sábado, 7 de outubro de 2023

A minha história com a espiritualidade é muito longa. Hoje sou um homem já com quase cinquenta anos, mas o acontecido se deu quando eu era bem novo

 A minha história com a espiritualidade é muito longa.
Hoje sou um homem já com quase cinquenta anos, mas o acontecido se deu quando eu era bem novo


Nenhuma descrição de foto disponível.
A minha história com a espiritualidade é muito longa.
Hoje sou um homem já com quase cinquenta anos, mas o acontecido se deu quando eu era bem novo.
Fui um menino criado com muito amor, mas quando eu tinha doze anos de idade minha mãe foi acometida por tuberculose e dentro de meses ela acabou falecendo.
Na vida era só eu e ela, a família era desestruturada então sempre que eu perguntava quem era meu pai ou onde estavam os meus avós e tios nunca tive respostas.
Morávamos de aluguel então quando minha mãe morreu fui levado até um abrigo temporário.
Pense numa criança de doze anos órfã sem ninguém no mundo? A revolta era muito grande e isso ocasionou muitas brigas dentro daquele abrigo pois eu não aceitava as ordens dos tutores.
Houve um momento em que uma das tutoras acostumadas a espancar os órfãos tentou me castigar da mesma maneira e eu reagi. Já não era tão pequeno para idade e ao tirar o cinto na mão dela a tutora apenas sorriu para mim e disse que no dia seguinte eu ia ter uma surpresa.
E dito e feito, no dia seguinte para na porta do abrigo uma Kombi, sou levado então até o fórum da Barra Funda e fico lá por meia hora sem falar com ninguém apenas me colocaram numa sala de espera, e logo depois vem uma assistente social fica do meu lado e diz que eu havia manifestado comportamento violento, que a tutora havia relatado comportamento malicioso e violento da minha parte e isso era incompatível com as outras crianças daquele abrigo e que portanto era necessário eu estar em um ambiente de correção social.
Eu não entendi muito bem o que se tratava até que ela falou:

👱🏼‍♀️— O Estado considera que mesmo com a sua pouca idade você precisa ir para a Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor, lá você vai ser bem acolhido e terá estudo e um curso profissionalizante durante o tempo que estiver ali. Poderá também passar por processos de adoção é claro.

Então o homem que estava junto comigo na Kombi pegou das mãos dessa assistente social uma série de documentações e me chamou, entramos no carro e assim que fechou a porta ele me disse:

🧑🏽‍🦳— Você sabe para onde está indo?

Eu sem ter muita ideia apenas repeti o que a assistente social tinha dito:
👦🏿— Vou para a Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor.

🧑🏽‍🦳— Sim, você vai para a FEBEM.

