Como lidar com a intolerância religiosa dentro da própria família?
A intolerância religiosa pode ser entendida como a “atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em reconhecer e respeitar diferenças ou crenças religiosas de terceiros.” Tal atitude, em não sendo bem administrada pelos familiares, leva a inúmeras discussões e ao distanciamento entre os membros daquele grupo familiar.
Na raiz da questão, encontramos o orgulho e o egoísmo, duas grandes chagas da humanidade e que fazem a pessoa acreditar ser possuidora da verdade, do certo e do errado. Quando o outro não pensa ou age como acredita ser o ideal, é duramente criticado.
A criatura precisa, de início, refletir sobre a força que sobreditos sentimentos exercem sobre si e se esforçar para os diminuir, evitando achar-se sempre com razão. Quem age com intolerância religiosa tem dificuldades para lidar com as próprias emoções e a do próximo. Esquece serem as crenças valores formados em virtude das diferentes experiências individuais de cada um e de fatores como educação familiar, vivências sociais, religiosidade, traumas, condição social etc.
Permitir que a formação, as preferências e as experiências pessoais influenciem o nosso entendimento acerca do outro, lamentavelmente, é algo ainda muito comum na humanidade. É mister atentarmos para as palavras de “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, quando ensina que, para os homens, “o orgulho é a catarata que lhes tolda a visão”, sendo necessário combatê-lo fortemente, pois é a causa de todo mal.
Portanto, diante da intolerância religiosa o respeito é essencial. Respeitar não significa concordar com a crença do outro, mas tão somente adotar postura de entendimento às diversidades. O ato de compreender e aceitar as diferenças é, certamente, um dos maiores desafios da humanidade atual.
A Doutrina Espírita, mais uma vez, lança luzes sobre nossas cabeças, ensinando-nos o valor da caridade, do amor e da humildade, conclamando-nos a adquirir inteligência emocional que nos faz compreender o mundo e o outro além de nós mesmos, de uma forma mais ampla. Lembremos do alerta trazido em “O Evangelho Segundo o Espiritismo”, ao asseverar: "Despertai, meus irmãos, meus amigos. Que a voz dos Espíritos ecoe nos vossos corações. Sede generosos e caridosos, sem ostentação, isto é, fazei o bem com humildade. Que cada um proceda pouco a pouco à demolição dos altares que todos ergueram ao orgulho. Numa palavra: sede verdadeiros cristãos e tereis o Reino da Verdade. [...] Quando o Senhor vos der uma manifestação mais retumbante da sua clemência, que o enviado celeste já vos encontre formando uma grande família; que os vossos corações, mansos e humildes, sejam dignos de ouvir a palavra divina que Ele vos vem trazer;"
Precisamos trabalhar em nós a flexibilidade e a tolerância, valores fundamentais para uma convivência pacífica e fraterna entre pessoas que adotam práticas religiosas diferentes, principalmente porque Deus é um só, que ama a todos os Seus filhos, estejam eles seguindo ou não uma religião.
Quando se tem este entendimento, o ato de tolerar torna-se mais fácil, estabelecendo a família limites e princípios a serem respeitados por todos, permitindo uma convivência saudável e amorosa. A intolerância, de outro modo, favorece a adoção de medidas radicais e dificulta qualquer aproximação entre os familiares.
O Espiritismo respeita todas as religiões e defende a liberdade de consciência, consequência natural da liberdade de pensar, patrimônio do homem. Entende que toda crença que incentive e eduque o ser humano a fazer o bem e não o mal é respeitável. A religião, entretanto, não pode ser utilizada como mecanismo de perseguição ou de imposição, pois a crença, quando imposta, não desenvolve os verdadeiros valores do homem, a fé sincera e o amor.
Lembremos das sábias e fraternas palavras do saudoso Chico Xavier que, ao participar do Programa Pinga Fogo, em 1971, da TV Tupi, abordando sobre as religiões e os milagres, destaca que todas as religiões que tornam o homem bom são boas e são instrumentos de ligação do homem com Deus. Disse ele que todos os fenômenos de bondade divina, como o trazido pela igreja católica, considerada por ele como a mãe da nossa civilização, são legítimos e, portanto, credores da nossa veneração, destacando não estarmos separados, os evangélicos-reformistas e os espíritas cristãos, por diferenças fundamentais.
Informa ensinarem os Espíritos que, conquanto estejamos todos em faixas diferentes de interpretação, somos uma família só diante de nosso senhor Jesus Cristo, razão pela qual reverencia o Papa em sua santidade e os eminentes cardeais no Brasil, protetores da nossa fé. Reforça que o homem não pode esquecer este fato e que amava a religião tradicional em tudo o que tem de belo e de divino, mesmo que se seguisse na faixa do Espiritismo cristão, dentro das conceituações de Allan Kardec, em virtude de a mediunidade tê-lo chamado para este campo de trabalho, também profundamente cristão.
Chico assevera que a religião é sempre boa quando fundada nos princípios do bem, pois torna os homens bons e é um processo de ligação com as forças divinas que emanam de Deus. Todas as religiões que objetivam o burilamento da criatura humana trazem paz e amor autênticos, sem nenhuma ofensa ou desconsideração para ninguém, sendo um caminho santo que os espíritas cristãos respeitam e devem respeitar sempre mais.
É exatamente este sentimento de fraternidade e irmandade entre as religiões que deve existir, todos nós devemos procurar viver em paz, trabalhando pelo crescimento da humanidade, fundamentada no amor e na vivência do Evangelho de Jesus. O Espiritismo relaciona-se com as demais religiões de modo tranquilo, sereno e com muito respeito, pois entende que assim como o Espiritismo pode levar, a depender do seu uso, as pessoas ao “céu” ou ao “inferno”, é dizer, a terem nos planos físico e espiritual uma vida feliz ou de sofrimento e dor, as demais religiões também podem. Tudo dependerá de como elas irão pensar e agir após estudar e praticar essas religiões.
O Espiritismo é uma doutrina sempre aberta à convivência e ao diálogo com as outras crenças religiosas, baseando-se numa compreensão ampliada dos ensinamentos morais de Jesus Cristo e nas Leis Naturais esclarecidas por Kardec. O essencial não é seguir uma religião ou outra, mas entendendo as Leis Naturais de Deus, agir de forma ética e moral, fundamentando-se nos princípios de igualdade, fraternidade, justiça e amor ao próximo, conforme tão bem apresentados e vivenciados por Jesus Cristo.
Caso a intolerância religiosa seja muito forte no âmbito familiar, a melhor atitude da criatura deve ser o silêncio. Aqueles que têm real convicção de suas crenças não precisam alardeá-la aos outros, mas apenas ao seu próprio coração. Muito mais importante que falar das crenças é vivenciá-las pelo exemplo. O silêncio evita discussões, acalma os ânimos, mantém a paz e o respeito familiar.
Confiemos e esperemos em Deus. Não existe “ex-Pai”! Não há intolerância religiosa que se sobreponha a Sua vontade. Jesus não tinha religião ou igreja e distribuiu o seu amor por toda a humanidade, indistinta- mente. Façamos o mesmo, renovemos o nosso coração, vivamos o Evangelho e façamos dele a nossa fala, a nossa fé e a nossa pregação. O Mestre estará conosco!