Candomblé
Candomblé Terreiro da Casa Branca (Ilê Axé Iyá Nassô Oká), em Salvador (BA) |
Religiões
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Candomblé é uma religião afro-brasileira derivada de cultos tradicionais africanos, na qual há crença em um Ser Supremo (Olorum, Mawu, ou Nzambi, dependendo da nação) e culto dirigido a forças da natureza personificadas na forma ancestrais divinizados: orixás, voduns ou inquices, dependendo da nação.[1][2][3]
De origem totêmica e familiar, é a religião declarada de 0,3% da população brasileira, segundo dados do Censo 2010 do IBGE.[4] Também é possível encontrar praticantes em outros países como Uruguai, Argentina, Áustria, Suíça, Itália, Alemanha, Portugal e Espanha.[5][6][7][8]
Inicialmente reprimido pela sociedade escravocrata, pela Igreja Católica, pelo Estado e rejeitado pela sociedade; o candomblé (como outros cultos de matriz africana), "formavam, até meados do século XX, uma espécie de instituição de resistência cultural, primeiramente dos africanos, e depois dos afro-descendentes [...] muita coisa mudou, fazendo dessas religiões organizações de culto desprendidas das amarras étnicas, raciais, geográficas e de classes sociais". Dessa forma, os elementos culturais que compõem o candomblé são, na atualidade, uma parte integrante da cultura do folclore brasileiros.[9]
O candomblé não deve ser confundido com a umbanda ou com outras religiões afro-brasileiras e afro-americanas com similar origem (tambor de mina, omolokô, xangô pernambucano ou batuque brasileiros; vodu haitiano, a santería cubana, o obeah e o kumina jamaicanos, o winti surinamês, dentre outras), as quais foram desenvolvidas independentemente do candomblé e são virtualmente desconhecidas no Brasil.
Etimologia[editar | editar código-fonte]
O termo "candomblé" é uma junção do termo quimbundo “candombe” (dança com atabaques) com o termo iorubá “ilé” ou “ilê” (casa): significa, portanto, "casa da dança com atabaques".[10]
Fernando D'Osogiyan publicou outra versão etimológica da palavra: “Ka Nzo Ndombe” significa em Kimbundo “Pequena Casa de Negros” ou “Pequena Casa de Nativos”. O “Ka” é utilizado como diminutivo. “Nzo” significa “Casa” (vide o nome de diversos Terreiros de origem Angola, que carregam em seus nomes a palavra “Nzo”) e por fim, “Ndombe” (Negro/Nativo). Assim, acreditamos que o “Ka Nzo Ndombe” tornou-se “Ka Ndombe”, até popularizar-se como conhecemos e falamos hoje “Candomblé”.[11]
História[editar | editar código-fonte]
Dentre as nações africanas praticantes do animismo, cada uma tinha, como base, o culto a um único orixá. A junção dos cultos é um fenômeno brasileiro em decorrência da importação de escravos onde, agrupados nas senzalas, nomeavam um zelador de santo, também conhecido como babalorixá no caso dos homens e iyalorixá no caso das mulheres.
Diz Clarival do Prado Valladares em seu artigo "A Iconologia Africana no Brasil", na Revista Brasileira de Cultura (MEC e Conselho Federal de Cultura), ano I, Julho-Setembro 1999, p. 37, que o "surgimento dos candomblés com posse de terra na periferia das cidades e com agremiação de crentes e prática de calendário verifica-se incidentalmente em documentos e crônicas a partir do século XVIII". O autor considera difícil para "qualquer historiador descobrir documentos do período anterior diretamente relacionados à prática permitida, ou sub-reptícia, de rituais africanos". O documento mais remoto, segundo ele, seria de autoria de dom Frei Antônio de Guadalupe, bispo visitador de Minas Gerais em 1726, divulgado nos "Mandamentos ou Capítulos da visita".
