A Mãe de todas as formas, esta é Binah, a terceira Sephirah. De acordo com o grande qabalista do século XVI, rabi Moisés Cordovero, esse número é a raiz das coisas. Substância-raiz cósmica e energia primordial são as expressões usadas por Blavatsky para designar essa manifestação particular, chamada na Qabalah de Grande Mar. O formato das letras da palavra hebraica para mar é um glifo eloqüentemente indicativo da elevação e expansão das ondas no seio das águas.
Os antigos simbolizaram muito sabiamente com o mar a substância virgem intocada espalhada espaço afora, pois a água é plástica, de forma sempre cambiante, e assume a forma de qualquer recipiente em que é despejada. O mar é um símbolo sumamente adequado dessa substância plástica a partir da qual todas as formas devem ser compostas e representa uma energia ininterrupta, a despeito de ser passiva. Diz-se que a cor de Binah é o preto, visto que o preto absorve todas as outras cores tal como todas as formas materiais após inumeráveis transformações e mutações retornam à substância-raiz e por ela volta a ser absorvidas.
Essas três emanações são únicas de uma maneira especial. A Coroa, com seus dois derivados, o Pai e a Mãe, é concebida como Sephiroth suprema, não tendo relação com as emanações que dela procedem. No diagrama da Árvore da Vida, as supremas são vistas como existindo além do Abismo, aquela grande voragem fixada entre o ideal e o real, separando-as das emanações que são as inferiores, o acima do que está abaixo. Tal como as ondas se alçam e afundam abaixo do nível normal das águas sem produzir qualquer efeito duradouro nas próprias águas, assim é considerada a relação do universo real com as Sephiroth supremas, pois elas repousam num plano completamente afastado de qualquer coisa que possamos compreender intelectualmente. É somente com o aparecimento da quarta emanação que temos algo que é realmente cognoscível pela mente humana.
Por essa razão, há um segundo método de numeração que se soma àquele que já apresentamos. As Sephiroth supremas são consideradas inteiramente independentes das inferiores, e enquanto estas são geradas a partir de sua própria essência divina e no seu interior, o ser das supremas não é de maneira nenhuma afetado. Como a luz brilha na escuridão e ilumina sem sofrer diminuição de sua própria existência, do mesmo modo as obras das supremas transbordam de seu ser central sem com isso diminuir em grau algum a realidade de sua fonte. Conseqüentemente, elas existem sozinhas além do Abismo, embora através do espaço seja difundida sua essência, sua numeração se completando em Três.
Começando com as inferiores abaixo do Abismo, o plano da existência finita condicionada, a numeração começa mais uma vez com o número Um. Assim, cada Sephirah, nesse sentido, possui dois números, indicando um distinto desenvolvimento duplo da corrente de vida. Chesed é tanto o número Quatro quanto o número Um, porquanto é a primeira Sephirah no plano da causalidade abaixo do abismo. Júpiter, como o pai dos deuses, é às vezes atribuído a Kether no alfabeto mágico. Mas também pertence a Chesed de uma outra maneira, visto que Chesed num plano inferior é o reflexo da Coroa.
A numeração direta é conservada para evitar a confusão de duas séries numéricas, continuando de um a dez sem interrupção. É apenas mencionada porque este fato por si só pode explicar os fragmentos isolados do sistema de numeração pitagórico que, quando aplicado à Árvore da Vida sem lembrar-se da dupla numeração, pode levar à imensa confusão.
Da primeira tríade, então, uma segunda tríade de emanações é refletida ou projetada abaixo do Abismo. Estas, do mesmo modo, são compostas de uma potência masculina e feminina com uma terceira Sephirah produzida em reconciliação direta de maneira a harmonizar e equilibrar seus poderes. A quarta é chamada tanto de Chesed, que significa graça, quanto Gedulah, que significa grandeza, tendo os antigos filósofos lhe designado a qualidade astrológica denominada Júpiter. Quatro é um número que significa sistema e ordem, qualidades atribuídas pela tradição astrológica ao planeta Júpiter. Segundo certas autoridades, esse é o primeiro número a mostrar a natureza da solidez, e como vimos acima que Chesed é a primeira Sephirah abaixo do Abismo, e é a primeira das Sephiroth “reais”, essas observações são justificadas. A Sephirah masculina Chesed simboliza as potencialidades da natureza objetivizada, e através da confirmação da atribuição astrológica, incluindo a figura mitológica da divindade tutelar com esse nome, os pitagóricos chamavam o Quatro de “o maior prodígio, um deus segundo uma maneira diferente da tríade”.
A quinta Sephirah é Geburah, poder, e apesar de ser uma emanação de qualidade feminina, sua natureza se afigura sumamente masculina. Alguns antigos afirmavam que o cinco era um símbolo do poder criativo e que nesse conceito de criatividade e poder se achava o caráter de Geburah. É uma força formativa, como o seu nome Poder e a atribuição planetária a Marte sugeririam, pela qual o plano formulado na imaginação cósmica e projetado como uma imagem na substância-raiz abaixo do Abismo em Chesed é impulsionado celeremente à atividade e manifestação. O cinco é composto de três e dois, o primeiro representando a energia passiva da Mãe e o segundo, a sabedoria do Pai. Não expressa tanto um estado de coisas mas um ato, uma passagem ulterior e uma transição da idealidade para a realidade.
