domingo, 12 de maio de 2019

Elementos de Liturgia ( altar – defumação – amaci – banhos – música)







Elementos de Liturgia ( altar – defumação – amaci – banhos – música)


Por influência do catolicismo, a Umbanda adotou o altar, ponto forte em seus templos, terreiros, choupanas, casas, etc.

As imagens de santos, sincretizados com os Orixás, se fazem presentes no altar, remetendo os fiéis a algo conhecido, acolhedor por conta de o Brasil ser um país de maioria católica.

O altar da Tenda Nossa Senhora da Piedade, onde foi fundada a Umbanda,  contém imagens Católicas, no topo há a imagem de Nossa Senhora da Piedade, que é a imagem da Pietá de Michelangelo, onde Maria segura Jesus nos braços;  teria dito o Caboclo das Sete Encruzilhadas que:

“Assim como Maria segura Jesus, a Umbanda seguraria os filhos seus”

 A Umbanda não inventou o sincretismo.

 Sincretismo é a junção de dois ou mais elementos de culturas que passa a ser um terceiro que é “re-significado”, resultante desses dois ou mais elementos.

 A Umbanda não inventou o sincretismo de Santos Católicos com Orixás, no qual, São Jorge representa Ogum, São Sebastião representa Oxóssi, Jesus Cristo representa Oxalá, Nossa Senhora da Conceição representa Oxum, Nossa Senhora dos Navegantes representa Iemanjá, São Bartolomeu representa Oxumaré, São Lázaro representa Obaluaiyê, São Roque representa Omulu, Cosme e Damião representam Ibeji, isso é sincretismo.


 A Umbanda não inventou esse sincretismo, ele já existia no Candomblé em algumas de suas rodas muito antes de existir a Umbanda.

A Umbanda adotou o sincretismo como algo presente na maioria das Tendas.

Na Tenda Espírita Mirim só há uma única imagem, a imagem de Jesus Cristo considerado o médium supremo. Depois surgirão algumas Tendas que vão abolir as imagens e vão usar somente as pedras ou símbolos ou signos ou ponto riscado.

No entanto, a maioria das Tendas tem um altar com santos Católicos, geralmente esse altar é construído numa mesa ou ele é construído em degraus  lembrando uma pirâmide.

 Quando o altar é construído em forma de pirâmide, é comum que no topo fique a imagem de Cristo e nos outros degraus fiquem as imagens dos outros santos Católicos representando os Orixás. É comum o altar de Umbanda ter a forma piramidal que é uma forma hierárquica de representação.

Imagens de Caboclos e Pretos Velhos ficam num plano um pouco mais abaixo no altar.

Na igreja Católica, no altar, existe um elemento chamado “pedra Dara”. Essa pedra Dara é um recipiente no qual, geralmente, há uma relíquia dentro. Uma relíquia é um pedaço do corpo de um santo.

Num altar Católico antigo e tradicional, colocava-se no altar um pedaço de osso do corpo de um santo.

Em Roma, na Igreja de São Pedro, a força do altar é o túmulo de São Pedro.

Isso é uma coisa que não se fala e que não se tem ideia, mas é como se a relíquia, a pedra Dara e às vezes o próprio túmulo do santo fosse o assentamento, o axé daquele templo, ali se coloca a relíquia, a pedra Dara e as imagens estão em volta, muitas ou poucas imagens dependo da igreja.

Relíquias podem ser de alguém que foi muito ligado ao Santo(a) e não necessariamente do próprio.

Se existe um altar, há alguma coisa naquele altar que justifique ele estar ali, geralmente não são apenas as imagens, existe algum elemento antigo ou forte considerado algo que tem energia e presença.

A partir de Moisés, poderia se dizer até, das conversas de Moisés com Jetro, seu sogro, Deus vai aparecendo a Moisés e vai colocando como é que o sacerdote tem que se vestir, como é que é o sacerdócio, como se monta um altar. Moisés encontra Deus, Ele dá as pedras da lei a Moisés, Moisés quebra a pedra, a pedra é refeita. Então, Deus explica a Moisés como é que ele vai construir a “arca da aliança”.

