Em 1991, quando eu tinha oito anos
Minha mãe se casou novamente.
meu pai havia falecido
já a alguns anos
E ela resolveu refazer a vida.
Só que as circunstâncias
Desse novo relacionamento
Eram muito estranhas.
Em 1991, quando eu tinha oito anos
Minha mãe se casou novamente.
meu pai havia falecido
já a alguns anos
E ela resolveu refazer a vida.
Só que as circunstâncias
Desse novo relacionamento
Eram muito estranhas.
Minha mãe era professora
Na rede pública aqui de São Paulo,
Era umbandista e trabalhava
Com a Pombagira das Sete Saias.
Nós tinhamos nossa vida
toda organizada,
Nossa casa, nossa rotina.
Mas quando aquele homem
Entrou na nossa vida
tudo mudou, foi de repente,
Em seis meses minha mãe
Largou o emprego, a religião,
Vendeu a casa, se casou e
nos mudamos para uma cidadezinha
No interior do estado
Chamada Barra Bonita.
E foi assim, do dia pra noite
Minha mãe se tornou
uma dona de casa submissa.
Meu padrasto, Manuel,
Nos colocou em uma
Chácara perto da rodovia
Isolada de tudo.
Certo dia eu cheguei da escola
E encontrei minha mãe
deitada, isso lá para o meio dia.
Quando fui ver se ela estava
Bem, vi que seu rosto estava
Inchado e escuro.
Aquele foi a primeira surra
Que ela levou.
Toda vez que Manuel tinha
As crises de nervosismo
ele espancava a minha mãe
E ela ficava ali, inerte,
Apanhando como uma boneca
Sem vida.
Muitas vezes eu pedi pra que
Ela voltasse para São Paulo,
Mas ela não ouvia.
Minha mãe vivia com o corpo
Marcado.
E então ela teve o primeiro bebê
Em 1993, uma menina que
Chamou de Michele,
Em 1995 teve um menino
Que chamou de Carlos.
Os dois partos foram feitos
Em casa por uma parteira
da região, minha mãe
não fez pré natal e nem
Registrou as crianças.
Ela era proibida de cruzar
a porteira da chácara
e obedecia isso mesmo
Quando Manuel não estava lá.
Então certo dia ele
Foi para a cidade trabalhar
E ficamos na chácara sozinhos.
Era de tarde quando mamãe
Estave estendendo roupas
No varal e ouviu alguém
chamar lá na porteira.
Ela foi ver quem era, e eu
Fui junto.
Na porteira tinha uma mulher
muito estranha, hoje
Eu sei que aquelas roupas
que vestia era porque se
Tratava de uma senhora cigana.
Minha mãe perguntou o
Que ela queria e a cigana disse:
— Eu sei ler o destino na mão das pessoas. Gostaria que eu lesse a sua sorte?
Minha mãe sorriu delicadamente:
— Desculpe mas eu não tenho dinheiro.
— Você me paga outro dia, está bem? Vamos, não se acanhe...
Então minha mãe passou a mão
pela grande do portão,
Mas a mulher não pegou na
Mão dela, o que faz foi agarrar
O braço de minha mãe e a
Puxou com força a fazendo
bater contra o portão.
Minha mãe perguntou o que
Estava acontecendo,
Mas a velha cigana apenas
aproximou o
Rosto do portão e olhou no
Fundo dos olhos de minha mãe.
E ai eu ouvi minha
Mãe dar um grito
Tão alto que achei que
Ela estava sendo machucada,
Mas quando olhei para o
Portão a cigana ja tinha virado
as costas e estava indo embora.
Mas a minha mãe estava totalmente
fora de si, ela olhava em volta,
Depois olhava para as próprias
mãos e para as roupas
que estava vestindo
como se não entendesse
Como tinha chegado ali.
Tempos depois ela me contou
Que nos olhos daquele cigana
Ela viu a imagem de si mesma
Refletida, e ali a amarração
Que Manuel tinha feito se quebrou.
Sim, o que fez minha mãe
Mudar tanto foi a amarração,
Um feitiço imundo.
