PERGUNTA: Porém, a prostituição, na sua feição de vida dissoluta e de liberdade sexual extrema, não se constitui numa perversão condenável pela sua feição de mal público e até, oficializado, em certos casos?
RAMATÍS: Na própria linguagem humana, a palavra perversão significa "a ação ou o efeito de perverter; mudança do bem em mal, corrupção, desmoralização, depravação de costumes". O ser humano pode praticar inúmeros tipos de perversão, que variam na manifestação de maior ou menor prejuízo a outrem, à sociedade ou às instituições políticas, sociais e mesmo religiosas.
Os tiranos do mundo praticam infindável número de "perversões", quer quando corrompem os valores políticos e doutrinários pelos quais são responsáveis ou se fizeram responsáveis, destruindo com requinte de perversidade e sadismo, homens, mulheres e até crianças, antes torturados, por efeito de prováveis denúncias ou espionagem. São mudanças do bem no mal, corrupção de costumes pelo suborno e astúcia, que se enquadram perfeitamente no tema "perversão".
As cruzadas, na Idade Média, foram verdadeiras prostituições religiosas, assim como a Santa Inquisição, em sua cretina hipocrisia, conduzindo hereges, judeus e infiéis para as fogueiras, sob o paraninfo de Fernando II e Isabel, reis católicos da Espanha, figuras prostitutas que corrompiam a ternura, o amor e a santidade do Cristo, matando, com falsas e prévias orações salvadoras, aqueles que não seguiam os seus interesses religiosos. Catarina de Médicis, ordenando a matança dos huguenotes, deu margem a uma das maiores perversões e prostituições na França. Os franceses, guilhotinando milhares de nobres e avessos à Revolução Francesa a qual pregava Liberdade, Igualdade e Fraternidade, foram execráveis prostitutas, desmentindo o bem pela prática do mal, nutrindo a tirania com o dístico de liberdade. O povo, exultante com a confecção da bomba atômica salvadora, acompanhou, num apoio mental e mesmo verbal, as manchetes jornalísticas que noticiaram a morte de 120.000 japoneses pela ação pacificadora da bomba atômica, mudando o bem em mal, pervertendo o sentido sublime da vida, assassinando criaturas indefesas, nascidas para a ventura humana e muitas mal saídas do ventre materno, comprovando a existência de uma prostituição coletiva, genocida. Teve menos culpa o militar encarregado do bombardeio que detonou a bomba atômica— foi apenas um agente para abrir as comportas das paixões humanas, satisfazendo o ódio represado e incrementado pelas paixões políticas, disseminado por todos os pseudocivilizados.
Assim, a aura abominável da prostituição do homem destruidor e criminoso torna uma sublime brisa a da prostituição humana. A patriótica negociação de seres mortos nos matadouros fratricidas das guerras, produzida pelos homens depravados e prostituídos pela ambição da fortuna ou da consagração política, é caracterizada como serviço à Pátria e à humanidade.
PERGUNTA: Poderíamos conceber que a prostituição atinge a sua mais flagrante disseminação nas épocas de degradação humana; não é assim?
RAMATÍS: Não só nas épocas da decadência de uma civilização dominante, como a do Império Romano e, também, na fase da passagem da Idade Média para a Moderna, quando os reis cultivavam o hábito de ter algumas concubinas; porém ela é mais acentuada durante as ocasiões de agravamento das condições econômicas, geradoras de fome, desemprego, criando desespero para a sobrevivência humana, ou posterior às revoluções, guerras, flagelos naturais ou, mesmo, pelo relaxamento dos costumes, por causa de certas doutrinas aceitas pelo povo. Eis por que as prostitutas desempenharam um relevante papel em Atenas e Corinto, durante a própria idade áurea da famosa cultura grega, onde dominavam a filosofia, o teatro, as artes, em sua máxima expressão. O culto a Vênus, a deusa do Amor, reinava absoluto na velha Grécia, em todas as suas formas e expressões, extensivas até às atividades de intercâmbio na vida de suas cidades. Aliás, foi o próprio Sólon, conhecido como um dos maiores filósofos e legisladores gregos, que, à guisa de um abalizado médico social, prescreveu para os atenienses a medicação dos prostíbulos, como antídoto da enfermidade grassante do homossexualismo. Sob tal prescrição terapêutica, Sólon havia instituído um lupanar estatal como antídoto ao homossexualismo masculino e ao lesbianismo.
PERGUNTA: Sob a égide dos ensinos de Jesus, como poderíamos encarar as mulheres prostitutas?
RAMATÍS: O Mestre Jesus, prenhe de amor e de compreensão por todos os filhos de Deus, é muito claro no seu julgamento da prostituta, ao exclamar a sua inolvidável sentença, justamente a quem era perseguida por adultério: "aquele que estiver sem pecado atire a primeira pedra". A turba enfurecida e pretendendo fazer justiça pelas próprias mãos à ignomínia do adultério, ou da prostituição, e o Cristo abrangeu-a com o seu melhor olhar límpido e angélico, penetrando na alma de cada julgador e desentranhando-lhe do fundo da alma a sua oculta prostituição nos demais setores da vida humana. Fê-los recuarem, atemorizados e indecisos, sem qualquer reação, pois, sentiam à luz do dia a culpa da prostituição na trapaça, na negociata, na ambição, no ciúme e na mentira da alma de cada um. Ademais, nenhum símbolo da redenção humana serve mais de estímulo à sublimação feminina do que a figura angustiada e desesperada de Maria Madalena, tocada pela figura carismática do Cristo-Jesus, libertando-a do lodo nauseante do prazer fescenino, despertando-a para a luz criativa do anjo adormecido em sua intimidade. Sob a égide de elevada inspiração, Maria Madalena é um eterno exemplo a todas as mulheres de má fama para lograr a própria redenção e o ingresso nas esferas angélicas, quando se propuserem "viver" incondicionalmente, no íntimo de sua alma, o amor puro do Cristo.
DO LIVRO: "SOB A LUZ DO ESPIRITISMO" RAMATÍS/HERCÍLIO MAES - EDITORA DO CONHECIMENTO.