 A arca da aliança é o assentamento de Moisés, a arca da aliança que Deus descreve, orienta, era considerado um ponto de força, de axé, tão forte que ninguém podia chegar perto, senão a pessoa iria ser queimada, fulminada porque aquela força era uma força terrível.

A arca da aliança seria colocada, mais tarde,  no Templo de Jerusalém, originalmente o Templo de Salomão.

 A arca ficaria num ambiente fechado, recluso.

 Imagine o espaço físico do Templo fechado, com salas dentro de salas e na sala mais reservada, contígua, ficaria o santo do santo, onde apenas o sumo sacerdote poderia entrar, ali é o axé, o altar sustentador da força, de toda energia.

 O altar Católico representa o ponto do Templo onde está o santo do santo.

No Terreiro, ou numa roça de Candomblé, não há altar, as pessoas não ficam de frente para um altar porque um Terreiro de Candomblé é um espaço que representa o universo com a dança circular, é um movimento circular.

As pessoas se movimentam num Terreiro de Candomblé de forma circular diferente do Terreiro de Umbanda, ou de uma igreja em que as pessoas estão alinhadas de frente para o altar.

No Candomblé o movimento é circular e o axé está no centro do Terreiro, ou seja, no meio há o assentamento que pode estar construído em cima do chão ou pode estar embaixo do chão.

Quando você entra num Terreiro de Umbanda ou de Candomblé, se no centro do Terreiro existe uma construção, ali está o assentamento. Às vezes não existe uma construção, às vezes há apenas uma lajota de cor diferente e ali é colocada uma lajota de cor diferente ou um sinal no centro do Terreiro para que se saiba que embaixo dele está o assentamento da casa.

 Os filhos, quando entram nesse Terreiro, onde há uma lajota diferente no meio, eles cruzam o chão e batem cabeça em cima daquela lajota.

Há Terreiros de Umbanda que colocam uma lajota diferente no meio, onde está o assentamento e também colocam no altar, então, as pessoas batem cabeça no centro, depois batem cabeça no altar. O que tem no nosso altar? Tem um Otá, um assentamento - pode ser um Otá, pode ser alguns Otás, alguns assentamentos e  geralmente, construídos em forma hierárquica e piramidal, os degraus onde Oxalá está no topo e os outros santos abaixo.

Isso não é um segredo.

As pessoas costumam acreditar que quando tornam as coisas um segredo, elas tem mais força, mas não tem mais força por ser um segredo, tem força por ter fundamento.
Pai Ronaldo Linares, da Federação Umbandista do Grande ABC, costuma orientar que no seu altar Oxalá deve estar no alto, o seu Orixá de Frente na direita, o seu Orixá de Juntó na esquerda e os outros abaixo. Não tem regra. O comum é colocar Oxalá no ponto mais alto porque ele representa a “fé”.

A imagem de Jesus sincretizada com Oxalá, representa a “fé”. E a “fé” é a base de toda a religião, é o ponto alto.

Abaixo pode colocar o de Frente na direita, o de Juntó na esquerda ou coloque abaixo aqueles que tocarem o seu coração da forma que você acha que deve ser.

Por que nós temos um altar na Umbanda?

Por que a Umbanda copiou a igreja Católica?

Qual é o sentido, o fundamento de ter um altar?

Para que ter um altar?

Poderíamos ter apenas o assentamento como ponto irradiante, vórtice de energia, ligação com a natureza.

A ligação com a natureza está no assentamento, bastaria ter um assentamento. Para que ter um altar?

Quando nós rezamos a Deus, elevamos o pensamento ao alto e as mãos para captar a irradiação de Deus e dos Orixás que vem do alto.

O tempo todo as irradiações estão vindo do alto para baixo, recebemos as irradiações do alto que vem na vertical.

Na horizontal, existem as vibrações naturais chamadas de correntes eletromagnéticas que nós estamos trocando e sentindo o tempo todo. Mas, a irradiação pura de Deus e do Orixá vem na vertical. O que o altar faz?

