A magia antiga ainda existe.
Foi em uma manhã muito triste
Que Norato se tornou apenas "Kainana".
Sim, antes daquele feito
Kainana não era um, eram dois,
Dois irmãos gêmeos.
A magia antiga ainda existe.
Foi em uma manhã muito triste
Que Norato se tornou apenas "Kainana".
Sim, antes daquele feito
Kainana não era um, eram dois,
Dois irmãos gêmeos.
Norato entrou na mata
A caçou um cipó fino e forte
Com ele trançou um colar
Belíssimo com penas de arara.
Enquanto trançava
Foi lembrando de toda sua vida.
Nasceu em uma tribo Tapuia
No norte da grande floresta,
Filho de uma índia com um deus.
Sim, no tempo antigo essas
Coisas aconteciam.
Norato e Maria eram filhos
De uma mulher humana
Com o deus Boiúna,
A grande cobra preta.
Boiúna era cheio dessas,
De se transformar em gente
E ir seduzir as moças,
Porém aquela foi a única vez
Que gerou filhos em alguém.
Toda a vida os gêmeos
Tinham o poder de ser gente
E de ser cobra
Tal qual o pai,
Era questão de decisão,
Ora andavam na terra com duas pernas
Ora rastejavam no leito do rio
Com corpo de serpente.
A mãe tentou criar os dois
Mas o povo da aldeia
Os queria era matar,
Tinham medo deles.
A mãe não teve alternativa
Senão por os filhos
Na margem do rio Pará
E torcer que sobrevivessem.
E é claro que sobrevieram,
Eram cobra de água
E nas aguas do rio se criaram.
Norato amava a irmã,
Com certeza a amava,
Mas Maria não era facil de conviver.
Para dizer a verdade,
Maria era um demônio,
Era má, violenta, perversa,
Fazia atrocidades.
Norato tentou com todo
O afinco educa-la,
Mas nada deu efeito.
Ele ia sempre visitar a mãe,
Mas Maria não.
Ele ajudava as pessoas que via
Em apuros no rio,
Já Maria se encontrasse
Um homem ou mulher
Nas águas... os coitados
Não sobreviveriam,
Os tinha prazer em matar.
Certa vez havia uma pequena canoa
Com três crianças navegando
Pelo rio Madeira.
Norato viu da margem,
percebeu que os três
Não tinham muito jeito,
Remavam errado
E se mexiam demais,
Se continuassem daquela forma
A canoa poderia afundar.
Então ele acabou por se
Comparecer dos pequeninos,
Se transformou em serpente,
Entrou no rio e sustentou
A canoa por baixo
Levando as crianças até a aldeia
A qual pertenciam.
Isso se repetiu muitas vezes,
Norato via as crianças no barco
E em forma de cobra
Os ajudava sem que percebessem.
Mas um dia a canoa não passou.
É, Norato já havia se habituado
Com o horário dos meninos
Passarem remando,
Mas naquele dia não vieram.
Então ele começou a ouvir
Os gritos ao longe,
Gritos agudos e desesperados.
Norato se transformou em cobra
E nas águas do rio nadou
O máximo que pode
Na maior velocidade que conseguia
Ate que os encontrou.
Sim, encontrou a água vermelha
E os pedaços das crianças espalhados
Pela água.
Ao observar a margem
Viu que havia outra serpente
Como ele,
E esta outra ainda tinha o braço
De um menino preso a boca.
Maria não comia carne de gente
Ela só comia carne de bicho,
Quando matava gente
Só matava por gostar.
Norato se sentiu horrorizado
E profundamente enojado da irmã.
Há decisões que são duras
Mas que tem de ser tomadas.
Então sorrateiramente ele foi para a
Outra margem e se tornou homem,
Ali caçou um cipó fino e forte
Com ele trançou um colar
Belíssimo com penas de arara.
Quando estava pronto
Foi até a irmã.
Maria era cobra
Mas ao ver o presente
Tomou a forma de gente
Para que o irmão pudesse
Lhe por o colar.
Norato assim vez,
Foi por trás e prendeu
O colar no pescoço fino dela,
E então invés de prender no fecho
Ele deu um nó e apertou com força.
Maria tentava se desvencilhar
Arfando a ponto de não conseguir dizer nada,
Apenas gemia e se debatia,
Mas Norato não afroxou,
Apertou a corda do colar
Com toda a força que tinha
Até a irmã parar de se mover,
Até que o corpo dela se tornasse
Flácido,
Até que estivesse morta.
Norato fez o que era certo,
E só deus sabe quantas
Vidas salvou ao tirar
A vida de Maria.
Porém seria mentira
Dizer que ficou tudo bem.
Não, Norato ficou mal,
Ficou triste por ser sozinho
Ficou triste por ter matado
Sua alma gêmea.
E foi assim até o dia em que morreu.
E como ele morreu?
Pergunte a Tranca Ruas,
Pois foi na ponta da faca
Daquele homem
Que Norato perdeu a vida.
Mas após a sua morte
Se sabe que foi chamado
Por gente que sabia de seu nome,
De sua lenda.
Primeiro se tornou encano,
Espírito da Mata,
Mas hoje Norato é conhecido como
Exu Kainana,
E ainda é meio homem
Meio cobra,
Mas ainda é aquele ser bom.
Bem, ele é bom quando
São bom pra ele,
Afinal ele ainda é cobra.
Porém meus amigos
Ha outra coisa a se dizer,
Tenham muito cuidado
Pois Maria Kainana
Ainda assim como o irmão
Também anda por ai
Em forma de espírito,
E essa... dessa até o diabo tem medo.
Saravá os Kainana!
Saravá Exu Kainana!
Felipe Caprini, Contos dos Maridos da Lua
Espero que tenham gostado!
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