quarta-feira, 1 de março de 2023

Quetzalcoatl

 Quetzalcoatl


Arte de Simone Torcasio


Quetzalcoatl era um dos deuses mais importantes do antigo panteão asteca e também em outros panteões mesoamericanos. Era conhecido como Kukulkán pelos maias, Gucumatz pelo povo quiché da Guatemala e Ehecatl pelos huastecas da costa do Golfo. Seu nome é a combinação  de duas palavras nauátles: quetzal, nome dado a um pássaro de plumagem esmeralda, e coatl, que significa serpente. Por isso, ele é comumente chamado de "Serpente Emplumada".

Origens

As raízes de Quetzalcoatl, ou pelo menos a forma da serpente emplumada, podem ser traçadas até a civilização olmeca, que existiu entre os séculos XIII e V a.C. A representação de uma serpente divina emplumada pode ser encontrada em uma famosa escultura em pedra olmeca localizada em La Venta, um sítio arqueológico pré-colombiano da civilização olmeca situado no atual estado mexicano de Tabasco. Nessa escultura, um homem é representado sentado diante dessa criatura. O culto à Quetzalcoatl, no entanto, só surgiria vários séculos depois, durante o período clássico tardio.

Monumento 19, La Venta


Atributos

Uma das civilizações desse período em que Quetzalcoatl era cultuado foi a civilização de Teotihuacan, que existiu entre os séculos III e VIII dC. Parece que o povo desta civilização adorava Quetzalcoatl como um deus da vegetação, da terra e da água, sendo intimamente conectado à Tlaloc, um deus da chuva.

Certas mudanças substanciais ocorreram no culto de Quetzalcoatl quando os toltecas chegaram ao poder. Durante este período, Quetzalcoatl foi transformado no deus das estrelas da manhã e da noite- uma vez que a guerra e o sacrifício humano, que eram características centrais desta cultura, estavam ligados à adoração de corpos celestes. Neste papel como deus das estrelas, Quetzalcoatl também era um símbolo de morte e renascimento.

O papel de Quetzalcoatl como uma divindade solar foi mantido durante o período asteca, embora ele tenha recebido uma série de outros papéis também. Por exemplo, Quetzalcoatl foi associado ao planeta Vênus, tornou-se o protetor dos ourives e outros artesãos e era considerado o deus do aprendizado, ciência, artesanato, artes e agricultura. A ele ainda eram atribuídos a invenção do calendário e a descoberta o milho, duas características importantes da civilização asteca. Além disso, Quetzalcoatl tornou-se fortemente associado aos ventos, especificamente como gerador de nuvens de chuva, o que era importante para uma sociedade dependente da agricultura.

Arte de LucasParolin


Quetzalcoatl e a criação

Mais importante, porém, foi a elevação de Quetzalcoatl ao status de um deus criador. Segundo os astecas, Quetzalcoatl era um dos quatro filhos de Ometeotl (também conhecido como o casal divino Tonacateuctli Tonacacihuatl), o deus criador original. Quetzalcoatl e um de seus irmãos, Tezcatlipoca, receberam a tarefa de criar o mundo.

Em uma versão do mito de criação, Quetzalcoatl e Tezcatlipoca constantemente entram em conflito, o que resultou na criação e destruição de várias eras sucessivas. Durante a primeira era, por exemplo, Quetzalcoatl atacou Tezcatlipoca com um taco de pedra, fazendo com que seu irmão enfurecido comandasse seus jaguares para devorar todas as pessoas. Os astecas acreditavam que esse ciclo de criação e destruição já havia ocorrido quatro vezes, e que a época em que viviam (e a nossa também) pertencia à quinta era.

Arte de doingwell


Em uma versão alternativa do mito, os dois irmãos são mais cooperativos, e conseguiram criar a terra e o céu antes da primeira era após se transformarem em serpentes gigantes e partirem em dois a monstruosa divindade conhecida como Tlaltecuhtli (ou Cipactli em outras versões). Similar ao que os deuses nórdicos Odin, Vili e Ve fizeram com o gigante de gelo Ymir, Quetzalcoatl e Tezcatlipoca usaram o corpo de Tlaltecuhtli para criar o mundo. A parte superior do seu corpo tornou-se a terra, as montanhas e os rios; seu cabelo tornou-se árvores e flores; seus olhos tornaram-se cavernas e poços. 