 O altar recebe essa irradiação na vertical e por meio das chamas das velas, do assentamento, da firmeza, de tudo o que houver no altar, coloca essa vibração que vem do alto de frente para a gente.

A partir do momento que temos um altar, nós nos colocamos de frente para o mistério ao qual estamos rezando: Deus, suas divindades, os Orixás, os santos, os Caboclos, a força deles, o poder deles está de frente pra gente por meio do altar, o altar se torna em si um vórtice de energia, ele se torna um grande portal. Inclusive, algumas entidades, alguns seres da natureza se manifestam a partir do altar, saem pelo portal que é criado ali no altar de comunicação com dimensões e realidades paralelas, então, esse é o fundamento de ter um altar.

O altar é o ponto irradiante de um Templo, o altar irradia as virtudes, as energias positivas e a tronqueira é o ponto absorvente.

Temos um ponto irradiante, um ponto absorvente. O altar irradiando as virtudes e a tronqueira absorvendo os vícios. O altar irradiando energia positiva e a tronqueira absorvendo as nossas energias negativas.

Assim se forma uma polaridade: altar e tronqueira é esse duplo pólo, um irradia e o outro absorve.

Isso cria um campo de energia dentro do Terreiro, dá movimento à energia dentro do Terreiro e isso está totalmente fundamentado, ou seja, tem um por que.

O altar é algo que conforta e acalma os corações daqueles que já são Cristãos, maioria do povo brasileiro, mesmo porque, deparar-se com um altar, uma imagem de Cristo,  já acalma o coração porque é um elemento conhecido.

 A Umbanda não é uma religião de exclusividade, é de inclusividade, ou seja, nós aceitamos tudo aquilo que é bom, tudo que é bom é aceito, faz parte da nossa liturgia.

O que mais podemos falar de liturgia? Sobre defumação.

Faz parte da nossa liturgia a defumação.

Não é exclusividade da Umbanda, nos rituais Católicos, se procede à defumação.

O turíbulo, recipiente onde são acondicionadas as ervas para a defumação,  é usado em quase todas as tradições.

Turíbulo é uma ferramenta, um instrumento de liturgia para queimar essências e, por meio da fumaça, a essência exala perfume no ar e a crença é que essa essência da defumação, limpa e purifica o ambiente.

Na cultura oriental, o incenso é muito comum. Costuma-se usar varetas de incenso. No turíbulo se põe carvão em brasa e as ervas ou as resinas para queimar em cima do carvão.

 Na igreja Católica o que se usa mais é a resina do olíbano, que é incenso também, tem propriedades aromáticas que mexem com o nosso mental, com o nosso cérebro e desperta o sentido de tranquilidade, harmonia, segurança.

Alguns defumadores, em tablete ou até em pó, aqueles que queimam sozinhos, têm, em sua composição, ervas misturadas com pólvora e com serragem, por isso queimam com facilidade.

 O ideal é usar erva seca pura ou com resina de boa qualidade.

O turíbulo pode ser de barro, ferro, não importa. O que importa é que dentro desse turíbulo haja carvão em brasa, prepara-se o carvão antes ou usa-se um recipiente com álcool onde se acende o carvão até virar brasa, há de se aprender a lidar com o turíbulo para não se machucar, e não se queimar.

 Muita gente se queima e não sabe acender um turíbulo, um defumador, uma maneira simples é: se o turíbulo é de metal, algo simples é você colocar uma cumbiquinha de barro no fundo dele, colocar um pouco de álcool nessa cumbuca, acender com cuidado e deixar o carvão queimando sozinho ali em torno de uns quinze, vinte minutos até virar brasa, se pega uma erva de boa qualidade, coloca-se dentro desse turíbulo e logo começa a sair  fumaça que é a defumação, que tem a propriedade de limpar e descarregar o ambiente.

Aí você vai escolher as ervas: naquele dia o ambiente está muito pesado? Você vai colocar ervas para cortar demanda. Naquele dia você está precisando harmonizar? Você coloca ervas de harmonização. Naquele dia você vai fazer uma Gira de Ogum? Coloque ervas de Ogum. Vai fazer uma Gira de Oxum? Coloque ervas de Oxum.

