores dele
E me contou:

👑 — Escute Dona Gioconda, neste mundo existem coisas além do que se vê, além do que se conhecem. Aquele corte no peito do seu filho foi feito por alguém que entende de artes obscuras.
🐐 — O quê? Esta a me falar de coisas do diabo? Bruxaria?
👑 — É... algo assim. Aquele corte está causando uma dor gigantesca...
🐐 — Mas é um corte de um palmo, não há de morrer por isto.

Paramos de falar por um momento
Pois uma onda de berros tão alta
Nos fez não poder ouvir uma a outra.

👑 — A questão é justamente essa. A ferida não o matará, mas também não cicatrizará. A dor que ela causa não é uma dor comum, é coisa que só a feitiçaria pode provocar. Não há chá nem erva que diminua a dor, ele está assim faz dois dias.
🐐 — Quem fez isto com ele? Quem!?
👑 — Foi Maria Quitéria.

Ao ouvir o nome desci as
Escadas correndo,
Subi na charrete e fui para
A casa vermelha, o cabaré.
Dona Maria Quitéria era a chefe
De todas as prostitutas
E corria boato que era
Uma noiva do demônio.
Entrei correndo e abordei
No meio do salão.

🐐 — Desfaça! Desfaça a maldade que fez com meu filho!

Ela era belíssima
Mas ao mesmo tempo
Tinha um peso horrendo
No olhar,
Um peso que se vê em olhos
De carrasco.
Ela ja sabia quem eu era,
E não me surpreendi,
A mulher sabia de tudo.
Me puxou pelo braço até o lado
De fora para que os clientes
Não ouvissem a conversa.

🍷 — Escute velha, seu filho teve o que mereceu.
🐐 — Ele não merece isso! Desfaça! Tire as garras do demônio de cima dele!
🍷 — Como é? — ela gargalhou.
🐐 — Meu menino é uma alma de Deus, você não pode fazer isto com ele! BRUXA!
🍷 — Talvez essa sua cabecinha estúpida pinte Meia-Noite como um anjo, mas ele não é. Sabe as circunstâncias que causou-lhe o ferimento? Ele estava tentando se apossar de algo meu, algo que uso para a magia negra.
🐐 — Esta dizendo o quê? Que meu filho é como você? Sua megera!
🍷 — Ele é. Nunca estranhou o fato de ele ter quase cinquenta anos e parecer um garoto, nunca viu a pele lisa e ausencia de cabelos brancos com desconfiança? Nunca perguntou porque as pessoas tem medo dele? Nunca quis saber para que há um quarto trancado na casa dele o qual nem tu que a mãe pode entrar? Me acusa de bruxa? Hipócrita! Você pariu e criou um também! A sorte é que eu fui mais esperta. Agora vai-te embora antes que a próxima a levar um talho envenenado no peito seja tu.

Sai de lá desabalada,
Voltei para a mansão.
Dama da Noite estava lá
Segurando a mão de meu menino.
Pela primeira vez olhei para ele
E reparei os sinais incomuns.
Tinha mesmo quarenta e nove ano,
Mas tinha todos os dentes
E em ótimo estado.
Tinha a pele do rosto lisa e os lábios
Cheios tal qual na época da adolescência.
Seu cabelo louro era brilhoso como
O primeiro cabelo de um bebê.
Meu filho não era normal,
E me senti a mais estúpida
Das mulheres por nunca ter visto.
Mas independentemente de qualquer
Coisa ele era meu filho.

🐐 — Quitéria me disse... me disse que Filippo é bruxo como ela. Isso é verdade?

Os três no quarto se entreolharam
Mas nada respoderam.
Quem cala consente.
Filippo prosseguia berrando,
Batia os pés no colchão,
Revirava os olhos,
Não parava de sofrer.
Fiquei ali a noite inteira e
Em um determinado momento
Ele Tomou ciência de que
Eu estava ao seu lado.

🕛 — MÃE! MÃE FAZ ISSO PARAR! MÃE! TA QUEIMANDO!

Dama da Noite veio correndo,
Tiriri se aproximou da cama.

🐐 — A mãe ta aqui Filippo, a mãe não vai te deixar.

Ele voltou a berrar
Em um sofrimento que
Não acabava.
E então eu percebi que era mãe
E que mãe tem de fazer
O que for pelo filho.
Com muita dor beijei
As faces dele, apanhei um
Travesseiro na cama
E com força apertei contra seu rosto.
Dama da Noite se impeliu
Para frente no intento de me impedir
Mas Capa Preta a segurou.
Tiriri manteve os braços de Filippo
Imobilizados e eu...
Eu o libertei do sofrimento.
Os gritos abafados pelo travesseiro
Duraram pouco tempo.
Logo ele não se debatia mais,
Logo ele estava quietinho na cama
Como se estivesse dormindo.

Duas ou três horas depois,
Chegamos a meu sítio.
Vim na charrete trazendo
O corpo de meu menino.
Dama da Noite veio atrás
Na carruagem junto com os dois.
Capa Preta e Tiriri abriram
A cova bem perto de uma árvore
Onde eu havia feito um balanço
No qual Filippo brincava quando criança.
Enterraram, se despediram
E se foram.

O pouco de tempo de vida
Que me restou foi fria.
Dama da Noite mandava
Toda semana uma moça vir
Limpar a casa e me dar dinheiro,
E eu ficava lá sentada.
Todo dia acordava cedo
Fazia o café e ficava sentada
Na cozinha, na frente do fogão
Esperando meu Filippo chegar.
Sabia que não viria, é claro que sabia.
Mas ainda assim esperava.
Andaram com umas conversas
De que o fanstama de meu filho
Estava perambulando pela encruzilhada
Da rua do Marechal
Mas eu nunca acreditei.
Uma noite me deitei mais cedo,
Tinha muita dor nos ossos,
E uma tosse que não passava.
Me deixei e demorei a dormir
Mas quando dormi de repente
Acordei com o barulho
Da égua de Filippo, a égua Sámoça
Que ele tanto gostava.
Saltei da cama com uma agilidade
Que a muito não tinha
E quando abri a porta do quarto
Meu Filippo estava lá,
Louro, bonito com paletó e chapéu.
Sorriu pra mim e me beijou,
Então segurou em minha mão
E me levou com ele
Para um outro lugar.

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Felipe Caprini, Contos dos Maridos da Lua
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