Para criar os humanos, Quetzalcoatl teve que ir até Mictlan (o submundo asteca) e coletar alguns ossos. Acompanhado de seu irmão Xolotl, um deus com cabeça de cachorro, Quetzalcoatl chegou em Mictlan e foi até a presença de Mictlantecuhtli Mictecacihuatl, os dois deuses que governavam esse reino. Os deuses concordam em entregar à Quetzalcoatl os ossos que ele precisava, mas somente se ele fosse capaz de completar o seguinte desafio: ele deveria dar quatro voltas no submundo tocando uma trombeta feita com uma concha. A tarefa parecia simples, porém a concha dada a Quetzalcoatl não produzia nenhum som. Quetzacoatl conseguiu contornar o problema fazendo com que vermes furassem a concha e colocando abelhas dentro dela, reproduzindo assim um som similar ao de um trombeta. 

Arte de nosuku-k


Ao ouvir o som da concha, Michlantechutli permite que Quetzalcoatl pegasse os ossos, porém o deus decidiu que iria roubar alguns dos ossos, enquanto fingiria que estava deixando Mictlan sem nenhum. Após ser ter seu plano descoberto por Mictlantecutli, o deus acaba caindo em uma cova preparada como armadilha para prendê-lo no submundo. Com a queda, os ossos se quebraram em vários pedaços diferentes (segundo a lenda, esta é razão pela qual as pessoas hoje possuem tamanhos diferentes).


Eventualmente, Quetzalcoatl consegue recolher os ossos e escapar do submundo. Ele os entrega para a deusa Cihuacoatl, que os tritura criando uma espécie de farinha e depois coloca essa farinha em um recipiente especial. Os deuses então se reúnem em torno deste recipiente e derramam gotas de seu próprio sangue. A partir dessa mistura, a humanidade é criada.

Arte de Sara Contreras (YunaXD)


Representações 

A representação mais antiga e sobrevivente de Quetzalcoatl é da civilização olmeca, a anteriormente citada escultura localizada em La Venta. Essa representação de Quetzalcoatl como uma serpente emplumada até hoje é a mais comum de se ver, mas não era a única.

A partir de 1200 d.C., Quetzalcoatl passou a ser frequentemente representado na forma humana, geralmente usando joias de concha e um chapéu cônico (copilli). Ele também pode ter uma faixa de chapéu segurando instrumentos de sacrifício, uma flor, um leque de penas pretas e amarelas e brincos de círculos de jade ou conchas em espiral (epcololli). O deus também costumava usar a joia do vento (Ehecailacozcatl), que é uma seção transversal de um verticilo usado como peitoral. 

Como Ehecatl-Quetzalcoatl, ele geralmente era representado na cor preto, usando uma máscara vermelha como o bico de um pato e tem longos dentes caninos. Como deus das direções cardeais, Quetzalcoatl também foi associado às cores preto (norte), vermelho (leste), azul (sul) e branco (oeste).


Após a conquista espanhola, os já complexos mitos em torno de Quetzalcoatl tornaram-se ainda mais distorcidos, situação não ajudada pela confusão da história do deus com a do lendário primeiro governante dos toltecas em Tollan, Ce Acatl Topiltzin Quetzalcóactl, que assumiu o nome de o deus como um de seus títulos. Ainda hoje, a lenda e o simbolismo de Quetzalcoatl perduram, e ele se tornou um farol do orgulho nacional mexicano e um poderoso símbolo da tradição indígena.


Arte de Abueloretrowave

fontes:

  • https://www.ancient-origins.net/myths-legends-americas/rise-quetzalcoatl-plumed-serpent-creator-god-008959

  • https://www.worldhistory.org/Quetzalcoatl/
  • Aztec and Maya Myths, de Karl Taube
  • South and Meso-american Mythology A to Z, 2º edição, de Ann Bingham