Minha mãe ficou na ponta dos pés
e olhou por cima do portão,
Então gritou:
— Obrigada! Muito obrigada!
E a cigana se virou e gritou, pois ja estava um pouco longe:
— Quando estiver na estrada, eu vou contigo!
E quando eu fui ver onde
A cigana estava, ja não vi nada,
Ela sumiu no meio da estrada.
Naquela noite mamãe fez o jantar
E Manuel dormiu na sala vendo
Televisão, e ali eu vi ela tirar
algumas notas da carteira dele,
Coisa como 10 ou 15 reais.
E durante a semana ela fez
Isso todos os dias.
Mas Manuel deu falta do dinheiro,
E desconfiou de mim.
Sem nem ter certeza ele me deu
Uma surra tão intensa que eu
Desmaiei de tanto levar socos.
E eu só tinha 13 anos.
Quando eu acordei, mamãe tinha
Me colocado na cama,
E logo que abri os olhos ela
Começou a brigar comigo
Perguntando onde estava o dinheiro.
Manuel gritou lá da sala
— Se ele não falar até amanhã de manhã, quando eu acordar queimo a mao dele na boca do fogão, pra aprender a não roubar.
Mamãe concordou com ele
E então rapidamente abaixou
e susssurrou no meu ouvido:
— Fica acordado, não durma por nada, entendeu? Agora vá lá, tire o lixo da cozinha
E coloque na lixeira.
Eu fiz que sim
E ela saiu do quarto.
Eu joguei o lixo na lixeira
Na frente do portão e o tranquei,
Depois voltei e coloquei a chave
Em cima da mesa da cozinha.
Passava da meia noite
Quando ela abriu a porta
Bem devagarinho
E sussurrou:
— Não faz barulho, me ajuda com Michele.
Peguei michele no colo,
Mamãe pegou carlos no berço,
Então sem fazer barulho
Ela abriu a janela da sala
E nós pulamos.
Bem devagarzinho
Mamãe pegou uma chave no bolso
E Abriu o portão da chácara.
Passamos com cuidado.
Assim que saimos
Mamãe foi ate o saco
De lixo que eu tinha colocado
la fora, o rasgou e tirou
de dentro uma Sacola
Com a mamadeira do bebê,
Um casaco para cada um de nós
e o dinheiro.
Mas assim que demos
Alguns passos o
O bebe acordou e começou
a chorar.
Mamãe deu a chupeta
E ele parou, mas quando
olhamos para a casa
Vimos que a luz da
Sala estava acesa.
Manuel acordou.
Mamãe olhou para mim,
Me deu o bebe, que era
Mais leve e pegou Michele
No colo, então me mandou
correr o mais rapido que podia.
E nós corremos
Pela rua de terra,
Corremos tanto que mamãe
perdeu os chinelos
e começou a correr descalça.
Perguntei para onde nós íamos
E ela disse:
— A rodovia!
Então corremos na direção
Do fim da rua,
Onde ja conseguiamos ver
As luzes dos caminhões passando.
Mas ai ouvimos
O som da moto de Manuel,
E a luz amarela do farol
Nos atingiu.
Mamãe mandou não desistir,
Mas disse:
— Se ele me pegar, você tem que continuar! Tem que fugir!
Manuel veio rasante com
A moto do nosso lado e
Agarrou o cabelo de minha mãe,
Então puxou com força a fazendo
cair, michele rolou no chão
de terra e eu a ajudei a levantar.
Mas eu não consegui fugir,
Estava muito assustado
então fiquei parado.
Ele desceu da moto e começou
Espancar a minha mãe,
E ai mamãe começou a pedir ajuda.
Ela gritava por ajuda, mas eu
Percebi que não estava pedindo
ajuda nem minha nem de ninguém
que estivesse na região,
Ela pedia ajuda de alguém
que só ela conhecia.
Então no meio da violência
Manuel tropeçou no pedal
Da moto e caiu para trás,
Assim do nada ele simplesmente
Tombou como se tivesse levado
um empurrão,
Nessa hora mamãe correu na minha
Direção apontando para a estrada.
