segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Zélio Fernandino de Moraes precursor da Umbanda

 

 Zélio Fernandino de Moraes precursor da Umbanda


Pode ser uma imagem de uma ou mais pessoasZélio Fernandino de Moraes precursor da Umbanda, é considerado por muito assim como Alan Kardec, um dos intermediários escolhidos pela Espiritualidade para divulgar o espiritismo, Pai Zélio foi amorosamente selecionado para revelar ao Brasil e ao mundo a formação de uma nova religião: a Umbanda.

Zélio nasceu aos dez dias do mês de abril de 1891, no distrito de Neves, município de São Gonçalo – Rio de Janeiro.

Dizem que sua mãe, D. Leonor de Moraes, levou Zélio a uma curandeira chamada D. Cândida, figura conhecida na região onde morava e que incorporava o espírito de um Preto-Velho chamado Tio Antônio que, depois de fazer as suas rezas ao rapaz, disse-lhe que possuía o fenômeno da mediunidade e deveria trabalhar procurar um centro espírita para trabalhar com a caridade.

Contam que A Federação era presidida pelo Senhor José de Sousa, chefe de um departamento da Marinha chamado Toque Toque, o que deixou a família de Zélio mais confortável, pois sabia tratar-se de alguém de reputação ilibada. Ali mesmo, na Federação, Zélio de Moraes agitou-se e teve outro de seus “ataques” que os familiares tanto temiam.
O presidente, através da clarividência, logo percebeu que se tratava do fenômeno da incorporação involuntária, já que o médium não tinha controle consciente sobre o fenômeno.

O próprio Zélio contava que no dia posterior (16 de novembro de 1908), pós a aparição do Caboclo das Sete Encruzilhadas na federação espírita ocorreu o seguinte:
– “Minha família estava apavorada, eu mesmo não sabia explicar o que se passava comigo. Surpreendia-me haver dialogado com aqueles austeros senhores de cabeça branca,
em volta de uma mesa onde se praticava um trabalho desconhecido para mim. Como poderia, aos dezessete anos, organizar uma religião? No entanto, eu mesmo falara, sem saber o que dizia e por que dizia. Era uma sensação estranha: uma força superior que me impelia a fazer e a dizer o que nem sequer passava pelo meu pensamento.

Quando perguntaram ao Pai Antônio se ele precisava de algo e ele disse: – “Minha caximba. Nêgo qué o pito que deixou no toco, manda muleque busca.”

Esta frase originou o ponto cantado com este texto. No dia seguinte, todos trouxeram cachimbos para o Preto-Velho, sendo a solicitação do primeiro elemento material de trabalho dentro da Umbanda. Foi Pai Antônio também a primeira entidade a solicitar uma guia até hoje usadas pelos membros da Tenda e carinhosamente chamada de “Guia de Pai Antônio”. Em suas sessões, todos trabalhavam com os pés descalços, não utilizavam atabaques, nem quaisquer outros objetos e adereços, como cocares ou capas. Os atabaques começaram a ser usados com o passar do tempo por algumas das Tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, mas nunca na Tenda Nossa Senhora da Piedade.

O pai de Zélio frequentemente era abordado por pessoas que queriam saber como ele aceitava tudo isso que vinha acontecendo em sua residência. Sua resposta era sempre a mesma, em tom de brincadeira, respondia que preferia um filho médium em lugar de um filho louco. Foi um trabalho árduo e incessante para o esclarecimento, difusão e sedimentação da Umbanda.

Em 1913, cinco anos após o Caboclo Sete Encruzilhadas ter se manifestado, e por sua vez, o Caboclo Canguruçu, de quem pouco se tem noticia, mas sabe-se que era um caboclo curador, manifestava-se no seculo XIX , na região norte do país, ladrilhando os caminhos que dali em diante seriam traçados.

Muito acreditam que a Umbanda foi trazida pelo Pai Zélio como uma nova versão da 3ª Revelação, uma estratégia da espiritualidade nos despertar para a mensagem de Amor e Paz como caminho iluminativo. O Espiritismo havia descambado para o intelectualismo excessivo e a Espiritualidade tinha pressa em promover o saneamento das almas e a pacificação dos sofrimentos e desigualdades seculares, trazidos pelas guerras, atrocidades, escravidão.

Ai veio a Umbanda, diferente do Espiritismo, por ter um vigor atuante, chamar à razão e à responsabilidade de cada um, sem sombra de paternalismo, sem dogmas de processos infernais ou paradisíacos, senão um cumprimento da Lei Maior.