Surgido na Bahia em meados do século XIX, é religião de matriz africana das mais difundidas no Brasil. O termo é uma junção do termo quimbundo candombe (dança com atabaques) com o termo iorubá ilê (casa): "casa da dança com atabaques". A religião tem por base o culto às forças da natureza, sendo chamada de animista.
Como os africanos escravizados eram provenientes de diversos povos e regiões, suas religiosidades evoluíram na forma de diversas tradições: são as chamadas "nações do candomblé", que se distinguem entre si principalmente pelas divindades veneradas, os atabaques, os cânticos e a língua litúrgica usada nos rituais.
Nações[editar | editar código-fonte]
Os africanos traficados como escravos para o Brasil pertenciam a povos diferentes que habitavam diferentes regiões da costa atlântica da África, desde o Senegal até Angola, Moçambique e Madagascar. Como resultado, havia uma multidão de cativos com línguas, hábitos e crenças distintas. Em comum, não tinham senão a infelicidade de estar, todos eles, reduzidos à escravidão, longe das suas terras de origem.[2]
Desse modo, os cativos eram agrupados pelos senhores em delimitações mais ou menos arbitrárias, tendo como base o povo a qual pertenciam, a região de origem ou mesmo o porto onde eram embarcados. Eram as chamadas “nações africanas”, como “mina”, “angola”, “jeje” e “nagô”. Com o tempo, essas categorias criadas pelos traficantes de escravos foram assumidas pelos próprios africanos e por seus descendentes como símbolo de origem e pertença étnica. É este recorte, baseado na procedência étnica dos fundadores dos primeiros candomblés (e, portanto, na origem étnico cultural de suas cosmologias e crenças religiosas), que dará origem às “nações do candomblé”.[12]
De Angola, Congo e do Golfo de Biafra vieram 39% dos africanos destinados a Bahia: eram os negros das nações “congo”, “angola, “macua”, “benguela”, dentre outros; que compunham o grupo linguístico bantu.[13][14]
Porém, 53% dos escravos desembarcados no litoral baiano eram provenientes do Golfo do Benin (igualmente chamado Costa da Mina ou Costa dos Escravos),[14][15] razão pela qual eram chamados genericamente de “negros minas", divididos em nagôs (termo que designava todos os iorubás da Costa dos Escravos)[16] e jejes (que incluem povos como os ewe, fanti-ashanti, grunsi e, principalmente, o povo fon do antigo Reino do Daomé).[3]
A predominância de escravos de origem jeje-nagô e bantu na Bahia revela a configuração das principais nações do candomblé, quais sejam:[2][12][13]
- De origem nagô (povo iorubá da Nigéria, Benin e Togo), cujo idioma é o iorubá:
- De origem jeje (povos euê-fon do Benin e Togo), cujo idioma é o fongbe:
- Nação jeje-mahi;
- Nação jeje-savalu;
- Nação jeje-nagô ou nagô-vodum (culto aos orixás nagôs em rito jeje);
- De origem bantu (povos congos e ambundos de Angola, República do Congo e República Democrática do Congo), cujos idiomas são o quicongo e o quimbundo (por vezes, o português):
- Nação congo-angola ou, simplesmente, nação angola;
- Candomblé de caboclo (sincretismo de elementos bantu e ameríndios).
É possível distinguir estas nações umas das outras pela maneira de tocar os atabaques, pela música, pelo idioma dos cânticos, pelas vestes litúrgicas, algumas vezes pelos nomes das divindades, e enfim por certos traços do ritual. Todavia, os candomblés de origem iorubá são os mais influentes.[16]
Desde o início do século XX, pesquisadores brasileiros e estrangeiros (como Nina Rodrigues, Arthur Ramos, Édison Carneiro, Melville Herkovits, Ruth Landes, Roger Bastide e Pierre Verger) deram ênfase à pesquisa científica sobre os terreiros que afirmavam ser de nação ketu, especialmente os três terreiros mais antigos e prestigiosos (Ilê Axé Iyá Nassô Oká - Casa Branca do Engenho Velho, Ilê Omin Axé Iyamassê - Terreiro do Gantois; e Ilê Axé Opô Afonjá). Cada um destacou a sua maneira a suposta "superioridade" ou "autenticidade" dos cultos de origem iorubá, detentores de uma tradição africana venerável. Os candomblés de angola ou de caboclo, no entanto, foram largamente ignorados pela pesquisa acadêmica e até mesmo considerados "deformados" ou "corrompidos" em alguns momentos.[17]
Crenças[editar | editar código-fonte]
O candomblé é uma religião monoteísta,[18][19] embora alguns defendam a ideia de que são cultuados vários deuses, o deus único para a Nação Ketu[20] é Olorum, para a Nação Bantu[21] é Nzambi e para a Nação Jeje é Mawu, são nações independentes na prática diária e em virtude do sincretismo existente no Brasil a maioria dos participantes consideram como sendo o mesmo Deus da Igreja Católica.