Eu entendi que era para correr
De novo, mas a figura do rosto
Da minha mãe com metade
Coberto por sangue e poeira
é uma coisa que eu nunca vou
Esquecer.
Comecei a correr e ela veio
Logo do meu lado,
Pegou michele no colo
E corriamos o maximo
que podiamos.
Então mamãe começou a murmurar
Pedindo ajuda novamente.
Ate hoje me lembro
de como meu corpo se arrepiou
Inteiro nessa hora.
Então ouvimos o som
Da moto se aproximando,
Manuel estava se chegando perto
Enquanto gritava que quando
Nos pegasse ia nos matar,
Que ia jogar gasolina em nós
e atear fogo.
E nós não paramos de correr,
Eu já sentia dor do lado
do corpo por correr tanto.
E ai Manuel nos alcançou,
E... simplesmente passou direto.
Eu cheguei a olhar para
O lado e ver a expressão
de furia que ele tinha,
Mas ele olhava para frente
Enquanto gritava aquelas
ameaças, ele parecia estar
Realmente perseguindo alguém
Lá na frente, e simplesmente
passou por nós como
Se não tivesse visto ninguém ali.
Nós paramos de correr
E vimos ele chegar na rodovia,
Parar a moto e ficar olhando para
Os lados como se nos procurasse.
Ele chegou a olhar para trás
Mas o olhar dele não pousou
Em nós.
Ele deu partida na moto
E entrou na rodovia
ainda em perseguição.
Quando eu olhei para a minha
Mãe ela estava sorrindo,
Mesmo com sangue escorrendo
pelo canto da boca ela sorria
e as vezes balbuciava "obrigada"
Falando com alguém que eu
Não conseguia ver.
Nós voltamos a correr,
Chegamos a rodovia
E começamos a correr pelo
Acostamento, mamãe agitando
Uma mão no ar pedindo carona,
Mas os caminhões passavam
Muito rápido.
Então um caminhão que já
Tinha passado por nós
parou uns cem metros a frente.
Corremos ate ele, o caminhoneiro
Abriu a porta a olhou para nós
espantado.
Estávamos sujos e mamãe
cheia de hematomas e de sangue
Escorrendo pelo rosto.
— A senhora está bem?
Mamãe estendeu a
Mão tremula para ele
Mostrando as notas de dinheiro.
— Por favor, eu preciso de uma carona, eu posso pagar, por favor moço, eu preciso tirar meus filhos daqui!
— Bom... eu to indo para o terminal de cargas de São Paulo, na Fernão Dias, serve?
— Sim! Sim por favor!
— Mas aqui na boléia so cabem você e as crianças.
— Mas só somos nós mesmo.
Então o caminhoneiro
Esticou o pescoço tentando
olhar atrás de nós.
— Mas e aquela mulher que tava com vocês? Aquela bem bonitona? Sumiu?
Então minha mãe abriu
Um sorriso largo.
— Ela... ela vai encontrar a gente em São Paulo.
O caminhoneiro deu
De ombros, nós entramos
Na boléia e ele nos
levou até São Paulo.
Por uma extrema gentileza
Ele não aceitou o dinheiro,
Então quando chegamos
na cidade tivemos como
Comer e pegar alguns ónibus
ate chegar na casa da
Minha vó.
Minha mãe refez a vida dela,
Voltou a ser professora, e
Principalmente voltou para
A fé.
E primeira vez que vi ela
Incorporada com Sete Saias
Depois que voltamos para
São Paulo foi mais ou menos
um mês depois.
No terreiro eu vi mamãe
vestida com aquela roupa
Linda, e quando ela incorporou
eu senti meu corpo arrepiar
Inteiro.
E ai eu percebi que o arrepio
foi idêntico ao que senti
Naquele estrada de terra.
Com um pouco de timidez
eu perguntei a ela:
— Era você? Era você a pessoa que ajudou a gente naquela noite?
Então ela sorriu para mim
E disse:
— Quando estiver na estrada, eu vou contigo.