Existe a possibilidade de escolha das ervas.

O incenso e o defumador mexem com as nossas emoções, mas não é apenas para isso que eles existem, eles têm propriedades de limpar e descarregar o ambiente, e costuma-se proceder da seguinte forma:  colocam-se as ervas no turíbulo ou a resina, e diante do altar, eleva-se o pensamento a Deus, Criador de tudo e de todos, Sua Lei Maior e Sua Justiça Divina e pede-se licença a Oxóssi que é o Senhor de todo reino vegetal, a Ossain, Senhor das folhas, para limpar e defumar o Terreiro, que eles coloquem seu axé ali naquelas ervas ou naquela resina que está queimando.

O procedimento de defumação começa quando o médium responsável por essa tarefa, com o turíbulo na mão, passa pelos outros médiuns da corrente balançando o turíbulo e parando na frente de um por um.

 Geralmente os médiuns colocam as mãos na fumaça e puxam-na para si ou  giram em torno de si, no sentido anti-horário para descarregar ou no sentido horário para receber a energia.

Se for um Terreiro pequeno, com poucos médiuns, dá para parar de um por um e ir defumando, mas agora se você está num Terreiro grande, com muitos médiuns, às vezes,  não tem muita saída de fumaça, então, o turíbulo tem que passar um pouquinho mais rápido, tem que pensar em tudo isso.

 A sequencia, normalmente é: defumar o altar, a curimba, se houver o dirigente depois se defuma o Terreiro em direção à porta da rua.

Tudo o que se faz para limpar, descarregar, se leva para a porta da rua, a fumaça, o aroma, vão inebriando, enchendo o Terreiro até a porta da rua, ao chegar à porta da rua,  se coloca o turíbulo na rua ou volte e guarde em local adequado.

Isto é a defumação, sua propriedade de queimar energia negativa, purificar energia negativa e tornar o ambiente mais leve, mais tranquilo para o trabalho espiritual aliviando assim parte da carga para os Guias. Faz parte da liturgia de Umbanda.

Na Umbanda as ervas são muito importantes, inclusive nos pontos cantados, se fala que são as ervas da Jurema, existem muitos pontos de Umbanda e pontos tradicionais. São pontos cantados desde o início da religião, há décadas e décadas, esses pontos são cantados em todos os Terreiros.

A defumação é um dos momentos do ritual que tem a maior variedade de pontos cantados. Canta-se para as ervas da Jurema, que são importantes no culto e no ritual de Umbanda porque a nossa religião é uma religião que reverencia a natureza.

Buscamos nas ervas a força da natureza que nos faz falta porque vivemos a maioria de nós, em regiões metropolitanas, não temos mais aquele contato com a natureza diário, não há, para a maioria de nós, esse contato.

A Umbanda é uma religião urbana, metropolitana, então, por meio das ervas a gente busca a força da natureza, a essência da natureza.  É comum se receitar banhos de ervas e aí você vai também escolher as ervas de acordo com a sua necessidade.

O banho mais simples e mais usado é: guiné, arruda e alecrim, é o grande banho genérico que serve para limpar,  purificar,  energizar,  equilibrar e etc.

 O banho de ervas pode ir à cabeça? Pode. É comum se proibir  banhos de ervas na cabeça por uma influência do Culto de Nação, do Candomblé. Porque no Candomblé só pode por na sua cabeça a erva do seu Orixá, na Umbanda não. Você pode por todas as ervas na sua cabeça, não tem problema nenhum.

A única restrição é:

 Existem ervas que são consideradas mais agressivas, como: “comigo-ninguém-pode”, “espada de São Jorge”, que inclusive são ervas tóxicas, a própria arruda é abortiva, por isso estamos falando de ervas para banho e não ervas para chá.
Há de se observar ainda, casos de reações alérgicas, por isso todo cuidado e discernimento na hora de manusear ervas.

É preciso que se tenha o mínimo de conhecimento das ervas dos Orixás, além de conhecer suas próprias reações quando utiliza ervas.

