Nzazi – A Justiça Divina
Nzazi a justiça divina, aquela que vem do céu através de um raio ou relâmpago, é um Nkisi usado como Medicina pelos Bakongo do baixo Kongo, Mayombe e Villi, para os Balubas aparece na astronomia, e no Zaire como fenômeno geológico.
No Kongo, Nzazi é o espírito que aparece nas tradições orais Bakongo, fazendo parte também da classe de espíritos poderosos e temidos como Nkondi, Mbumba Luangu, Mpulu Mbuzi entre outros.
O Nzazi é invocado apenas por um especialista, pois apenas ele tem o poder de manipular essa energia, Nzazi é usado para estabelecer a ordem em uma aldeia e também para avisar que a estação da seca está indo embora e a chuvosa está próxima. O Nganga Nzazi, sacerdote do culto ao raio, invoca a chuva com objetos sagrados, assim também fazendo o trovão ecoar através do período seco.
O Fogo de Nzazi vem através do raio que atinge uma palmeiras e árvores frutíferas, quando atingidas por esse raio, ficam proibidas de serem tocadas pelas pessoas, isso é determinado por Nkisi Nzazi através do Nganga. Acredita-se que passando perto da árvore, o Nkisi Nzazi estará livrando-se de uma maldição. As árvores atingidas por Nzazi são usados como materiais para confecção dos amuletos e objetos sagrados ligado a esse Nkisi.
Dentro da medicina, Nkisi Nzazi tem vários formados como objetos sagrados, usados pelo Nganga para várias finalidades como ataque, defesa, cura e também como julgador de ladrões e saqueadores de aldeias. Os objetos Nkisi usados pelo Nganga são:
Mbwa Nzazi: o Cão de Nzazi, é usado para controlar o raio e o relâmpago para manter as pessoas longe do que eles podem causar.
Mwilu kilembika Nzazi: Um vaso de barro com Ki-nzazi, metal duro, branco, brilhante, como folha de flandres, zinco e pemba usado também para acalmar a fúria do relâmpago.
Biteke Nzazi: são duas estatuas de formato masculino, usado pelo sacerdote para encontrar e julgar suspeitos de roubos, quando invocado, o curandeiro bate as duas estátuas, assim formando um som de trovão, pedindo para que Nzazi puna o culpado mesmo quando os suspeitos negam o delito, causando uma maldição. A reação é imediata no corpo, a pele do culpado começa a entrar em erupção causando o bolhas e queimaduras, a doença é chamada de Tiya twa Nzambi (o fogo de deus), muitas vezes o ladrão não revela o roubo e a maldição acaba causando a morte, o sacerdote enterra o corpo em cruzamento de estrada, assim afastando a maldição dos arredores. Caso o ladrão devolva o artigo roubado, a seguinte ação do sacerdote é quebrar a maldição de Nzazi, a pessoa ou a família diz ao Nganga para trazer sua imagem, e derrama algum vinho da palma no furo no estômago de sua imagem, agita bem o vinho, e o dá à pessoa ou às pessoas para beber, isto é chamado nua mbozo (para beber a mistura), essa mistura torna os participantes imunes à doença acima, e da morte por relâmpagos.
Se vários membros de uma família morrem por Nzazi, ou seja, por um raio ou por uma maldição, a família passa pela cerimônia de pacto com o Nkisi Nzazi, ou um dos membros da família se torna um Nzazi Nganga, isso é chamado tintuka Nzazi (para vir a influência benigna de Nzazi).
Acredita-se que, se Nzazi pertence à família, terá piedade. Deve ser lembrado que, quando a maldição Nzazi é colocada em um ladrão, a família do ladrão está incluída na maldição, e se a família tem uma forte suspeita de que um dos seus membros seja o ladrão, eles tentam se proteger da maneira acima, e sem dúvida, o ladrão muitas vezes se protege, aproveitando o antídoto.
Nkutu Nzazi: saco de raios, com cabeças de cobra, serve para vingança, quando ocorre um ataque espiritual contra um indivíduo ou uma família.
Para os Baluba
Para os Baluba Nzazi “o Raio” tem a representação de um animal, uma cabra preta com cauda de pavão que, quando abertas, saem faíscas de fogo. Nas estações mais secas ele vive no interior de uma caverna, no período de chuva ele sobe à superfície. Ele sempre se move como um estrondo, formando o Nkuba (o trovão). Muitas vezes lança-se em direção a terra com objetivo de tocar um objeto, um animal ou homem, para absorver sua energia e se alimentar.
