quinta-feira, 7 de junho de 2018
O TARÔ DE THOTH
Disse Crowley, em 29 de Maio de 1942,à Sra.Frieda Harris:
“É importante que você entenda as minhas razões: essa Obra do Tarô é uma Enciclopédia de toda filosofia “oculta” séria. É um Livro de Referência que determinará o curso do pensamento místico e mágico nos próximos 2000 anos. Meu único sentimento de ansiedade restringe-se a salvá-lo da destruição, fazendo com que seja reproduzido numa forma permanente e assim distribuí-lo por várias partes do mundo. Não estou em boas condições financeiras, mas se fosse ao contrário, eu doaria 200 cópias à Bibliotecas Nacionais em todas as partes do mundo e algumas mais aos meus representantes”.
Marguerit Frieda Bloxam adotou o nome de Lady Frieda Harris após se casar com o parlamentar Sir Percy Alfred Harris. Iniciou-se na Sociedade Teosófica e foi apresentada a Crowley por uma amiga em comum, a artista Greta Valentine. A pesar dessa qualificação, era iniciante em assuntos mágicos além de conhecer pouco sobre o tarô.
Foi por insistência sua que Crowley decidiu escrever o Livro de Thoth (ou Atu de Tahuti). Atu - termo egípcio para "casa"' ou "chave". Também, segundo a Besta, derivou a palavra francesa "atout" ou trunfo. Inicialmente ele queria apenas redesenhar os arcanos maiores com algumas adições oriundas da filosofia telêmica influenciado, mais especificamente, pelas revelações feitas em Liber 418, em 1909, na experiência do 6º Éter. No entanto, Harris o importunou tanto, querendo que ele escrevesse uma nova obra de tarô, que fez uma oferta irrecusável: pagaria a ele 2 libras por semana se ele a introduzisse nos caminhos da magia. Diante dessa oferta, Crowley aceitou e bom grado e começaram a produção em 1938.
Trabalhando sobre as notas e esboços de Crowley, além de uma intensa troca de correspondências, Harris chegava a pintar a mesma lâmina oito vezes até satisfazê-lo. Ele admitiu mais tarde que foi a energia dela que impulsionou o trabalho, ficando a seu cargo orientar a intuitiva discípula na pintura das lâminas.
Crowley chama a atenção sobre o medo dela de desenhar rostos, dizendo que era um sintoma mundial de covardia d'alma. No entanto, a ausência de expressões faciais marcantes na obra despersonaliza o elemento humano, deixando a cargo dos símbolos, cores e formas gerais a transmissão dos conceitos desenvolvidos por Frater Therion, resultando numa obra mais arquetipica. O exemplo mais marcante e a carta 11, a mais intensa do tarô, o Tesão: o rosto de Babalon está virado, deixando a cargo das formas a expressão da mensagem. E o 12, o símbolo da iniciação? Apenas um rosto é sugerido.
Se formos citar as principais referências da obra da Besta no desenvolvimento do tarô, sem dúvida nenhuma ficamos com Liber Al vel Legis e A Visão e a Voz .
Apesar de ter sido publicado apenas na década de 60, Harris fez 3 exibições: uma em Junho de 1941 no Randolph Hotel em Oxford, outra em Julho de 1942 na Berkley Galleris em Davis Street e em Agosto do mesmo ano na Royal Society of Painters in Water Colours em Londres. Em 1943 Harris termina as aquarelas e, no ano seguinte, Crowley publica The Book of Thoth by The Master Therion: A Short Essay on the Tarot of the Egyptians .
Chegou ao público uma possível disputa com Crowley pelos direitos da obra, após a publicação do livro, causando um atrito entre os autores. No entanto, Harris o visitou dias antes dele morrer. Infelizmente a sua condição era tão precária que não a reconheceu. Foi uma das pessoas que compareceram ao seu funeral. Ambos não ganharam financeiramente nada com o trabalho. Após o falecimento da artista (em 1962 na Índia onde sobreviveu duramente da venda de sua arte após a morte do marido) os originais foram para o Warburg Institute em Londres.
Interessantemente o trabalho, dedicado a expressão visual de uma corrente de pensamento cujo representante é um deus da guerra, foi feito no tumultuado período da Segunda Guerra Mundial, onde a Inglaterra vivia na iminência de uma tragédia.