A religião tem, por base, a anima (alma) da Natureza, sendo, portanto, chamada de anímica. Os sacerdotes africanos que vieram para o Brasil como escravos, juntamente com seus orixás/nkisis/voduns, sua cultura, e seus idiomas, entre 1549 e 1888, é que tentaram de uma forma ou de outra continuar praticando suas religiões em terras brasileiras. Foram os africanos que implantaram suas religiões no Brasil, juntando várias casas em uma casa só para a sobrevivência das mesmas. Portanto, não é invenção de brasileiros.[22]
Os orixás/inquices/voduns recebem homenagens regulares, com oferendas de animais, vegetais e minerais, cânticos, danças e roupas especiais. Mesmo quando há na mitologia referência a uma divindade criadora, essa divindade tem muita importância no dia a dia dos membros do terreiro, mas não são cultuados em templo exclusivo, é louvado em todos os preceitos e muitas vezes é confundido com o Deus cristão.
- os orixás da mitologia ioruba[23] foram criados por um deus supremo, Olorun (Olorum) dos Yoruba;
- os Voduns da Mitologia Fon[24] foram criados por Mawu, o deus supremo dos Fon;
- os Nkisis da mitologia banta,[25] foram criados por Zambi, Zambiapongo, deus supremo e criador.
- os orixás são: Exú, Ogum, Odé (Oxóssi), Ossain, Oxumaré, Omolu (ou obaluaê), Nanã, Iemanjá, Oxum, Xangô, Oyá (Iansã), Obá , Ewá, Oxalá, Logun'edé e outros.
O candomblé cultua, entre todas as nações, umas cinquenta das centenas deidades ainda cultuadas na África. Mas, na maioria dos terreiros das grandes cidades, são doze as mais cultuadas. O que acontece é que algumas divindades têm "qualidades" que podem ser cultuadas como um diferente orixá/inquice/vodun em um ou outro terreiro. Então, a lista de divindades das diferentes nações é grande, e muitos orixás do queto podem ser "identificados" com os voduns do jeje e inquices dos bantos em suas características, mas na realidade não são os mesmos; seus cultos, rituais e toques são totalmente diferentes.
Orixás têm personalidades individuais, habilidades e preferências rituais, e são conectados ao fenômeno natural específico (um conceito não muito diferente do Kami no xintoísmo japonês, ou do Yazata no zoroastrismo persa). Toda pessoa é escolhida no nascimento por um ou vários "patronos" Orixás, que um babalorixá identificará. Alguns Orixás são "incorporados" por pessoas iniciadas durante o ritual do candomblé, outros Orixás não, apenas são cultuados em árvores pela coletividade. Alguns Orixás chamados Funfun (branco), que fizeram parte da criação do mundo, também são incorporados.
Acreditam na vida após a morte, e que os espíritos dos babalorixás falecidos possam materializar-se em roupas específicas, são chamados de babá Egum ou Egungun e são cultuados em roças dirigidas só por homens no Culto aos Egungun, os espíritos das iyalorixás falecidas são cultuados coletivamente Iyami-Ajé nas sociedades secretas Gelede, ambos cultos são feitos em casas independentes das de candomblé que também se cultuam os eguns em casas separadas dos Orixás.