 Há banhos de ervas para todas as situações, para tudo que você imagina existe um banho adequado e os nossos Guias, os Caboclos, os Pretos Velhos, eles recomendam muito os banhos de ervas e, pelo menos no dia de trabalho, o ideal é que se tome um banho de erva antes de ir para o Terreiro ou se não tem condição tome um banho de erva de manhã.
Os banhos de ervas fazem parte da nossa tradição, além deles existe o “amaci”. O amaci é um extrato forte de erva. Como é preparado um amaci? Um amaci é feito geralmente pilando erva fresca. Então, se é um amaci de Oxalá, você vai pegar as folhas de Oxalá ainda frescas e você vai pilar isso com um pilão até você ter um sumo bem forte, um extrato bem forte daquela erva.

Usa-se uma quantidade pequena de água, diferente do banho. E no amaci você não vai coar, vai fazer um preparado de erva. O amaci é feito para ser aplicado na coroa do médium, é o banho de ervas que vai à coroa.

O amaci pode ser feito para limpeza da coroa e geralmente o primeiro amaci que se faz é o amaci de Oxalá. Dentro do sacerdócio, da preparação sacerdotal na estrutura de Pai  Rubens Saraceni, são preparados quatorze amacis para os quatorze Orixás.

O mais tradicional é o amaci com erva fresca, mas é possível trabalhar o amaci com erva seca também, a diferença é que erva seca sempre vai ter que dar uma pilada, usa-se o pilão para ativar, como se estivesse acordando a essência da erva, então é possível trabalhar com erva seca também e esse amaci é colocado na coroa.

Ritualisticamente, numa apresentação ou numa iniciação, dentro do sacerdócio são feitos quatorze iniciações na força dos quatorze Orixás. O que é uma Iniciação? Dentro da estrutura de Saraceni, a Iniciação é a apresentação formal do médium ou do adepto – o médium de incorporação – para o Orixá realizado no Templo ou na natureza.

No Templo é como uma Gira, então você vai fazer uma Iniciação na força de Egunitá, você nunca viu Egunitá, nunca incorporou Egunitá. O dirigente vai incorporar Egunitá, vai chamar a força de Egunitá para esses médiuns incorporarem. Antes, cada um recebeu um amaci na sua coroa com o axé de Egunitá para concentrar a força de Egunitá na sua coroa.

E assim é para Ogum,  Oxóssi, Xangô, Obaluaiyê. E existem amacis, para vários objetivos – esse, acima citado, é o amaci usado na Iniciação dentro da estrutura de Terreiro, um amaci para cada Orixá, um amaci para cada Iniciação – existem amacis de limpeza, e de descarrego.

Na Tenda Nossa Senhora da Piedade existem poucos rituais específicos além da Gira de atendimento e da Gira do desenvolvimento, diga-se de passagem, na Tenda Nossa Senhora da Piedade o desenvolvimento mediúnico é feito apenas com o trabalho prático dentro do Terreiro e uma vez por ano, é feito um amaci.

É importante citar a Tenda porque é a primeira Tenda de Umbanda que trouxe a tradição de fazer amaci, lá é feito o amaci na mata, do lado de uma cachoeira. Os médiuns vão até a mata e cada um pega as folhas que lhe agrada, mesmo sem conhecer, cada um vai lá e pega as folhas que mais lhe agrada. Essas folhas são colocadas numa grande bacia, junto dessas folhas são colocadas bebidas das entidades. Existe um amaci da Nossa Senhora da Piedade que é colocado na bacia: a cerveja branca do Caboclo, a cerveja preta de Xangô, vai o vinho, vai a cidra, misturam bebidas com ervas e ali misturado com a mão é feito um amaci de ervas e bebidas.

Médium por médium, em fila, se ajoelha, deita no chão, esse amaci é pego e é colocado na coroa do médium e ele naquele momento,  vai incorporar a sua entidade com esse amaci na coroa. É um amaci anual, de firmeza e de forças, que também pode ser feito no Terreiro. Em alguns Terreiros, em algumas apresentações, Iniciações,  se usa no lugar do amaci, colocar a bebida na coroa do médium.

