A FORÇA DO ENCANTO
Contam os mais velhos que, um dia, Oxóssi chegou ao ponto mais escondido da mata.
Fazia tempos que ele vinha seguindo o rastro da Cobra Encantada. De repente, ele avistouuma palhoça bem escondida. Aproximou-se com cautela, pois um bom caçador não denuncia sua presença.
Oxóssi notou, ao lado da palhoça, alguém mexendo uma grande panela que estava fervendo no fogo. Imaginou que não tinha sido notado, pois o vulto não se virou para trás.
De repente, o estranho falou assim, sem se virar.
– Você deve estar cansado de tanto procurar a Cobra Encantada...
Se sente que eu vou lhe servir uma bebida. Você aceita?
– Com quem eu falo? Perguntou Oxóssi.
– Com Ossáin. Resmungou o outro.
– Ah, sim! O dono do segredo das folhas...
Nem te reconheci. — Explicou Oxóssi.
– É... Faz um bom tempo que não vejo ninguém.
Aliás, nenhum caçador esteve aqui antes. Sabe que você é corajoso?
— Ossáin disse isso, virando-se para o caçador.
– Já me disseram isso antes...
— Respondeu Oxóssi cheio de si mesmo.
– Mas desta bebida, com certeza, você nunca provou antes. — Ossáin disse isso, enquanto passava às mãos de Oxóssi uma cumbuca fumegante.
Por um momento, Oxóssi se lembrou da Cobra Encantada. Mas era costume seu não se encabular com nada.
Mesmo, a teimosia sempre foi sua companheira.
Ele só acreditava depois que via e pegava.
Por esse motivo, inúmeras vezes, passou por maus bocados, mas foi-se acostumando com isso.
Sabe como é esse povo teimoso: sempre duvida da intuição.
Esperou um tempinho para a beberagem esfriar um pouco e foi bebericando em silêncio.
E um sono pesado fechou seus olhos.
Era o dia da caça: ele caiu na armadilha...
Aí, as pessoas começaram a sentir falta de Oxóssi.
Ogum, o seu irmão, buscava notícias por todo canto.
Iemanjá, a Grande Mãe, contou a todos o que soube através de Ifá: Oxóssi tinha sido encantado por Ossáin, no fundo da Mata.
Ogum juntou um grande grupo de caçadores e se embrenharam na mata, dias e dias, procurando, até que encontraram.
Ossáin sentiu o cheiro de gente estranha, se escondeu na touceira de taquari e ficou espiando por trás das folhas. Oxóssi recebeu os caçadores, muito tranqüilo e feliz da vida. Ogum, muito afoito e briguento, quis saber o que houve.
E os dois tiveram uma conversa:
– Meu irmão, o que aconteceu?
Você desapareceu! O que houve?
– Não houve nada! E não estou entendendo o porquê de tanto alarido...
– Como não está entendendo? Você desapareceu, meu irmão, e a gente veio à sua procura. E olhe que a gente tem andado por dentro desta imensidão de mata...
– Eu não desapareci. Eu resolvi ficar uns tempos por aqui mesmo...
– Com quem?
– Com Ossáin...
– Já que é assim... Cada qual com seu igual!
Ogum chamou os outros caçadores e todos se retiraram.
Ossáin saiu do taquari, derramou sobre Oxóssi o pó do bambuzeiro que faz as pessoas se envultarem e se confundirem com as folhas.
É por isso que até hoje se diz, quando alguém resolve seguir outro: Quem foi amarrado porque bebeu da cumbuca de Ossáin, nem a espada de Ogum corta este nó.
Texto: Ruy do Carmo Póvoas.
Postado:#GrupoCandonblenaÍntegra