Acreditam que algumas crianças nascem com a predestinação de morrer cedo são os chamados abikus (nascidos para morrer) que podem ser de dois tipos, os que morrem logo ao nascer ou ainda criança e os que morrem antes dos pais em datas comemorativas, como aniversário, casamento, e outras.
No candomblé, como nas religiões tradicionais africanas, acredita-se em um Deus Supremo que criou o mundo, chamado Olorum (tradição nagô), Mawu (tradição jeje) ou Nzambi (tradição angola). Em seguida, essa divindade suprema se afastou, deixando sua criação funcionando por meio das forças da natureza por Ele criadas, as quais são chamadas orixás na tradição nagô, voduns na tradição jeje e minkisi na tradição angola. O que se busca é a interferência concreta de Deus "neste mundo" mediante a invocação das forças sagradas da natureza.
A cada orixá, vodun ou nkisi cabe reger e controlar as forças da natureza assim como certos aspectos da vida humana e social. Cada um, além de ter funções distintas e poderes específicos condizentes com seus traços de personalidade, conta também com símbolos particulares, como as roupas, as cores das roupas e das contas, determinados objetos, adereços, batidas de atabaque e canções características, bebidas e alimentos, sem falar dos animais sacrificiais próprios de cada divindade. E cada orixá, vodun ou nkisi tem ainda uma saudação dirigido somente a ele.
A relação entre cada indivíduo e seu "santo" particular que se estabelece o que é certo ou errado. Para um adepto do candomblé, a definição do que é bom e do que é mau nunca é abstrata, mas sempre relativa a uma pessoa concreta com seu orixá (igualmente voduns e minkisi), pois cada um está relacionado a uma série de tabus específicos, os chamados ewó ou quizila. O que o devoto não pode fazer é quebrar os tabus de seu orixá, mas aquilo que é proibido para um orixá não é necessariamente proibido para outro.[26]
Sincretismo[editar | editar código-fonte]
No tempo das senzalas, os negros, para poderem cultuar seus orixás, nkisis e voduns, usavam como camuflagem um altar com imagens de santos católicos e, por baixo, os assentamentos escondidos. Segundo alguns pesquisadores, esse sincretismo já havia começado na África, induzido pelos próprios missionários cristãos para facilitar a conversão.
Depois da libertação dos escravos, começaram a surgir as primeiras casas de candomblé, e é fato que o candomblé de séculos incorporou muitos elementos do cristianismo. Imagens e crucifixos eram exibidos nos templos, orixás eram frequentemente identificados com santos católicos, algumas casas de candomblé também incorporam entidades de caboclos, que eram consideradas pagãs como os orixás.
Mesmo usando imagens e crucifixos, inspiravam perseguições por autoridades e pela Igreja Católica, que viam o candomblé como paganismo e bruxaria.
Nos últimos anos, tem aumentado um movimento em algumas casas de candomblé que rejeitam o sincretismo aos elementos cristãos e procuram recriar um candomblé "mais puro" baseado exclusivamente nos elementos africanos.[27]
Templos[editar | editar código-fonte]
Denominação[editar | editar código-fonte]
Em língua portuguesa, os templos de candomblé são normalmente chamados de casas, roças, terreiros, barracão ou axé. Adotam ainda denominações oriundas de línguas africanas, de acordo com a nação ao qual pertencem: ilê axé (nações ketu, efon e ijexá), kwe, abaçá ou humpame (nações jeje), nzo, mbazi, canzuá (nações bantu). Por exemplo, o Zoogodô Bogun Malê Sejahundê (nação jeje mahi), é mais conhecido como Kwe Sejahundê ou simplesmente Roça do Ventura.[28]
Arquitetura[editar | editar código-fonte]
Geralmente, os terreiros ficam localizados em lugares distantes, como sítios; alguns em locais mais centrais. Podem ser grandes ou pequenos, porém precisam ser bem planejados para comportar todos os segmentos necessários para o bom andamento das liturgias.