No Culto de Nação, o adepto não é aceito como tal, não está de acordo se não fizer obrigação. Na Umbanda não, o médium faz desenvolvimento mediúnico. Mas o Pai Ronaldo Linares, instituiu como obrigações algumas oferendas aos Orixás e ele diz que não é algo que chama “obrigação” porque é você que tem que se obrigar a fazer essas oferendas, mesmo porque obrigação não é fundamento de Umbanda.

É uma questão de linguagem e na Umbanda essa questão de linguagem é sempre um problema. Pai Ronaldo Linares faz as apresentações aos Orixás no formato de oferenda e cada oferenda é uma obrigação. Quando faz oferenda para Xangô é como uma Iniciação a Xangô, você faz uma pequena oferenda com as velas para Xangô, com a bebida para Xangô e há o momento em que a cerveja preta de Xangô é colocada na coroa do médium, que tem a cabeça coberta e se recolhe para rezar para Xangô.

Da mesma forma se faz oferenda para os outros Orixás, a bebida do Orixá é colocada na cabeça. É importante citar isso porque às vezes, se ouve dizer que se você tomar um banho de erva errado na sua cabeça vai ficar louco. Isso não vai acontecer. Ninguém vai ficar louco porque tomou um banho de erva na cabeça. Pode ter sim uma alergia, talvez, ou ter os cabelos ressecados, além de outras coisas de ordem prática.

Em alguns livros, está escrito que:  se você colocar uma bebida alcoólica na sua cabeça, banhando-a, vai ficar louco, não vai ficar louco, fará menos mal que ingerir o alcoólico, com certeza.

Existem trabalhos de limpeza e descarrego na força de Exu que se toma banho de pinga para descarregar, existem trabalhos na força de Exu que você passa pinga na cabeça para descarregar, não se faz isso todo dia, mas se faz num determinado momento.

Dizem que não se pode tomar banho de sal grosso de cabeça, seria o mesmo que dizer que a gente não pode mais entrar no mar porque o mar é água salgada. Então, se eu não posso por sal grosso na minha cabeça, eu não posso mais tomar banho de mar, isso é uma grande bobagem. O que é preciso é conhecer a erva e saber por que estou usando essa erva, se eu sei por que eu posso lavar minha cabeça e eu passo a erva no meu corpo todo.

Como exemplo, podemos dizer o seguinte:

A pessoa vai até a farmácia, compra um xampu, um condicionador que contém uma química violenta, lava a cabeça com a tal química e não faz mal. Como é que um banho de erva vai fazer mal? Um simples banho de erva vai fazer mal? Você compra uma tinta para pintar o seu cabelo que é uma química violentíssima. E é um banho de erva que vai te fazer mal? Não.

O importante é saber para quê eu estou colocando na minha coroa a erva, seja em forma de amaci ou banho. Mas, faça isso de uma forma simples e simplificada sem complicar porque Umbanda é simples. No entanto, tem fundamento é preciso conhecer.

A música é um fundamento da religião de Umbanda.

A Umbanda é musicada por tradição, dentro das religiões, de quase todas as religiões há uma tradição musical.

Na Cabala Hebraica ainda se diz que: quando você quer chamar um Anjo, você quer evocar, para ele saber que está sendo chamado, você deve falar: “Rafael, Miguel ou Gabriel”, estou apenas falando o nome do Anjo. Agora, se eu cantar o seu nome, então ele vai entender que está sendo chamado. Daí vem também o coro de cantos Gregorianos dentro do Catolicismo onde o objetivo do canto é ser ouvido pelas divindades e a música traz harmonia para nossa vida, traz alegria para nossa vida.

Existe uma origem para o canto e para a dança que é sagrada. Quem estuda a arte da dança vai encontrar a raiz dos movimentos da dança nos templos antigos, quem estuda música vai encontrar a origem, a raiz da música nos templos. Então, a religião também tem o objetivo de trazer alegria para nossa vida ou pelo menos deveria ter o objetivo de trazer alegria para nossa vida. A Umbanda é extremamente cantada, musicada, isso mostra uma descontração dentro da religião.