A parceria refletiu perfeitamente os arquétipos masculino e feminino de Chokmah e Binah: o primeiro contribuiu com a semente e a segunda deu a forma.
Porque o tarô vem com 3 versões da carta do Magus? A história por trás desse mistério é a seguinte: o caderno de impressão, na gráfica, foi feito em quatro folhas, cada uma contento 20 cartas. Como são 78, sobram 2 espaços vazios. Então o editor da primeira publicação do baralho, A.G. Mueller, decidiu “presentear” os compradores colocando um bônus: duas cartas do Arcano I, recusadas por Crowley.
Uma das versões chamada "The Magician" (na qual a figura está na posição de suástica ou Aleph), corresponde ao descrição feita na primeira experiência de frater Therion no desenho de tarô, na Golden Dawn, como tarefa do grau de Adeptus Minor. Essas descrições existem resumidas na coluna CLXXXI do Liber 777 (Em outro livro, Liber 78, estão contidas as descrições das cartas, apesar de não serem tão completas quando o Livro de Thoth, estão em sintonia com a obra).
Uma passagem em especial de Liber Al deixou Crowley confuso por anos:
“Todas estas velhas letras do meu Livro estão corretas; mas Tzaddi não é a Estrela. Isto também é secreto: meu profeta o revelará aos sábios."
Mais tarde a Besta resolveu o problema alterando o tarô e dois caminhos da Árvore da Vida: trocando as atribuições da letra da Estrela pelo Imperador. A explicação foi a seguinte:
“Não vejo mal em revelar o mistério de Tzaddi aos ‘sábios'; outros dificilmente entenderiam a minha explicação: Tzaddi é a letra do Imperador, o Trunfo IV e He é a Estrela, o Trunfo XVII. Aquário e Áries estão em oposição tendo no meio Peixes, o mesmo com os Trunfos VIII e XI em relação a Virgem. Essa revelação faz a nossa atribuição do Tarô perfeita e simétrica”.
Essa foi a segunda mudança(Outra mudança ocorrida refere-se a associação dos Querubins com os elemento) no tarô em um curto espaço de tempo. A anterior foi creditada a Golden Dawn: quando atribuíram as letras do alfabeto hebraico a cada carta, trocaram a numeração dos atus da Justiça e da Força , pois se seguirmos o fluxo das letras, a carta da Justiça ficaria com a letra “Theth” que representa o signo de Leão e a Força com a letra “Lamed” que está associada a casa de Libra. Além disso, existe uma terceira, a troca da posição do Louco na seqüência: foi passado para o início (antes ficava entre os Atu XX e XXI) um lugar apropriado para o número “0”. Essas mudanças foram confirmadas, de certa forma, em Liber 418, na experiência do 6º Éter, na visão da Urna:
" Mas a Urna é algo maravilhoso; feita de denso Mercúrio e dentro estão as cinzas do Livro do Tarô, o qual foi totalmente consumido.(...) Agora a Urna parece se tornar o centro do Espaço Infinito e Hadit é o fogo que consumiu o livro do Tarô. No livro estava preservada toda a sabedoria (pois o Tarô foi chamado o Livro de Thoth) do Æon que passou."
Mas existem algumas interessantes discrepâncias na obra da Besta relativo a esse assunto: no Livro de Thoth, no comentário final sobre a carta do Imperador, ele volta a atribuir o caminho de Chokmah a Tiphareth ao arcano (embora no começo diga que pertença a Tzaddi).
E numa outra obra sua, O Mudo Desperto (The Wake World), Lola Sonhadia e seu Príncipe das Fadas , ao chegarem na sephiroth de Netzach , descrevem os caminhos que levam a ela, um em particular é interessante:
“Então surgiu outra passagem, só que realmente secreta para tudo, e digo a vocês que lá estava a mais bela Deusa que já se vira, banhando-se num rio de orvalho. Se perguntasse o que estava fazendo ela diria: ‘estou criando raios e trovões'. Era uma luz estelar e ainda assim podia se enxergar claramente, então não diga que estou mentindo”.
Qual a razão desses equívocos? Pode-se especular várias, mas só existe um meio de saber: percorrendo o caminho.
Veremos a seguir as interpretações das lâminas do tarô contidas no Livro de Thoth.