Como naquela época havia muito feitiçaria, pessoas que trabalhavam com o intuito de fazer maldades, também em 1913, Zélio passou a trabalhar também com um Orixá de nome Mallet (Malé). Com o surgimento do espírito Orixá Mallet, rapidamente ele alcançou lugar destacado no panteão da Umbanda, passando trabalhar nos trabalhos de desmanche e magia, e sendo respeitado pelas outras entidades do Sr. Zélio, o Pai Antônio e o próprio Caboclo das Sete Encruzilhadas. Trabalhava com animais em seus trabalhos, mas os mantinham vivos. De um “temperamento” forte, tanto podia promover materializações de borboletas, proteger pombas, como atirar pedras em médiuns, como o fez na cachoeira e inusitadamente carregar por meio quilometro até a linha da água do mar, o Sr. Benjamim Figueiredo, que depois disso abriu a Tenda Mirim.

Leal de Souza, em seu livro, relata que em uma reunião fechada, com cerca de 20 pessoas, o espírito Orixá Mallet começou a traçar pontos no chão, e levou a mão até eles, e dali se materializaram duas borboletas amarelas, em seguida tocou a mão do próprio Leal de Souza depositando ali a terceira borboleta, dizendo que ele veria a borboleta ao chegar em sua casa, e também em seu trabalho. E assim foi, chegando tarde da noite dos trabalhos mediúnicos, encontrou a borboleta amarela ao chegar em casa, e no dia seguinte, dentro do local onde trabalhava, seus colegas, surpresos, constataram que uma borboleta amarela pousava sobre sua cabeça.

Mais adiante, na mesma obra, há o relato que o autor se dirigiu ao Rio Macacu, no município de Cachoeiras de Macacu, levando duas pombas brancas, segundo fora solicitado, ao chegar lá, o espírito Orixá Mallet riscou um ponto no chão e as aves ficaram como que imantadas ao local. Depois disso, o espírito comentou que os animais não suportariam a carga que estavam sendo movimentadas, e enviou as pombas até a outra margem, e lá elas ficaram, até o final do trabalho, quando então voltaram por sua vontade, são e salvas.

Sobre o episódio da pedra o que ocorreu foi o seguinte:

“João Severino Ramos, dirigente da Tenda São Jorge, mais uma das tendas fundadas pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, ao fazer sua primeira visita a Zélio em Cachoeiras de Macacu, se mostrava cético e incrédulo, pedindo provas para crer.

O Orixá Malet (da vibração de Ogun) pegou uma pedra à beira do rio e acertou bem no meio da testa de Severino que caiu dentro das águas. A entidade proibiu os amigos de socorrê-lo e pediu que esperassem minutos depois Severino atravessou as margens do Rio Macacu já incorporado de Ogun Timbiri, com quem trabalharia à gente da tenda citada. ”

(Fonte: Revista Espiritual de Umbanda – Nº 08)

Muito se fala sobre a oferenda utilizando carne de porco, o que parece ir contra os princípios trazidos pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas. E entrevista para esclarecer este assunto, a neta do Sr. Zélio, a Sra. Lygia nos esclarece no Blog do nosso irmão Cláudio Zeus (Umbanda Sem Medo):

“O ritual para elaboração da comida de Ogum foi trazido por Orixá Mallet (uma das entidades que atuavam junto ao Caboclo das Sete Encruzilhadas, também através de meu avô) que seria obrigatoriamente um sarapatel. O sarapatel era feito com os miúdos de um porco castrado, por isso usava-se o animal com esta característica. Ele era morto por uma pessoa de fora do terreiro, fora da TENSP, habilitado e contratado para tal. A carne era usada como alimento para qualquer refeição.”

Este relato afasta completamente a afirmação de alguns, quanto ao sacrifício de animais, que não era fato, em relação a esta oferenda. Ela ainda afirma que nos dias atuais, tal oferenda é comprada em mercados, junto com os ingredientes que são utilizados nas demais oferendas.