Memorias de Terreiro, Arte e texto por Felipe Caprini
Espero que tenham gostado
Não copie o texto ou reposte a arte sem dar os créditos! Seja Honesto!
Minha mãe se casou novamente.
meu pai havia falecido
já a alguns anos
E ela resolveu refazer a vida.
Só que as circunstâncias
Desse novo relacionamento
Eram muito estranhas.
Minha mãe era professora
Na rede pública aqui de São Paulo,
Era umbandista e trabalhava
Com a Pombagira das Sete Saias.
Nós tinhamos nossa vida
toda organizada,
Nossa casa, nossa rotina.
Mas quando aquele homem
Entrou na nossa vida
tudo mudou, foi de repente,
Em seis meses minha mãe
Largou o emprego, a religião,
Vendeu a casa, se casou e
nos mudamos para uma cidadezinha
No interior do estado
Chamada Barra Bonita.
E foi assim, do dia pra noite
Minha mãe se tornou
uma dona de casa submissa.
Meu padrasto, Manuel,
Nos colocou em uma
Chácara perto da rodovia
Isolada de tudo.
Certo dia eu cheguei da escola
E encontrei minha mãe
deitada, isso lá para o meio dia.
Quando fui ver se ela estava
Bem, vi que seu rosto estava
Inchado e escuro.
Aquele foi a primeira surra
Que ela levou.
Toda vez que Manuel tinha
As crises de nervosismo
ele espancava a minha mãe
E ela ficava ali, inerte,
Apanhando como uma boneca
Sem vida.
Muitas vezes eu pedi pra que
Ela voltasse para São Paulo,
Mas ela não ouvia.
Minha mãe vivia com o corpo
Marcado.
E então ela teve o primeiro bebê
Em 1993, uma menina que
Chamou de Michele,
Em 1995 teve um menino
Que chamou de Carlos.
Os dois partos foram feitos
Em casa por uma parteira
da região, minha mãe
não fez pré natal e nem
Registrou as crianças.
Ela era proibida de cruzar
a porteira da chácara
e obedecia isso mesmo
Quando Manuel não estava lá.
Então certo dia ele
Foi para a cidade trabalhar
E ficamos na chácara sozinhos.
Era de tarde quando mamãe
Estave estendendo roupas
No varal e ouviu alguém
chamar lá na porteira.
Ela foi ver quem era, e eu
Fui junto.
Na porteira tinha uma mulher
muito estranha, hoje
Eu sei que aquelas roupas
que vestia era porque se
Tratava de uma senhora cigana.
Minha mãe perguntou o
Que ela queria e a cigana disse:
— Eu sei ler o destino na mão das pessoas. Gostaria que eu lesse a sua sorte?
Minha mãe sorriu delicadamente:
— Desculpe mas eu não tenho dinheiro.
— Você me paga outro dia, está bem? Vamos, não se acanhe...
Então minha mãe passou a mão
pela grande do portão,
Mas a mulher não pegou na
Mão dela, o que faz foi agarrar
O braço de minha mãe e a
Puxou com força a fazendo
bater contra o portão.
Minha mãe perguntou o que
Estava acontecendo,
Mas a velha cigana apenas
aproximou o
Rosto do portão e olhou no
Fundo dos olhos de minha mãe.
E ai eu ouvi minha
Mãe dar um grito
Tão alto que achei que
Ela estava sendo machucada,
Mas quando olhei para o
Portão a cigana ja tinha virado
as costas e estava indo embora.
Mas a minha mãe estava totalmente
fora de si, ela olhava em volta,
Depois olhava para as próprias
mãos e para as roupas
que estava vestindo
como se não entendesse
Como tinha chegado ali.
Tempos depois ela me contou
Que nos olhos daquele cigana
Ela viu a imagem de si mesma
Refletida, e ali a amarração
Que Manuel tinha feito se quebrou.
Sim, o que fez minha mãe
Mudar tanto foi a amarração,
Um feitiço imundo.
Minha mãe ficou na ponta dos pés
e olhou por cima do portão,
Então gritou:
— Obrigada! Muito obrigada!