 A Umbanda é uma religião des-repressora, a Umbanda tem o objetivo de dizer a você: “Viva sua vida com alegria”. Em alguns momentos, a Umbanda praticamente nos ensina a viver a vida com tanta liberdade como se não houvesse religião. Por quê? Porque a Umbanda não nos enche de regras do que pode ou não se fazer, isso é muito importante.

Isso não quer dizer que a gente pode sair cometendo as maiores barbaridades, não é isso. O que quer dizer é que a Umbanda ensina que “A semeadura é livre e a colheita é obrigatória”. A Umbanda não fica nos enchendo de regras e proibições, a Umbanda nos ensina a ter consciência do que é e do que não é bom.

A Umbanda ensina a se ter refinamento, qualidade de vida. Existem algumas restrições que fazem parte do dia-a-dia do Terreiro que são justamente restrições para que a gente consiga sentir melhor as energias que circulam pelo nosso corpo.
Para os médiuns de incorporação, existe, por regra, normalmente, que vinte e quatro horas antes da Gira não se deve comer carne, beber e não deve ter relação sexual. Isto é pedido para que antes da Gira você tenha esse preceito, essa restrição. Por quê? - Isso também faz parte da nossa liturgia – Por que a Umbanda é contra o sexo? Contra a bebida? A Umbanda é contra a carne? Não. Porque quando a gente tem uma relação sexual, a gente troca energia e essa energia que você deu, dependendo do trabalho, principalmente se é um trabalho de atendimento, pode lhe fazer falta.

 Por exemplo, você vai fazer um trabalho de cura, de atendimento, você precisa estar com a sua energia em alta e às vezes a energia do outro que está em você pode ser uma energia que não virá a ajudar durante um trabalho de cura, por exemplo, que é um trabalho super sutil. Então, a questão do sexo é essa: é que aquela troca de energia, às vezes, pode não colaborar com o trabalho.

O ideal é não proibir, é você sentir o que te faz bem e o que não faz bem. Você é um laboratório, faça experiência, sinta no seu corpo, mas faça a experiência de sentir a vida de uma maneira diferente. Proíbe-se de comer carne porque a digestão da carne é pesada, ela leva até 48 horas para ser digerida.

E você está querendo incorporar um Caboclo, o Caboclo quer trabalhar, mas o seu corpo quer fazer a digestão, a energia do seu corpo está voltada a fazer a digestão, fica pesado, difícil de trabalhar incorporado com aquele monte de carne. Agora, não adianta a semana inteira comer feijoada e 24 horas antes do trabalho no Terreiro você não comer carne, você está pesado do mesmo jeito.

Você não come carne, mas faz uma refeição super pesada e aí chega ao Terreiro para incorporar? Gira de Umbanda, geralmente é sexta-feira à noite, antes de ir para a Gira, para o trabalho de Umbanda, sessão de Umbanda, você janta? “Ah, mas, não comi carne”, você comeu tudo que tinha, mas não comeu carne.

A questão é você estar atento à energia do seu corpo, não beber é uma coisa óbvia, pois a energia da bebida, quando passa de certo limite, embriaga: “Ah, mas o Guia incorporado bebe”, mas, ele está manipulando a bebida, é diferente.

O objetivo na Umbanda não é proibir, é ensinar. No momento em que você aprende o que é bom e o que não é bom para você, você não precisa ser proibido de nada, a Umbanda não está aqui para proibir, ela não proíbe, ela ensina.

O objetivo é lidar com a consciência, a Umbanda lhe dá toda liberdade do mundo, você deve ter consciência que o preço da liberdade é a responsabilidade e entre liberdade e responsabilidade, o único caminho é o caminho da consciência.

Dentro de tudo isso, a Umbanda é uma religião de alegria, de prazer, é uma religião de descontração, de dês-repressão e aí entra a música na Umbanda com o seu atabaque que é uma escolha.
 Há livros de Umbanda que dizem que o atabaque estimula o animismo. O atabaque atrapalha porque ele mexe com as suas ondas cerebrais. O atabaque é um instrumento Xamânico, o couro, a percussão é um instrumento Xamânico.