Em seus últimos dias vivente em nossas terras, perguntado por uma jornalista sobre os trabalhos com os Exus, Zélio respondeu:

– “O trabalho com os Exus requer muito cuidado. É fácil ao mau médium dar manifestação como Exu e ser, na realidade, um espírito atrasado, como acontece, também, na incorporação da Criança. Considero o Exu um espírito que foi despertado das trevas e, progredindo na escala evolutiva, trabalha em benefício dos necessitados. O Caboclo das Sete Encruzilhadas ensinava que Exu é, como na polícia, o soldado. O chefe de polícia não prende o malfeitor; o delegado também não o prende, quem prende é o soldado que executa as ordens dos chefes. E o Exu é um espírito que se prontifica a fazer o bem porque, a cada passo que dá em benefício de alguém, é mais uma luz que adquire para si. Atrair o espírito atrasado que estiver obsedando e afastá-lo é um dos seus trabalhos. E é assim que vai evoluindo. Torna-se, portanto, um auxiliar do Orixá.”

A história não registra quando estes espíritos que tanto atuaram nos primórdios da Umbanda desceram em terra pela última vez. Sabe-se que o espírito Orixá Mallet era um espírito que exauria as forças do franzino corpo de seu médium. Falava pouco, quase somente por gestos, ou era Pai Antônio que trazia suas ordens e ensinamentos nos trabalhos de demanda e estabelecimento de disciplina. Foi a última entidade a se manifestar e a primeira a parar, através do Sr. Zélio. Contam os estudiosos que assim foi devido a sua grande elevação, de alta escala vibratória. Seria o espírito Orixá Mallet mais iluminado que o Caboclo das Sete Encruzilhadas? Ou apenas suas missões já eram previstas pela Espiritualidade, o Caboclo com sua tendência a anunciar, organizar e evangelizar, enquanto que o espírito Orixá Mallet agiria disciplinarmente, na proteção, segurança, combatendo o mal e as demandas, ações estas que se refletem em cada terreiro de Umbanda, em cada filho de Banda, até os dias de hoje?

Dez anos após a fundação da Tenda Nossa Senhora da Piedade (registrada como Tenda Espírita, por não poder ser feito o registro de uma entidade com especificação de Umbanda), em 1918, o Caboclo das Sete Encruzilhadas declarou que iria iniciar a segunda parte da sua missão: a fundação de outras sete Tendas criadas a partir do corpo mediúnico da Tenda da Piedade: (1918) Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, (1927) Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, (1933) Tenda Espírita Santa Bárbara, (1935) Tenda Espírita São Pedro, Tenda Espírita São Jorge, Tenda Espírita São Jerônimo e (1939) Tenda Espírita Oxalá, algumas delas ainda hoje em funcionamento.

Fato interessante ocorreu no tocante à criação da Tenda Espírita São Jerônimo (a Casa de Xangô): ainda faltava apontar o dirigente adequado para a sua formação quando, numa noite de quinta-feira, José Alvares Pessoa, espírita e estudioso de todos os ramos do espiritualismo, não dando muito crédito ao que lhe relatavam sobre as maravilhas ocorridas em Neves, resolveu verificar pessoalmente o que se passava. Logo que entrou na sala, o Caboclo das Sete Encruzilhadas interrompeu a palestra e disse:

– “Já podemos fundar a Tenda São Jerônimo e seu dirigente acaba de chegar.”

O senhor Pessoa ficou muito surpreso, pois era desconhecido no ambiente e não anunciara a sua visita. Viera apenas verificar a veracidade do que lhe narravam. Após breve diálogo, em que o Caboclo das Sete Encruzilhadas demonstrou conhecer a fundo o visitante, José Alvares Pessoa assumiu a responsabilidade de dirigir o Templo que a entidade determinou.

O Caboclo das Sete Encruzilhadas não adotava atabaques nem palmas para marcar o ritmo dos cânticos e nem objetos de adorno, como capacetes, cocares, etc.

Quanto ao número de guias a ser usado pelo médium, Zélio opina:

“- A guia deve ser feita de acordo com os protetores que se manifestam. Para o Preto Velho deve-se usar a guia de Preto Velho; para o Caboclo, a guia correspondente ao Caboclo. É o bastante. Não há necessidade de carregar cinco ou dez guias no pescoço…”

Perguntaram a Zélio sobre qual era a sua opinião sobre o sacrifício de animais que alguns médiuns fazem na intenção dos Orixás. Zélio absteve-se de opinar, limitou-se a dizer:

“- Os meus guias nunca mandaram sacrificar animais, nem permitiriam que se cobrasse um centavo pelos trabalhos efetuados. No Espiritismo não pode pensar em ganhar dinheiro; deve-se pensar em Deus e no preparo da vida futura.”