Tombamento[editar | editar código-fonte]
Há mais de 30 anos, o IPHAN (Instituto do Patrimônio Artístico e Histórico Nacional) reconhece os espaços sagrados dos terreiros como patrimônio cultural brasileiro. Assim, o órgão do Governo Federal tombou os seguintes terreiros em Salvador, Itaparica e Cachoeira, todos no estado da Bahia:[29]
- Ilê Axé Iyá Nassô Oká (Casa Branca do Engenho Velho, Salvador/BA)
- Ilê Axé Opô Afonjá (Salvador/BA)
- Ilê Iyá Omin Axé Iyamassé (Terreiro do Gantois, Salvador/BA)
- Ilê Mariô Láji (Terreiro do Alaketu, Salvador/BA)
- Mansu Bandukenké (Terreiro do Bate-Folha, Salvador/BA)
- Ilê Oxumarê Axé Ogodô (Casa de Oxumarê, Salvador/BA)
- Ilê Agboulá (Itaparica/BA)
- Zoogodô Bogun Malê Sejahundê (Roça do Ventura, Cachoeira/BA)
Hierarquia[editar | editar código-fonte]
No Brasil, existe uma divisão nos cultos: Ifá, Egungun, Orixá, Vodun e Nkisi são separados por tipo de iniciação ao sacerdócio.
- No culto de ifá, participam tanto homens quanto mulheres, sendo um culto patriarcal conduzido pelos babalaôs.
- No culto aos egunguns, participam tanto homens quanto mulheres, sendo um culto patriarcal que lida diretamente com a ancestralidade, conduzidos pelos Ojé.
- No candomblé queto, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido tanto por homens (babalorixás) quanto por mulheres (ialorixás), entram em transe com orixá.
- No candomblé jeje, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido tanto por homens quanto por mulheres Vodunsis, entram em transe com vodun.
- No candomblé banto, participam tanto homens quanto mulheres, sendo conduzido tanto por homens quanto por mulheres iniciadas muzenzas: entram em transe com nkisi.
Sacerdócio[editar | editar código-fonte]
Nas religiões afro-brasileiras, o sacerdócio é dividido em:
- Babalawo - Sacerdote de Orunmila-Ifa do Culto de Ifá
- Bokonon - Sacerdote do Vodun Fa
- Babalorixá ou Iyalorixá - Sacerdotes de Orixás
- Doté ou Doné - Sacerdotes de Voduns
- Tateto e Mameto - Sacerdotes de Inkices
- Ojé - Sacerdote do Culto aos Egungun
- Babalosaim - Sacerdote de Ossaim
- Lista de sacerdotes do candomblé
Adeptos[editar | editar código-fonte]
Povo do Santo[30] ou povo de santo, ou simplesmente "do santo" é como se definem as pessoas devotadas ao culto dos orixás, voduns e inquices, as entidades africanas, no Brasil.
A famosa música "O Que é que a Baiana Tem", composta por Dorival Caymmi e imortalizada por Carmen Miranda, apresenta o estereótipo da baiana de santo, e por extensão o estereótipo de todo um grupo social, com seus trajes, comidas, penteados e danças típicas. Porém, muito além do clichê, encontra-se uma cultura bastante complexa e interessante. Jorge Amado e Carybé foram outros artistas que retrataram muito bem os modos do povo do santo em suas obras.
O Candomblé empresta a seus devotos maneiras de pensar e modos de vida cotidianos: o vestir, o comer, o falar, tudo é influenciado pela religião. Há algumas iniciativas contemporâneas de preservação, afirmação e revitalização dessas culturas, seja a obra de estudiosos como Pierre Verger, Edison Carneiro, Roger Bastide, Nina Rodrigues, Deoscóredes Maximiliano dos Santos, o Mestre Didi, Juana Elbein dos Santos, Mãe Stella de Oxóssi, José Flávio Pessoa de Barros, Reginaldo Prandi, Raul Lody.