Os Homens atingidos pelo Raio sempre é os sacerdotes chamados de Mluba, ao ver o Flash do raio, inclina-se para evitar de ser atingido. Quando atingido os ossos entra em demanda, por ser extremamente valiosos para confeccionar um Nkisi poderoso. Para isso é reduzido os ossos em pó, que é colocado em um chifre de cabra, joga-se água quente, quando ativado o raio sai da trompa de forma violenta para derrotar o indivíduo designado pelo sacerdote.
No Zaire
No Zaire (RDC) o rio Nzadi tem uma grande importância espiritual perto de Tadi Moenga, na outra margem do rio há uma formação rochosa conhecida como Tadi a Nzazi "a pedra relâmpago", composta por massas de granito antigo, misturado com quartzo e mica, localizado em uma planície com grama e algumas plantações de milho em um local isolado.
No alto da colina, o Obelisco natural, um local sagrado de veneração ao raio pelos nativos, acredita-se que nos tempos mais primitivos essa rocha foi formada por uma colisão do raio na terra, tendo poderes espirituais. A Pedra do Raio também é considerada a residência de Simbi, o protetor dos rios, nesse local se faz oferendas e também rituais ao redor da pedra, ofertando-se na beira, frutos para Simbi.
No Candomblé de Angola
Nkisi Nzazi no Candomblé Kongo Angola é cultuado em grande escala, é uma energia que representa a justiça divina, a punição que vem dos céus, também está diretamente ligado ao fogo, muito respeitado e temido pelos antigos, alguns dos seus cânticos são um pedido de misericórdia, para que ele chegue entre nós com calma sem causar danos.
As cores de Nzazi são o branco e o vermelho, o branco representando ação espiritual, o poder do raio sobre seus julgamentos, o vermelho representando o Fogo, dado aos antepassados através do raio ao tocar em uma árvore.
Assim como nas terras Bantu, no Brasil também é usado elementos semelhantes para cultuar essa energia, bem próximo de alguns aspectos energéticos como madeira, metal, pedras, etc.
A Fogueira feita para Nzazi é um modo de agradecimento e conexão através do fogo gerado pelo raio que atingiu uma árvore.
O Sincretismo
Muitos ainda fazem confusão de Nzazi, o raio e Xangô o Deus Yorubá, ambos têm ligação com o raio e o fogo, mas observa-se que Xangô quanto Orixá teve uma vasta história mundana, é um ancestral divinizado e como rei é exaltado tanto no Candomblé de Ketu quanto na sua terra nativa em Oyó, Nigéria.
Já Nzazi se trata puramente de um fenômeno da natureza e também de uma ancestralidade ligado a esse elemento, há muitas afirmações que Nzazi seja uma cópia fiel de Xangô, mesmo o Candomblé de Angola passando por todo um sincretismo religioso, Nzazi não é cópia, e sim, único e peculiar no seu culto, e importante para seu povo assim como Xangô para o Candomblé de Ketu.
Invocar uma divindade que seja da mesma classe elementar como Nzazi e Xangô, não quer dizer que são mesmos, ambos têm ações ligadas a justiça, porém o culto é diferente, o modo de transe, o cântico de Xangô, que fala sobre passagens de sua vida e suas ações como líder de um povo, muito diferente de Nzazi, onde seus cânticos falam sobre o modo que o raio aparece para seu povo, muitos deles também sendo pedidos de misericórdia por conta do que Nzazi pode causar em sua chegada.
Texto de Glauber Willians e Leonardo Luis
Fontes :
Narrative of an expedition to explore the river Zaire usually called the Congo in South Africa in 1816
Por James Kingston Tuckey , Christen Smith
Two Trips to Gorilla Land and the Cataracts of the Congo
Por Richard Francis Burton
African-Atlantic Cultures and the South Carolina Lowcountry
Por Ras Michael Brown
Kongo Political Culture: The Conceptual Challenge of the Particular
Por Wyatt MacGaffey
Folk-lore - A Quarterly Review of Myth,Tradition,Instituition, and Custom
Por David Nutt
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