A Umbanda é uma religião de transe. A Umbanda é uma religião de êxtase religioso. A Umbanda é uma religião Xamânica também. E o couro, o atabaque é um instrumento que entra como recurso de ajuda no transe.

Os Xamãs chamam o seu tambor de arco porque ele é o arco e o Xamã é a flecha, esse arco vai lançar o Xamã num estado de transe. Então, o atabaque bem tocado, é uma vibração que nos pega de baixo para cima, ele mexe com o nosso sentido da terra, é algo que sobe, é algo que mexe com seu chacra de base e a incorporação é um fenômeno visceral.

Quando o Ogã estuda e quando ele tira música, não quando ele está surrando, batendo no couro, mas, quando ele tira música do couro do atabaque, esse atabaque bem tocado com ritmo, com melodia, com harmonia,  ajuda,  por quê? Porque Ogum tem uma vibração, Oxum tem outra vibração, Iansã tem outra vibração, o toque do atabaque vai induzir essa vibração, ele vai auxiliar a incorporação.

O toque de Oxum é melodioso, chama-se “o toque de Ijexá”. E a música, os cantos de Oxum são cantos cadenciados e melodiosos como: “Oxum lava meus olhos, Oxum minha emoção. Oxum flor das águas lava o meu coração” Ou “Eu vi mamãe Oxum nas cachoeiras, sentada na beira de um rio. Colhendo lírios, lírios ê, colhendo lírios, lírios á, colhendo lírios pra enfeitar o seu congá”.

É esse o ritmo de Oxum, essa energia de Oxum, é a cadencia de Oxum, diferente de Iansã que tem um toque de barra vento, um toque de guerra.

 Ogum também, às vezes, traz um toque de guerra, o atabaque, a música ajuda a estabelecer essa vibração, essa energia dentro do Terreiro, ele bem tocado é um recurso de liturgia e ajuda o médium a descontrair porque o médium está ouvindo música, ele gosta daquela música, ele está se soltando, ele está descontraído e a incorporação se torna algo muito mais natural naquele momento.

A música é uma ferramenta e deve ser uma ferramenta bem aproveitada, é uma ferramenta que vai trazer alegria, que vai trazer profundidade, isso vai dar profundidade ritualística.

 A música ajuda a criar o ambiente e,  no momento em que está todo mundo tocando para Ogum ou para Oxum ou ainda para Iemanjá: “Mãe d‘água rainha das ondas, sereia do mar. Mãe d’água seu canto é bonito quando tem luar. Iê Iemanjá rainha das ondas, sereia do mar; rainha das ondas, sereia do mar”. O embalo da música, do ritmo, induz o transe e tranquiliza a todos.

Alguns pontos são muito antigos e tradicionais, conhecidos, isso traz para a pessoa, a memória das vezes em que ela foi à festa de Iemanjá, então cria o ambiente, o vinculo. Da mesma forma na Umbanda, muitas vezes se usa também a maraca que é o chocalho - a maraca ou maracá – que tem todo um simbolismo, os nossos índios brasileiros usam muito a maraca.

O atabaque entra mais como influência afro e a maraca entra com uma influência indígena. A gente tem aqui no Brasil os “Kariri Xocó” são os guardiões da Jurema. Então, no Catimbó, na Jurema sagrada o que mais se utiliza como instrumento musical é a maraca, no Candomblé o que mais se usa é o atabaque.

Na Umbanda se usa bastante o atabaque e tem alguma influência da maraca porque a maraca é um instrumento individual, é comum um ou outro Caboclo usar a maraca. O chocalho ou a maraca bem tocada também induz o transe, ajuda o transe e entra como uma ferramenta de trabalho importante.

Principalmente no desenvolvimento mediúnico, um atabaque bem tocado, uma maraca bem tocada, bem cadenciada, tocando direitinho, ajuda muito e colabora bastante com o trabalho mediúnico.

A música faz parte da nossa liturgia, a música é algo que faz parte da religião de Umbanda e não só a música, mas a alegria, a descontração, a dês-repressão.

Anna Pon

(baseado no Curso de Teologia de Umbanda Sagrada – Desenvolvido por Rubens Saraceni – Ministrado por Alexandre Cumino)