Naquele instante um arrepio percorreu meu corpo, eu não tinha juntado a sigla a princípio mas quando ele disse eu percebi que estava indo para o inferno.
Quem é de São Paulo e já tem uma certa idade se lembra muito bem que Febem era um presídio infantil, eu me refiro a de fato um presídio com tudo o que uma cadeia para homens adultos tem.
Durante o trajeto até o bairro do Tatuapé eu ficava me lembrando da reportagens que via na TV das rebeliões que aconteciam na Febem e de tantas mortes inexplicadas que aconteciam lá.
Chegando no complexo fui colocado em o que era chamado quarto coletivo mas que tinha colchões no chão e barras de Ferro nas portas e janelas, ou seja fui colocado em uma cela com outros trinta meninos de idade aproximada. A princípio eu não compreendi porque é que eu estava lá, pelo que tinha ouvido e visto nos noticiários a Febem era um local para menores que haviam cometido crimes. Mas não demorou muito para perceber que a cor da pele da maioria dos que estavam ali era igual a minha, a Febem eram depósito de crianças negras.
E ali no meio de fato haviam muitos criminosos convivendo com crianças que não tinham feito absolutamente nada mas que apenas eram consideradas indesejadas pela sociedade.
Entrei lá em 1987 como um menino de rosto redondo e muito bem cuidado, seis meses depois eu havia me tornado uma criança magra cheia de cicatrizes pelo corpo e com medo de tudo.
Eu nunca fui um valentão e por isso ali dentro apanhava de basicamente todo mundo, eram surras, porradas mesmo que vinham dos outros internos, dos carcereiros, dos Professores, e até mesmo dos enfermeiros.
Fazia seis meses que estava ali e toda noite antes de dormir éramos obrigados a rezar pois era uma instituição católica mesmo sendo pública, mas conforme o tempo foi passando fui me lembrando da Fé que aprendi dentro de casa.
Minha mãe durante toda a vida foi da Umbanda e trabalhou muito com uma entidade em especial, uma malandra chamada Maria navalha.
Toda vez que o padre passava pelos corredores observando se estávamos todos rezando dentro de nossas celas, ele com certeza me via ajoelhado do lado do meu colchão com os olhos fechados rezando mas na realidade não era para Deus que eu rezava, eu rezava para Maria Navalha.
Eu sei que isso parece muito estranho afinal de contas a gente não faz orações para entidades mas compreendam que eu era uma criança que não conseguia desassociar a figura da entidade da figura da minha mãe, como desde muito cedo eu vi minha mãe incorporando e trabalhando da espiritualidade, na verdade até de uma maneira um pouco despropositada eu acreditava que Maria navalha era parte da minha mãe.
Então eu me apeguei naquela fé porque no fim a fé era a única coisa que eu ainda tinha, e todas as vezes que os meninos mais velhos me espancavam, todas as vezes que um dos Funcionários me levava para o banheiro de madrugada para fazer coisas horríveis comigo, todas essas vezes eu fechava os meus olhos e pedia para que Maria navalha viesse me socorrer.
Então chegou um dia que um rapaz mais velho que tinha seus dezesseis anos e que por uma questão de desorganização foi parar na mesma cela que eu avisou a todos nós que tinha um plano para fazer uma fuga mas que iria precisar da cooperação de todo mundo.
Eu tinha muito medo dessa história de fuga pois nós sabíamos que em outras vezes quando outros meninos tentaram fugir muitos acabaram sendo mortos, a polícia militar era chamada e saía percorrendo as ruas em volta da fundação atirando nos fugitivos e depois recolhia os corpos e colocava dentro da FEBEM dizendo que os meninos tinham matado uns aos outros em uma guerra de gangues, e eu sabia que sendo pequeno e fraco não teria chance e que se eu participasse de uma fuga eu iria acabar morto.
Mas o dia chegou e a fuga estava armada para as dez da noite quando as luzes apagam, então foi combinado de muitos ali fazerem a fuga por quê aquele rapaz que estava organizando tudo precisava de uma grande quantidade de meninos correndo para causar distração enquanto ele tinha já um destino certo.
A primeira vista eu disse para ele que eu não ia participar, mas ele colocou um estilete no meu pescoço e disse que se eu tinha medo de morrer na Fuga ele já fazia o serviço ali mesmo para antecipar, então sem alternativa abaixei minha cabeça e concordei que iria fugir junto com ele.
Deu dez horas da noite e a agitação começou, não me perguntem como mas os rapazes mais velhos conseguiram abrir as portas das celas então de repente no corredor estava todos os meninos juntos em uma agitação muito doida, conseguiram render dois guardas e dali a pouco um deles grita que o portão de fora estava aberto pois tinham conseguido arrombar todos os portões até a saída, eu não faço ideia de como isso aconteceu porque não participei de planejamento afinal de contas eu só era um peão no jogo deles mas quando ele mandou correr todos nós corremos para fora.
Sai na rua feito um doido correndo até chegar em vielas mais para frente e depois correndo ainda mais junto com outros meninos, cada um indo para um canto diferente.
Então eu vejo brilhar no asfalto aquela luz vermelha piscando, era uma viatura da Rota que vinha atrás de nós.

Continuei correndo o mais rápido que podia mas as minhas pernas eram lentas, então entrei em um beco e outros rapazes entraram junto comigo pois tentávamos nos esconder.
Ali eu escuto o primeiro disparo.
Um grito abafado e o menino de treze anos chamado Jorge que era meu colega de cela caiu pouco mais n frente com tiro na nuca.
Então o outro disparo e outro e outro e todos os rapazes foram caindo e eu continuava correndo Mas de repente senti como se alguém me empurrasse e cai no chão, caí junto com outros corpos de meninos já mortos.
E foi nesse momento que algo surpreendente aconteceu.
Eu ouvi uma voz de mulher sussurrando no meu ouvido

"Fica de olho fechado, prende a respiração"