Enquanto Zélio estava encarnado, foram fundadas mais de 10.000 Tendas a partir das acima mencionadas. Zélio nunca usou como profissão a mediunidade, sempre trabalhou para sustentar a sua família e, muitas vezes, também para manter os Templos que o Caboclo fundou. Com o seu coração generoso, e por determinação das entidades, por vezes Zélio recolhia os enfermos mais necessitados em sua residência até o término do tratamento astral. E, muitas vezes, as filhas, Zélia e Zilméa, crianças ainda, cediam o seu aposento e dormiam em esteiras, para que os doentes ficassem bem acomodados.

Em 1939, o Caboclo das Sete Encruzilhadas determinou a fundação de uma Federação (posteriormente denominada de União Espírita de Umbanda do Brasil, segundo relata Seleções de Umbanda n.º 7 1975) para congregar Templos Umbandistas e ser o núcleo central da nossa abençoada religião, no qual o simples uniforme branco de algodão dos médiuns estabeleceria a igualdade de classes e a simplicidade permitida pelo ritual.

A partir da década de 1940, iniciaram-se as atividades da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade na cidade do Rio de Janeiro, tendo passado por vários endereços. Curiosamente, todas as sedes pelas quais a Tenda da Piedade já passou, foram demolidas.

Após 55 anos de atividades, Zélio entregou a direção dos trabalhos da Tenda à sua filha Zélia de Moraes Lacerda e, depois, à Zilméa Moraes da Cunha. Mais tarde, junto com a sua esposa Maria Elizabete de Moraes (médium ativa da Tenda e aparelho do Caboclo Roxo), fundou a Cabana de Pai Antônio, no distrito de Boca do Mato, município de Cachoeiras do Macacu/RJ. Eles dirigiram os trabalhos enquanto a saúde de Zélio permitiu.

Nesta época em que eram mais raras as incorporações em Pai Zélio, o Caboclo das Sete Encruzilhadas deixou claro que não mais incorporaria em outro médium, nem em outro local, senão no que havia criado. Disse que dali em diante só se manifestaria em datas especiais. E assim o fez, como no 63º aniversário da tenda Nossa Senhora da Piedade, em que transcrevo o trecho final da sua belíssima mensagem que foi gravada:

“A Umbanda tem progredido e vai progredir muito ainda.
É preciso haver sinceridade, amor de irmão para irmão, para que a vil moeda não venha a destruir o médium, que será mais tarde expulso, como Jesus expulsou os vendilhões do Templo.
É preciso estar sempre de prevenção contra os obsessores, que podem atingir o médium.
É preciso ter cuidado e haver moral para que a Umbanda progrida e seja sempre uma Umbanda de humildade, amor e caridade. Essa é a nossa bandeira.
Meus irmãos: sede humildes, trazei amor no coração para que, pela vossa mediunidade, possa baixar um espírito superior; sempre afinado com a virtude que Jesus pregou na Terra, para que venha buscar socorro em vossas casas de caridade, todo o Brasil…
Tenho uma coisa a vos pedir: se Jesus veio ao planeta Terra na humilde manjedoura, não foi por acaso.
Foi o Pai que assim o determinou. Que o nascimento de Jesus, o espírito que viria trazer à humanidade o caminho de obter a paz, a saúde e a felicidade;
a humildade em que ele baixou neste planeta, a estrela que iluminou aquele estábulo, sirva para vós, iluminando vossos espíritos, retirando os escuros da maldade por pensamento, por ações; que Deus perdoe tudo o que tiverdes feito ou as maldades que podeis haver pensado, para que a paz possa reinar em vossos corações e nos vossos lares. Eu, meus irmãos, como o menor espírito, baixo à Terra, mas amigo de todos, e em nome dos espíritos que me rodeiam neste momento, peço que eles sintam a necessidade de cada um de vós e que, ao sairdes deste Templo de caridade, encontreis os caminhos abertos, vossos enfermos curados e a saúde para sempre em vossa matéria.
Com o meu voto de paz, saúde e felicidade; com humildade, amor e caridade, sou e serei sempre o humilde Caboclo das Sete Encruzilhadas.”

† Zélio Fernandino de Moraes desencarnou no dia 03 de Outubro de 1975, aos 84 anos de idade, com o sentimento da missão brilhantemente cumprida. A sua cerimônia fúnebre foi celebrada por Pai Ronaldo Linares, a pedido de seus familiares.

FONTE: www.casadetodosossantos.com.br