E a cigana se virou e gritou, pois ja estava um pouco longe:
— Quando estiver na estrada, eu vou contigo!
E quando eu fui ver onde
A cigana estava, ja não vi nada,
Ela sumiu no meio da estrada.
Naquela noite mamãe fez o jantar
E Manuel dormiu na sala vendo
Televisão, e ali eu vi ela tirar
algumas notas da carteira dele,
Coisa como 10 ou 15 reais.
E durante a semana ela fez
Isso todos os dias.
Mas Manuel deu falta do dinheiro,
E desconfiou de mim.
Sem nem ter certeza ele me deu
Uma surra tão intensa que eu
Desmaiei de tanto levar socos.
E eu só tinha 13 anos.
Quando eu acordei, mamãe tinha
Me colocado na cama,
E logo que abri os olhos ela
Começou a brigar comigo
Perguntando onde estava o dinheiro.
Manuel gritou lá da sala
— Se ele não falar até amanhã de manhã, quando eu acordar queimo a mao dele na boca do fogão, pra aprender a não roubar.
Mamãe concordou com ele
E então rapidamente abaixou
e susssurrou no meu ouvido:
— Fica acordado, não durma por nada, entendeu? Agora vá lá, tire o lixo da cozinha
E coloque na lixeira.
Eu fiz que sim
E ela saiu do quarto.
Eu joguei o lixo na lixeira
Na frente do portão e o tranquei,
Depois voltei e coloquei a chave
Em cima da mesa da cozinha.
Passava da meia noite
Quando ela abriu a porta
Bem devagarinho
E sussurrou:
— Não faz barulho, me ajuda com Michele.
Peguei michele no colo,
Mamãe pegou carlos no berço,
Então sem fazer barulho
Ela abriu a janela da sala
E nós pulamos.
Bem devagarzinho
Mamãe pegou uma chave no bolso
E Abriu o portão da chácara.
Passamos com cuidado.
Assim que saimos
Mamãe foi ate o saco
De lixo que eu tinha colocado
la fora, o rasgou e tirou
de dentro uma Sacola
Com a mamadeira do bebê,
Um casaco para cada um de nós
e o dinheiro.
Mas assim que demos
Alguns passos o
O bebe acordou e começou
a chorar.
Mamãe deu a chupeta
E ele parou, mas quando
olhamos para a casa
Vimos que a luz da
Sala estava acesa.
Manuel acordou.
Mamãe olhou para mim,
Me deu o bebe, que era
Mais leve e pegou Michele
No colo, então me mandou
correr o mais rapido que podia.
E nós corremos
Pela rua de terra,
Corremos tanto que mamãe
perdeu os chinelos
e começou a correr descalça.
Perguntei para onde nós íamos
E ela disse:
— A rodovia!
Então corremos na direção
Do fim da rua,
Onde ja conseguiamos ver
As luzes dos caminhões passando.
Mas ai ouvimos
O som da moto de Manuel,
E a luz amarela do farol
Nos atingiu.
Mamãe mandou não desistir,
Mas disse:
— Se ele me pegar, você tem que continuar! Tem que fugir!
Manuel veio rasante com
A moto do nosso lado e
Agarrou o cabelo de minha mãe,
Então puxou com força a fazendo
cair, michele rolou no chão
de terra e eu a ajudei a levantar.
Mas eu não consegui fugir,
Estava muito assustado
então fiquei parado.
Ele desceu da moto e começou
Espancar a minha mãe,
E ai mamãe começou a pedir ajuda.
Ela gritava por ajuda, mas eu
Percebi que não estava pedindo
ajuda nem minha nem de ninguém
que estivesse na região,
Ela pedia ajuda de alguém
que só ela conhecia.
Então no meio da violência
Manuel tropeçou no pedal
Da moto e caiu para trás,
Assim do nada ele simplesmente
Tombou como se tivesse levado
um empurrão,
Nessa hora mamãe correu na minha
Direção apontando para a estrada.
Eu entendi que era para correr
De novo, mas a figura do rosto
Da minha mãe com metade
Coberto por sangue e poeira
é uma coisa que eu nunca vou
Esquecer.