Ser "do santo" é considerado uma atitude de afirmação individual, dentro do culto, mas também dentro da sociedade brasileira. Poucas figuras de destaque tomaram tal posição publicamente, como foi o caso de Agenor Miranda, Gilberto Gil e Antonio Olinto, Edvaldo Brito figuras públicas que têm cargos no santo. Por outro lado, grandes zeladores do santo, os chamados pais de santo e mães de santo, tornaram-se célebres por seu trabalho sério dentro da religião do Candomblé, como foi o caso de Mãe Aninha, Mãe Senhora, Menininha do Gantois, Mãe Stella,Mae Edelzuita de Osagian, Edvaldo Brito,[31] dentre outros.
Temas polêmicos[editar | editar código-fonte]
Preconceito[editar | editar código-fonte]
Ver artigo principal: Preconceito contra religiões afro-brasileiras
Manuel Raimundo Querino foi um abolicionista ferrenho, lutou contra as perseguições existentes aos praticantes das religiões afro-brasileiras que eram rotuladas de religiões bárbaras e pagãs.
Procópio de Ogum teve o seu reconhecimento por ter participado da legitimação da religião do candomblé, durante a perseguição às religiões afro-brasileiras promovida pelas autoridades do Estado Novo. Nesse período, o Ilê Ogunjá foi invadido pela polícia baiana, sob a supervisão do famoso delegado Pedrito Gordo. Procópio foi preso e espancado. O jornalista Antônio Monteiro foi uma das pessoas que ajudou na libertação de Procópio. Tal acontecimento - caso Pedrito - registrou o nome de Procópio na história popular baiana, chegando mesmo a fazer parte de uma letra de samba-de-roda:
“ | "Não gosto de candomblé que é festa de feiticeiro quando a cabeça me dói serei um dos primeiros Procópio tava na sala esperando santo chegá quando chegou seu Pedrito Procópio passa pra cá Galinha tem força n’aza o galo no esporão Procópio no candomblé Pedrito é no facão. Acabe com este santo Pedrito vem aí lá vem cantando ca ô cabieci" | ” |
“ | O Jornal da Bahia, de 3 de maio de 1855, faz alusão a uma reunião na casa Ilê Iyá nassô: "Foram presos e colocados à disposição da polícia Cristóvão Francisco Tavares, africano emancipado, Maria Salomé, Joana Francisca, Leopoldina Maria da Conceição, Escolástica Maria da Conceição, crioulos livres; os escravos Rodolfo Araújo Sá Barreto, mulato; Melônio, crioulo, e as africanas Maria Tereza, Benedita, Silvana... que estavam no local chamado Engenho Velho, numa reunião que chamavam de "candomblé"". | ” |
Abdias do Nascimento conta, em uma entrevista concedida ao Portal Afro:
“ | Os cultos afro-brasileiros eram uma questão de polícia. Dava cadeia. Até hoje, nos museus da polícia do Rio de Janeiro ou da Bahia, podemos encontrar artefatos cultuais retidos. São peças que provavam a suposta delinquência ou anormalidade mental da comunidade negra. Na Bahia, o Instituto Nina Rodrigues mostra exatamente isso: que o negro era um camarada doente da cabeça por ter sua própria crença, seus próprios valores, sua liturgia e seu culto. Eles não podiam aceitar isso. | ” |
Homossexualidade[editar | editar código-fonte]
A homossexualidade está presente na maioria das religiões, porém oculta, indiscutivelmente abafada por princípios e muitas vezes negada pelos ex-homossexuais.
No candomblé, a homossexualidade é amplamente aceita e discutida nos dias atuais, mas já teve um período que homens heterossexuais e homossexuais não podiam ser iniciados como rodantes (termo usado para pessoas que entram em transe), não era permitido em festas que um homem dançasse na roda de candomblé mesmo que estivesse em transe.
O mais famoso e revolucionário homossexual do candomblé foi sem dúvida Joãozinho da Goméia, que afrontou as matriarcas e ocupou seu espaço tornando-se conhecido internacionalmente. Tiveram muitos outros, mas nenhum conseguiu suplantá-lo em ousadia e popularidade.