Imediatamente obedeci e fechei os meus olhos e parei de respirar, então senti dedos finos passando em cima do meu rosto e dos meus braços, uma coisa úmida e quente se espalhando sobre a minha pele.
Ouvi o som das botas pesadas dos policiais e também o chiado do cão farejador que farejava corpo por corpo vendo se os meninos estavam vivos.
Senti o bafo daquele cachorro pastor alemão no meu pescoço e sabia que ele iria delatar que eu estava com o coração batendo, mas o cachorro simplesmente me farejou e depois seguiu adiante sem dar sinal nenhum.
Ouvi os policiais falando que tinham que seguir pois tinha mais moleques escorrendo logo à frente e que eles tinham que pará-los, e um dos policiais avisando no rádio que os corpos estavam ali naquele beco e que alguém tinha que vir com a Kombi da FEBEM para pegar.
Os policiais saíram do beco eu ainda de olhos fechados ouvi o som dos passos se afastando Então aquela voz de mulher gritou no meu ouvido

"CORRE!"

Eu me levantei e saí correndo, corri por ruas que eu não sabia quais eram nem sabia para onde estava indo, e tinha muito medo da polícia me achar pois agora eu estava só e sabia que se os policiais me encontrassem eles não iam só dar um tiro na minha cabeça porque todos sabiam que quando os policiais pegavam o menino fugitivo sozinho ele gastava um tempo numa morte bem demorada.
Mas eu continuei correndo mesmo quando começou a chover, e corria sem parar mesmo já tendo perdido os meus chinelos continuei correndo descalço sem ter a menor ideia de para onde estava indo. Mais de uma hora eu corri por ruas escuras onde haviam apenas bares abertos, corri até que fiquei tão cansado e desesperado que parei de correr e só andava devagarzinho.
Vocês não tem ideia de como é se sentir sozinho no mundo você olhar em volta e não ter a menor ideia de para onde deve ir ou o que deve fazer porque não tem ninguém por você.
Caminhando mais um pouco eu entrei em mais uma viela e vi uma casinha com uma luz acesa e três mulheres na porta e meu coração ficou gelado porque duas daquelas mulheres estavam usando aquelas roupas de baiana armadas igual eu via as amigas da minha mãe usando na macumba, e no meio delas tinha uma mulher já um pouco idosa mas que usava uma calça branca e uma camisa listrada de vermelho e branco com um chapéu Panamá na cabeça, e só de olhar eu sabia quem era aquela entidade.
Quando eu fui me aproximando ouvi uma daquelas mulheres de roupa de baiana reclamando:

👩🏼‍🦰— Mas o que tanto a senhora quer aqui fora? Vamos entrar logo dona Navalha, o povo lá dentro está te esperando...

E aquela outra mulher de chapéu Panamá apenas respondeu que tinha que esperar mais um pouco porque alguém estava chegando.
Fiquei meio sem jeito mas acabei me aproximando delas, imediatamente as duas moças vestidas de roupa de baiana deram um pulo para trás e gritaram assustadas. Não tiro a razão delas de terem gritado pois naquele momento onde eu estava deitado no chão de olhos fechados e senti dedos passando pelo meu rosto e pelos meus braços não tinha reparado mas haviam marcas de sangue por todo o meu corpo, não era meu sangue e sim de outra pessoa mas que parecia ter sido colocado ali em mim para simular que eu estava morto.
Acredito que naquele momento naquela noite chuvosa eu devia estar muito assustador vestindo uma roupa cinza da instituição e com o corpo coberto de manchas vermelhas escorrendo de sangue pela água da chuva que já me lavava.
Mas Maria navalha deu dois passos para frente deixando a chuva lhe atingir e abrir os braços para mim.
Como uma pessoa que se agarra a único Fio de Esperança que se apresenta eu corri para ela e abracei forte, e ela me abraçou de volta enquanto passava a mão pelas minhas costas dizendo:

🃏— Calma, agora já acabou.