Comecei a correr e ela veio
Logo do meu lado,
Pegou michele no colo
E corriamos o maximo
que podiamos.
Então mamãe começou a murmurar
Pedindo ajuda novamente.
Ate hoje me lembro
de como meu corpo se arrepiou
Inteiro nessa hora.
Então ouvimos o som
Da moto se aproximando,
Manuel estava se chegando perto
Enquanto gritava que quando
Nos pegasse ia nos matar,
Que ia jogar gasolina em nós
e atear fogo.
E nós não paramos de correr,
Eu já sentia dor do lado
do corpo por correr tanto.
E ai Manuel nos alcançou,
E... simplesmente passou direto.
Eu cheguei a olhar para
O lado e ver a expressão
de furia que ele tinha,
Mas ele olhava para frente
Enquanto gritava aquelas
ameaças, ele parecia estar
Realmente perseguindo alguém
Lá na frente, e simplesmente
passou por nós como
Se não tivesse visto ninguém ali.
Nós paramos de correr
E vimos ele chegar na rodovia,
Parar a moto e ficar olhando para
Os lados como se nos procurasse.
Ele chegou a olhar para trás
Mas o olhar dele não pousou
Em nós.
Ele deu partida na moto
E entrou na rodovia
ainda em perseguição.
Quando eu olhei para a minha
Mãe ela estava sorrindo,
Mesmo com sangue escorrendo
pelo canto da boca ela sorria
e as vezes balbuciava "obrigada"
Falando com alguém que eu
Não conseguia ver.
Nós voltamos a correr,
Chegamos a rodovia
E começamos a correr pelo
Acostamento, mamãe agitando
Uma mão no ar pedindo carona,
Mas os caminhões passavam
Muito rápido.
Então um caminhão que já
Tinha passado por nós
parou uns cem metros a frente.
Corremos ate ele, o caminhoneiro
Abriu a porta a olhou para nós
espantado.
Estávamos sujos e mamãe
cheia de hematomas e de sangue
Escorrendo pelo rosto.
— A senhora está bem?
Mamãe estendeu a
Mão tremula para ele
Mostrando as notas de dinheiro.
— Por favor, eu preciso de uma carona, eu posso pagar, por favor moço, eu preciso tirar meus filhos daqui!
— Bom... eu to indo para o terminal de cargas de São Paulo, na Fernão Dias, serve?
— Sim! Sim por favor!
— Mas aqui na boléia so cabem você e as crianças.
— Mas só somos nós mesmo.
Então o caminhoneiro
Esticou o pescoço tentando
olhar atrás de nós.
— Mas e aquela mulher que tava com vocês? Aquela bem bonitona? Sumiu?
Então minha mãe abriu
Um sorriso largo.
— Ela... ela vai encontrar a gente em São Paulo.
O caminhoneiro deu
De ombros, nós entramos
Na boléia e ele nos
levou até São Paulo.
Por uma extrema gentileza
Ele não aceitou o dinheiro,
Então quando chegamos
na cidade tivemos como
Comer e pegar alguns ónibus
ate chegar na casa da
Minha vó.
Minha mãe refez a vida dela,
Voltou a ser professora, e
Principalmente voltou para
A fé.
E primeira vez que vi ela
Incorporada com Sete Saias
Depois que voltamos para
São Paulo foi mais ou menos
um mês depois.
No terreiro eu vi mamãe
vestida com aquela roupa
Linda, e quando ela incorporou
eu senti meu corpo arrepiar
Inteiro.
E ai eu percebi que o arrepio
foi idêntico ao que senti
Naquele estrada de terra.
Com um pouco de timidez
eu perguntei a ela:
— Era você? Era você a pessoa que ajudou a gente naquela noite?
Então ela sorriu para mim
E disse:
— Quando estiver na estrada, eu vou contigo.
Memorias de Terreiro, Arte e texto por Felipe Caprini
Espero que tenham gostado
Não copie o texto ou reposte a arte sem dar os créditos! Seja Honesto!