Seis é a Sephirah desenvolvida para proporcionar harmonia e equilíbrio às forças anteriores, e seu nome é Tiphareth, uma palavra hebraica que significa beleza e harmonia. O número é um símbolo de tudo que é equilibrado, harmonioso e de boa proporção, e como é o dobro de três, reflete novamente as idéias variadas representadas por esse número. Considerando-se, portanto, que o três representa os reais poderes motivadores da evolução, o Macroprosopus ou o Logos, da mesma maneira em Tiphareth encontramos uma reflexão devida e uniforme num Logos menor, o Microprosopus.
A essa Sephirah os qabalistas atribuíram o sol, o senhor e centro do Sistema Solar. Ao consultar o diagrama da Árvore da Vida, o leitor pode perceber que Tiphareth ocupa uma posição destacada no centro da estrutura da Árvore da Vida como um todo. Os filósofos pitagóricos asseveraram que seis era o símbolo da alma, e mais tarde descobriremos que no ser humano Tiphareth, a harmoniosa emanação do sol é a Sephirah da alma do homem, o centro do sistema microcósmico e a luminosa intermediária entre o Espírito meditativo acima e o corpo com os instintos abaixo. Os doutores do Zohar da divina filosofia atribuíam a terceira letra “V” do nome divino a Tiphareth, e visto que a Tiphareth é o filho do Pai e da Mãe Celestiais, é chamada de Filho. O selo de Salomão, os triângulos entrelaçados, um verdadeiro símbolo de equilíbrio, é o símbolo apropriado.
Os processos de reflexão continuam, e a segunda tríade composta dos números quatro, cinco e seis – embora tenham sido eles mesmos projetados pelas Sephiroth supremas –, por sua vez, gera uma terceira tríade reproduzindo a si mesma num plano ainda mais inferior. A primeira dessas Sephiroth é masculina – Netzach, que significa triunfo ou vitória. Concebe-se que o sete é um número inteiro que representa uma consumação das coisas, a conclusão de um ciclo e seu retorno para si mesmo. Assim, na sétima Sephirah, começando uma nova tríade e concluindo a segunda série de Sephiroth, são resumidas novamente todas as potências anteriores. Sua natureza é a do amor e da força de atração; o poder de coesão no universo, unindo uma coisa à outra e atuando como a inteligência instintiva entre as criaturas vivas. O planeta Vênus, emblema do amor e da emoção, é atribuído pelos filósofos da magia a essa Sephirah; da mesma maneira, a cor verde, tradicionalmente pertencente a Afrodite, como as forças pertencentes a essa Sephirah estão peculiarmente ligadas ao cultivo, à colheita e à agricultura.
Em oposição a Netzach como segunda Sephirah da terceira tríade está Hod, esplendor ou glória, que é uma qualidade feminina repetindo as características de Chocmah num plano menos exaltado e sublime. Representa essencialmente uma qualidade mercurial das coisas – sempre fluindo, em metamorfose constante e fluxo contínuo, tendo sido denominada, acredito, “mudança na estabilidade”. Com ela, detentora de natureza bastante similar, esta a nona Sephirah, Yesod, o fundamento, que é “estabilidade em mudança”. Tal como a tremenda velocidade das partículas eletrônicas assegura a estabilidade do átomo, do mesmo modo as formas fugazes e o movimento de Yesod constituem a permanência e a segurança do mundo físico. É a nona Sephirah e por conseguinte o nono dígito, compreendendo em si todos os números precedentes. Comumente chamada de plano astral ou alma do mundo, Yesod é aquele fundamento de sutil substância eletromagnética no qual todas as forças mais elevadas estão focalizadas, constituindo a base ou o modelo final sobre o qual o mundo físico é construído.
Yesod tem natureza lunar, a lua sendo o luminar atribuído visto haver uma curiosa relação entre o satélite morto da Terra e a luz astral. Yesod completa as três tríades, cujo apêndice é Malkuth, a décima e última Sephirah, que representa em forma concreta, numa completa cristalização visível e tangível aos sentidos, todas as qualidades dos planos precedentes. A própria palavra significa reino, o reino do mundo físico e o cenário das atividades e encarnações das almas exiladas de cima, a morada do Espírito Santo. No Zohar é dada a letra “H” do nome divino a Malkuth, que é chamada de Filha, sendo o reflexo mundano do primeiro “H”, que é a Mãe. Essa décima Sephirah é chamada alhures de Noiva, de Filha e de Virgem do Mundo.
Reconhecidamente, esse esboço acima oferece somente uma vista resumida e geral do sistema numérico de evolução e desenvolvimento cósmico que tanto fez jus ao respeito de Lévi e dele teve uma admiração tão grande e extremada. Nesse esboço elementar será possível perceber claramente que os números se vinculam a processos criativos ou evolutivos, e que fundamentalmente compreendida, a natureza do número é o ritmo. Essa última afirmação é importante, já que proporções e atividades harmoniosas realmente conduzem e marcam as primeiras manifestações da Vida Una nos elementos e substâncias diversas presentes em toda parte.
Essas diferenciações são corretamente simbolizadas pelo número, que se concebe como sendo glifo precisamente dos processos de revelação. Representam o desenvolvimento de um universo tangível explícito a partir de uma essência intangível implícita; de uma concepção ideal à consumação da forma construída na qual o ideal encontra sua morada terrestre. Assim, para o teurgo, os números simbolizam o próprio ritmo do universo, e com seus signos apropriados eles representam poderes e entidades com os quais o teurgo procura comungar.(Continua)
(Israel Regardie)