Ela me colocou para dentro do terreiro e todos ali que estavam numa gira de malandros ficaram muito assustados quando me viram entrar daquele jeito, mas Zé Pilintra veio junto e disse alto que aquela casa era dele e de Maria Navalha e que pelo pedido de uma amiga eu iria passar uns tempos ali.
É claro que todo mundo ficou com medo de mim porque naquela época a Febem era muito popular todos sabiam o tipo de gente que estava lá e o meu uniforme da instituição com a sigla bordada na calça causou espanto pois o pessoal achou que eu era um bandido.
Muito a contra-gosto uma cambona da casa foi designada para trazer para mim roupas novas e me indicaram onde era o banheiro, e eu estava totalmente sem entender nada mas fui tomar banho e me vesti e quando sair Maria navalha estava lá no salão sentada e na frente dela uma daquelas mesas de lata igual mesa de bar aonde tinha em cima a cerveja que ela estava tomando mas também havia um prato coberto com papel alumínio.
A cambona me disse que momentos antes havia havido uma confraternização e todos haviam comido mas como a comida era pouca Maria Navalha ordenou que fizesse um prato e a cambona não entendeu porque já que a entidade não come, mas ainda assim obedeceu, e agora ela entendia que o prato era para mim.
Fazia muito tempo que não comia uma comida tão boa mas eu comi calado com medo de que depois daquilo fossem me pôr para fora.
Quando a festa acabou e todos foram embora Maria navalha foi conversar com uma moça que era filha carnal daquela médium onde a própria Navalha estava incorporada, elas duas eram mulheres sozinhas que moravam ali, então navalha convenceu aquela moça de me abrigar.
A moça ficou com muito medo então me colocou para dormir dentro do quarto da Maria Navalha que era onde ficava o assentamento dela, aquele era um quarto que tinha tranca na porta porque o pessoal tinha medo de alguém entrar e mexer Então me trancaram lá dentro para passar a noite.
No meio da noite eu acordei com frio e acabei indo mexer nos panos que tinham ali perto, e eu peguei um paletó branco que era da Navalha, e por aquele momento que eu percebi quem é que tinha me levado até aquele lugar, isso porque o cheiro daquele paletó era o cheiro da minha mãe.
Muita coisa aconteceu ali mas Maria Navalha conseguiu convencer a médium, uma mulher de uns sessenta nos chamada Mariana a tomar conta de mim.
Hoje em dia vocês sabem que existe muita burocracia com documentação mas lá no final dos anos oitenta a coisa no Brasil corria solta, então o que aconteceu foi que eu levei Dona Mariana até a casa que eu morava com a minha mãe, o dono do imóvel Vendeu tudo que tinha dentro para pagar os meses de aluguel que estavam atrasados, todos os móveis e eletrodomésticos se foram mas ele deixou uma mala grande com as minhas roupas e uma caixa de papelão enorme com fotografias e todos os documentos.
O sobrenome da minha mãe era Silva e o de Dona Mariana também era, afinal de contas é o sobrenome mais popular do país, então sem precisar provar parentesco Dona Mariana simplesmente me levou para escola e me matriculou, o pessoal da secretaria achou que ela fosse minha tia ou algo assim.
O fato de eu ser um fugitivo da Febem nunca apareceu na minha vida, e vocês sabem que isso é algo impossível de acontecer pois o indivíduo que é foragido de uma instituição penal deve ser marcado por isso mas Dona Maria Navalha sabe o que faz.
Morei naquele terreiro até os meus vinte e um anos quando eu saí de lá para me casar.
Nunca mais apanhei, nunca mais me senti abandonado.
Hoje eu sou o guarda civil Metropolitano, sou Ogã de Dona Maria Navalha e para sempre serei amigo dela.
Dona Mariana já faleceu, mas eu ainda cuido do assentamento da Malandra dela.
Como eu poderia pagar tudo o que ela fez por mim?
Jamais Pagarei.
Mas sempre terei ela como minha melhor amiga.

Saravá Dona Maria Navalha!

♠️♥️♦️♣️🃏🗡🃏♣️♦️♥️♠️
Arte e texto por Felipe Caprini
♠️♥️♦️♣️🃏🗡🃏♣️♦️♥️♠️
Espero que tenham gostado!
Não copie o texto ou reposte a arte sem dar os créditos! Seja Honesto!
♠️♥️♦️♣️🃏🗡🃏♣️♦️♥️♠️
Quer saber sobre os mistérios da vida? Sobre sobre os seus caminhos?
Ou descobrir quem são suas entidades?
Venha jogar Tarô comigo!
O jogo custa 35,00 e dá direito a 5 perguntas em até uma hora.
Me chame no whatsapp
11944833724
Ou simplesmente clique no link:
https://wa.me/message/3AXPJWLXRT4QM1