Aborto[editar | editar código-fonte]
As religiões afro-brasileiras, que, na maioria, são religiões derivadas das religiões tribais africanas, são contra o aborto: o africano vê o filho como a continuação da própria vida, filho é o bem mais precioso que o homem africano pode ter. Em consequência disso, foram trazidos para o Brasil alguns conceitos.
- No conceito social: amparam e orientam adolescentes e mulheres grávidas.
- No conceito religioso: Oxum é quem rege o processo de fecundidade, cuida do embrião, evita o aborto espontâneo, não aprova o aborto provocado, mantém a criança viva e sadia na barriga da mãe até o nascimento. Uma mulher quando não consegue engravidar, recorre a Oxum.
- No conceito jurídico: só aprova a interrupção da gravidez nos casos previstos em lei.
Sacrifício[editar | editar código-fonte]
No candomblé, esta parte do ritual denominada de sacrifício não é propriamente secreta; porém não se realiza senão diante de um reduzido número de pessoas, todos fiéis da religião.
Uma pessoa especializada no sacrifício, Axogun, que tem tal função na hierarquia sacerdotal, é quem o realiza ou, na sua falta, o babalorixá. O Axogun não pode deixar o animal sentir dor ou sofrer porque a oferenda não seria aceite pelo Orixá. O objeto do sacrifício, que é sempre um animal, muda conforme o Orixá ao qual é oferecido; trata-se, conforme a terminologia tradicional, ora de um animal de duas patas, ora de um animal de quatro patas, galinha, pombo, bode, carneiro. Na realidade não se trata de um único sacrifício: sempre que se fizer um sacrifício a qualquer Orixá, deve ser antes feito um para Exú, o primeiro a ser servido.[33][34][35]
Mudança de hábitos e costumes[editar | editar código-fonte]
As casas de candomblé são frequentadas e habitadas por um número variável de pessoas, pode variar de 20 a 300 pessoas dependendo do tamanho da casa e da ocasião ou do evento. Fora do período de festas na casa só ficam as pessoas residentes, mas nas obrigações e festas além dos residentes virão os outros filhos de santo da casa, os visitantes e convidados. Quanto maior o número de pessoas, maior será a preocupação com a higiene e alimentação. Os animais são abatidos pelo Axogum e limpos, as comidas são preparadas sempre sob a vigilância da encarregada da cozinha e responsável pela qualidade dos alimentos tanto para os orixás como para as pessoas.
A maior preocupação nas casas de candomblé e das outras religiões afro-brasileiras sempre foi com as doenças infecciosas, principalmente a tuberculose e hepatite, por serem transmissíveis através de copos e talheres. Por esse motivo, cada filho da casa deve ter seu prato e caneca identificados, iyawos durante o período de recolhimento não usam talheres, só passam a usá-los depois da caída de quelê. A higiene com pratos, talheres e copos sempre foi constante. Nos tempos modernos, quando já existem os materiais descartáveis, ficou um pouco mais fácil de lidar com o problema.
Com o surgimento de novas doenças como a aids,[36] muitos hábitos e costumes do candomblé tiveram que ser mudados.[37] Na iniciação, os Iyawos tinham suas cabeças raspadas e curas feitas por uma única navalha que a Iyalorixá recebia de sua mãe-de-santo quando da posse do cargo; isso passou a ser feito com mais cuidado, adotando-se navalhas individuais ou descartáveis.
Um dos maiores problemas enfrentados nas casas de candomblé tem sido com a dengue, principalmente nas regiões onde os focos do mosquito estão sendo combatidos. Os potes de abô (infusão de folhas sagradas) foram esvaziados para evitar possível proliferação do mosquito, os banhos são preparados com água e folhas frescas e usados imediatamente.
A presença de crianças durante as festas de candomblé tem sido foco de discussões nos terreiros da Bahia, após a proibição feita pela Federação Baiana do Culto Afro-Brasileiro